ACÓRDÃO Nº 35/10 17.Dez.2010/1ªS/PL
RECURSO ORDINÁRIO Nº 6/2010
(Processo nº 1825/2009)
DESCRITORES
1. Contratação interna ou contratação in house.
2. Jurisprudência comunitária.
3. Administração regional de saúde.
4. Serviço de Utilização Comum dos Hospitais (SUCH).
SUMÁRIO
1. A doutrina constante dos Pareceres n.º 1/95 e 145/2001 emitidos pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República no sentido de que os contratos que contemplam a prestação de serviços pelo Serviço de Utilização Comum dos Hospitais (SUCH) aos seus associados não se encontram submetidos às normas sobre contratação pública, não podem considerar-se actuais face aos estatutos daquela associação em vigor a partir de 2006 e ao que actualmente dispõe o Código da Contratação Pública e face à evolução ocorrida no direito e jurisprudência na Comunidade Europeia, em matéria de contratação in house.
2. No que respeita aos estatutos, assistiu-se a uma evolução no sentido de uma diminuição dos poderes de intervenção do Estado e a um correspondente reforço dos poderes exercidos pela Assembleia Geral e, portanto, dos que nela participam (entes públicos e entes não públicos). O SUCH passou ainda a ter como finalidade a constituição de unidades de serviços partilhados, sob a forma de unidades orgânicas suas, ou sob a forma de pessoas colectivas integradas por si e por seus associados e ou por terceiras entidades. O SUCH passou assim a incluir o complexo de entidades que, à sombra dos estatutos, podem ser criadas sob qualquer forma e para as quais, ao abrigo de disposições protocolares são transmitidas decisões de adjudicação que inicialmente lhe são feitas directamente.
3. Face à jurisprudência comunitária, entende-se que na verificação do requisito do "controlo análogo" a que se refere a alínea a) do nº 2 do artigo 5º do Código dos Contratos Públicos deve, designadamente, observar-se o seguinte:
a) O controlo pode ser exercido pelo conjunto de entidades públicas/adjudicantes que, de alguma forma, participam na (ou controlam a) entidade adjudicatária do contrato, não tendo que ser exercido só pela entidade pública adjudicante;
b) O controlo exercido pela entidade adjudicante, ou pelo conjunto das entidades públicas/adjudicantes, sobre a entidade adjudicatária deve revelar que esta pode ser considerada uma "estrutura de gestão interna de um serviço público";
c) O reconhecimento do requisito deve ser o resultado de uma interpretação estrita, cabendo o ónus da prova da sua existência a quem o invoque;
d) Nessa interpretação estrita deve ter-se em conta todas as disposições legislativas e circunstâncias pertinentes;
e) De entre as circunstâncias pertinentes a ter em conta cumpre considerar, designadamente, a detenção do capital da entidade adjudicatária, a composição dos órgãos de decisão desta e a extensão dos poderes reconhecidos ao seu conselho de administração;
f) A participação, ainda que minoritária, de capitais privados na entidade adjudicatária do contrato exclui de qualquer forma que a entidade adjudicante possa exercer sobre aquela um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços. Mas a circunstância de a entidade adjudicante deter, isolada ou em conjunto com outros poderes públicos, a totalidade do capital da entidade adjudicatária tende só a indicar, sem ser portanto decisiva, que esta entidade adjudicante exerce sobre a adjudicatária um controlo análogo ao que exerce sobre os próprios serviços.
4. Se a não aplicação dos procedimentos concorrenciais deve ser objecto de interpretação estrita quando estão em causa relações contratuais entre entes públicos, o mesmo tipo de interpretação deve ser feita, a fortiori ratione, quando estão em causa entes públicos e não públicos, como é o caso do SUCH que, sendo uma pessoa colectiva de utilidade pública administrativa, tem sido considerado pela doutrina dominante como pessoa colectiva de direito privado.
5. A natureza associativa do SUCH é pouco relevante para se aferir sobre se existe controlo análogo sobre ele exercido pela entidade adjudicante ou pelo conjunto das entidades adjudicantes.
6. A natureza dos associados do SUCH - entidades públicas e não públicas, designadamente as IPSS, em particular as santas casas da misericórdia, canonicamente erectas e com a autonomia que legalmente lhes está reconhecida - não milita a favor de se considerar que as relações entre a entidade adjudicante e o SUCH sejam análogas à que aquela estabelece com os seus serviços. Assim, se no caso da relação entre entidades públicas adjudicantes e sociedades comerciais adjudicatárias com capitais não integralmente públicos, nas quais aquelas participem, este facto é um indício de que se não está perante uma situação de controlo análogo, o facto de o SUCH ser uma associação privada com associados com larga autonomia e independência face aos poderes públicos é igualmente indício de que se não está perante uma situação de controlo análogo.
7. No protocolo em causa, a prestação dos serviços que constituem o seu objecto pode ser cometida pelo SUCH a entidades terceiras constituídas sob qualquer modalidade jurídica, mediante simples comunicação à entidade adjudicante, desde que nelas o SUCH detenha "participação maioritária, controlo de gestão e dos respectivos órgãos de administração". Assim, por via daquelas disposições, a aquisição pública de bens e serviços ultrapassa definitivamente o perímetro legalmente estabelecido em que são admitidas soluções não concorrenciais.
8. Os associados públicos e não públicos do SUCH exercem os seus direitos em assembleia geral, nelas se aprovando e apreciando os planos estratégicos e de actividades do SUCH, o relatório e contas anuais e a gestão do SUCH, se elegendo a sua mesa, a maioria dos membros do conselho de administração e a totalidade dos membros do conselho fiscal. Ora o resultado dessas votações não poderá deixar de atender às especificidades das entidades não públicas associadas. A participação não negligenciável daquelas concretas entidades não públicas nestas decisões é mais um indício de que na relação entre a entidade adjudicante e o SUCH, ainda que em conjunto com as demais entidades públicas associadas, aquela se não pode comportar relativamente a este de forma análoga à que faz com os seus próprios serviços.
9. O SUCH é uma organização empresarial sofisticada, que conjuga meios próprios com parcerias de negócio, nas quais participam empresas privadas de carácter puramente mercantil e que, necessariamente, tem de desenvolver com autonomia as suas actividades. O modelo organizativo que o SUCH atingiu e a actividade desenvolvida dificilmente se compaginam com a tradicional visão de um instrumento de pura "cooperação e interajuda", de "colocação em comum de meios para a obtenção de directas vantagens comuns, dentro do mesmo círculo pessoal dos associados". A sofisticação empresarial atingida pelo SUCH é incompatível com a sua redução a um "prolongamento administrativo" dos associados, nos quais se contam, como se viu, entidades não públicas.
10. A criação da SPMS, Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, EPE, não altera a solução constante do protocolo: o SUCH mantém-se como adjudicatário, mantém-se a cláusula que permite o deferimento da prestação de serviços a qualquer entidade, não foi produzida prova de que a posição contratual do SUCH se tenha antes transmitido a ACE, nem há prova de que, se porventura isso aconteceu, a posição contratual se tenha transmitido à SPMS. E a extinção do ACE Somos Contas, particularmente em foco neste processo, não está expressamente determinada na lei.
Lisboa, 17 Dezembro de 2010
O Juiz Conselheiro - (João Figueiredo)
ACÓRDÃO Nº35/10 17.Dez.2010/1ª S/PL
Recurso Ordinário nº 6/2010
(Processo nº 1825/2009)
I - RELATÓRIO
1. A Administração Regional de Saúde do Norte, I.P. (doravante designada por ARS Norte ou ARSN), inconformada com o Acórdão nº 6/2010-25.FEV.-1ªS/SS que, no acima referido processo, recusou o visto ao "Protocolo de Adesão ao Centro de Processamento de Contabilidade e Finanças" (doravante designado por protocolo), celebrado em 1 de Setembro de 2009 com o SUCH - Serviço de Utilização Comum dos Hospitais (doravante designado por SUCH), veio dele interpor recurso.
2. A recusa de visto fundamentou-se na alínea a) do n.º 3 do artigo 44º da LOPTC (1).
3. A decisão recorrida baseou-se, nos seus aspectos essenciais, nos seguintes fundamentos:
a) Em face do disposto no nº 2, do artigo 5º, do CCP (2), da jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e dos princípios que enformam as regras de contratação pública, em especial o da concorrência, não pode considerar-se que a relação entre o SUCH e os seus associados públicos seja uma relação "interna", equiparada à que é por estes estabelecida com os seus próprios serviços;
b) Consequentemente, não pode afirmar-se que a ARSN, IP exerce, por si ou conjuntamente com as demais entidades públicas associadas, sobre o SUCH, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços;
c) Daí que não possa aplicar-se, ao caso presente, a excepção prevista no artigo 5.º, n.º 2, al. a), do CCP;
d) Não podendo aplicar-se ao caso sub judice tal excepção, e porque, por outro lado, não foi estabelecido a favor do SUCH qualquer direito exclusivo de prestação dos serviços em causa (vide artigo 5º, nº4, al. a) do CCP), não se mostra existir qualquer outra excepção à aplicação das regras da contratação pública;
e) Ora, considerando:
- que o Protocolo, em causa, é um contrato público de aquisição de serviços;
- que a contratação foi efectuada após a entrada em vigor do CCP;
- que o contrato foi celebrado por um instituto público e é de valor superior ao referido na alínea b) do artigo 7.º da Directiva n.º 2004/18/CE (3);
- que o contrato não está abrangido por qualquer excepção à aplicação do regime da contratação pública, é-lhe aplicável o CCP, incluindo a sua parte II, nos termos do disposto nos artigos 1.º, n.º 2, 2.º, n.º 2, alínea a), e 5.º, n.º 3, alínea b), do referido Código;
f) Assim, e de acordo com o estipulado no artigo 20.º, n.º 1, alínea b), do mesmo Código, o contrato deveria ter sido precedido de concurso público ou de concurso limitado por prévia qualificação, com publicação dos respectivos anúncios no Jornal Oficial da União Europeia;
g) Não tendo sido realizado nenhum destes procedimentos, resulta desta norma legal que o contrato não podia ter sido celebrado;
h) A ausência do concurso, obrigatório no caso, implica a falta de um elemento essencial da adjudicação, o que determina a respectiva nulidade, nos termos do artigo 133.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, como tem sido entendimento uniforme deste Tribunal;
i) Esta nulidade, que pode ser declarada a todo o tempo, origina a nulidade do contrato, nos termos do estabelecido no artigo 283.º, n.º 1, do CCP.
4. Na sua petição de recurso que aqui se dá por integralmente reproduzida, a ARSN, apresenta as seguintes conclusões:
"1. No ACÓRDÃO de que ora se recorre, o Tribunal de Contas veio recusar o visto ao PROTOCOLO, com o fundamento de que "não pode (...) considerar-se que a relação entre o SUCH e os seus associados públicos e, em particular, entre o SUCH e a RECORRENTE, seja uma relação «interna»", pelo que não poderia "aplicar-se ao caso a excepção prevista no artigo 5.º, n.º 2, do Código".
2. O ACÓRDÃO recorrido padece, porém, de diversos erros de julgamento, quer de facto quer de direito, revelando-se consequentemente ilegal a decisão final aí proferida.
3. Desde logo, cumpre impugnar, ao abrigo do disposto no artigo 685.º-B do CPC, e por não ter total correspondência com a verdade, ou por não ter o efeito jurídico pretendido pelo Tribunal com a sua invocação, a matéria alegada nas alíneas I), Q), R), W) OO), NN) do Capítulo II ("Matéria de Facto"), bem como os factos ou a interpretação dos mesmos constantes da páginas 39 e 55 do Capítulo III ("O Direito"), todos do ACÓRDÃO.
4. Mais! Tendo por base a factualidade invocada, na presente sede, pela RECORRENTE, verifica-se que o PROTOCOLO foi outorgado em termos e condições que asseguraram o estrito cumprimento da lei.
5. Na verdade, a ora RECORRENTE limitou-se a actuar em conformidade com a doutrina constante dos Pareceres n.º 1/95 e 145/2001 emitidos pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República no sentido de que os serviços prestados pelo SUCH aos seus associados - ou melhor, os contratos que contemplam a realização de tais serviços - não se encontram submetidos às normas sobre contratação pública.
6. Contrariamente ao defendido no ACÓRDÃO, os mencionados pareceres mantêm-se, hoje em dia, plenamente actuais e válidos.
7. A este respeito, cumpre realçar que não ocorreram quaisquer alterações significativas, ao nível das relações entre o SUCH e os seus associados, que coloquem em crise a visão do primeiro como instrumento de pura cooperação. Com efeito, a única alteração assinalável foi a perda do controlo directo exercido pelo Estado, em virtude do enfraquecimento dos poderes de tutela do Ministério da Saúde, sendo esse controlo agora assegurado, em homenagem ao princípio constitucional da descentralização administrativa (na modalidade de devolução de poderes administrativos), pela maioria dos seus associados, integrados na administração indirecta do Estado, pelo que a alteração dos Estatutos do SUCH é assim irrelevante, mantendo-se a natureza do SUCH como instrumento de auto-satisfação das necessidades dos seus associados.
8. Por outro lado, as principais áreas de actuação do SUCH reportam-se a actividades para as quais não existem entidades a operar no mercado, sendo, concretamente, exemplo disso, a implementação do Centro de Processamento de Contabilidade e Finanças, objecto do presente PROTOCOLO, justificando-se, nessa medida, a existência do SUCH para colmatar falhas de mercado.
9. Quanto à alegada existência de capital privado e irrelevância da forma associativa, importa considerar que o risco associado pela jurisprudência comunitária à existência de capital privado nos entes quase internos da Administração - concretamente, a respectiva sujeição a considerações inerentes a interesses privados - encontra-se afastado pela própria natureza do SUCH (pessoa colectiva de natureza associativa sem fins lucrativos) e, bem assim, pelo carácter altruístico e comum dos objectivos visados por todos os seus associados com a respectiva integração nessa associação: pura e simplesmente assegurar, de forma adequada e eficiente, a auto-satisfação das respectivas necessidades.
10. A situação vertente apresenta, pois, contornos particulares, em razão da especial configuração do SUCH enquanto pessoa colectiva de natureza associativa, caracterizada, enquanto tal, pela prevalência do elemento pessoal, pela prossecução de fins não lucrativos, pela intransmissibilidade das participações sociais e pela não distribuição de dividendos.
11. A posição contrária à defendida pelo Tribunal de Contas encontra, aliás, apoio no entendimento recentemente advogado pelo TJCE nos acórdãos Coditel e Comissão/Alemanha, proferidos, respectivamente, em 9 de Junho de 2009 e 13 de Novembro de 2008 (Procs. n.º C-324/07 e 480/06). Assim, no primeiro acórdão, a respeito da aferição do requisito do «controlo análogo», o TJCE entendeu necessário sublinhar e relevar a circunstância de o adjudicatário em questão consistir numa entidade que "está constituída, não sob a forma de uma sociedade por acções ou de uma sociedade anónima susceptível de prosseguir objectivos independentemente dos seus accionistas, mas sob a forma de uma sociedade cooperativa intermunicipal regida pela lei relativa às associações intermunicipais". Com base nesta circunstância, o Tribunal afirmou que o adjudicatário "tem por objectivo estatutário a realização da missão de interesse municipal para o cumprimento da qual foi criada e que não possui qualquer interesse distinto do das autoridades públicas que lhe estão associadas", o que permitiu comprovar o preenchimento do requisito do «controlo análogo».
12. Nesta medida, à luz da jurisprudência comunitária, não corresponde à verdade a afirmação constante no ACÓRDÃO de que a natureza associativa do SUCH não constitui uma circunstância determinante para a aferição do requisito de «controlo análogo».
13. Ademais, importa ainda referir que as instituições particulares de solidariedade social não se inserem nem no sector público nem no sector privado, integrando, por força do disposto no n.º 4 do artigo 82.º da Constituição, uma terceira categoria: o sector cooperativo e social. Ora, quando o TJCE refere a rejeição do controlo análogo sempre que existirem participações privadas não pretende abranger o caso das participações detidas por entidades cooperativas e sociais - que, como se viu, constituem um sector distinto, reconhecido e protegido pela própria Constituição (cfr. artigo 82.º).
14. Também não se afigura legítimo afirmar que as duas sociedades anónimas que assumem a qualidade de associados do SUCH - CESPU, SERVIÇOS DE SAÚDE, S.A. e o HOSPITAL DOS LUSÍADAS -- consubstanciem entidades materialmente privadas.
15. Daqui resulta, em síntese, que, ao contrário do que é assumido pelo Tribunal de Contas, o SUCH não integra, hoje em dia, qualquer associado privado, isto é, qualquer entidade inserida no sector privado da economia, na acepção constitucionalmente relevante do mesmo. Pelo que as participações no substrato pessoal do SUCH de instituições particulares de solidariedade social e de sociedades anónimas não podem, no caso em apreço, ser consideradas participações privadas, não existindo, assim qualquer obstáculo à verificação do requisito de «controlo análogo.
