Acórdão n.º 13/2011, de 5 de Julho de 2011, do Plenário da 1.ª Secção do Tribunal de Contas (proc. n.º 1373/2011)

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ACÓRDÃO Nº 13/11 - 5.JUL. 2011 - 1ª S/PL

RECURSO ORDINÁRIO Nº 1/2011

(Proc. nº 1373/2011)

I - RELATÓRIO  

1. A Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos (doravante designada por Câmara Municipal ou por CMAV), notificada do Acórdão nº 43/10, de 17/12/2010 - 1ª. S/SS, que recusou o visto ao contrato de empreitada, celebrado em 24 de Setembro de 2010, com a empresa "Veiga Lopes, Lda.", pelo valor de 899.491,79 €, acrescido de IVA, tendo por objeto a "Ampliação e Requalificação da Escola EB1/JI de S. Tiago dos Velhos", do mesmo veio interpor recurso.

2. O referido acórdão considerou que, no processo de formação do contrato, ocorreu a violação das seguintes disposições legais:
a) Dos artigos 155º e seguintes do CCP (1), na medida em que não se verificou o pressuposto de "caso de urgência" que permitisse a adoção do procedimento de concurso público urgente;
b) Do artigo 1º, nº 4, do mesmo código, na medida em que "foi utilizado um procedimento que não garante o respeito pelos princípios da legalidade, da concorrência e da igualdade", porque só a fixação de um prazo como o previsto no nº1 do artigo 135º do CCP "permitiria garantir um verdadeiro processo concorrencial e uma igualdade de oportunidades, efectiva, entre os diversos agentes económicos interessados em apresentar-se ao concurso".
c) Face a tais violações de lei, a decisão recorrida procedeu à recusa de visto, com base na alínea c) do nº3 do artigo 44º da LOPTC (2).

3. Na sua petição de recurso que aqui se dá por integralmente reproduzida, a CMAV, apresenta as seguintes conclusões:
"A) A Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos tinha motivos que justificavam a situação de urgência na adopção do concurso público urgente previsto no artigo 155º. e seguintes do Código dos Contratos Públicos, e que eram os seguintes:
1-A existência de um contrato de financiamento celebrado para obtenção do financiamento comunitário através do Programa Operacional Regional do Centro, cujo prazo de candidatura terminava às 18 horas do dia 29/10/2010 com a condição de apenas serem admitidas as candidaturas cujos procedimentos concursais subjacentes se encontrassem em fase de adjudicação, no caso das empreitadas, conforme se pode comprovar pelo teor do Aviso Para Submissão De Candidaturas Em Regime De Balcão Permanente (3),(...) bem como pelo "timing" corrido desde a deliberação para a abertura do procedimento concursal a 9/08/2010 e a remessa do contrato ao Tribunal de Contas a 8/10/2010 para fiscalização prévia.
2-E a necessidade de conclusão da empreitada da ampliação e requalificação da Escola EB1 de S. Tiago dos Velhos antes do inicio do ano lectivo 2011-2012, para fazer face às necessidades locais nesta área educativa, nomeadamente, pela autorização excepcional do Ministério da Educação de funcionamento da EBI de Adoseiros para o ano lectivo 2010/2011, até à conclusão das obras de ampliação e requalificação da Escola EBI de S. Tiago dos Velhos, e pelo próprio Programa de Acção celebrado com o Governo e os Municípios do Oeste e Lezíria do Tejo aquando do abandono do projecto do aeroporto na Ota (4) (...).

B) Assim, sob pena de perder o prazo de candidatura e o financiamento da obra, foi esta Câmara Municipal motivada a escolher aquele tipo de procedimento pré-contratual excepcional ao abrigo do nº. 2 do artigo 52.° do Decreto-Lei nº. 72-A/2010, de 18 de Junho, na medida em que sem aquele financiamento comunitário, ficava em causa, a execução da obra, por parte da autarquia face ao encargo financeiro que representa uma obra desta dimensão na sua totalidade e cujo encargo não se encontra previsto no orçamento municipal, por razões económicas sobejamente conhecidas.

C) Porém, assumimos, desde já, a nossa falta de entendimento aquando do pedido de esclarecimentos suscitado pela vossa Direcção-Geral no oficio de 17/11/2010, sobre qual a urgência que se verificou para justificar a adopção do procedimento pré-contratual utilizado, pois, efectivamente, não esclarecemos devidamente a situação de urgência, aquando da adopção do procedimento nem na resposta ao pedido de esclarecimentos, quando na verdade existiam as razões suficientes, como atrás foram invocadas, que ameaçavam seriamente a satisfação prioritária do interesse público aqui subjacente - não perder o financiamento comunitário da operação Ampliação e Requalificação da Escola EB1/JI de S. Tiago dos Velhos, cujo prazo de candidatura terminava no dia 29/10/2010 e consequentemente, concluir a empreitada a tempo do inicio do ano lectivo de 2011/2012.

D) Face a esta nova factualidade, e sem necessidade de grande interpretação jurídica, logo se conclui que, na adopção do procedimento de concurso público urgente, que antecedeu o contrato de empreitada aqui em análise, se verificaram os pressupostos exigidos pelo nº. 2 do artigo 52º. do Decreto-Lei nº. 72-A/2010, de 18 de Dezembro e o pressuposto prévio do nº. 1 do artigo 155º do Código dos Contratos Públicos.

E) E pelas razões, atrás, invocadas fica demonstrada a circunstância de se estar perante um caso de urgência na celebração do contrato de empreitada sub judice, e por conseguinte se verificar o pressuposto prévio exigido pelo artigo 155º. do Código dos Contratos Públicos, a da urgência, concretizada no risco de perder o prazo de candidatura de 29/10/2010 e por consequência o financiamento e dar execução física à obra em causa.

F) Embora o douto acórdão alegue que "(...) a invocação da utilização de fundos comunitários, não serve como fundamento justificativo de urgência. ", verifica-se, no entanto, que esse Tribunal já aceitou tal fundamento no Acórdão da 1ª. Secção, nº 35/2010, de 19 de Outubro proferido no processo nº. 1229/2010, admitindo que o risco de se perderem os financiamentos comunitários, torna o procedimento de formação do contrato um caso de urgência.

G) Admitido o nosso erro de fundamentação da urgência em devido tempo, apela-se a V. Exa. que tenha em consideração estes novos esclarecimentos e se digne reapreciar de novo o presente processo, pois, caso venham a ser atendidas as razões invocadas de estarmos perante um caso de urgência, todos os outros aspectos, indicados no douto acórdão, designadamente, o prazo mínimo de apresentação das propostas, acaba por ter enquadramento legal no procedimento de concurso público urgente plasmado nos artigos 155º. e seguintes do Código dos Contratos Públicos.

H) De acordo com o artigo 158º.do Código dos Contratos Públicos o prazo mínimo de apresentação das propostas é de 24 horas para o concurso público urgente. Ora, o que se verificou no processo em apreço, que foi concedido o prazo de seis dias para a apresentação de propostas, tendo sido, apresentadas a concurso 7 propostas, pelo que se poderá dizer que foram observados os princípios básicos da contratação pública, designadamente, os princípios de igualdade e da concorrência, nos termos do nº. 4 do artigo 1º. do mencionado código.

I) A actuação desta Câmara Municipal foi, assim, ditada por razões de interesse público, por se verificar a urgência na efectivação da obra, pelo prazo de candidatura ao projecto co-financiado por fundos comunitários terminar a 29/10/2010, motivo pelo qual se adoptou o concurso publico urgente, nos termos do artigo 155.° e seguintes do Código dos Contratos Públicos, permitido pelo artigo 52.° do Decreto-Lei nº. 72-A/2010, de 18 de Junho como mecanismo excepcional para o ano de 2010".
4. Em anexo à petição de recurso é junto o "Aviso Para Submissão De Candidaturas Em Regime De Balcão Permanente", datado de 18 de junho de 2010, onde se refere que o "prazo para apresentação de candidaturas decorre entre a data de publicação do presente Aviso e as 18 horas do dia 29.10.2010. Este prazo permite que as candidaturas que vierem a ser submetidas (...) possam ser apreciadas e reunir as condições de aprovação em 2010 e assim beneficiarem das iniciativas previstas no Memorando de Entendimento (...)".
5. Em anexo à petição de recurso é junto igualmente ofício do Programa Operacional Regional do Centro (5) onde se refere que na "implementação do Plano de Iniciativas previsto no memorando de entendimento celebrado entre o Governo e a ANMP (...) foram processados pedidos de pagamentos (...) que correspondem ao reforço da taxa de co-financiamento de 70% para 80%". No âmbito do memorando e para poderem beneficiar das iniciativas previstas importa ter em consideração os seguintes prazos: - 29 de Outubro de 2010: constitui a data limite para submeter novas candidaturas no âmbito do Balcão Permanente, sendo que apenas serão admitidas as que se encontrarem em adiantada fase de estabelecimento de vínculo contratual (...). Entende-se como adiantada fase de estabelecimento de vínculo contratual, no caso de empreitadas, a preparação da adjudicação, mais precisamente em fase de audiência prévia".