16. No que tange, por seu turno, à (alegada) exigência de que o SUCH seja exclusivamente composto por entidades adjudicantes, o n.º 2 do artigo 5.º do CCP é absolutamente lapidar: basta, para que haja «controlo análogo», que entidades adjudicantes, isoladamente ou em conjunto com outras entidades adjudicantes - no caso, as entidades integradas na administração indirecta do Estado e que exercem a sua actividade no sector da saúde, estando, portanto, submetidas a poderes de tutela e de superintendência do ministro que tutela este sector -, exerçam sobre o SUCH um «controlo análogo».
17. Nesta medida, não pode, pois, proceder o argumento de que a verificação do requisito de «controlo análogo» depende, sempre e em qualquer caso, da entidade adjudicatária ser exclusivamente composta por entidades adjudicantes, bastando, para tanto, que as entidades que não assumam essa natureza não disponham do controlo ou não impeçam o «controlo análogo» pelas entidades adjudicantes.
18. Relativamente à questão da participação do SUCH em ACE'S, cabe referir que a detenção por parte do SUCH de participações noutras entidades - nomeadamente, sob a forma de agrupamentos complementares de empresas - não tem quaisquer implicações no controlo que, no quadro dessa associação e, em particular, no âmbito da formação das suas decisões, é exercido pelo conjunto das entidades adjudicantes que a compõem.
19. Em todo o caso, importa salientar que, na presente data, foi publicado o Decreto-Lei n.º 19/2010, de 22 de Março, que cria a empresa pública SPMS - SERVIÇOS PARTILHADOS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, E.P.E., detida integralmente pelo Estado, e que sucede nas atribuições dos agrupamentos complementares de empresas, criados e participados pelo SUCH, que, nessa medida, se extinguem. Assim sendo, dada a publicação do diploma acima referido, perde razão de ser a linha de argumentação expendida pelo Tribunal de Contas, na parte em que se refere à questão do SOMOS CONTAS, ACE, como constituindo um obstáculo à verificação da relação in house entre a RECORRENTE e o SUCH, devendo toda a parte do ACÓRDÃO respeitante aos agrupamentos complementares de empresas dar-se por não escrita.
20. Noutro plano, em face do quadro legal e estatutário que serve de base ao exercício da respectiva actividade, é possível depreender a afectação do SUCH à prossecução de fins que coincidem com atribuições particularmente importantes da Administração, atribuições essas cometidas ao conjunto de entidades que integram o seu substrato pessoal, não procedendo, pois, o argumento da falta de imposição administrativa da entidade adjudicante, como obstando ao exercício de «controlo análogo».
21. Nesta conformidade, à luz das considerações expostas e da evolução da jurisprudência comunitária, considera-se suficientemente comprovado o preenchimento dos requisitos de que depende a aplicação da excepção prevista no artigo 5.º, n.º 2, do CCP para os contratos celebrados no quadro de relações in house."
5. E a petição termina requerendo que deve ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, concedido o visto ao "Protocolo de Adesão ao Centro de Processamento de Contabilidade e Finanças", celebrado entre a ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DE SAÚDE DO NORTE, I.P. e o SUCH - SERVIÇO DE UTILIZAÇÃO COMUM DOS HOSPITAIS, por não se verificarem os fundamentos que levaram à respectiva recusa.
6. O Ministério Público pronunciou-se pela improcedência do recurso, assim fundamentando o seu parecer:
"(...) o modelo organizativo estatutário e a actividade desenvolvida pelo SUCH, não permitem qualificá-lo como um instrumento de pura cooperação e inter-ajuda para auto-satisfação das necessidades dos associados e, consequentemente, que a entidade adjudicante exerça sobre a sua actividade, isolada ou conjuntamente, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços, como exige a lei (art. 5º, nº 2 do CCP), o que inviabiliza a aplicação da excepção aos princípios do regime da contratação pública.
Acresce, como resulta demonstrado no douto acórdão em recurso, que o estatuto e regime do SUCH sofreram modificações que reforçam a sua vertente associativa e privada, passando a ter como objectivo a iniciativa de constituir unidades de serviços partilhados sob a forma de unidades orgânicas suas, ou sob a forma de pessoas colectivas integradas por si e por seus associados e/ou por terceiras entidades.
Daí decorre que, sempre que um associado proceda a uma adjudicação ao SUCH de um contrato em matéria de serviços partilhados, o SUCH pode assumir directamente a respectiva execução ou transmiti-la a terceiro, seja qual for a natureza deste último (artº. 3º, nº. 2, dos Estatutos).
E com esta faculdade de transmissão a terceiros, indiferenciadamente, se mostram frustrados os objectivos da contratação pública e, consequentemente, os princípios da transparência, igualdade e concorrência.
Relativamente à alteração legislativa introduzida pelo DL 19/2010, de 22/03, com a criação da S.P.M.S.-E.P.E., diploma cujo teor não prima pela clareza e coerência, não se alcança que a mesma tenha vindo alterar substancialmente as questões que se debateram na decisão recorrida, posto que o SUCH continua a figurar como adjudicatário do contrato, mantendo, no essencial, a mesma natureza, atribuições e modelo estatutário.
Com efeito, as alterações a nível dos agrupamentos complementar de empresas reflectem-se, basicamente, para o que aqui interessa considerar, na "previsão" de extinção da empresa "Somos Compras", e na transmissão das posições jurídicas dos três agrupamentos: "Somos Compras", "Somos Contas" e "Somos Pessoas".
As posições jurídicas do próprio SUCH parecem não sofrer qualquer alteração.
Por outro lado, mantém-se a possibilidade de constituição de unidades de serviços partilhadas para a prestação da generalidade dos serviços de cuidados de saúde, nos termos amplamente permitidos pelo nº. 3, do artº. 2º, dos respectivos Estatutos. Subsistem, por conseguinte e a nosso ver, as razões que motivaram a decisão em recurso.
Em suma: a alteração legislativa não teve reflexos na relação jurídica contratual em causa, pelo que, mantendo-se a validade dos motivos que constituem a base da douta Decisão que considerou não verificados os requisitos que permitiriam a aplicação da excepção prevista no artº. 5º, nº. 2, do CCP, deve a mesma ser confirmada julgando-se improcedente o presente recurso".
7. Foram colhidos os vistos legais.
II - FUNDAMENTAÇÃO
8. Como resulta das conclusões, a petição de recurso impugna a decisão recorrida em alguns dos aspectos da matéria de facto dada como assente e em questões de direito. Comecemos por apreciar as questões referidas como controversas na matéria de facto.
II.A - AS QUESTÕES DE FACTO
9. Refere-se no acórdão recorrido (4): "A fls. 10 do Anexo I ao PROTOCOLO, verifica-se que são as seguintes as responsabilidades do SUCH, C.P.C.F., ACE: (...)".
A entidade recorrente rebate tal facto afirmando: "(...) cumpre recordar que - conforme o SUCH teve a oportunidade de esclarecer no Ofício n.º 100, de 18 de Janeiro de 2010, em anexo ao Ofício n.º 02666 da ora RECORRENTE, de 19 de Janeiro de 2010, a fls. ... dos autos - a referência contida na referida folha do Anexo I do PROTOCOLO configura um mero lapso de escrita, uma vez que não existe qualquer agrupamento complementar de empresas com aquela denominação, nem a unidade operacional a que se refere o PROTOCOLO reveste semelhante natureza, uma vez que se trata do Centro de Processamento de Contabilidade e Finanças, pelo que onde se lê "SUCH C.P.C.F., ACE" deve ler-se apenas "SUCH C.P.C.F."."
Acolhe-se o reparo formulado pela recorrente nesta matéria, considerando-se que a referência a ACE se reduz a um lapso de escrita. Contudo, deve sublinhar-se que tal facto agora impugnado e cuja correcção é aceite não tem relevância na fundamentação da decisão recorrida. E também não a terá na presente.
10. Refere-se no acórdão recorrido (5): "O SUCH tem 138 associados, entre os quais se contam serviços simples do Estado, Institutos Públicos, Entidades Públicas Empresariais, Instituições Particulares de Solidariedade Social, Pessoas Colectivas de Direito Privado e Utilidade Pública Administrativa e duas sociedades anónimas ("CESPU, SA" e o Hospital dos Lusíadas)", sendo o capital da primeira sociedade integralmente detido pela -CESPU - Cooperativa de Ensino Superior, Politécnico e Universitário, CRL".
A entidade recorrente impugna esses factos afirmando: "(...) quanto à afirmação de que o SUCH tem 138 associados, sendo a ARS Norte, IP um desses 138 associados [cfr. alíneas Q) e R) do Capítulo II do ACÓRDÃO], importa salientar que o SUCH tem, na verdade, apenas 99 associados, correspondendo o número 138 ao cômputo total dos votos detidos por esses associados em sede de Assembleia-Geral. (...) Por seu turno, é possível verificar que, a respeito das sociedades anónimas que segundo a alínea Q) do Capítulo II do ACÓRDÃO integram o SUCH, o ACÓRDÃO vem referir que uma delas, mais concretamente, a CESPU, SA., é integralmente detida pela "CESPU - Cooperativa de Ensino Superior, Politécnico e Universitário, CRL" (cfr. nota de rodapé n.º 4 do ACÓRDÃO). (...) O mesmo Acórdão esquece-se, contudo, de mencionar que - conforme o SUCH teve igualmente a oportunidade de esclarecer (cfr. Anexo IV ao mencionado Ofício do SUCH de 18 de Janeiro de 2010, a fls. ... dos autos) a outra sociedade anónima aí identificada, ou seja, o Hospital dos Lusíadas, é detido, na sua totalidade, pela CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, que, por sua vez, representa uma empresa pública integralmente detida pelo Estado".
Acolhem-se igualmente estas observações feitas pela recorrente (6). Assim, deve ter-se em conta que o SUCH tem 99 associados, correspondendo o número 138 ao cômputo total dos votos detidos por esses associados em sede de Assembleia-Geral.
Quanto ao Hospital dos Lusíadas, manda o rigor que se diga (7) que a HPP Lusíadas, SA, tem capital detido a 100% pela Hospitais Privados de Portugal, SGPS, SA, cujo capital é detido a 100% pela Fidelidade Mundial, a qual é detida também a 100% pela Caixa Geral de Depósitos. Deve pois igualmente ter-se em conta este facto.
11. Refere-se no acórdão recorrido (8): "O número de votos de cada associado na Assembleia-Geral é determinado pelo valor percentual dos serviços adquiridos relativamente à facturação total do SUCH".
Quanto a esse facto a entidade recorrente diz: "(...) importa referir que este facto se afigura parcialmente incorrecto. Na verdade, de acordo com o disposto no artigo 14.º, n.º 6, dos Estatutos do SUCH:
"Tendo como referência os quantitativos do ano anterior, o número de votos de cada associado é determinado pelo valor percentual dos serviços adquiridos relativamente à facturação total do SUCH, nos seguintes termos:
a) um voto como mínimo;
b) dois votos para uma percentagem pelo menos igual a 1%;
c) três votos para uma percentagem igual ou superior a 3%;
d) quatro votos para uma percentagem igual ou superior a 5%;
e) cinco votos para uma percentagem igual ou superior a 10%;
f) seis votos para uma percentagem igual ou superior a 15%".
Assim, nos termos do citado normativo, o número de votos de cada associado é determinado em função do valor percentual dos serviços adquiridos no ano anterior, mas entre um mínimo de um voto e o máximo de seis votos.
Daqui resulta, desde logo, que a afirmação que "o número de votos de cada associado na Assembleia-Geral é determinado pelo valor percentual dos serviços adquiridos relativamente à facturação total do SUCH" não corresponde totalmente à verdade, uma vez que tal número de votos também se encontra balizado por um limite mínimo correspondente a 1 e por um limite máximo correspondente a 6, (...) não se encontrando, desse modo, simplesmente dependente do valor percentual dos serviços adquiridos relativamente à facturação total do SUCH. Isto é relevante na medida em que permite demonstrar a inexistência de grandes discrepâncias ao nível da representatividade de cada um dos associados em sede de Assembleia-Geral. Assim, a título meramente exemplificativo e hipotético, veja-se que mesmo que um associado adquira serviços ao SUCH num valor superior a 15% da facturação deste último nunca poderá ter um número de votos superior a 6. Não corresponde, assim, inteiramente à verdade o facto dado como assente pelo Tribunal de Contas de que o número de votos é apurado (apenas) em função do valor percentual dos serviços adquiridos relativamente à facturação total do SUCH, - razão pela qual se impugna (parcialmente) este facto".
Analisados os estatutos do SUCH deve reconhecer-se que colhe a argumentação que fundamenta a impugnação parcial deste facto, devendo ser corrigido.
12. Refere-se no acórdão recorrido (9) que, em 31 de Dezembro de 2008, o valor facturado a associados do SUCH cifrou-se em €75.438.058,33 e a não associados correspondeu a €12.266.042,64 (representando este, portanto, 16,25% do total da facturação)".
Quanto a esse facto a entidade recorrente diz: "(...) contrariamente ao que se refere na alínea OO) do Capítulo II do ACÓRDÃO, no que respeita ao ano de 2008, o volume de facturação correspondente a serviços prestados a entes não associados do SUCH perfez o valor total de € 7.340.225,02, e não de € 12.266.042,64. Os serviços prestados a não associados do SUCH representam, assim, apenas 8,36% da sua facturação global, em vez de 16,25%, conforme decorreria do mencionado ponto do ACÓRDÃO (...) sendo este facto demonstrativo da falta de vocação de mercado do SUCH. Em contrapartida, e sempre por referência ao ano de 2008, o volume de facturação respeitante a serviços prestados aos associados do SUCH ascendeu a € 80.464.853,47 o que representa 91,6% do volume total de negócios desse mesmo ano (...) revelando-se, assim, igualmente incorrecto o valor indicado na alínea OO) do Capítulo II do ACÓRDÃO (€75.438.058,33, correspondentes a 83,75%).Os dados que ora se apresentam encontram-se comprovados nos elementos constantes dos Anexos V e VI ao Ofício do SUCH de 18 de Janeiro de 2010, junto aos presentes autos por Ofício n.º 02666 da ora RECORRENTE, de 19 de Janeiro. Por aqui se vê, de resto, que não correspondem à verdade as considerações tecidas pelo Tribunal de Contas a propósito da crescente natureza empresarial e postura de mercado do SUCH nos últimos anos, as quais o ACÓRDÃO tenta suportar com a afirmação de que "como se referiu na alínea OO) do probatório, uma parte relevante da facturação do SUCH em 2008 respeitou a entidades não associadas do mesmo (12.266.042,64€)" - cfr. página 39. Face ao exposto, cumpre, assim, impugnar o ACÓRDÃO, na parte em que dá como assente o facto segundo o qual, no ano de 2008, o valor facturado a associados do SUCH cifrou-se em €75.438.058,33 e a não associados correspondeu a €12.266.042,64 (representando este, portanto, 16,25% do total da facturação) (cfr. alínea OO) do Capítulo II do ACÓRDÃO)".
Os referidos anexos V e VI - com base nos quais a entidade recorrente diz poderem ser comprovados os valores agora por ela indicados - são listagens de facturação a clientes do SUCH em 2008 e um resumo dessa facturação. Seguindo um determinado critério de análise dessas listagens, seria possível obter os valores referidos na decisão recorrida. Seguindo outro - o que terá agora sido usado pela entidade recorrente e que também não é explicitado - será possível obter os valores que agora são apresentados.
Dado que tais factos não são relevantes para a presente decisão, decide-se retirar tais dados da matéria de facto dada como assente e ignorá-los como fundamentação.
13. Refere-se no acórdão recorrido (10): "Em documento publicitado pelo SUCH onze dias após a celebração do PROTOCOLO, diz-se que" o SUCH irá prestar (...) Serviços Partilhados de Processamento de Contabilidade e Finanças, área operacionalizada através do SOMOS CONTAS, que actua como um Centro de Serviços Partilhados em Gestão Financeira (...) O Centro de Processamento de Contabilidade e Finanças do SUCH, operado pelo SOMOS CONTAS, passará a desenvolver em Castelo Branco dois dos processos inerentes aos serviços, nomeadamente "Contas a Pagar" e "Contabilidade Geral", enquanto Lisboa assegura os processos de "Contas a receber" e "Controlo de gestão".