6. O Ministério Público pronunciou-se pela improcedência do recurso, em bem fundamentado parecer que nos seus aspetos essenciais diz o seguinte:
"Da matéria de facto, dada como comprovada na 1ª instância, ficou a constar (...) que esta empreitada dispunha de um apoio financeiro do "Programa Operacional Regional do Centro", no montante global de 1.099.976,15 Euros, (...) cujo "Contrato de Financiamento" foi celebrado em 22 de Abril de 2010, sendo que a Cláusula 3ª, desse "Contrato de Financiamento", estabeleceu que "a data do inicio da operação é 01/07/2009 e a de fim é 30/06/2011" (...).
Durante a instrução do processo, quando a CMAV foi questionada sobre qual a fundamentação da urgência invocada para este procedimento (atento o tipo de obra e o aludido prazo de execução fixado), respondeu de acordo com o texto que ficou a constar (...) do probatório e onde não é feita a menor referência a qualquer data concreta (29/10/2010) de termo do prazo de candidatura ao FEDER, ainda para mais, com a condição de apenas serem admitidas as candidaturas cujos procedimentos concursais subjacentes, se encontrassem em fase de adjudicação; para sustentação do ora alegado, o recorrente fez juntar aos presentes Autos (...) o "Aviso para Submissão de Candidaturas" do Programa Operacional da Região Centro (Comunidade Intermunicipal do Oeste) do QREN.
Da análise deste documento, consta do seu nº 4, que o prazo para a apresentação das candidaturas decorreu entre a data da publicação deste Aviso (21 de Junho de 2010) e as 18 horas do dia 29 de Outubro de 2010; e, do seu nº 6, consta que, para além das condições previstas nos anexos a este "Aviso", apenas seriam aceites "as candidaturas que se encontrem em avançada fase de estabelecimento de vínculo contratual com os respectivos fornecedores" (...) entendendo-se, como "avançada fase de vínculo contratual", no caso das empreitadas, "a comunicação da intenção de adjudicação". (fim de citação).
Parece, pois, manifesto, que a CMAV, na sua resposta às solicitações do Tribunal, na fase da instrução do processo, não se referiu a este documento, nem às suas datas e respectivas condições; assim sendo, resulta evidente que se tratou de elementos factuais não especificados no probatório do douto Acórdão recorrido e que, segundo a CMAV, serão de grande relevância para a reconsideração dos fundamentos da recusa do "Visto", no sentido ora proposto; para o sublinhar, mais invocou uma outra decisão, da 1ª Secção deste Tribunal, onde, alegadamente, já teria sido aceite tal fundamento (o de utilização de "fundos comunitários"), como justificativo da escolha do "concurso público urgente" - ao contrário do que ficou a constar, expressamente, deste douto Acórdão, ora recorrido, (...) "a invocação da utilização de fundos comunitários não serve como fundamento justificativo de urgência" (...) (6)
É preciso, contudo, desmistificar, esta aparente contradição de fundamentos, alegada pela recorrente; com efeito, no ponto 7 da "Fundamentação" (cfr. fls. 4), exarada no douto Acórdão nº 35/2010 de 19/10 (citado pela recorrente), apenas ficou a constar uma mera citação do que constava "na proposta para decisão de autorização do procedimento e que acima foi transcrito na al. b) do nº 2. Tornava-se urgente dar execução física e financeira à obra, sob pena de ser posto em risco o financiamento comunitário"; para, logo no parágrafo seguinte, se referir que, (...) "as questões do financiamento comunitário surgem, assim, no presente processo, invocadas na verificação de dois pressupostos. No da al. a) do nº 2 do artº. 52º (é um projecto co-financiado por fundos comunitários) e no do artº. 155º do CCP (o risco de se perderem os financiamentos comunitários tornava o procedimento de formação deste contrato um caso de urgência). Se o pressuposto da al. a) está objectivamente verificado, numa primeira abordagem podemos admitir estar igualmente perante um caso de urgência, pese embora a urgência invocada não esteja factual e documentalmente demonstrada" (fim de citação).
Em mais nenhum lugar do douto Acórdão acabado de citar e transcrever (Acórdão nº 35/2010 de 19/10), se fez qualquer afirmação através da qual seja possível concluir pela aceitação, pura e simples, do fundamento da utilização de fundos comunitários como justificação para a escolha de um qualquer procedimento de natureza urgente para se evitar uma eventual perda desses financiamentos; não é, pois, legítima a invocação de que sempre que se esteja em risco de perda de financiamentos comunitários, então estar-se-á perante um "caso de urgência"; das transcrições efectuadas não é isso que resulta, mas apenas de que sendo comprovadamente (al. a) citada naquele aresto) um projecto co-financiado por fundos comunitários, podia admitir-se (numa primeira abordagem), "estar igualmente perante um caso de urgência" - pese embora a urgência invocada não esteja factual e documentalmente demonstrada (fim de transcrição).
Significa isto, no fundo, que para o Tribunal poder ajuizar sobre se haverá suficiente fundamento legal para a escolha de um procedimento concursal urgente (baseado nos ditos normativos), torna-se sempre necessário demonstrar e justificar, caso-a-caso, quais as razões concretas da invocada urgência; e, naquele caso (Acórdão nº 35/2010), a Câmara Municipal de Viana do Castelo não logrou fazer tal demonstração, pelo que a decisão proferida foi a da recusa do "Visto", a um contrato idêntico ao dos presentes Autos, muito embora com diversos pressupostos factuais e jurídicos; o que nos permite, desde já, avançar no sentido de sustentar que, mesmo levando em linha de conta a argumentação da ora recorrente, relativa aos prazos e condições da sua candidatura ao FEDER e que não teria sido invocada no momento próprio (durante a fase de instrução do processo e por isso não foi incluída no probatório), isso não lhe permite, sem mais, concluir pela suficiente fundamentação da verificação de todos os requisitos justificativos da escolha do procedimento concursal urgente; para tanto, torna-se necessário indagar se, não obstante aqueles prazos e condições, ainda assim a CMAV obteria o mesmo resultado (cumprimento desses prazos e obrigações), ou com um procedimento concursal normal ou, se tal não fosse de todo possível, com um procedimento concursal urgente, mas com o recurso a prazo para a apresentação das propostas mais dilatado do que aquele que foi utilizado neste concreto caso (7).
Para responder a esta questão teremos de revisitar o probatório, ao qual poderão ser aditados os factos, agora trazidos ao conhecimento do Tribunal, relativos aos prazos e condições constantes do alegado "Contrato de Financiamento" e expressamente invocadas pela recorrente para justificação da "urgência" neste procedimento: o de que a candidatura terminava a 29 de Outubro de 2010, desde que estivesse nesse momento em fase de adjudicação (8); ora a cronologia relevante, deste procedimento, foi a seguinte:

a) 9 de Agosto de 2010 - deliberação para a abertura do procedimento
b) 12 de Agosto de 2010 - envio de anúncio para publicação
c) Até 20 de Agosto de 2010 - apresentação das propostas
d) 24 de Agosto de 2010 - despacho de adjudicação (ratificado pelo executivo em 6 de Setembro)
e) 20 de Setembro de 2010 - aprovação da minuta
f) 24 de Setembro de 2010 - celebração do contrato
g) 8 de Outubro de 2010 - remessa a "Visto"
h) 13 de Outubro de 2010 - devolução do contrato à CMAV
i) 29 de Outubro de 2010 - resposta desta entidade ao Tribunal de Contas.