Quanto a esse facto a entidade recorrente diz: "No que concerne aos factos alegadamente respeitantes ao teor de um comunicado publicitado pelo SUCH em 12 de Setembro de 2009 [cfr. alínea NN) do Capítulo II e nota de rodapé n.º 15 do ACÓRDÃO], pretende o ACÓRDÃO demonstrar a intenção do SUCH em ceder a administração e gestão do Centro de Processamento de Contabilidade e Finanças, objecto do PROTOCOLO, ao agrupamento complementar de empresas denominado SOMOS CONTAS, ACE. Isto significa que, através do excerto enunciado do Comunicado do SUCH, de 12 de Setembro de 2009 - e a expressa referência ao facto de o mesmo ter sido emitido onze dias após a celebração do PROTOCOLO -, pretende o ACÓRDÃO demonstrar que a cedência da posição contratual do SUCH para o SOMOS CONTAS, ACE não representaria uma mera possibilidade, mas antes uma realidade certa e incontornável. Sucede, porém, que, para chegar a tal consideração, o Tribunal de Contas interpreta erradamente a referência ao "SOMOS CONTAS", entendendo que a mesma se reporta ao "SOMOS CONTAS, ACE", quando, na realidade, o que consta do referido Comunicado é (apenas) SOMOS CONTAS, reportando-se, por isso, à unidade de serviços partilhados (11) do próprio SUCH e não ao referido agrupamento complementar de empresas. Com efeito, a designação de "SOMOS CONTAS" corresponde à identificação de uma das áreas de negócios (12) em que o SUCH actua, respeitante, em concreto, aos serviços partilhados de contabilidade e gestão financeira. A título exemplificativo, veja-se que, à semelhança do "SOMOS CONTAS", existe a unidade de serviços partilhados "SOMOS PESSOAS", que não se confunde com o respectivo ACE criado para nela poder actuar, designado por "SOMOS PESSOAS, ACE". Atento o sobredito, referindo-se o comunicado (literalmente) à área de negócios (13) "SOMOS CONTAS", não pode o ACÓRDÃO pretender retirar do conteúdo do mesmo o efeito de que a execução dos serviços objecto do PROTOCOLO seria cometida ao "SOMOS CONTAS, ACE". Tal como foi afirmado no Ofício n.º 001230, de 29 de Outubro de 2009, do SUCH, anexo ao Ofício da ora RECORRENTE, de 18 de Novembro de 2009 (Refer.ª n.º CD 0277), a fls. 10 e seguintes dos autos, a prestação dos serviços no âmbito da unidade de negócios (14) SOMOS CONTAS poderia ou não ser assumida parcialmente pelo SOMOS CONTAS, ACE (...) tendo o SUCH manifestado, desse modo, total abertura para excluir a possibilidade de participação do SOMOS CONTAS, ACE na execução do PROTOCOLO, caso o Tribunal de Contas, concedendo visto, recomendasse nesse sentido".
Vejamos estas alegações. Não é contestado o facto do referido comunicado ter sido emitido, nos termos em que foi invocado na decisão recorrida. Contesta-se sim a interpretação que se diz o acórdão fazer daquele facto. Assim, a decisão recorrida daria a entender, com base em tal comunicado, que a execução dos serviços objecto do protocolo seria deferida ao "Somos Contas, ACE". E argumenta-se que afinal o "Somos Contas" a que se refere o comunicado não é o "Somos Contas, ACE", mas o "Somos Contas" simplesmente, ora considerado como área de negócios, ora como unidade de negócios ou de serviços partilhados. Mas pergunta-se: é "área" ou "unidade"? É que "área de negócios" remete para uma categoria da gestão (um dos domínios do negócio do SUCH, que pode ser directamente assumido pelo SUCH ou deferido a terceiros, como os estatutos permitem) e "unidade de negócios" ou "unidade de serviços partilhados" sugerem uma entidade orgânica ou estrutural do SUCH , dotada dos meios próprios, com capacidade para assumir a execução dos serviços objecto do protocolo. Face à argumentação agora expendida, parece que se trataria de uma verdadeira entidade orgânica ou estrutural do SUCH e não o ACE "Somos Contas": seria pois uma "unidade de negócios" ou "unidade de serviços partilhados" do próprio SUCH, dotada dos meios próprios, com capacidade para assumir a execução dos serviços. Mas se é assim, o "Somos Contas" (não ACE) distingue-se do Centro de Processamento de Contabilidade e Finanças (CPCF), unidade operativa autónoma de serviços partilhados do SUCH, a que a ARS Norte aderiu pelo protocolo sub judicio? Ou não se distingue, e são a única e mesma realidade? Mas se assim é, para quê dar duas designações distintas: CPCF e Somos Contas (não ACE)?
Ou, pelo contrário, significa que o SUCH para a prestação de serviços partilhados, no domínio da contabilidade e finanças, conta com três entidades distintas: o CPCF, o "Somos Contas" (não ACE) e o "Somos Contas, ACE (15)"? Mas como aceitar isso, quando para a prestação de serviços partilhados se invocam argumentos de economia de meios e recursos?
Ora, da decisão recorrida retira-se o entendimento de que no referido comunicado ao falar-se em "Somos Contas" se pretendia dizer "Somos Contas, ACE". E a não referência a "ACE" é compreensível, no plano da linguagem comunicacional. Relembra-se que se tratava de um comunicado...
A convicção de que tal entendimento era correcto mantém-se.
E a argumentação da petição de recurso só contribui para o reforço dessa convicção: não é racionalmente admissível a existência de duas ou três entidades distintas no mesmo "universo" (o do SUCH) a desenvolver as mesmas actividades.
E, como se verá, a argumentação também apresentada na petição relativa à criação dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, EPE (SPMS), sucedendo aos vários ACE's criados pelo/através do SUCH, reforça essa convicção. E acrescente-se: a cedência da posição contratual do SUCH para o SOMOS CONTAS, ACE que era explicitada como uma possibilidade que, aliás, a ARS referia desconhecer (16), e que a entidade recorrente diz que surgia, na decisão recorrida, como uma realidade certa e incontornável, adquire, efectivamente, estas características, com a dita argumentação relativa aos SPMS. Se a possibilidade de envolvimento do Somos Contas, ACE, era só uma probabilidade, porquê argumentar-se que surgiu o SPMS, sucedendo aos ACE's?
Mas diga-se mais: cria-se uma nova convicção neste Tribunal que agora julga o recurso: a de que o CPCF ou o dito "Somos Contas" (não ACE) são "nomines júris" sem substância real.
Mas diga-se ainda o seguinte nesta matéria: a afirmação feita na petição de recurso de que "a prestação dos serviços no âmbito da unidade de negócios SOMOS CONTAS poderia ou não ser assumida parcialmente pelo SOMOS CONTAS, ACE (...) tendo o SUCH manifestado, desse modo, total abertura para excluir a possibilidade de participação do SOMOS CONTAS, ACE na execução do PROTOCOLO, caso o Tribunal de Contas, concedendo visto, recomendasse nesse sentido" não corresponde em rigor ao que consta dos textos: destes o que resulta é que a ARS do Norte afirma desconhecer se o SUCH vai ou não deferir a execução do protocolo ao Somos Contas, ACE, e adianta que é matéria que só ao SUCH compete esclarecer (17). E o SUCH veio dizer que "a gestão do centro de processamento de contabilidade e finanças não configura uma realidade estática e imutável", e que a atribuição ao Somos Contas, ACE, da execução dos serviços "é uma possibilidade a considerar pelo SUCH (18)". E enigmaticamente acrescentou-se: possibilidade a considerar "depois de o mesmo Protocolo ser visado e se nenhuma condição existir ou for colocada a tal atribuição ou a desaconselhar, caso em que essa gestão poderá ser assumida directamente pelo SUCH, no âmbito do referido Protocolo"
Ora, como se sabe, não cabe a este Tribunal, no exercício das suas competências de fiscalização prévia, fixar condições, nem dar conselhos, nem esclarecer enigmas. E as recomendações que o Tribunal pode legalmente fazer têm fundamentos e finalidades completamente distintas das que se pretende naquele texto sugerir.
Portanto, estas alegações são completamente irrelevantes...
E o que releva é que tendo-se perguntado se a prestação dos serviços ia ser deferida ao Somos Contas, ACE, a ARS disse que "não sabia" e o SUCH respondeu que "talvez"... E a argumentação agora produzida sobre a criação dos SPMS, que sucederão aos ACE's, sugere fortemente que "sim": pretendia-se que a prestação dos serviços fosse deferida ao Somos Contas, ACE.
Mantém-se pois nesta parte o que consta do acórdão recorrido, em termos de matéria de facto, rejeitando-se a impugnação. A interpretação do facto que agora se fez, e que justifica a relevância deste, é, naturalmente, da nossa responsabilidade, secundando a que foi feita na primeira instância.
14. Refere-se no acórdão recorrido (19) que o "Somos Compras, ACE", considerado como central de compras do Estado pelo Decreto-Lei nº 200/2008, de 9 de Outubro, integra parceiros privados.
Quanto a esse facto a entidade recorrente diz: "(...) importa sublinhar que, contrariamente ao que se refere no ACÓRDÃO e conforme decorre de comunicado oportunamente publicitado pelo SUCH, desde Março de 2009, que o agrupamento complementar de empresa denominado "SOMOS COMPRAS, ACE" já não integra qualquer empresa privada, contando apenas com as participações do SUCH e dos três centros hospitalares de Lisboa, seus associados".
Acolhe-se a observação feita.
Contudo, deve referir-se que o acórdão recorrido é de 25 de Fevereiro e a alteração agora comunicada operou-se em Março seguinte. Por outro lado, na economia do acórdão, o ACE que assume importância, em termos de fundamentação, é o "Somos Contas, ACE".
Sobre este, se diz no acórdão recorrido (20):"(...) o "Somos Contas" é (...) um ACE em que o SUCH detém uma participação de 95% e a "Accenture, SA" os restantes 5%".
E na petição de recurso sobre este ACE se diz (21) que "(...) sendo verdade que dois dos referidos ACE - concretamente o SOMOS PESSOAS, ACE e o SOMOS CONTAS, ACE - integram parceiros privados - respectivamente, as empresas denominadas CAPGEMINI e ACCENTURE -, a verdade é também que o SUCH nunca deixou de garantir a detenção de uma participação maioritária sobre os mesmos (...)".
Confirma-se pois que o Somos Contas, ACE, integra um parceiro privado.
15. Refere-se no acórdão recorrido (22) que "a estrutura organizativa do SUCH comporta a representação, nos órgãos de administração, de representantes desses parceiros privados, que estão colocados numa posição que lhes permite influenciar as decisões de gestão e, dessa forma, interferir com os interesses prosseguidos".
Quanto a esse trecho, a entidade recorrente diz: "ao contrário do que é referido no ACÓRDÃO, não é verdade que a estrutura organizativa do SUCH comporte a representação nos respectivos órgãos sociais (seja na Assembleia-Geral, no Conselho de Administração ou no Conselho Fiscal) de representantes dos agrupamentos complementares de empresas por ele criados ou dos respectivos membros".
Analisados os estatutos, concorda-se com a observação feita pela entidade recorrente na sua petição. Por isso deve considerar-se alterada a matéria de facto, nesse ponto, pese embora a questão seja também pouco relevante para a decisão.
16. Toda a restante factualidade constante no acórdão recorrido, não tendo sido impugnada, mantém-se.
Deve contudo ter-se em conta um novo facto, surgido na pendência do presente recurso: o SUCH remeteu (23) a este Tribunal os seus novos estatutos aprovados em assembleia geral realizada em 1 de Outubro de 2010 e homologados pelo Secretário de Estado da Saúde em 20 de Outubro.
II.B - AS QUESTÕES DE DIREITO
17. Fixada a matéria de facto, enfrentem-se pois as questões de interpretação e de aplicação do direito.
A questão central que se suscita no presente processo é a de saber se o protocolo acima identificado poderia ter sido formado e celebrado ao abrigo do nº 2 do artigo 5º do CCP que consagra, como se sabe, uma excepção à aplicação da parte II do Código, com o fundamento de se estar no âmbito da "contratação interna (24)" ou de "relações internas" (ou "in house providing", na linguagem corrente comunitária) entre a entidade adjudicante e a adjudicatária.
18. Relembre-se o que a referida disposição legal estabelece:
"Artigo 5º
Contratação excluída
(...)
2 - A parte II do presente código também não é aplicável à formação dos contratos, independentemente do seu objecto, a celebrar por entidades adjudicantes com uma outra entidade, desde que:
a) A entidade adjudicante exerça sobre a actividade desta, isoladamente ou em conjunto com outras entidades adjudicantes, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços; e
b) Esta entidade desenvolva o essencial da sua actividade em benefício de uma ou de várias entidades adjudicantes que exerçam sobre ela o controlo análogo referido na alínea anterior.
(...)".
19. Àquela pergunta, a entidade recorrente dá resposta afirmativa, discordando da decisão recorrida e alegando, no essencial, o seguinte:
a) A doutrina dos pareceres da Procuradoria-Geral da República, no que concerne à verificação dos pressupostos da relação in house, mantém-se actual, dado que as alterações verificadas nos estatutos do SUCH foram irrelevantes. Por outro lado, as principais áreas de actuação do SUCH reportam-se a actividades para as quais não existem entidades a operar no mercado(25);
b) É relevante para se concluir da natureza interna das relações entre a entidade adjudicante e a adjudicatária, a natureza associativa desta (26);
c) É relevante para se concluir da natureza interna das relações entre a entidade adjudicante e a adjudicatária, o facto de inexistirem associados privados nesta, sendo de acolher a distinção constitucional entre sector privado e sector cooperativo e social, não sendo exigível que a entidade adjudicatária seja exclusivamente composta por entidades adjudicantes (27);
d) A simples possibilidade abstracta de o SUCH recorrer aos serviços de outras entidades - e, em particular, de entidades por si participadas - de forma a assegurar determinadas prestações necessárias ao exercício das atribuições que lhe competem, não pode servir para infirmar a especial natureza da sua relação com os associados e, nessa medida, obstar à aplicação da excepção estabelecida no artigo 5.º, n.º 2, do CCP não procedendo igualmente o argumento da falta de poderes de imposição administrativa da entidade adjudicante sobre a adjudicatária como obstando à verificação do requisito do controlo análogo (28).
Vejamos pois cada uma dessas temáticas para obter a resposta à questão colocada e decidir.
II.B.1 - A doutrina do parecer da Procuradoria-Geral da República sobre o SUCH e sua actualidade
A evolução verificada nos estatutos do SUCH
20. Como acima se referiu no nº 16, o SUCH remeteu ao Tribunal os seus novos estatutos entretanto aprovados e homologados. Dado que tanto na decisão recorrida, como na petição de recurso, a questão dos estatutos adquire uma importância central, há que tomar posição sobre se aprovados os novos estatutos são eles que relevam para a presente decisão ou se esta deve continuar a ter em conta os anteriores.
Vejamos.
O que está em causa no presente processo é saber se o protocolo celebrado entre a ARSN e o SUCH pode estar excluído da aplicação das regras procedimentais da contratação pública, por se enquadrar no nº 2 do artigo 5º do CCP. Ora, esta disposição diz respeito ao tipo de relações existentes entre entidade adjudicante e entidade adjudicatária, como fundamento para a celebração de um instrumento contratual sem procedimento concorrencial. Ora, o protocolo em causa foi celebrado no concreto contexto estatutário então existente. É esse concreto contexto que fundamentou a formação e posterior celebração do protocolo, nos referidos termos legais. A questão jurídica essencial a esclarecer é essa: podia o protocolo ser celebrado à luz daquela disposição legal, tendo em conta o concreto contexto estatutário então existente?
E para responder a essa questão só pode atender-se aos estatutos então existentes. Os novos estatutos serão relevantes para a apreciação de actos e contratos celebrados já na sua vigência.
Contudo, e atendendo a posições tomadas pelo Tribunal de Justiça europeu - como a seguir se verá (29) - se as questões enfrentadas na presente decisão tivessem solução diferente, por força dos novos estatutos - considerando-se por exemplo que os requisitos do nº 2 do artigo 5º do CCP se passavam a verificar - poder-se-ia apelar a estes, na medida em que o contrato sub judicio pese embora tenha sido formado à luz dos anteriores estatutos poderia obter plena eficácia à luz do novo quadro estatutário.
Mas não é essa a situação presente, pelo que se atenderá aos estatutos ao abrigo dos quais foi celebrado o protocolo.
21. Tendo em conta esse pressuposto relembre-se que, na sua petição, a recorrente refere que as alterações introduzidas nos estatutos do SUCH são irrelevantes e que se limitou "a actuar em conformidade com a doutrina constante dos Pareceres n.º 1/95 e 145/2001 emitidos pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República no sentido de que os serviços prestados pelo SUCH aos seus associados - ou melhor, os contratos que contemplam a realização de tais serviços - não se encontram submetidos às normas sobre contratação pública".
22. Como se relembrou na decisão recorrida, tais pareceres foram emitidos durante a vigência das Directivas 93/36/CEE, 93/37/CEE e 93/38/CEE. O primeiro parecer reportou-se ao regime constante do Decreto-Lei n.º 211/79, de 12 de Julho, e o segundo concluiu já sobre os Decretos-Lei nºs 55/99, de 2 de Março, e 197/99, de 8 de Julho.
23. Destaquem-se as seguintes conclusões do parecer de 2001, invocado no presente processo:
"1.ª O serviço de utilização comum dos hospitais (SUCH), criado nos termos do Decreto-Lei n.º 46 668, de 24 de Novembro de 1965, retomou (...) a estrutura associativa e a designação de pessoa colectiva de utilidade pública administrativa (artigo 1.º, n.º 2, dos estatutos).
(...)
3.ª No regime estatutário do SUCH compreendem-se traços juspublicísticos, com incidência na designação de titulares dos seus órgãos directivos pelo Governo (artigos 13.º, n.º 2, e 16.º, n.º 2, dos estatutos) e a sujeição de alguns actos de gestão a tutela integrativa do Estado (artigo 15.º, n.º 1, alíneas e), f) e g), dos mesmos estatutos).
4.ª A finalidade principal do SUCH é a prestação de certos serviços aos seus associados, para um funcionamento mais ágil e eficiente destes e em regime materialmente de cooperação e entreajuda, sem apelo a recursos exteriores.
(...)
6.ª O regime previsto nos Decretos-Leis n.ºs 59/99, de 2 de Março, e 197/99, de 8 de Junho, pressupõe a necessidade de recurso a contratantes externos, destinando-se a salvaguardar os princípios da concorrência e da imparcialidade em vista a garantir a igualdade de tratamento dos operadores que pretendam contratar com a Administração.
7.ª Consequentemente, a actuação do SUCH no exercício das atribuições referidas na conclusão 4.ª mostra-se excluída dos pressupostos de aplicação do regime jurídico dos diplomas legais mencionados na conclusão anterior.
8.ª Fora das situações a que se referem as anteriores 4.ª e 7.ª conclusões, o SUCH, sempre que, como dono de obra ou adjudicante de bens e serviços, careça de contratar com terceiros, inclui-se entre as entidades equiparadas a organismos de direito público, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, e 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho, compreendendo-se, nessa estrita medida, no âmbito da aplicação subjectiva destes diplomas legais."
O SUCH surge, no parecer, como resultado de uma "actividade materialmente cooperativa"e de "auto-organização das entidades do sistema de saúde", em que não se coloca a questão do "recurso a entidades exteriores (...) com uma exigência da qual decorra a necessidade de defender ou acautelar quer o princípio da concorrência" quer os princípios da imparcialidade e da igualdade, não se verificando assim "os pressupostos que compelem à realização de procedimentos concursais e consequente contratação entre o SUCH e as unidades que o integram, pelos serviços por aquele prestados ou fornecidos". Contudo, note-se, acrescenta ainda o parecer, sempre que o "SUCH, como dono de obra ou como adjudicante de bens e serviços, careça de contratar com terceiros, essa sua actividade situa-se já num plano alheio ao do regime de cooperação material entre associados e ganha uma outra característica que lhe é conferida pela necessidade de intervenção externa". Neste caso, conclui o parecer, a actividade do SUCH subordina-se ao que está disposto nos regimes da contratação pública (30).
24. O recorte juspublicístico conferido no parecer ao SUCH, permite relembrar, como faz a decisão recorrida, alguma doutrina construída sobre as directivas comunitárias então em vigor, que admitia com largueza que os contratos celebrados entre dois entes públicos estavam excluídos da regulação comunitária.
Nesse sentido, para esses autores, era relativamente ampla a possibilidade de caracterizar determinados tipos de contratação entre entes públicos como auto-satisfação de necessidades.
25. Tenha-se presente, contudo, algumas circunstâncias relativas ao momento de elaboração do parecer.
Sendo elaborado em 2003, expressamente se estriba em pareceres anteriormente formulados pelo Conselho Consultivo, muito especialmente o Parecer nº1/95: "Mantém-se por isso a doutrina do parecer nº1/95 por não haver razões para a alterar(31)". E, segundo declaração de voto (32), foi também seguida "largamente" a doutrina do parecer nº 56/99, para dar resposta "à mesma questão substancial que é colocada na presente consulta, mas em relação à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa".
Pareceres, portanto, anteriores a importantes marcos na evolução da temática que, no presente acórdão, deve ser abordada, e que não pode deixar de se ter presente no presente acórdão: marcos na evolução do Direito e marcos na evolução jurisprudencial que o aplica.
26. De facto, no que respeita ao direito aplicável e à jurisprudência, recorde-se que foram publicadas novas directivas europeias (33), que introduziram limitações à possibilidade de atribuição directa de contratos entre entidades públicas; foi proferida relevante jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre a matéria; foi publicado o novo Código dos Contratos Públicos (CCP); e, finalmente o estatuto e o regime do SUCH sofreram também modificações que se consideram relevantes (34).
27. Vejamos desde já a evolução do SUCH. Compulsando os estatutos de 1996, com base nos quais foi emitido o parecer da PGR, e os estatutos de 2006, assistiu-se - como aliás reconhece a recorrente - a uma diminuição dos poderes de intervenção do Estado e a um correspondente reforço dos poderes exercidos pela Assembleia Geral e, portanto, dos que nela participam: entes públicos e entes não públicos (35).
O SUCH passou ainda a ter como finalidade a constituição de unidades de serviços partilhados, sob a forma de unidades orgânicas suas, ou sob a forma de pessoas colectivas integradas por si e por seus associados e ou por terceiras entidades.
Destas alterações resulta que o actual SUCH constitui uma entidade com características diferentes da que existia à data da emissão do parecer a que nos estamos a referir.
Vejamos porquê.
Assistiu-se ao enfraquecimento dos poderes tutelares e de controlo do Estado, e reforçou-se a sua natureza privada e associativa: mantendo-se, como se diz na petição de recurso (36), a sua natureza de "instrumento de satisfação das necessidades dos seus associados" enfraqueceram-se os laços de relacionamento com os poderes públicos, agora quase só manifestados através das posições assumidas pelos associados públicos nos órgãos do SUCH ou da intervenção do Ministro da Saúde em momentos pontuais e excepcionais da vida associativa (designação de dois dos cinco membros do conselho de administração, alteração de estatutos, contracção de empréstimos de montantes muito elevados, dissolução da associação (37)).
E, em matéria de organização e de prestação de serviços partilhados, operou-se uma alteração muito importante: a que resulta das novas (38) disposições constantes da alínea d) do nº1 e do nº 3 do artigo 2º dos estatutos.
Estas disposições permitem que naquele domínio - o dos serviços partilhados - podem ser constituídas unidades orgânicas do SUCH ou pessoas colectivas por ele integradas e pelos seus associados e ou por terceiras entidades.
É verdade, como diz a recorrente, que já nas versões anteriores dos estatutos, "se estabelecia a possibilidade de constituição de pessoas colectivas, integradas pelo SUCH e pelos seus associados".
Contudo, aquelas novas disposições inovam em dois aspectos: estabelecem o objecto dessas novas unidades ou entidades - os serviços partilhados - e tendo em conta este concreto objecto, significa que se destinam directamente à prestação de serviços aos associados.
Quer isto dizer que, ao abrigo destas disposições, podem entidades exteriores ser chamadas a satisfazer necessidades dos associados do SUCH. Ora, esta solução contradiz um dos pressupostos do parecer da PGR: a satisfação daquelas necessidades passava por não se recorrer a entidades exteriores. Tudo se passava no estrito contexto dos associados e dos meios por eles só mobilizados, como instrumentos de ajuda mútua.
Ora, esta nova solução não resultava das disposições constantes dos anteriores estatutos.
E não pode este Tribunal ser condicionado na apreciação dos factos ou ser limitado na observação da realidade sobre a qual deve decidir. Não pode estar confinado a apreciar o que os estatutos de novo trouxeram.
Este Tribunal deve estabelecer uma relação entre estas disposições estatutárias e as disposições contratuais que permitem ao SUCH deferir as posições que obtém por via contratual, para estas novas entidades terceiras, que podem assumir qualquer natureza jurídica (pública ou privada, com membros privados e públicos, associados e não associados).
Com estas alterações estatutárias, e com o uso que delas tem sido feito (concretamente no protocolo sub judicio), bem se pode dizer que o actual SUCH não é já o SUCH a que se referiam os pareceres da PGR.
Tem pois acerto o que dizia a decisão recorrida (39): -[f]ace ao disposto no artigo 2º, nº 3, dos Estatutos, bem pode dizer-se que a entidade SUCH não é apenas SUCH, mas, ao invés, inclui o complexo de entidades que, à sombra daquela disposição estatutária, podem ser criadas sob qualquer forma e para as quais, ao abrigo de disposições protocolares (...) são transmitidas decisões de adjudicação inicialmente feitas ao SUCH (...).
Note-se: esta é uma das questões essenciais do presente processo.
28. Assim, e ao contrário do que se defende na petição de recurso (40), as alterações introduzidas nos estatutos do SUCH não foram irrelevantes e determinam que a doutrina do parecer da PGR não pode já ser atendida, em todas as suas dimensões. Mas a desactualização do parecer é também ditada pela evolução ocorrida na jurisprudência comunitária, como a seguir se verá.
A jurisprudência comunitária sobre a contratação "in house"
29. A tese da contratação "in house", surgida no âmbito da aplicação das directivas comunitárias sobre contratação pública, assenta na ideia de que uma entidade adjudicante está dispensada de cumprir as regras de concorrência quando escolhe realizar ela mesma as operações económicas de que necessita, no âmbito da sua autonomia organizativa, através de uma outra entidade que funciona como um seu prolongamento administrativo. Será, então, essa especial relação de prolongamento que, integrando, no plano substantivo, uma relação de dependência entre os entes em causa, elimina a autonomia de vontade de um deles e permite considerar que o contrato não é celebrado com um terceiro. Assim, enquanto o regime da contratação pública pressupõe a necessidade de recurso a contratantes externos, no caso da "contratação in house" há recurso a meios organizativos que substancialmente são internos, pese embora constituam uma entidade jurídica diferente, que pode assumir as mais diversas formas.
30. Foi na Directiva 92/50/CEE (relativa à prestação de serviços) que se abordou pela primeira vez a possibilidade de celebração de contratos públicos entre entidades adjudicantes a ela sujeitas. Referia-se na alínea c) do seu artigo 1º que "os prestadores de serviços são qualquer pessoa singular ou colectiva, incluindo organismos de direito público, que ofereçam serviços". E no artigo 6º estabelecia-se que a directiva não era aplicável à celebração de contratos de serviços "atribuídos a uma entidade que seja ela própria uma entidade adjudicante na acepção da alínea b) do artigo 1º, com base num direito exclusivo estabelecido por disposições legislativas, regulamentares, ou administrativas publicadas". Esta disposição suscitou diversas interpretações, admitindo alguma doutrina que os contratos celebrados entre entidades adjudicantes estavam excluídos da aplicação daquela directiva (41).
É no contexto dessa polémica que a jurisprudência comunitária se pronunciou várias vezes, concluindo que as directivas comunitárias eram aplicáveis aos contratos celebrados entre entidades adjudicantes.
31. Repare-se que o parecer da PGR de 2003 em nenhum ponto remete ou refere a jurisprudência que entretanto veio a desenvolver-se no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias. Compreende-se tal facto pois, à data, só tinha sido proferido o Acórdão Teckal, em 18 de Novembro de 1999 - quatro anos antes, portanto - e que marca, com um singelo parágrafo, o início da evolução jurisprudencial nesta matéria, reafirmada sobretudo a partir de 2005 - dois anos depois do parecer.
No que respeita à jurisprudência do Tribunal de Justiça europeu recordem-se - como já parcialmente o fez o acórdão recorrido - os acórdãos proferidos nos processos C-107/98 (Teckal) de Novembro de 1999, C-26/03 (Stadt Halle) em Janeiro de 2005, C-84/03 (Comissão v. Espanha) também de Janeiro de 2005, C-231/03 (Coname), de Julho de 2005, C-458/03 (Parking Brixen), de Outubro de 2005, C-29/04 (Comissão v. Áustria), de Novembro de 2005, C-340/04 (Carbotermo e Consorcio Alisei), de Maio de 2006, C-410/04 (ANAV), C-295/05 (Asemfo/Tragsa), de Abril de 2007, C-337/05 (Comissão v. Itália), de Abril de 2008, C-573/07 (Sea Srl contra Comune di Ponte Nossa), de Setembro de 2008, C-324/07 (Coditel), de Novembro de 2008 e C-480/06 (Comissão vs República Federal da Alemanha), de Junho de 2009.
32. Dar breve conta desta produção jurisprudencial é importante neste processo, pois, como se sabe, a solução consagrada no CCP em matéria de contratação interna (in house) seguiu a que foi enunciada inicialmente pelo referido acórdão Teckal.