Por aqui se pode concluir, sem grande dificuldade, que sendo aquele prazo-limite, o dia 29 de Outubro de 2010, para que a CMAV comunicasse a mera "intenção de adjudicação", (à autoridade competente pela gestão do FEDER), não se compreende, justifica, ou aceita o tal excesso de urgência no procedimento, por forma a que o prazo para a apresentação das propostas, que normalmente é de 20 dias, no mínimo, tivesse sido "encolhido" para apenas seis dias; se tivesse sido usado um procedimento concursal "normal", contando os 20 dias a partir de 12 de Agosto de 2010 (data do envio do anúncio para publicação no DR), o prazo para a apresentação das candidaturas poderia ter ido até à primeira semana de Setembro, que ainda havia todo este mês e quase todo o seguinte (Outubro), para que a CMAV se decidisse pela adjudicação, ainda antes do termo daquele prazo de 29 de Outubro de 2010 e, só depois dele, vir a celebrar o contrato.
Por conseguinte e salvo melhor entendimento, temos para nós que a circunstancia de se tratar de empreitada co-financiada, nos termos e com as condições específicas agora apuradas e esclarecidas (pese embora isso devesse ter sido feito na fase de instrução do processo e só não o foi por culpa exclusiva da recorrente, o que foi aludido na própria decisão recorrida, no último § de fls. 9, através da expressão "nada veio dizer a tal respeito"), daí não poderá decorrer ("ipso facto"), que se tivesse justificado o procedimento de natureza urgente e, dentro deste, que o prazo para a apresentação das propostas tivesse sido tão "encurtado", ao ponto de descaracterizar uma verdadeira e autêntica concorrência - isto, não obstante se terem apresentado sete candidatos à execução da obra e de nenhum ter sido excluído no âmbito do procedimento concursal (9).
Nestes termos, entendemos que a argumentação factual, da ora recorrente, não será suficiente para justificar a excessiva urgência imprimida a este procedimento, o qual poderia muito bem ter atingido todos os seus objectivos, incluíndo o da obtenção do co-financiamento comunitário, através do respeito dos princípios gerais da contratação pública, acima enunciados e, bem assim, a adopção de um prazo, para apresentação das candidaturas, um pouco mais dilatado e mais conforme com as garantias de um procedimento mais adequado ao tipo de contrato e de obra a executar; nesta conformidade, também entendemos, que a argumentação da recorrente, não chegou a colocar em causa a fundamentação subjacente à recusa do "Visto", do douto Acórdão recorrido, naquilo que ela teve de mais relevante, sobre a não verificação do requisito legal da "urgência" para justificação da opção tomada pela CMAV; finalmente, acrescenta-se que, se existe alguma "moral" em toda esta história, ela terá de se exprimir do seguinte modo: mais vale um procedimento concursal genuíno e escorreito, com todas as garantias de um processo legal, justo e equilibrado, concorrencial e equitativo para todos os operadores económicos, visando a optimização das melhores condições para salvaguarda do interesse financeiro público, do que a obtenção "a outrance" de todos os financiamentos comunitários possíveis, ainda que com atropelo daqueles princípios!".

7. Foram colhidos os vistos legais.

II - FUNDAMENTAÇÃO

8. No recurso interposto não foi impugnada a matéria de facto elencada na decisão recorrida. Dá-se pois por assente tal matéria então elencada.
Contudo, há que ter em conta os novos factos produzidos pela recorrente e acima elencados nos nºs 3 a 5 e que se prendem com as razões por que considera estar verificado o pressuposto de urgência estabelecido pelo CCP para o recurso à figura de concurso público urgente.
Há que ter ainda em conta outro aspeto: tanto na matéria de facto da decisão recorrida, como na petição de recurso e no parecer do Ministério Público é referida a existência de um contrato de financiamento comunitário celebrado em 22 de abril de 2010. Ora, por interessar à presente decisão, convém explicitar que nesse contrato de financiamento se previu que a comparticipação atribuída corresponde à aplicação da taxa de 70% sobre o montante das despesas elegíveis (10).

9. Estabelecida a matéria de facto, passe-se às questões de direito.

No presente recurso, face à decisão recorrida, à petição apresentada e à posição do Ministério Público, duas questões se impõe abordar:
a) A de saber se se verifica o pressuposto de urgência estabelecido pelo artigo 155º do CCP para a formação de contratos mediante concurso público urgente;
b) A de saber se o prazo fixado para apresentação de propostas está conforme com regime jurídico aplicável.

Vejamos cada uma dessas questões. 

II.A - A formação do contrato mediante concurso público urgente

10. Estabeleceu o nº 2 do artigo 52.º do Decreto-Lei n.º 72-A/2010, de 18 de junho:

"Pode adoptar-se o procedimento do concurso público urgente, previsto nos artigos 155.º e seguintes do Código dos Contratos Públicos (CCP), na celebração de contratos de empreitada, desde que:
a)Se trate de um projecto co-financiado por fundos comunitários;
b)O valor do contrato seja inferior ao referido na alínea b) do artigo 19.º do CCP; e
c)O critério de adjudicação seja o do mais baixo preço."

11. Como se sabe, nos artigos 155.º e seguintes do CCP, estabelece-se um procedimento de concurso público urgente para, em caso de urgência, se proceder à celebração de contratos de locação ou de aquisição de bens móveis ou de serviços de uso corrente.
Entendeu o legislador alargar a possibilidade de se recorrer ao mesmo procedimento, para a celebração de contratos de empreitada, durante a vigência do Decreto-Lei n.º 72-A/2010, desde que se verificassem os pressupostos fixados nas alíneas a) a c) do nº 2 do seu artigo 52º, agora transcrito.
O recurso a esta possibilidade pressupõe, naturalmente, face ao disposto no artigo 155º do CCP, que se esteja em caso de urgência.

12. Concluiu a decisão recorrida que os pressupostos fixados nas alíneas a) a c) do nº 2 do citado e transcrito artigo 52º se encontravam verificados e, portanto, tal matéria não é controvertida.