Assim:
a) O acórdão Teckal de Novembro de 1999 dispôs (42) que as directivas comunitárias em matéria de contratação pública são aplicáveis quando uma entidade adjudicante, como uma autarquia local ou regional, pretende celebrar por escrito, com uma entidade dela distinta no plano formal e dela autónoma no plano decisório, um contrato oneroso, quer esta seja ela própria uma entidade adjudicante quer não. No entender do Tribunal, só pode ser de outro modo na hipótese de, simultaneamente, a autarquia exercer sobre a pessoa em causa um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços e de essa pessoa realizar o essencial da sua actividade com a ou as autarquias que a controlam;
b) O acórdão Stadt Halle (43) de Janeiro de 2005 manteve a orientação da decisão anterior mas acrescentou um novo aspecto: a participação, ainda que minoritária, de uma empresa privada no capital de uma sociedade no qual participa também a entidade adjudicante em causa exclui de qualquer forma que esta entidade adjudicante possa exercer sobre esta sociedade um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços. E sobre esta matéria refere o acórdão que importa observar que "a relação entre uma autoridade pública (...) e os seus próprios serviços se rege por considerações e exigências específicas da prossecução de objectivos de interesse público. Ao invés, o capital privado numa empresa obedece a considerações inerentes a interesses privados e prossegue objectivos de natureza diferente". E a decisão relembrou ainda um aspecto da maior importância: dado que o objectivo principal das disposições comunitárias em matéria de contratos públicos é a livre circulação de serviços e a abertura à concorrência não falseada em todos os Estados-Membros, a obrigação de aplicação das regras comunitárias pertinentes só pode ser afastada como resultado de uma interpretação estrita, cabendo o ónus da prova de que se encontram efectivamente reunidas as circunstâncias excepcionais que justificam a derrogação a quem delas pretenda prevalecer-se;
c) No acórdão Comissão v. Espanha (44), também de Janeiro de 2005, o Tribunal de Justiça decidiu que o Reino de Espanha não tinha procedido a uma correcta transposição das directivas de 1993, na medida em que a legislação espanhola tinha excluído do seu âmbito de aplicação as relações estabelecidas entre as Administrações Públicas, os seus organismos públicos e, de um modo geral, as entidades de direito público não comerciais, qualquer que fosse a natureza dessas relações. E o tribunal relembra a sua jurisprudência referindo que tal só pode acontecer nas condições enunciadas no acórdão Teckal;
d) O acórdão Coname, de Julho de 2005, veio reafirmar (45) a necessidade de um procedimento transparente, num caso de atribuição directa por um município da gestão de um serviço de distribuição de gás a uma sociedade de capitais maioritariamente públicos (com capitais privados, portanto) o que impedia que esta sociedade fosse considerada uma estrutura de gestão "interna" de um serviço público;
e) O acórdão Parking Brixten (46), de Outubro de 2005, manteve a orientação do acórdão Teckal reafirmando que a aplicação das suas duas condições de não aplicação das regras comunitárias deve ser objecto de interpretação estrita. E a apreciação do caso "deve ter em conta todas as disposições legislativas e circunstâncias pertinentes" e, desta apreciação, deve resultar que a entidade adjudicatária está sujeita a um controlo que permite à entidade pública adjudicante influenciar as suas decisões. E acrescenta que deve "tratar-se de uma possibilidade de influência determinante, quer sobre os objectivos estratégicos quer sobre as decisões importantes". E no caso em apreciação - a concessão de um serviço público de estacionamento automóvel, por uma câmara municipal a uma empresa especial que era propriedade do município - pese embora estivesse fora do âmbito de aplicação das directivas comunitárias, a entidade adjudicante estava vinculada a fazer observar os princípios dos tratados comunitários, em particular os da não discriminação e de igualdade de tratamento e, na sua sequência, os da transparência, da publicidade e imparcialidade dos processos de adjudicação. E, no caso, decidiu que tais princípios "devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que uma entidade pública atribua, sem abertura de concurso, uma concessão de serviços públicos a uma sociedade anónima resultante da transformação de uma empresa especial desta autoridade pública, sociedade cujo objecto foi alargado a novas áreas importantes, cujo capital deve ser obrigatoriamente aberto a curto prazo a outros capitais, cuja área territorial de actividades foi alargada a todo o país e ao estrangeiro e em que o conselho de administração possui amplos poderes de gestão que pode exercer de forma autónoma";
f) O acórdão Comissão v. Áustria, de Novembro de 2005, reafirma (47) que a participação, ainda que minoritária, de uma empresa privada no capital de uma sociedade no qual participa também a entidade adjudicante em causa exclui, de qualquer forma, que esta entidade adjudicante possa exercer sobre esta sociedade um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços. Neste acórdão outro aspecto deve ser relevado: na data em que o contrato apreciado no processo foi adjudicado, sem procedimento concorrencial, a sociedade adjudicatária era ainda detida, em 100% do seu capital, pela entidade adjudicante. Mas quando o Tribunal aprecia a questão já tinha sido transmitido 49 % do capital a uma entidade privada. E o Tribunal, neste caso, considerou relevante a data em que apreciava e não a data em que o contrato fora celebrado, considerando que "as circunstancias do presente processo requerem a tomada em consideração dos acontecimentos sobrevindos posteriormente";
g) O acórdão Carbotermo e Consorcio Alisei, de Maio de 2006, traz alguns elementos inovadores a ter presentes (48): assim depois de recordar não só as condições referidas no Acórdão Teckal, como a necessidade de serem consideradas todas as disposições e circunstâncias pertinentes (na linha do acórdão Parking Brixten), afirma que a "circunstância de a entidade adjudicante deter, isolada ou em conjunto com outros poderes públicos, a totalidade do capital de uma sociedade adjudicatária tende a indicar, sem ser decisiva, que esta entidade adjudicante exerce sobre esta sociedade um controlo análogo ao que exerce sobre os próprios serviços". E no caso concreto, apesar de o capital de entidade adjudicatária ser detido a 100% por entidades públicas, considerou não haver "controlo análogo" porque tal detenção era feita não directamente, mas através de uma sociedade holding (embora esta também fosse de capitais integralmente públicos detidos pelas entidades públicas em causa), e os estatutos conferiam ao conselho de administração da adjudicatária os mais amplos para a sua gestão ordinária e extraordinária;
h) O acórdão Asemfo/Tragsa (49), de Abril de 2007, manteve a orientação do acórdão Teckal, e reconheceu estar-se no caso concreto perante uma situação em que se verificavam as condições estabelecidas neste acórdão para afastar as regras comunitárias em matéria de contratação pública: tratava-se de adjudicação de contratos de fornecimento a uma empresa pública, com capitais integralmente públicos, obrigada a realizar as tarefas que lhe eram confiadas pelas entidades públicas detentoras do seu capital, não podendo participar nos concursos públicos por estas abertos;
i) O acórdão Comissão v. Itália (50), de Abril de 2008, retoma igualmente a orientação do acórdão Teckal, e na linha do acórdão Stadt Halle reafirma que a participação, ainda que minoritária, de uma empresa privada no capital de uma sociedade na qual também participa a entidade adjudicante exclui, de qualquer forma, que esta entidade adjudicante possa exercer sobre esta sociedade um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços;
j) O acórdão Sea Srl contra Comune di Ponte Nossa, de Setembro de 2008, repetindo muita da matéria de anteriores acórdãos traz contudo alguns elementos que importa realçar. Assim, recordando que a existência efectiva de uma participação privada no capital da sociedade adjudicatária afasta a verificação da condição do "controlo análogo" e que tal existência deve, em regra, ser aferida no momento da celebração do contrato, afirma que "não se pode excluir a possibilidade de acções de uma sociedade serem vendidas a terceiros em qualquer momento. No entanto, admitir que esta mera possibilidade possa manter em suspenso indefinidamente a apreciação sobre o carácter público ou não do capital de uma sociedade adjudicatária de um contrato público não seria conforme com o princípio da segurança jurídica". Assim, "a abertura do capital da sociedade a investidores privados só pode ser tomada em consideração se existir", no momento da adjudicação, "uma perspectiva concreta e a curto prazo dessa abertura". Assim, numa situação em que o capital da sociedade adjudicatária é inteiramente público e em que não há nenhum indício concreto da abertura iminente do capital a accionistas privados, "a mera possibilidade de particulares participarem no capital da referida sociedade não basta para se concluir que a condição relativa ao controlo da autoridade pública não foi preenchida";
k) O acórdão Coditel (51), de Novembro de 2008, manteve igualmente a orientação do acórdão Teckal e, tratando-se de um caso de concessão de serviço público, nele refere-se, na linha do acórdão Parking Brixen, que "devem tomar-se em consideração todas as disposições legislativas e todas as circunstâncias pertinentes" e acrescenta que, no controlo análogo, deve "tratar-se de uma possibilidade de influência determinante, tanto sobre os objectivos estratégicos como sobre as decisões importantes desta entidade". Refere ainda que de entre as circunstâncias pertinentes a ter em conta cumpre considerar "em primeiro lugar, a detenção do capital da entidade concessionária, em segundo lugar, a composição dos órgãos de decisão desta e, em terceiro lugar, a extensão dos poderes reconhecidos ao seu conselho de administração". E quanto à primeira dessas circunstâncias, o Tribunal reafirma que "está excluído que uma autoridade pública concedente possa exercer, sobre uma autoridade concessionária, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços se uma empresa privada detiver uma participação no capital dessa entidade". E acrescenta que, pelo contrário, "a circunstância de a autoridade pública deter, em conjunto com outras autoridades públicas, a totalidade do capital de uma sociedade concessionária indicia, sem ser decisiva, que essa autoridade pública exerce sobre esta sociedade um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços". E o acórdão refere ainda, a propósito da entidade concessionária, que esta "está constituída não sob a forma de uma sociedade por acções ou de uma sociedade anónima susceptível de prosseguir objectivos independentemente dos seus accionistas, mas sob a forma de uma sociedade cooperativa intermunicipal" sem natureza comercial e que tem como objectivo estatutário "a realização da missão de interesse municipal (...) para a qual foi criada e que não possui qualquer interesse distinto do das autoridades públicas que lhe estão associadas". Por isso, "não goza de uma margem de autonomia que exclua que os municípios que lhe estão associados exerçam sobre ela um controlo análogo ao que exercem sobre os seus próprios serviços". E afirma ainda que a "jurisprudência exige que o controlo (...) seja análogo (...) mas não que lhe seja idêntico em todos os pontos". E perante o facto da entidade concessionária ser detida por várias entidades públicas refere ainda que o controlo análogo pode ser exercido pelo conjunto de tais entidades e não é necessário ser aferido para cada uma delas;
l) O acórdão Comissão v. República Federal da Alemanha (52), de Junho de 2009, mantém também a orientação do acórdão Teckal. Contudo, e estes aspectos têm particular importância, deve atender-se que o contrato controvertido neste processo fora celebrado entre quatro municípios e a cidade de Hamburgo para tratamento de resíduos em instalação pertencente a uma sociedade constituída parcialmente por capitais privados. O Tribunal considerou que era pacífico não existir controlo algum exercido pelos municípios contratantes e os serviços da cidade de Hamburgo e a sociedade gestora da instalação de tratamento de resíduos. No entanto, realçou que o contrato foi um instrumento de cooperação intermunicipal e o fundamento e o quadro jurídico para a construção e a exploração futuras de uma instalação destinada a prestar um serviço público de tratamento de resíduos. Sublinhou ainda que o contrato foi celebrado por autoridades públicas, sem a participação de privados. Finalmente, o acórdão relembra que a cooperação entre autoridades públicas, para a realização das suas missões de serviço público, deve ter presente os objectivos dos tratados em matéria de contratação pública, garantindo-se a observância do princípio da igualdade de tratamento, de modo que nenhuma empresa privada seja colocada numa situação privilegiada relativamente aos seus concorrentes. Pese embora tenha reconhecido não existir no caso controlo análogo, o Tribunal considerou o contrato conforme com o direito comunitário.
Conclusões a retirar das decisões do Tribunal de Justiça
33. Tendo explicitado os aspectos que se consideram mais relevantes nas decisões do Tribunal de Justiça em matéria de contratação "in house", é útil proceder-se a uma leitura global de tais decisões para se descobrirem linhas de tendência que possam ser úteis na presente decisão, considerando a unidade da ordem jurídica comunitária e porque "[n]as decisões a proferir o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito" (53).
De tal leitura podem destacar-se as seguintes conclusões:
g) As directivas comunitárias em matéria de contratação pública não são aplicáveis quando uma entidade pública adjudicante pretende celebrar por escrito, com uma entidade dela distinta no plano formal e dela autónoma no plano decisório, um contrato oneroso, quer esta seja ela própria uma entidade adjudicante quer não, quando aquela exercer sobre esta um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços e quando esta realizar o essencial da sua actividade para aquela ou aquelas entidades que a controlam (54);
h) O controlo análogo pode ser exercido pelo conjunto de entidades públicas/adjudicantes que, de alguma forma, participam na (ou controlam a) entidade adjudicatária do contrato, não tendo que ser exercido só pela entidade pública adjudicante;
i) O controlo exercido pela entidade adjudicante, ou pelo conjunto das entidades públicas/adjudicantes, sobre a entidade adjudicatária deve ser análogo ao que exerce ou exercem sobre os seus próprios serviços, mas "não tem de ser idêntico em todos os pontos". Deve revelar que a adjudicatária pode ser considerada uma "estrutura de gestão interna de um serviço público", sobre a qual se exerce uma influência determinante, tanto sobre os objectivos estratégicos, como sobre as decisões importantes desta entidade;
j) Dado que o objectivo principal das disposições comunitárias em matéria de contratos públicos é a livre circulação de serviços e a abertura à concorrência não falseada em todos os Estados-Membros, a não aplicação das regras comunitárias à luz do que agora se referiu na alínea a) só pode ser considerada como resultado de uma interpretação estrita, cabendo o ónus da prova de que se encontram efectivamente reunidas as circunstâncias excepcionais que justificam a derrogação a quem delas pretenda prevalecer-se;
k) Nessa interpretação e consequente aplicação estritas, deve ter-se em conta todas as disposições legislativas e circunstâncias pertinentes;
l) A verificação de condições que permitam admitir a derrogação das regras comunitárias à luz do que agora se referiu na alínea a), deve ser, em regra, aferida ao momento da celebração do contrato. Contudo, circunstâncias pertinentes posteriores podem ser tidas em conta, quando tais circunstâncias lançarem luz sobre as condições que efectivamente existiam no momento da celebração do contrato;
m) De entre as circunstâncias pertinentes a ter em conta cumpre considerar, designadamente, em primeiro lugar, a detenção do capital da entidade adjudicatária, em segundo lugar, a composição dos órgãos de decisão desta e, em terceiro lugar, a extensão dos poderes reconhecidos ao seu conselho de administração;
n) A participação, ainda que minoritária, de capitais privados na entidade adjudicatária do contrato exclui de qualquer forma que a entidade adjudicante possa exercer sobre aquela um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços. A relação entre uma autoridade pública e os seus próprios serviços rege-se por considerações e exigências específicas da prossecução de objectivos de interesse público. Ao invés, a participação de capitais privados na entidade adjudicatária faz com que esta obedeça a considerações inerentes a interesses não públicos. Deve ter-se em conta que nenhuma empresa privada deve ser colocada numa situação privilegiada relativamente aos seus concorrentes. Mas, por outro lado, deve igualmente atender-se que a circunstância de a entidade adjudicante deter, isolada ou em conjunto com outros poderes públicos, a totalidade do capital da entidade adjudicatária tende só a indicar, sem ser portanto decisiva, que esta entidade adjudicante exerce sobre a adjudicatária um controlo análogo ao que exerce sobre os próprios serviços.
34. Também por estes motivos - os agora referidos a partir do nº 29 - relacionados com a evolução da jurisprudência comunitária, o parecer da PGR perde actualidade. Como se sabe tal jurisprudência repercutiu-se no direito nacional. E o parecer da PGR não tinha em conta os dois requisitos da contratação "in house" entretanto estabelecidos e aprofundados.
35. No mesmo bloco de argumentos, refere ainda a recorrente que "as principais áreas de actuação do SUCH reportam-se a actividades para as quais não existem entidades a operar no mercado, sendo, concretamente, exemplo disso, a implementação do Centro de Processamento de Contabilidade e Finanças, objecto do presente PROTOCOLO, justificando-se, nessa medida, a existência do SUCH para colmatar falhas de mercado".
Perante tal afirmação, pergunta-se: está convicta a recorrente que, no mercado, não existem soluções alternativas para prestação de serviços de contabilidade e finanças? Em que assenta tal convicção?
Não está demonstrada tal convicção.
E diga-se que tem este Tribunal convicção absolutamente contrária, apoiada em mera experiência empírica e em simples consultas de internet.
36. Como já se referiu, rejeitam-se nestes aspectos os argumentos produzidos pela recorrente (55) e contrariam-se as conclusões 5ª a 8ª da petição (56).
II.B.2 - A natureza associativa do SUCH
37. A ARS Norte é uma entidade adjudicante, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º do Código dos Contratos Públicos.
Como se viu, a jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias tem vindo a afirmar claramente que o regime de contratação pública se aplica, em princípio, aos casos em que uma entidade adjudicante celebra por escrito, com uma entidade dela distinta no plano formal e dela autónoma no plano decisório, um contrato a título oneroso que tenha um objecto abrangido por essas directivas, quer esta segunda entidade seja ela própria uma entidade adjudicante quer não.
As directivas de 2004, na senda da jurisprudência do Tribunal de Justiça, vieram clarificar que a participação de organismos de direito público como concorrentes em procedimentos pré-contratuais não pode pôr em causa a livre concorrência (57) e que a possibilidade de celebração directa de um contrato público entre entidades adjudicantes está, hoje, apenas prevista para contratos públicos de serviços e somente em caso de existência de um direito exclusivo (58).
Assim, é hoje bem claro, no plano do direito europeu dos contratos públicos, que a celebração de contratos públicos economicamente relevantes deve estar sujeita às normas de contratação pública, mesmo quando seja feita entre entidades públicas.
38. O SUCH é, nos termos do nº2 do artigo 1º dos estatutos, uma pessoa colectiva de utilidade pública administrativa.
Como é consentido pelo artigo 6.º dos mesmos Estatutos, podem contar-se, entre os associados do SUCH, entidades públicas e privadas, bem como instituições particulares de solidariedade social ou outras pessoas colectivas de utilidade pública administrativa que desenvolvam actividades de promoção e protecção da saúde.
Como já se viu, acresce ainda que, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea d), esta associação tem também por objecto constituir unidades de serviços partilhados e de acordo com o n.º 3 do mesmo artigo dos Estatutos, estas unidades de serviços partilhados podem ser constituídas sob a forma de pessoas colectivas integradas pelo SUCH e pelos seus associados e/ou por terceiras pessoas.
Em conclusão: o presente protocolo foi celebrado entre uma entidade adjudicante (nos termos do CCP) e uma pessoa colectiva de utilidade pública administrativa, que pode contar como associados entidades públicas, entidades privadas e outras pessoas colectivas de utilidade pública administrativa.
Ora, as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa, têm sido consideradas pela doutrina dominante como pessoas colectivas de direito privado (59).
39. Ora, se a contratação inter-administrativa não é, como já se viu, em regra, e por si própria, considerada como uma forma de auto-satisfação das necessidades, a não ser em situações muito delimitadas, não há razões para deixar de aplicar os mesmos critérios rigorosos de avaliação quando esteja em causa a contratação entre entes públicos e entes não públicos.
40. Contudo na petição de recurso, veio a recorrente (60) especialmente alertar para a natureza associativa do SUCH, relembrando que "o risco associado pela jurisprudência comunitária à existência de capital privado nos entes quase internos da Administração (...) encontra-se afastado pela própria natureza do SUCH (pessoa colectiva de natureza associativa sem fins lucrativos) e, bem assim, pelo carácter altruístico e comum dos objectivos visados por todos os seus associados com a respectiva integração nessa associação" e afirmando que a "situação vertente apresenta, pois, contornos particulares, em razão da especial configuração do SUCH enquanto pessoa colectiva de natureza associativa, caracterizada, enquanto tal, pela prevalência do elemento pessoal, pela prossecução de fins não lucrativos, pela intransmissibilidade das participações sociais e pela não distribuição de dividendos".
E refere ainda que a sua posição tem apoio em entendimento recentemente advogado pelo TJCE que "entendeu necessário sublinhar e relevar a circunstância de o adjudicatário em questão consistir numa entidade que "está constituída, não sob a forma de uma sociedade por acções ou de uma sociedade anónima susceptível de prosseguir objectivos independentemente dos seus accionistas, mas sob a forma de uma sociedade cooperativa intermunicipal regida pela lei relativa às associações intermunicipais". Com base nesta circunstância, o Tribunal afirmou que o adjudicatário "tem por objectivo estatutário a realização da missão de interesse municipal para o cumprimento da qual foi criada e que não possui qualquer interesse distinto do das autoridades públicas que lhe estão associadas", o que permitiu comprovar o preenchimento do requisito do «controlo análogo»".
41. Vejamos estes argumentos.
Em primeiro lugar, deve reconhecer-se que o TJCE no acórdão Coditel (61) sublinhou o facto de a entidade adjudicatária ter natureza associativa. Mas, não pode deixar de notar-se que se tratava de uma associação em que todos os associados eram entidades públicas (municípios).
Deve reconhecer-se ainda que o TJCE associa o não reconhecimento da situação "in house" com a existência de capitais privados - em qualquer dimensão - e, estes, com a manifestação de interesses diferentes ou, pelo menos, nem sempre coincidentes com os de natureza pública. Contudo, deve notar-se também que o Tribunal europeu não se pronunciou sobre situações em que a par de entidades públicas, outro tipo de entidades - ainda que não lucrativas - de qualquer forma participam nas entidades adjudicatárias de contrato controvertidos.
Não nos distraiamos, contudo, da questão essencial. O que se trata é de demonstrar se o controlo exercido pela entidade adjudicante sobre a adjudicatária é análogo ou não ao que exerce sobre os seus próprios serviços.
A natureza da entidade adjudicatária é pouco relevante. Esta poderá ser um serviço público administrativo personalizado, uma empresa pública sob forma societária, uma entidade pública empresarial, uma sociedade comercial (62), uma associação pública, uma associação de direito privado... E em cada uma destas soluções pode existir ou não existir controlo análogo... Deve-se analisar caso a caso, segundo as circunstâncias pertinentes.
É natural que maiores exigências se devam colocar relativamente a soluções institucionais em que as entidades adjudicatárias envolvem entidades privadas de finalidade lucrativa. Por uma especial razão: é que nesses casos não só a celebração não concorrencial de contratos afasta a possibilidade de a eles acederem outros concorrentes, como se beneficia em especial as entidades privadas participantes nas adjudicatárias de tais contratos. Neste tipo de casos há ou haveria uma dupla violação dos princípios da concorrência e da igualdade.
Já atrás se referiu que, mesmo entre entidades públicas, o direito comunitário instaurou um clima de exigência na contratação, para preservação dos princípios da concorrência e da igualdade. E igualmente o direito nacional, também como forma de melhor se preservarem os interesses públicos. Ora, se tal solução foi adoptada nesse âmbito, como já se disse não se vê razão para a "interpretação estrita" de que fala a jurisprudência do TJCE e que a decisão recorrida sufragou, deixe de ser adoptada nos demais casos de contratação em que entidades de outra natureza estão em causa.
Em conclusão: perfilha-se o entendimento da decisão recorrida de que a natureza associativa do SUCH não é determinante para decidir se há ou não controlo análogo.
42. Rejeitam-se assim nestes aspectos os argumentos produzidos pela recorrente (63) e contrariam-se as conclusões 9ª a 12ª da petição (64).
II.B.3 - A natureza dos associados do SUCH
43. Como acima se viu, na impugnação da decisão recorrida, a petição de recurso, para apoiar a sua tese de que entre a entidade adjudicante (a ARSN) e a adjudicatária (o SUCH) se estabelecem relações meramente "internas", apoia-se ainda na natureza dos associados do SUCH. A esse propósito refere:
§ "(...) ao contrário do que é assumido pelo Tribunal de Contas, o SUCH não integra, hoje em dia, qualquer associado privado (...);
§ (...) as instituições particulares de solidariedade social não se inserem nem no sector público nem no sector privado(...);
§ (...) não se afigura legítimo afirmar que as duas sociedades anónimas que assumem a qualidade de associados do SUCH - CESPU, SERVIÇOS DE SAÚDE, S.A. e o HOSPITAL DOS LUSÍADAS -- consubstanciem entidades materialmente privadas;
§ (...) quando o TJCE refere a rejeição do controlo análogo sempre que existirem participações privadas não pretende abranger o caso das participações detidas por entidades cooperativas e sociais (...);
§ (...) as participações no substrato pessoal do SUCH de instituições particulares de solidariedade social e de sociedades anónimas não podem, no caso em apreço, ser consideradas participações privadas, não existindo, assim qualquer obstáculo à verificação do requisito de «controlo análogo."
44. Vejamos os factos (65). O SUCH, como se viu, tem 99 associados. Destes, 24 são entidades não públicas: 19 irmandades e santas casas da misericórdia (66), a União das Misericórdias Portuguesas, a Confraria de Nossa Senhora da Nazaré (67), a Fundação Aurélio Amaro Diniz (68), a CESPU - Serviços de Saúde, S.A., e o Hospital dos Lusíadas.
45. Deve reconhecer-se que a recorrente tem razão quando sublinha o facto de os associados do SUCH que são entes não públicos, em rigor, não poderem ser qualificados como entidades privadas. De facto, o Hospital dos Lusíadas sendo uma sociedade anónima tem o capital integralmente detido - ainda que não directamente, o que deve relevar-se - por uma entidade pública (a CGD), e as misericórdias, como as demais entidades associadas não públicas, integram-se no sector cooperativo e social consagrado na Constituição, no seu artigo 82º.
Analisemos mais em detalhe cada uma das situações, não perdendo de vista que se trata de perceber se o protocolo em causa poderia ter sido celebrado com fundamento no exercício de controlo análogo do SUCH pela ARSN.
46. Ora, as irmandades ou santas casas de misericórdia, integram-se no sector cooperativo e social, e nos termos do Decreto-Lei nº 119/83, de 25 de Fevereiro (69), são instituições particulares de solidariedade social, que "escolhem livremente as suas áreas de actividade e prosseguem autonomamente a sua acção", cujo contributo o "Estado aceita, apoia e valoriza", sem que tais apoios possam "constituir limitações ao direito de livre actuação". As IPSS, nos termos do disposto no respectivo estatuto, adquirem a natureza de pessoas colectivas de utilidade pública (70). E nos termos do Decreto-Lei nº 460/77, de 7 de Novembro, prosseguem fins de interesse geral, ou da comunidade nacional ou de qualquer região ou circunscrição, cooperando com as administrações públicas.
Nos termos da doutrina e jurisprudência dominantes, as IPSS são pessoas colectivas de direito privado, com autonomia, não administradas pelo Estado (71).
Retenha-se igualmente que as irmandades ou santas casas da misericórdia são associações constituídas na ordem jurídica canónica, podendo ser extintas pelo ordinário diocesano e pelos tribunais (72).
47. A União das Misericórdias Portuguesas, a Confraria de Nossa Senhora da Nazaré e a Fundação Aurélio Amaro Diniz são igualmente instituições particulares de solidariedade social.
48. A CESPU - Serviços de Saúde, S.A., tem capital social integralmente subscrito pela CESPU - Cooperativa de Ensino Superior, Politécnico e Universitário, CRL (73). Refira-se que a CESPU - Cooperativa de Ensino Superior Politécnico e Universitário, CRL, é uma cooperativa que tutela administrativamente quatro estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo. A cooperativa deu progressivamente origem a um grupo económico - o Grupo CESPU - "com diversificada intervenção no sector da saúde e significativo impacto social (74)", em que se integram a referida CESPU Saúde, S.A., a CESPU Formação, S.A. e a SOIBSA, SGPS, Lda. (a Sociedade Ibérica de Saúde (75)).
49. O Hospital dos Lusíadas, como acima se viu, é uma sociedade anónima com capital detido a 100% pela Hospitais Privados de Portugal, SGPS, SA, cujo capital é detido a 100% pela Fidelidade Mundial, a qual é detida também a 100% pela Caixa Geral de Depósitos.
50. Em conclusão, o SUCH tem de entre os seus 99 associados, 24 que são entidades não públicas, das quais são 22 são IPSS (das quais 19 são canonicamente erectas) e 2 são sociedades anónimas (uma com o capital detido por uma cooperativa que lidera um grupo económico e outra detida por uma SGPS, por sua vez detida por outra S.A., por sua vez detida por outra S.A., de capitais exclusivamente públicos).
51. Relembre-se, mais uma vez, que a construção da teoria das relações internas (ou in house) arrancou da constatação de que a contratação inter-administrativa justificava um regime especial, na medida em que as entidades públicas podem auto-organizar-se para a satisfação das suas necessidades. Foi perante essa constatação que inicialmente foi admitido, por alguns sectores doutrinários, que a contratação entre entidades públicas poderia não ser submetida aos princípios e regras da contratação pública. Mas a essa abordagem inicial, como já se viu, sucedeu-se outra com maior exigência, visando simultaneamente a observância alargada do princípio da concorrência, mas igualmente uma melhor satisfação dos interesses públicos. Daí surgiram as condições do acórdão Teckal. E daí também resultou, no direito nacional, o que dispõe o CCP nessa matéria.
Ora, se essas exigências surgiram para sujeitar, em regra, a contratação entre instituições públicas aos princípios e regras da contratação pública, como já se disse, mais sentido faz ainda sujeitar a tais princípios e regras, a contratação entre uma entidade pública (a ARSN) e uma entidade não pública, como é o SUCH.
E quando esta - uma pessoa colectiva de direito privado, como acima se viu - tem como associados, em número não despiciendo, entidades não públicas, aquelas exigências não podem aligeirar-se, sob pena de incoerência na aplicação do direito. Deve pois manter-se uma interpretação estrita do direito aplicável.
52. É verdade que, em rigor, não se trata de entidades privadas, como defende a recorrente. Mas manda a objectividade reconhecer que não sendo privadas, e embora podendo alegar-se que prosseguem interesses públicos, também não são públicas, pelas mesmas e invocadas razões constitucionais.
E convém referir o seguinte a propósito das duas S.A. (uma detida por uma cooperativa que lidera um grupo económico e a outra que é longinquamente detida por uma sociedade de capitais integralmente públicos): relembre-se o Acórdão Carbotermo (76), em que apesar de o capital de entidade adjudicatária ser detido a 100% por entidades públicas, considerou não haver "controlo análogo", porque tal detenção era feita não directamente, mas através de uma sociedade holding (embora esta também fosse de capitais integralmente públicos detidos pelas entidades públicas em causa). Mutatis mutandis, também se poderá referir que estas sociedades anónimas, pese embora se possam situar no campo do sector social e cooperativo e no sector público, estão suficientemente distantes deles, para se poder dizer que obedecem estritamente a uma lógica de interesses sociais e públicos, de tal forma que a entidade adjudicante possa exercer sobre uma associação de que estes fazem parte um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços.
53. Ora, como se pode invocar que o controlo exercido pela ARSN (obviamente em conjunto com as demais entidades adjudicantes) sobre o SUCH é análogo ao que exerce sobre os próprios serviços, quando o SUCH não só é uma pessoa colectiva de direito privado (o que não seria por si impeditivo, embora constituísse uma circunstância pertinente a considerar), mas tem como associados um número relevante de entidades não públicas que notoriamente escapam aos controlos públicos.
Relembre-se que na contratação interna, a entidade adjudicatária deve poder ser considerada uma "estrutura de gestão interna de um serviço público (77)" ou materialmente um prolongamento administrativo da entidade adjudicante. Pode considerar-se o SUCH, com 24 associados não públicos - com larguíssima autonomia legalmente consagrada, a maior parte dos quais erguidos no âmbito da ordem canónica, com reflexo na ordem jurídica - como uma estrutura de gestão interna da ARSN e das demais entidades públicas associadas?
Ora, parece evidente que na relação entre as entidades públicas e o SUCH aquelas não podem comportar-se relativamente a este como se de uma estrutura interna se tratasse. A condução dos destinos do SUCH e a sua gestão - face aos próprios poderes que resultam dos estatutos - não poderão ignorar a participação de um relevante número de instituições particulares de solidariedade social e sociedades anónimas.
54. Em conclusão: a natureza dos associados do SUCH - entidades públicas e não públicas, designadamente as IPSS, em particular as santas casas da misericórdia, canonicamente erectas e com a autonomia que legalmente lhes está reconhecida e as S.A. longinquamente detidas por entidades do sector público e cooperativo - não milita a favor de se considerar que as relações entre a ARSN e o SUCH sejam análogas à que aquela estabelece com os seus serviços. Assim, se no caso da relação entre entidades públicas adjudicantes e sociedades comerciais adjudicatárias com capitais não integralmente públicos, nos quais aquelas participem, este facto é um indício de que se não está perante situação de controlo análogo, o facto de o SUCH ser uma associação privada com associados com larga autonomia e independência face aos poderes públicos é indício de que se não está perante uma situação de controlo análogo.
55. A recorrente refere ainda que existe uma (alegada) exigência de que a entidade adjudicatária - no caso de ser uma associação, como no caso é o SUCH ou outra entidade colectiva em que, por qualquer forma, outras entidades participem, no caso de sociedades, através da detenção do seu capital, por exemplo - seja constituída só por entidades adjudicantes.
De facto, não pode ser formulada tal exigência. O nº2 do artigo 5º do CCP não o permite. Dir-se-á simplesmente que se for constituída por entidades adjudicantes, haverá um indício favorável à verificação do requisito do controlo análogo. Se existirem entidades públicas não adjudicantes tal indício é simplesmente mais frágil...
56. Rejeitam-se assim, nestes aspectos, os argumentos produzidos pela recorrente (78) e contrariam-se as conclusões 13ª a 15ª (79). E concordando-se com as conclusões 16ª e 17ª da petição, delas não se pode concluir necessariamente que, no caso, se verifica o requisito do controlo análogo.
II.B.4 - As unidades de serviços partilhados
57. O artigo 2.º, n.º 3, dos Estatutos estipula que as unidades de serviços partilhados constituídas pelo SUCH podem ser constituídas sob a forma de unidades orgânicas do SUCH ou sob a forma de pessoas colectivas integradas pelo SUCH e pelos seus associados e ou por terceiras entidades.
No nº2, da cláusula 3ª, do Protocolo, prevê-se que a administração, gestão e operação do Centro de Processamento de Contabilidade e Finanças podem ser cometidas, ou cedidas pelo SUCH, a entidades terceiras (Entidades Gestoras) constituídas sob qualquer modalidade jurídica que o SUCH entenda conveniente, mediante simples comunicação à ARSN, IP., desde que nelas o SUCH detenha "participação maioritária, controlo de gestão e dos respectivos órgãos de administração".
58. Ora, não pode o julgador deixar de atender a estas disposições. Perante elas, como acima já se disse (80), a entidade SUCH não é só o SUCH, mas inclui o complexo de entidades que, à sombra daquela disposição estatutária, podem ser criadas sob qualquer forma e para as quais, ao abrigo de disposições protocolares (como no presente caso) são "passadas" decisões de adjudicação inicialmente feitas ao SUCH, sem procedimentos concorrenciais alguns. Assim, por via daquelas disposições - estatutárias e protocolares ou contratuais - a aquisição pública de bens e serviços ultrapassa definitivamente o perímetro legalmente estabelecido em que são admitidas soluções não concorrenciais.
E, no presente caso, como acima já se referiu (81), há suficientes indícios de que a execução do objecto do protocolo iria ser assumida por uma entidade terceira: a esta conclusão se chega por via da referida cláusula protocolar, por via das posições assumidas pela entidade adjudicante e pelo próprio SUCH na primeira instância e, ainda, por via da própria argumentação do recurso.
E, contrariamente ao que é referido pela recorrente (82), não se pode dizer que o recurso do SUCH aos serviços de outras entidades seja uma mera possibilidade abstracta.
Assim, no caso dos ACE ou de quaisquer outras entidades através dos quais são prestados serviços, e que integram ou podem integrar parceiros privados (83), a adopção de procedimentos de adjudicação directa ao SUCH (ou aos próprios ACE ou a essas outras entidades) permite que as empresas privadas participantes beneficiem de uma vantagem relativamente aos seus concorrentes.
59. E, obviamente, entre as entidades públicas adjudicantes e associadas do SUCH (a ARSN, nomeadamente) e tais entidades terceiras a quem as decisões de adjudicação são "passadas" não existe, nem pode existir um controlo análogo ao que têm sobre os seus próprios serviços. É tão evidente esta asserção que não precisa de ser demonstrada. Nem a argumentação relativa a "participação maioritária, controlo de gestão e dos respectivos órgãos de administração (84)" põe em causa o essencial do que agora se disse.
60. Rejeitam-se assim, nestes aspectos, os argumentos produzidos pela recorrente (85) e contraria-se a conclusão 18ª da petição (86).
II.B.6 - Outras circunstâncias pertinentes para aferir sobre a existência de controlo análogo: as entidades não públicas e o seu direito de voto na Assembleia Geral, a complexidade empresarial do SUCH e a falta de poderes de imposição administrativa da entidade adjudicante sobre a adjudicatária.
61. Face ao disposto nos estatutos, à matéria de facto dada como assente e à informação constante do processo, podem os 99 associados do SUCH exercer os seus direitos em assembleia geral, mobilizando-se 138 votos, dos quais 24 correspondem às entidades não públicas acima identificadas e caracterizadas.
É no uso desses direitos de voto que se aprovam os planos estratégicos e de actividades do SUCH, o relatório e contas anuais, se aprecia a gestão do SUCH, se elege a sua mesa, se elege a maioria dos membros do conselho de administração, se elege a totalidade dos membros do conselho fiscal, se decidem os recursos interpostos pelos associados de decisões irregulares do conselho de administração, se delibera sobre a aquisição, alienação e oneração de bens imóveis e sobre a contracção de empréstimos (87).
Ora o resultado dessas votações não poderá deixar de atender às especificidades das entidades não públicas associadas. Se estas não fossem atendidas, que sentido teria a sua participação?