13. Verificados os pressupostos do citado artigo 52º, impunha-se e, face ao que se disse na decisão recorrida e na petição de recurso, impõe-se saber se se estava perante um caso de urgência.
Efetivamente, a verificação dos pressupostos fixados no artigo 52.º do Decreto-Lei n.º 72-A/2010, de 18 de junho, não constitui por si só fundamento suficiente para a adoção do procedimento de concurso público urgente para a formação de contratos de empreitada. Deve entender-se que foi intenção do legislador que, verificados aqueles pressupostos, e havendo urgência, podiam as entidades adjudicantes fazer uso daquele tipo de procedimento em empreitadas.
Efetivamente o artigo 155º do CCP prevê que "[e]m caso de urgência pode adoptar-se o procedimento de concurso público" urgente.
Face à matéria de facto, entendeu o acórdão recorrido que tal pressuposto não estava verificado.
Perante tal matéria, subscreve-se o entendimento então tomado pelo tribunal a quo.

14. Contudo, na sua petição de recurso, veio a CMAV juntar novos factos que acima, nos nºs 3 a 5 se referem.
Para demonstrar a urgência necessária para adoção de concurso público urgente na formação do presente contrato, alegou a CMAV que era necessário aceder a financiamentos comunitários "cujo prazo de candidatura terminava às 18 horas do dia 29/10/2010 com a condição de apenas serem admitidas as candidaturas cujos procedimentos concursais subjacentes se encontrassem em fase de adjudicação, no caso das empreitadas (...)" e que se impunha assegurar a "conclusão da empreitada da ampliação e requalificação da Escola EB1 de S. Tiago dos Velhos antes do inicio do ano lectivo 2011-2012, para fazer face às necessidades locais nesta área educativa, nomeadamente, pela autorização excepcional do Ministério da Educação de funcionamento da EBI de Adoseiros para o ano lectivo 2010/2011, até à conclusão das obras de ampliação e requalificação da Escola EBI de S. Tiago dos Velhos".
Tratava-se pois de "não perder o financiamento comunitário da operação Ampliação e Requalificação da Escola EB1/JI de S. Tiago dos Velhos, cujo prazo de candidatura terminava no dia 29/10/2010 e consequentemente, concluir a empreitada a tempo do inicio do ano lectivo de 2011/2012".
Como bem disse o Ministério Público no seu parecer "[p]arece, pois, manifesto, que a CMAV, na sua resposta às solicitações do Tribunal, na fase da instrução do processo" não explicitou estes factos, e por isso são " elementos factuais não especificados no probatório do douto Acórdão recorrido". A própria CMAV na sua petição admite "o nosso erro de fundamentação da urgência em devido tempo".

15. Vejamos amiudadamente os factos que interessam para esclarecer esta questão: os já elencados na decisão recorrida e os agora produzidos e demonstrados na petição. Assim:
a) Em 22 de abril de 2010 foi celebrado, entre a CMAV e a competente estrutura de gestão, um contrato de financiamento comunitário tendo como objeto suportar os encargos com a presente empreitada, em que se previu que a comparticipação atribuída correspondia à aplicação da taxa de 70% sobre o montante das despesas elegíveis;
b) A partir de 18 de junho de 2010, a CMAV toma conhecimento de um "Aviso Para Submissão De Candidaturas Em Regime De Balcão Permanente" onde se previa que o prazo para apresentação de candidaturas decorreria entre aquela data e as 18 horas do dia 29 de outubro de 2010 e que as candidaturas aprovadas naquele regime beneficiariam das iniciativas previstas no Memorando de Entendimento celebrado entre o Governo e a ANMP, designadamente o reforço da taxa de co-financiamento de 70% para 80%;
c) Para beneficiarem de tais vantagens, as candidaturas a apresentar deveriam estar em adiantada fase de estabelecimento de vínculo contratual que, no caso de empreitadas, se devia traduzir na "preparação da adjudicação, mais precisamente em fase de audiência prévia";
d) Em 9 de agosto de 2010 é tomada a deliberação para a abertura do procedimento;
e) Em 13 de agosto de 2010 é enviado o anúncio para publicação;
f) Em 18 de agosto de 2010 terminou o prazo de apresentação das propostas;
g) Em 24 de agosto de 2010 é proferida a decisão de adjudicação, ratificada em 6 de Setembro;
h) Em 20 de setembro de 2010 é aprovada a minuta;
i) Em 24 de setembro de 2010 é celebrado o contrato;
j) Em 29 de outubro de 2010 terminou o prazo de apresentação de candidaturas a financiamentos comunitários em condições mais vantajosas.

16. Como valorar tais factos? Estando assegurado o financiamento comunitário a partir de 22 de abril de 2010, para suporte da empreitada em causa, a CMAV tomou conhecimento a partir de 18 de junho de 2010 de que tal financiamento poderia ter melhores condições desde que fosse apresentada candidatura segundo a nova regulamentação "Em Regime De Balcão Permanente" em que se previa que o prazo para apresentação de candidaturas decorreria entre aquela data e as 18 horas do dia 29 de outubro de 2010, sendo pressuposto de tais candidaturas estar o correspondente procedimento na fase de audiência prévia para decisão de adjudicação.

Isto é: no momento em que toma conhecimento da possibilidade de obter financiamento comunitário em condições mais favoráveis, a CMAV tem de decidir lançar um procedimento que, num horizonte temporal aproximado de quatro meses, tenha já como resultado um projeto de decisão de adjudicação.

Decide então proceder ao lançamento de um concurso público urgente, nos termos da legislação já referida.