A participação não negligenciável daquelas concretas entidades não públicas nestas decisões é mais um indício de que na relação entre a ARS Centro e o SUCH, ainda que em conjunto com as demais entidades públicas associadas, aquela se não pode comportar relativamente a este de forma análoga à que faz com os seus próprios serviços.
Concorda-se que não se pode exigir que o controlo seja "igual" mas "análogo", isto é, sem interferência de interesses diferentes dos da Administração Pública. Ora, ainda que se considerasse que as IPSS (certamente) e as referidas sociedades anónimas (duvidosamente) prossigam interesses públicos também, é um facto que embora havendo cooperação, são entidades que pertencem a sectores diferentes: público e social e cooperativo.
Ora, se é jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que a participação, ainda que minoritária, de uma empresa privada no capital de uma sociedade no qual participa também a entidade adjudicante em causa exclui, de qualquer forma, que esta entidade adjudicante possa exercer sobre esta sociedade um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços, também a participação não negligenciável de entidades sociais e cooperativas e outras, através do seu voto nas decisões estratégicas e mais importantes da gestão do SUCH, milita a favor de que não é possível considerar-se que estamos perante uma situação de controlo análogo.
Não pode concluir-se de outro modo, se se quiser (e assim deve ser) manter uma interpretação estrita das excepções aos princípios e regras da contratação pública.
62. Conforme foi referido no acórdão recorrido e não foi contestado, consta de website do SUCH (88) que este - certamente no uso das faculdades conferidas pelo nº 3 do artigo 2º e pelo artigo 3º dos Estatutos - se associou "a outras entidades a fim de reforçar a sua capacidade competitiva em determinados segmentos de mercado" sendo referidas as seguintes em que detém participações sociais:
a) SUCH Dalkia, Serviços Hospitalares. Criado em Junho de 1996, é um Agrupamento Complementar de Empresas (ACE), sendo 50% propriedade do SUCH e os restantes 50% da DALKIA - Empresa de Serviços, Condução e Manutenção de Instalações Técnicas, S.A. Este ACE tem por objecto social a produção de energia eléctrica e a gestão das actividades dos seus membros relacionadas com a gestão e exploração de actividades de apoio em hospitais, designadamente o conjunto de serviços técnicos de manutenção de equipamentos e exploração de lavandarias;
b) Coimbravita - Agência de Desenvolvimento Regional SA. Criada em Julho de 2000, com uma participação de 3,69% do SUCH, tem por objecto a promoção de acções que criem emprego e melhorem o ambiente e a qualidade de vida no distrito de Coimbra e distritos limítrofes, nas áreas dos serviços, indústria e comércio, exclusivamente relacionadas com o sector da saúde e ciências da vida;
c) EAS - Empresa de Ambiente na Saúde, Tratamento de Resíduos Hospitalares. Criada em Maio de 2001, a EAS é totalmente detida pelo SUCH. Transformada em Maio de 2008 em EAS Unipessoal, Lda. com alargamento do seu objecto social, possui uma participação de 64,53% no capital da Valor Hospital, SA;
d) Coimbra Inovação Parque - Parque de Inovação em Ciência, Tecnologia, Saúde, SA. O SUCH detém 2% do capital da sociedade. Constituída em Fevereiro de 2004, tem como objecto a implementação, gestão e administração de parques empresariais, científicos e tecnológicos e o apoio à actividade económica e empresarial em geral;
e) Somos COMPRAS, ACE. Criado em Abril de 2007, Somos COMPRAS é uma entidade empresarial de serviços partilhados para a área de compras e logística na Saúde. São agrupados deste ACE, para além do SUCH, com 86%, três grupos hospitalares - Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE, Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, EPE e Hospital de Santa Maria, EPE, representando uma participação de 9%. Integrava ainda este ACE, com uma participação de 5%, um parceiro especializado, a SGG - Serviços Gerais de Gestão SA, uma empresa do universo da Deloitte Touche Tohmatsu (89);
f) Somos PESSOAS, ACE. Com uma participação de 95%, o SUCH é o principal agrupado do Somos PESSOAS, criado em Junho de 2007, tendo a Capgemini, SA, como parceiro especializado, os restantes 5%. Este ACE disponibiliza serviços partilhados de gestão de Recursos Humanos;
g) Somos CONTAS, ACE. O SUCH detém uma participação de 95% na Somos CONTAS, criado em Junho de 2007, para o desenvolvimento de serviços partilhados de gestão financeira, em que também é agrupado um parceiro especializado, a Accenture, Consultores de Gestão, SA, que detém os restantes 5%;
h) Somos AMBIENTE, ACE. Com uma participação de 80%, o SUCH é o principal agrupado do Somos AMBIENTE, ACE, criado em Julho de 2008. Esta unidade empresarial tem por objectivo principal a construção e exploração de um centro integrado de valorização energética, reciclagem e tratamento de resíduos e conta com a participação de um parceiro especializado e de um parceiro tecnológico.
Do exposto resulta que estamos perante uma organização empresarial sofisticada, que conjuga meios próprios com parcerias de negócio, nas quais participam empresas privadas de carácter puramente mercantil e que, necessariamente, tem de desenvolver com autonomia as suas actividades.
O modelo organizativo que o SUCH atingiu e a actividade desenvolvida dificilmente se compaginam com a tradicional visão de um instrumento de pura "cooperação e interajuda", de "colocação em comum de meios para a obtenção de directas vantagens comuns, dentro do mesmo círculo pessoal dos associados (90)".
Esta complexidade empresarial constitui novo indício de que dificilmente se pode considerar que entre as entidades adjudicantes associadas do SUCH e este se estabelece um controlo análogo ao que exercem sobre os seus próprios serviços.
63. Com esta dimensão e complexidade organizacional se relaciona outro aspecto abordado pela decisão recorrida e impugnado na petição de recurso: a falta de poderes de imposição administrativa da entidade adjudicante sobre a adjudicatária.
Dizia-se na decisão recorrida que ao SUCH compete "tomar a seu cargo as iniciativas susceptíveis de contribuir para o funcionamento mais ágil e eficiente dos seus associados (...) designadamente constituindo unidades de serviços partilhados" e acrescentava-se que esta "incumbência do SUCH surge como uma vertente do seu objecto social, descrito nos Estatutos, e não como uma imposição administrativa da entidade adjudicante. As concretas prestações são asseguradas por via negocial". Assim, "não se pode afirmar que a adjudicante possa impor ao SUCH a prestação dos serviços em causa. O SUCH oferece-os, no âmbito do seu objecto social (91), e não por determinação da adjudicante". E concluía-se dizendo que "[f]ace ao regime aplicável, afigura-se que, formalmente, o SUCH dispõe de liberdade quanto ao seguimento a dar a um pedido feito pelos seus associados, e também quanto ao preço aplicável às suas prestações (92)(93)."
Perante tal avaliação refere a entidade recorrente: "(...) de acordo com a jurisprudência comunitária, não se afigura exigível - para o preenchimento do requisito do «controlo análogo» - a existência de prerrogativas de controlo (sobre a entidade co-contratante) idênticas às que são exercidas pela entidade adjudicante sobre os seus próprios serviços, bastando a constatação de um controlo suficiente que permita que os objectivos de interesse público se possam realizar através das actividades da entidade instrumental, sem interferência de outros interesses concorrentes (94). Assim sendo, se o controlo das autoridades públicas sobre os seus próprios serviços se caracteriza juridicamente, na maioria dos casos, pela existência de um poder de dar instruções e de faculdades de fiscalização - ou, citando o ACÓRDÃO, pela possibilidade de "imposição administrativa da entidade adjudicante" -, o controlo análogo exercido pela entidade pública sobre uma entidade instrumental no âmbito de uma relação quase interna (ou in house) implica a existência de um grau de autonomia maior do que o próprio órgão administrativo, já que não existe naqueles casos relação de hierarquia, mas sim de mera dependência (95). Nestes casos, pois, o que é decisivo é que a entidade adjudicante esteja em condições de prosseguir os seus objectivos de interesse público, através da entidade co-contratante (96)".
64. Argumenta-se pois com a necessidade de entre a entidade adjudicante e a adjudicatária dever existir um "controlo suficiente" e uma "relação quase interna" e que estas circunstâncias não exigem a consagração ou manutenção dos poderes próprios de "imposição administrativa", bastando tão-somente para que se verifique o requisito da contratação in house que os objectivos de interesse público se possam realizar.
Relembre-se: da lei, da jurisprudência, da doutrina resulta a necessidade de controlo análogo (e não suficiente) e da existência de facto de relações internas (e não quase internas): a entidade adjudicatária deve ser de facto um prolongamento administrativo da adjudicante (ou do conjunto das entidades adjudicantes).
E, obviamente, não pode dizer-se, neste ponto, que basta que a entidade adjudicante possa prosseguir os seus objectivos de interesse público através da entidade instrumental co-contratante para estarmos perante a verificação do requisito do controlo análogo. A entidade adjudicante pode prosseguir os seus objectivos de interesse público com a colaboração de qualquer entidade com quem contrate a prestação dos serviços de que necessite.
Daí que se subscreve o entendimento da decisão recorrida quando falou de "imposição" ou "determinação" administrativas. Ainda que, em rigor, formalmente, nas relações "in house" não se deva referir tal possibilidade, na medida em que se trata de entidades autónomas, substancialmente, nesse quadro de relações, a entidade adjudicatária deve estar em posição de sujeição perante as entidades adjudicantes. Só assim se pode dizer que aquela é um prolongamento administrativo destas(97).
65. E analisando-se atentamente o teor do protocolo, dele resulta claramente que se trata de um verdadeiro instrumento contratual em que se conciliam vontades autónomas.
E é natural que assim seja, face à dimensão organizacional e económica das entidades envolvidas.
Nesse sentido, vejam-se nomeadamente as cláusulas relativas à suspensão do protocolo e à sua rescisão sem justa causa em que se prevêem indemnizações e a cláusula relativa à resolução judicial de conflitos.
66. Enfrentam-se assim, neste aspecto, os argumentos produzidos pela recorrente e a conclusão 20ª da petição (98).
II.B.6 - A criação dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde
67. Como acima se referiu a recorrente finalmente diz que "(...) importa salientar que, na presente data, foi publicado o Decreto-Lei n.º 19/2010, de 22 de Março, que cria a empresa pública SPMS - SERVIÇOS PARTILHADOS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, E.P.E., detida integralmente pelo Estado, e que sucede nas atribuições dos agrupamentos complementares de empresas, criados e participados pelo SUCH, que, nessa medida, se extinguem. Assim sendo, dada a publicação do diploma acima referido, perde razão de ser a linha de argumentação expendida pelo Tribunal de Contas, na parte em que se refere à questão do SOMOS CONTAS, ACE, como constituindo um obstáculo à verificação da relação in house entre a RECORRENTE e o SUCH, devendo toda a parte do ACÓRDÃO respeitante aos agrupamentos complementares de empresas dar-se por não escrita".
Pese embora a presente decisão deva assentar na aplicação do direito vigente no processo de formação e de celebração do protocolo pelas razões acima referidas acima no nº 20, não deixaremos de abordar a argumentação apresentada pela recorrente.
68. O referido diploma legal cria efectivamente a SPMS, E.P.E., que "tem por atribuições a prestação de serviços partilhados específicos da área da saúde em matéria de compras e logística, financeiros e recursos humanos aos estabelecimentos e serviços do Serviço Nacional de Saúde (SNS), independentemente da sua natureza jurídica, bem como aos órgãos e serviços do Ministério da Saúde e a quaisquer outras entidades, quando executem actividades específicas da área da saúde".
69. Como já se disse, a invocação deste diploma para impugnação do acórdão recorrido nos aspectos em que neste se aborda a questão dos ACE's, e em particular o Somos Contas, ACE, veio confirmar o acerto do que consta naquela decisão.
70. No presente acórdão importa atender em especial ao que dispõe o artigo 11º daquele diploma legal. Dele resulta:
a) A SPMS sucede na posição de central de compras do ACE "Somos Compras", a extinguir;
b) As posições jurídicas dos ACE "Somos Compras", "Somos Contas" e "Somos Pessoas", bem como das estruturas do SUCH para a prossecução das actividades daqueles agrupamentos, devem transmitir-se para a SPMS no prazo de 60 dias, nos termos e condições estabelecidos em acordo a celebrar pela SPMS e aquelas entidades e homologado pelo Governo;
c) As posições jurídicas referidas na alínea anterior compreendem a universalidade de bens e direitos dos ACE afecta ao exercício das actividades em causa.
71. Da referida disposição legal e com relevo para apresente decisão resulta:
a) O Somos Compras será extinto. Não se sabe, contudo, se já foi ou não extinto;
b) O "Somos Contas", e o "Somos Pessoas" não são extintos e as posições jurídicas existentes à data de entrada em vigor do diploma e relativas "ao exercício das actividades em causa" devem transmitir-se para a SPMS. Não se sabe, contudo, se já foram ou não transmitidas.
72. Ora, no protocolo que constitui objecto do processo, as posições jurídicas nele existentes são da ARSN e do SUCH.
As do SUCH, à data da entrada em vigor do diploma, tinham-se já transmitido ao ACE Somos Contas? Se sim, tinha razão a decisão recorrida... Mas em rigor não se sabe, e a recorrente nada disse de claro sobre isso...
E se sim... posteriormente já se transmitiram, por força do diploma para a SPMS? Não se sabe igualmente e nada sobre isto a recorrente veio igualmente dizer.
De qualquer modo mantém-se no protocolo agora em apreciação o nº 2, da cláusula 3ª, onde se prevê que a administração, gestão e operação do Centro de Processamento de Contabilidade e Finanças podem ser cometidas, ou cedidas pelo SUCH, a entidades terceiras (Entidades Gestoras) constituídas sob qualquer modalidade jurídica que o SUCH entenda conveniente, mediante simples comunicação à ARSN, IP., desde que nelas o SUCH detenha participação maioritária, controlo de gestão e dos respectivos órgãos de administração.
Isto é: a questão definitiva que na decisão recorrida conduziu à conclusão de que não é possível considerar-se que o protocolo se insira no contexto de relações "in house" mantém-se...
No essencial, concorda-se pois com a posição tomada pelo Ministério Público nesta matéria.
73. Rejeitam-se assim, nestes aspectos, os argumentos produzidos pela recorrente (99) e contraria-se a conclusão 19ª da petição (100).
II.B.7 - Conclusões quanto à verificação do requisito do controlo análogo
74. Retiremos pois conclusões da apreciação de direito até agora feita. Assim:
a) O SUCH é uma pessoa colectiva de direito privado. Pese embora tal natureza não seja impeditiva do estabelecimento de relações in house, o facto de estas terem sido juridicamente definidas para enquadrar certo tipo de relações contratuais entre entidades públicas, conduz a que também relativamente a relações contratuais entre entes públicos e privados se mantenha e até reforce a interpretação estrita que deve ser feita na aplicação de excepções aos princípios e regras da contratação pública;
b) O SUCH é uma associação sem fins lucrativos. Pese embora estejam afastadas preocupações relacionadas com fins lucrativos - que tanto relevo têm assumido na jurisprudência comunitária, por exemplo - a natureza associativa não é determinante para considerar que os requisitos das relações "in house" se encontram reunidos. O relevante é saber se as entidades adjudicantes (nelas incluídas a ARSN) exercem ou não sobre tal associação um controlo análogo ao que realizam sobre os seus próprios serviços;
c) De entre os associados do SUCH constam IPSS, designadamente santas casas da misericórdia, e sociedades anónimas, em número não negligenciável, com direito de voto na assembleia geral, votando nas decisões estratégicas e importantes na gestão do SUCH, associados que, dada a sua natureza, contribuem para não ser admissível considerar-se que o SUCH se possa conformar a um mero prolongamento administrativo das entidades adjudicantes associadas ou uma estrutura da sua gestão interna. Tais factos constituem um forte indício de que não pode verificar-se no caso o requisito do controlo análogo;
d) O SUCH apresenta uma estrutura organizativa e um modelo de negócios que aponta para uma autonomia de gestão correspondente a uma organização empresarial sofisticada, autonomia que não é compatível com o controlo análogo a que as entidades adjudicantes sujeitam os seus próprios serviços. Tal complexidade e sofisticação conduz a que o SUCH não se possa limitar a sujeitar-se a executar o que lhe é determinado pelas entidades adjudicantes. É destas um parceiro contratual com capacidade e vontade próprias. Nesse sentido vão claramente disposições do protocolo em apreciação neste processo. Tais factos constituem outro forte indício de que não pode verificar-se no caso o requisito do controlo análogo;
e) No protocolo em causa mantém-se o SUCH como entidade adjudicatária, mas com a possibilidade de transmitir a sua posição contratual a entidades terceiras de qualquer natureza, mediante mera comunicação à entidade adjudicante. Tal disposição remete o protocolo definitivamente para o exterior do perímetro legalmente admissível do estabelecimento de relações in house;
f) A criação da SPMS não altera a solução constante do protocolo: o SUCH mantém-se como adjudicatário, mantém-se a cláusula referida na alínea anterior, não há prova de que a posição contratual se tenha antes transmitido a ACE, nem há prova de que, se porventura isso aconteceu, a posição contratual se tenha transmitido à SPMS. E a extinção do ACE Somos Contas, particularmente em foco neste processo, não está expressamente determinada na lei.