Perante estes factos, está reunido o pressuposto de "caso de urgência" previsto pelo artigo 155º do CCP?
Considera-se que sim.

Por dois motivos: por um lado, a obtenção de um financiamento comunitário com uma taxa de comparticipação superior é uma boa decisão financeira. Permite a realização de uma obra pública, decidida pela entidade competente, com menor dispêndio de fundos nacionais. Por outro, seria muito arriscado com o horizonte temporal existente, conseguir obter o resultado necessário, por via do lançamento de um concurso público não urgente.
A forma como decorreu o procedimento demonstra igualmente a celeridade imprimida pela Câmara Municipal para obter o resultado necessário.
Face a estes factos produzidos pela recorrente, distanciamo-nos pois das conclusões que fundamentadamente, nesta matéria, suportaram a decisão recorrida e que, na primeira instância, como se viu, não foram apresentados.

17. Como se viu, argumentou ainda a CMAV de que era urgente a conclusão da empreitada da ampliação e requalificação da Escola EB1 de S. Tiago dos Velhos antes do inicio do ano lectivo 2011-2012, para fazer face às necessidades locais nesta área educativa, nomeadamente, pela autorização excepcional do Ministério da Educação de funcionamento da EBI de Adoseiros para o ano lectivo 2010/2011, até àquela conclusão.
Ora, tal argumentação não é convincente: efetivamente, sendo o prazo de execução da obra de 210 dias e sabendo-se das novas condições de financiamento em junho de 2010, decorreria um período de quase 14 meses até ao início do ano escolar de 2011/2012, suficiente para lançar um procedimento de natureza não urgente e realizar a obra a tempo.

18. Contudo, como se viu, no nº 16, pode concluir-se que estava a CMAV perante uma situação de urgência que permitia adotar o procedimento de concurso público urgente para a formação do contrato de empreitada. Foi pois respeitado o pressuposto estabelecido no artigo 155º do CCP. 

II.B - O prazo para apresentação de propostas no concurso público urgente

19. Foi fixado como fim do prazo para apresentação de propostas as 23 horas e 59 minutos do sexto dia a contar da data do envio do anúncio para publicação no Diário da República.
Como já se referiu importa decidir se tal prazo é compatível com as exigências do regime jurídico aplicável. Passemo-lo em revista, com brevidade.

20. Dispõe o artigo 158º do CCP que o prazo mínimo para a apresentação de propostas, nos concursos urgentes, seja de 24 horas "desde que estas decorram integralmente em dias úteis".
Assim dito, à partida, dir-se-ia que o prazo fixado respeitou aquela determinação legal. Contudo, sublinhe-se que a lei estabeleceu tal prazo como mínimo. Isto é: aos responsáveis administrativos compete estabelecer o concreto prazo respeitando tal mínimo.
É inquestionável que a lei confere à Administração um poder discricionário na fixação do prazo para apresentação de propostas. Deve reconhecer-se que a lei dá uma margem de decisão ao aplicador administrativo da lei para que possa decidir qual o prazo adequado.
Tal margem de decisão resulta, aliás, expressamente da lei: dispõe o nº 1 do artigo 65º do CCP que "[o] prazo para apresentação de propostas é estabelecido livremente, com respeito pelos limites mínimos" estabelecidos no código.
Mas aquela margem de decisão está balizada por critérios de competência e outros fixados pela lei para o exercício do poder discricionário, pelo respeito pelas finalidades da norma e pelos princípios gerais a que se subordina a atividade administrativa.
E, como é mais que reafirmado na doutrina e na jurisprudência, não sendo os poderes discricionários poderes arbitrários - até porque, no exercício do que nesta matéria está em causa, devem ser observados os referidos critérios, finalidade e princípios que constituem, aliás, a sua dimensão vinculada - o seu exercício está igualmente sujeito a controlo jurisdicional. Mas, sublinhe-se, nesta sua dimensão vinculada.
Assim, a CMAV, podia no exercício de um poder discricionário, e respeitados aqueles critérios e princípios, fixar o prazo mais adequado.
E este Tribunal deve exercer o controlo jurisdicional do exercício daquele poder, na dimensão vinculada já referida, para salvaguarda da legalidade administrativa na sua vertente financeira, usando as competências que a lei lhe confere.
Que dimensão vinculada deve então ser respeitada pelos órgãos administrativos em matéria de fixação de prazo para apresentação de propostas num concurso público urgente?

21. Sobre esta matéria, relembre-se o que dispõe o CCP no nº 2 do seu artigo 63º, aplicável por força do artigo 156º:
"Na fixação do prazo para a apresentação das propostas deve ser tido em conta o tempo necessário à sua elaboração, em função da natureza, das características, do volume e da complexidade das prestações objecto do contrato a celebrar, em especial dos aspectos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, bem como a necessidade de prévia inspecção ou visita a locais ou equipamentos, por forma a permitir a sua elaboração em condições adequadas e de efectiva concorrência."

De tal disposição, e de outras diretamente aplicáveis ao caso, resultam orientações de dois tipos:
a) Por um lado, o prazo deve ser o adequado face à dimensão e características da obra a realizar, tratando-se de uma empreitada, para que se obtenham propostas que rigorosamente correspondam às exigências fixadas pelos documentos do procedimento. Trata-se de salvaguardar os interesses públicos e, sobretudo, prevenir sobressaltos na fase de execução;
b) Por outro lado, trata-se de assegurar que outros princípios fundamentais da contratação pública sejam observados, nomeadamente os princípios da transparência, da igualdade e da concorrência, também fixados no nº 4 do artigo 1º do CCP, mas igualmente na Constituição (11). 

22. Relembre-se ainda que, em matéria de prazos, do artigo 470º do CCP, resultam duas regras com relevância neste procedimento:
a) Os prazos de apresentação das propostas "são contínuos, não se suspendendo aos sábados, domingos e feriados";
b) No caso de concurso público urgente o dia da publicação do anúncio é considerado na contagem.

23. Relembre-se ainda que o artigo 135º do CCP exige, em concursos públicos sem publicidade internacional, para formação de contratos de empreitada de obras públicas, a fixação de um prazo de, pelo menos, vinte dias, para apresentação de propostas, e em casos de manifesta simplicidade de, pelo menos, nove dias.
Deve reconhecer-se que tendo o legislador permitido a formação de tais contratos através de concurso público urgente, sem nada ter estabelecido de novo, em matéria de prazo para apresentação de propostas, admitiu que aquelas balizas temporais podiam não ser respeitadas.

Isto é: resulta da lei ser admissível, em princípio, a fixação de um prazo superior às 24 horas mínimas. Contudo, como já se disse há que atender aos critérios que resultam do nº 2 do artigo 63º.

24. Avaliemos então os factos.
Como se viu foi estabelecido como fim do prazo para apresentação de propostas as 23 horas e 59 minutos do sexto dia a contar da data do envio do anúncio para publicação no Diário da República.
O anúncio foi enviado para publicação no dia 13 de agosto de 2010. Seguindo as regras estabelecidas no 470º do CCP, acima referidas no nº 22, o prazo terminou às 23 horas e 59 minutos do dia 18 de agosto.
Não é irrelevante o facto de o dia 13 de agosto de 2010 ter sido uma sexta-feira. Isto é: publicado o anúncio num dia, os dois dias imediatos não foram dias úteis. E passados estes dois dias, sobraram aos potenciais interessados três dias úteis para formularem as suas propostas.
Dir-se-á que para a lei é irrelevante que, publicado o anúncio num dia, logo se tenha seguido um fim-de-semana. É verdade que a lei manda considerar para efeitos destes prazos os sábados, domingos e feriados. Mas também é a própria lei que, com realismo, dá alguma relevância ao facto de o um dia poder não ser útil. Relembre-se que o prazo mínimo de 24 horas pode ser fixado "desde que estas decorram integralmente em dias úteis".

Em conclusão: publicado o anúncio na sexta-feira, dia 13, sobraram aos concorrentes três dias úteis para prepararem e apresentarem as suas propostas.

Estamos perante uma empreitada com valor de quase 900 mil euros e com um prazo de execução de sete meses.

A fixação de um prazo de seis dias, nele incluídos o dia da publicitação e dois dias não úteis, respeita os critérios fixados na lei e que acima se destacaram no nº 21?
Considera-se que não.

25. Não pode deixar de perguntar-se: é aceitável que, para a formação de um contrato, com estas características, suportando uma obra com estas dimensões, se estabeleça um prazo de seis dias - dos quais dois não foram úteis - para apresentação de propostas? Propostas para uma empreitada, que têm de corresponder a um determinado programa, a um projecto de execução, lista de todas as espécies de trabalhos e mapa de quantidades, "bem como a necessidade de prévia inspecção ou visita a locais ou equipamentos, por forma a permitir a sua elaboração em condições adequadas"?
Parece ser evidente que, no caso de empreitadas de obras públicas, sobretudo com esta dimensão física e financeira, não é razoável admitir que naquele prazo estejam asseguradas condições de efetiva igualdade e de leal concorrência entre os potenciais interessados em apresentar propostas e asseguradas efetivas condições de transparência na condução do procedimento.
E, sobretudo, parece ser evidente que para uma correta apresentação de propostas, com o rigor necessário à salvaguarda dos interesses públicos, e para prevenção de sobressaltos na fase de execução, aquele prazo é insuficiente.
Faz sentido perguntar: alguém, gerindo recursos financeiros próprios, admitiria adjudicar e realizar uma obra com aqueles montantes e aqueles prazos de execução, exigindo a apresentação de propostas em seis dias, neles incluídos o dia de publicitação e um fim-de-semana? Pensa-se que não.
Ficaria tranquilo com as propostas que iria receber? Pensa-se que não.
Então, como admitir esses factos na gestão financeira e patrimonial públicas?
Não é admissível.
Como que secundando este entendimento, o legislador - em momento posterior ao do presente procedimento, é certo - veio a dizer no nº 6 do artigo 35º do Decreto-Lei nº 29-A/2011, de 1 de março, que neste concurso públicos urgentes para a formação de contratos de empreitada, "é aplicável o prazo mínimo de 15 dias para apresentação de propostas".

26. Referiu a CMAV que houve "7 propostas, pelo que se poderá dizer que foram observados os princípios básicos da contratação pública, designadamente, os princípios de igualdade e da concorrência, nos termos do nº. 4 do artigo 1º. do mencionado código".
De facto, houve concorrência. Mas não se pode afirmar que toda a concorrência possível tenha sido salvaguardada. O julgador não pode deixar de ter em conta as circunstâncias concretas em que o procedimento decorreu, com a emergência de uma forte crise económica e retracção do investimento, público e privado e que podem, embora só em parte, explicar tão elevado número de concorrentes.
E, sobretudo, diga-se que um prazo tão reduzido, numa empreitada desta natureza, faz fraquejar a certeza, que deve imperar na gestão pública, de que a transparência foi assegurada e as formalidades no procedimento - que na Administração de um Estado de Direito são garantia de observância de valores essenciais - foram efetivamente conduzidas de acordo com a lei.  