75. Em face do disposto no n.º 2 do artigo 5.º do Código dos Contratos Públicos, da jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, dos princípios que enformam as regras de contratação pública, em especial o da concorrência, e das disposições do protocolo em causa, não pode, pois, considerar-se que a relação entre o SUCH e os seus associados públicos, e, em particular, entre o SUCH e a ARS Norte, seja uma relação "interna" equiparada à que é estabelecida pela entidade adjudicante com os seus próprios serviços.
Face a tal conclusão não é necessário proceder a avaliação sobre se o segundo requisito fixado no nº 2 do já citado artigo 5º se verifica ou não.
Contraria-se pois a conclusão 21ª da petição (101).
Consequentemente, não pode aplicar-se ao caso a excepção prevista no artigo 5.º, n.º 2, do Código.
É também claro que não foi estabelecido a favor do SUCH qualquer direito exclusivo de prestação do serviço em causa (vide artigo 5.º, n.º 4,alínea a) do CCP).
Não se vislumbra outra qualquer excepção à aplicação das regras de contratação pública ao caso.
A formação do contrato deveria ter obedecido ao disposto na Parte II do CCP.
De acordo com o estipulado no artigo 20.º, n.º 1, alínea b), do mesmo Código, o contrato deveria ter sido precedido de concurso público ou de concurso limitado por prévia qualificação, com publicação dos respectivos anúncios no Jornal Oficial da União Europeia. Não tendo sido realizado nenhum destes procedimentos, resulta desta norma legal que o contrato não podia ter sido celebrado. A ausência do concurso, obrigatório no caso, implica a falta de um elemento essencial da adjudicação, o que determina a respectiva nulidade, nos termos do artigo 133.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, como tem sido entendimento uniforme deste Tribunal. Esta nulidade, que pode ser declarada a todo o tempo, origina a nulidade do contrato, nos termos do estabelecido no artigo 283.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos.
A nulidade constitui fundamento de recusa de visto, como estabelece a alínea a) do n.º 3 do artigo 44º da LOPTC.
III - DECISÃO
1. Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes, em plenário da 1ª Secção, em julgar improcedente o recurso, mantendo a decisão de recusa do visto.
2. São devidos emolumentos nos termos da alínea b) do nº1 e do nº2 do artigo 16º do regime anexo ao Decreto-Lei nº66/96, de 31 de Maio, com as alterações introduzidas pela Lei nº 139/99, de 28 de Agosto, e pela Lei nº 3-B/2000, de 4 de Abril.
Lisboa, 17 de Dezembro de 2010
Os Juízes Conselheiros, - (João Figueiredo, relator) - (Alberto Fernandes Brás) -(Carlos Morais Antunes)
Fui presente
O Procurador-Geral Adjunto - (Jorge Leal)
(1) Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas: Lei nº 98/97, de 26 de Agosto, com as alterações introduzidas pelas Leis nºs 87-B/98, de 31 de Dezembro, 1/2001, de 4 de Janeiro, 55-B/2004, de 30 de Dezembro, 48/2006, de 29 de Agosto, 35/2007, de 13 de Agosto, e 3-B/2010, de 28 de Abril.
(2) Código da Contratação Pública, provado pelo Decreto-Lei nº 18/2008, de 29 de Janeiro, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 18-A/2008, de 28 de Março e alterado pela Lei nº 59/2008, de 11 de Setembro, pelos Decretos-Lei nºs 223/2008, de 11 de Setembro, 278/2009, de 2 de Outubro, e pela Lei nº 3/2010, de 27 de Abril.
(3) O qual é, de acordo com o Regulamento (CE) n.º 1422/2007, de € 206.000,00.
(4) Cfr. alínea I) do Capítulo II do ACÓRDÃO.
(5) Cfr. alínea Q) do Capítulo II e nota de rodapé n.º 4 do ACÓRDÃO.
(6) São esses os dados que resultam da listagem constante a fls 183 e ss. dos autos na primeira instância. Na presente decisão remeter-se-á para essas listagens quando esta questão for abordada, na sua relevância jurídica.
(7) Vide informação constante de fl. 322 do processo nº 1807/2009.
(8) Cfr. alínea W) do Capítulo II do ACÓRDÃO.
(9) Cfr. alínea OO) do Capítulo II do ACÓRDÃO.
(10) Cfr. alínea NN) do Capítulo II do ACÓRDÃO.
(11) Negrito da nossa responsabilidade
(12) Idem.
(13) Idem.
(14) Idem.
(15) Disse a ARS Norte: "O Somos Contas, ACE, é um agrupamento complementar de empresas, constituído, integrado e controlado pelo SUCH, na sequência de uma deliberação dos seus associados tomada em Assembleia Geral, que tem por objecto a prestação de serviços de contabilidade e finanças ao SUCH e aos seus associados" (vide fls. 14 e ss. do processo).
(16) Disse ainda a ARS Norte: "O SUCH não comunicou a esta ARS a eventual pretensão de cometer àquele Agrupamento Complementar de Empresas ou a qualquer outra entidade a gestão do Centro de Processamento de Contabilidade e Finanças, ao abrigo da supracitada cláusula do Protocolo" (in ofício CD 277 de 18Nov2010, a fls 10 e ss. dos autos).
(17) Idem.
(18) Ofício do Somos nº 1230 de 29.OUT2009 (a fls 19 e ss. dos autos).
(19) Vide página 55 e nota de rodapé 68 do Acórdão.
(20) Cfr. nota de rodapé n.º 15 do ACÓRDÃO.
(21) Vide artigo 134º da petição.
(22) Vide p. 55 do acórdão.
(23) Ofício nº 1423 de 29 de Outubro de 2010.
(24) Expressão fortemente ambígua, para não dizer incorrecta, pois se é "contratação" não pode ser "interna" e se é "interna" não pode haver "contratação".
(25) Vide conclusões 5 a 8, acima no nº 4 e, nomeadamente, artigos 69º a 84º da petição.
(26) Vide conclusões 9 a 12, acima no nº 4 e, nomeadamente, artigos 85º a 111º da petição.
(27) Vide conclusões 13 a 17 acima no nº 4 e, nomeadamente, artigos 112º a 129º da petição.
(28) Vide conclusões 18 a 20 acima no nº 4 e, nomeadamente, artigos 130º a 156º da petição.
(29) Vide abaixo, na alínea f) do nº 32, o acórdão Comissão v. Áustria, de Novembro de 2005
(30) Vide nº4 do parecer.
(31) Vide de novo o nº 4 do parecer.
(32) Vide o nº 2 da declaração de voto do Conselheiro Carlos Alberto Fernandes Cadilha.
(33) Directivas n.ºs 2004/18/CE e 2004/17/CE, de 31 de Março.
(34) Os seus estatutos foram revistos em 2003 e em 2006. A versão que releva na presente decisão foi publicada no Diário da República, II Série, de 29 de Dezembro de 2006.
(35) Veja-se, designadamente, a composição e forma de designação dos titulares dos órgãos e a redução dos poderes de intervenção do Ministro da Saúde.
(36) Vide artigos 69º a 71º.
(37) Vide nºs 2 e 3 do artigo 15º e nº 2 do artigo 16º dos estatutos. Neste aspecto concorda-se com o que é referido na petição de recurso: ocorreu um "enfraquecimento dos poderes de tutela do Ministério da Saúde" (vide conclusão 7ª). Mas esse facto é diferentemente valorado por este Tribunal.
(38) Novas, porque não existiam nos estatutos antes em vigor.
(39) Vide p. 55 in fine do ACÓRDÃO.
(40) Vide acima a alínea a) do nº 19.
(41) Sobre estas questões vide Gonçalo Guerra Tavares e Nuno Monteiro Dente, "Código dos Contratos Públicos - âmbito da sua Aplicação".
(42) Vide, em especial, os seus nºs 50 e 51.
(43) Vide em especial os nºs 42 a 52.
(44) Vide em especial os nºs 38 a 40.
(45) Vide em especial os nºs 23 a 28.
(46) Vide os nºs 43 a 72 e, em especial, os nºs 46, 58, 63, 65 e 72.
(47) Vide em especial os nºs 38 a 48.
(48) Vide em especial os nºs 34 a 40.
(49) Vide, em especial, os nºs 10 a 15 e 49 a 65.
(50) Vide, em especial, os nºs 36 a 40.
(51) Vide, em especial, os nºs 26 a 32 e 45 a 50.
(52) Vide, em especial, os nºs 34 a 50.
(53) In nº 3 do artigo 8º do Código Civil.
(54) No essencial, como se sabe, foram estas as circunstâncias excepcionais que vieram a ser consideradas no nº 2 do artigo 5º do CCP.
(55) Vide acima a alínea a) do nº 19.
(56) Vide acima no nº 4.
(57) Vide o 4.º considerando da Directiva 2004/18/CE: "os Estados-membros devem velar por que a participação de um proponente que seja um organismo de direito público, num processo de adjudicação de contratos públicos, não cause distorções da concorrência relativamente a proponentes privados."
(58) Cfr. artigos 18.º da Directiva 2004/18/CE e 25.º da Directiva 2004/17/CE.
(59) Segundo Marcelo Caetano são pessoas colectivas de direito privado e regime administrativo. Segundo Diogo Freitas do Amaral são instituições particulares de interesse público. Por ambos, vide Freitas do Amaral in "Curso de Direito Administrativo", Vol. I, Almedina, p. 549 ss. Cfr. ainda a declaração de voto de Carlos Alberto Fernandes Cadilha, no parecer da PGR.
(60) Vide, designadamente, acima, no nº 4, conclusões 9ª a 12ª.
(61) Vide acima alínea k) do nº 32.
(62) E note-se que as entidades empresariais em causa podem ter sido criadas para satisfazer necessidades de interesse geral ou não, e ter carácter industrial ou comercial ou não...
(63) Vide acima a alínea b) do nº 19.
(64) Vide acima no nº 4.
(65) Vide listagem constante a fls 183 e ss. dos autos na primeira instância.
(66) Montalegre, Murça, Alijó, Bombarral, Cinfães, Coimbra, Entroncamento, Esposende, Guarda, Marco de Canaveses, Mealhada, Pinhel, Portimão, Póvoa do Lanhoso, Sabrosa, Santiago do Cacém, Valpaços, Vila Real.
(67) Instituição particular de solidariedade social. Vide http://www.cnsn.pt/portal/index.php consultado em 8.11.2010.
(68) Fundação de solidariedade social. Vide http://www.faad.online.pt/regulamentos/Estatutos_FAAD.pdf consultado em 8.11.2010.
(69) Aprova o Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social. Rectificado por Declaração de 2.3.85, foi alterado pelos Decretos-Lei nºs 386/83, 9/85, 89/85, 402/85 29/86. Vide ainda Lei nº 101/97, de 13 de Setembro.
(70) Vide artigos 2º nº 1 alínea e), 4º nºs1 e 4, 8º e 68º do Estatuto das IPSS.
(71) Vide, por todos, o Acórdão do STA de 8/10/2002 no processo 1308/02. Refira-se contudo que esta decisão judicial afirma uma sujeição à tutela do Estado, com base em disposições legais que estão revogadas (designadamente o artigo 32º do Estatuto das IPSS, revogado pelo Decreto-Lei nº 89/85 de 1 de Abril) ou de conteúdo indefinido (v.g. qual a natureza do visto e quais os serviços competentes a que se refere o artigo 33º daqueles Estatutos). Vide igualmente Freitas do Amaral, "Curso de Direito Administrativo", Vol. I, Almedina.
(72) Vide artigos 69º e 71º do Estatuto das IPSS.
(73) Vide Diário da República, III série, de 22 de Junho de 2001.
(74) Vide http://www.cespu.pt/pt-PT/instituicao/ consultado em 8.11.2010.
(75) Quanto às S.A. vide os respectivos estatutos no DR III Série de 22 de Junho de 2001. Quanto à SGPS diz-se no sítio da CESPU antes indicado que "a Sociedade Ibérica de Saúde é a entidade que gere as participações em empresas que se dedicam à importação e comercialização de equipamentos e materiais de saúde. Esta empresa desenvolve a sua actividade no mercado ibérico".
(76) Vide acima na alínea g) do nº 32.
(77) Vide acima a alínea c) do nº 33.
(78) Vide acima a alínea c) do nº 19.
(79) Vide acima no nº 4.
(80) Vide acima o nº 27.
(81) Vide acima o nº 13.
(82) Vide artigo 136º da petição.
(83) Como é o caso do Somos CONTAS, ACE que tem como agrupado a Accenture SA. Da matéria de facto resulta não só a participação efectiva de uma entidade privada, como os poderes que ela exerce por via da sua participação nos órgãos sociais, reforçados pelo facto de ser necessária a unanimidade para certas decisões. Destaque-se ainda como objectivo acessório do ACE a realização e a partilha de lucros entre os agrupados.
(84) Vide acima o nº 57.
(85) Vide acima a alínea c) do nº 19.
(86) Vide acima no nº 4.
(87) Com a excepção prevista no nº 3 do artigo 15º.
(88) In http://www.somos.pt/Publicdocs/EMPRESAS%20PARTICIPADAS%20SUCH_Set2008.pdf, consultado em 10.11.2010.
(89) Como se disse acima, em Março de 2009, a SGG - Serviços Gerais de Gestão, SA, deixou de participar no ACE. Deve contudo atender-se ao que sobre este ACE também dispõe o Decreto-Lei nº 19/2010, de 22 de Março, abaixo analisado.
(90) Como se referia nos pareceres da Procuradoria-Geral da República.
(91) Refere-se que este consta dos estatutos, sendo que estes são alteráveis pelo órgão máximo do SUCH.
(92) E diz-se na decisão recorrida: "Não obstante e precisamente por se afirmar, a páginas 134 do Relatório de Gestão e Contas 2008, que o SUCH trabalha com "pequenas margens de negócio", para satisfazer a expectativa dos associados na melhor relação preço-qualidade".
(93) É citado o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça no processo C-295/05 (Asemfo/ Tragsa).
(94) São citadas as conclusões apresentadas pela Advogada-Geral STIX-HACKL, em 23 de Setembro de 2004, Processo C-26/03 (Acórdão Stadt Halle) e Conclusões apresentadas pela Advogada-Geral JULIANE KOKOTT, em 1 de Março de 2005, Processo C-458/03 (Acórdão Parking Brixen). Sobre este aspecto, veja-se ainda, ERIC DE FENOYL, Contrats «in house »: état dês Lieux après l'arrêt Asemfo, Actualité Juridique Droit Administratife, n.º 32, 2007, p. 1762.
(95) Autores existem que têm sobre este argumento posição contrária. Veja-se Gonçalo Guerra Tavares e Nuno Monteiro Dente in op. cit. onde dizem: "Assim, para nós, controlo análogo ao exercido sobre os próprios serviços é, como não pode deixar de se considerar, um controlo análogo ao controlo hierárquico administrativo, já que é esse tipo de controlo que uma entidade exerce sobre os seus próprios serviços". "Neste sentido, de que o controlo análogo deve ser entendido como um controlo efectivo, idêntico ao exercido no âmbito de uma relação hierárquica administrativa, também, CLÁUDIA VIANA, Contratos ... cit. e PHILIPPE FLAMME, MAURICE-ANDRÉ FLAMME, CLAUDE DARDENNE, Les Marchés Publics Européens et Belges" l' Irresistible Européanisation du Droit de la Commande Publique, Larcier, Bruxelles, 2005, pág. 29 e segs.
(96) São citadas as conclusões apresentadas pela Advogada-Geral JULIANE KOKOTT, em 1 de Março de 2005, Processo C-458/03 (Acórdão Parking Brixen).
(97) Neste sentido vide Gonçalo Guerra Tavares e Nuno Monteiro Dente in op. cit. onde dizem: "(...) entendemos que se verificará o critério do controlo análogo ao exercido sobre os próprios serviços, previsto no artigo 5.º, n.º 2, alínea a), do Código, sempre que, da situação em concreto, resulte, sem margem para dúvidas, que a entidade adjudicante tem sobre a entidade adjudicatária poderes análogos ao poder de direcção, tal como administrativamente configurado, no âmbito de uma relação hierárquica administrativa, podendo emitir ordens às quais a entidade adjudicatária terá, necessária e inelutavelmente, que se subordinar. Isto é, a entidade adjudicatária não se poderá negar à realização daquelas tarefas ou incumbências, não sendo, para esse efeito, necessário o seu consentimento, nem importando a sua vontade".
(98) Vide acima no nº 4.
(99) Vide acima a alínea c) do nº 19.
(100) Vide acima no nº 4.
(101) Vide acima no nº 4.