II.E - A relevância das violações de lei identificadas para efeitos de fiscalização prévia

27. Resulta do exposto que pese embora se reconhecer agora que houve fundamentos para o lançamento de concurso público urgente, mantém-se a avaliação feita na decisão recorrida em considerar como violadora da lei a solução adotada em matéria de prazo para apresentação de propostas. Considera-se que a CMAV, no exercício do poder discricionário conferido pela lei em tal fixação, violou a dimensão vinculada que é expressamente manifestada no nº 2 do artigo 63º do CCP.
Tal violação pode ter, por um lado, restringido o universo de potenciais interessados e concorrentes e, por outro, tendo ofendido o rigor e a transparência que devem imperar no procedimento, sendo suscetíveis de ter alterado, ou alterarem o resultado financeiro do procedimento.
Enquadram-se, pois, tais violações no disposto na alínea c) do nº 3 do mesmo artigo 44º da LOPTC (12), quando aí se prevê "ilegalidade que ... possa alterar o respectivo resultado financeiro."
Refira-se, a propósito, que quando se diz "[i]legalidade que (...) possa alterar o respectivo resultado financeiro" pretende-se significar que basta o simples perigo ou risco de que da ilegalidade constatada possa resultar a alteração dos resultados financeiros.

28. Assim, com base no disposto na alínea c) do nº 3 do artigo 44º da LOPTC, há fundamento para manter a decisão de recusa de visto.  

IV - DECISÃO

29. Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes, em plenário da 1ª Secção, em julgar improcedente o recurso e em manter o acórdão recorrido.
30. São devidos emolumentos nos termos da alínea b) do nº1 e do nº 2 do artigo 16º do Regime Jurídico dos Emolumentos do Tribunal de Contas (13).

Lisboa, 5 de julho de 2011

Os Juízes Conselheiros,
(João Figueiredo - Relator)
(José Luís Pinto Almeida)
(Carlos Alberto Morais Antunes)

O Procurador-Geral Adjunto,
(Jorge Leal) 


(1) Código dos Contratos Públicos aprovado pelo Decreto-Lei nº 18/2008, de 29 de janeiro, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 18-A/2008, de 28 de março e alterado pela Lei nº 59/2008, de 11 de setembro, pelos Decretos-Lei nºs 223/2008, de 11 de setembro, 278/2009, de 2 de outubro, e pela Lei nº 3/2010, de 27 de abril. 
(2) Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas: Lei nº 98/97, de 26 de agosto, com as alterações introduzidas pelas Leis nºs 87-B/98, de 31 de dezembro, 1/2001, de 4 de janeiro, 55-B/2004, de 30 de dezembro, 48/2006, de 29 de agosto, e 35/2007, de 13 de agosto. 
(3) Junto em anexo como documento nº 1, parcialmente reproduzido no número seguinte. 
(4) Junta os documentos com os nºs 3 e 4 relativos à referida decisão excecional do Ministério da Educação e ao Programa de Ação invocado. 
(5) Ofício circular 2290/2010 a fls 12 do processo de recurso. 
(6) De salientar, que a afirmação genérica de que a utilização de fundos comunitários não servia de fundamento justificativo de urgência, constante do presente douto Acórdão ora recorrido, se baseou em idênticas afirmações retiradas de outros Acórdãos da 1ª Secção deste Tribunal, designadamente aqueles que foram citados na nota 11 de pé de página e que se reportam a decisões de 1999 e 2001 (Acórdãos nºs. 14/99; 104/99 e 155/2001). 
(7) A questão colocada no texto sobre o prazo para a apresentação das propostas tem a máxima relevância, neste caso, na medida em que tal prazo foi de apenas 6 dias (até às 23 horas e 59 minutos do sexto dia a contar da data do envio, para publicação, do anúncio da sua abertura) e se considerou que, não obstante o prazo mínimo estabelecido no artº. 158 do CCP seja de 24 horas, ainda assim, um prazo de seis dias sempre seria manifestamente insuficiente, para os aludidos efeitos, atentas as especificidades de um contrato de empreitada com a sua natural complexidade, quando comparado com o limite mínimo de 9 dias de empreitadas de grande simplicidade conforme dispõe o artº. 135º do  CCP, o que, neste caso, nem sequer foi considerado, tendo aquele prazo efectivo ficado abaixo deste limite; esta consideração teve um grande peso na fundamentação da recusa do "Visto" a este contrato. 
(8) De sublinhar, que, o ponto 6 do já citado "Aviso Para Submissão de Candidaturas", se refere à "comunicação da intenção da adjudicação" e não ao acto de adjudicação própriamente dito, que lhe poderia ser posterior. 
(9) De destacar, também, que tendo a CMAV celebrado o "Contrato de Financiamento" no dia 22 de Abril de 2010 e o prazo para a apresentação das candidaturas ao FEDER, tivesse começado a contar no dia 21 de Junho de 2010, mal se compreende que apenas em 9 de Agosto de 2010 a CMAV tivesse deliberado a abertura deste procedimento concursal, podendo fazê-lo mais cedo.  
(10) Vide nº 2 da cláusula quinta, a fl. 55v do processo. 
(11) Vide nº 2 do artigo 266º e a alínea f) do artigo 81º da CRP. 
(12) Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas: Lei nº 98/97, de 26 de agosto, com as alterações introduzidas pelas Leis nºs 87-B/98, de 31 de dezembro, 1/2001, de 4 de janeiro, 55-B/2004, de 30 de dezembro, 48/2006, de 29 de agosto, 35/2007, de 13 de agosto, e 3-B/2010, de 28 de abril. 
(13) Aprovado pelo Decreto-Lei nº 66/96, de 31 de maio, com as alterações introduzidas pela Lei nº 139/99, de 28 de agosto, e pela Lei nº 3-B/00, de 4 de abril.