ACÓRDÃO Nº 12 /11 - 15.MAR.2011 - 1ª S/SS
Proc. nº 1836/2010
Acordam os Juízes da 1ª Secção do Tribunal de Contas, em Subsecção:
I - RELATÓRIO
A Câmara Municipal de Anadia remeteu, para efeitos de fiscalização prévia, o contrato de empreitada, celebrado em 16 de Dezembro de 2010, com a empresa "Prioridade - Construção de Vias de Comunicação, SA", pelo valor de 650.769,34 €, acrescido de IVA, tendo por objecto as "Áreas de Acolhimento Empresarial - Zona Industrial de Vilarinho do Bairro".
II - MATÉRIA DE FACTO
Para além do referido acima, relevam para a decisão os seguintes factos, que se dão por assentes:
A) O contrato foi precedido de concurso público urgente, com invocação do disposto no artigo 52º, do DL nº 72-A/2010 de 18 de Junho e dos artigos 155º e seguintes, do Código dos Contratos Públicos (CCP), sendo que o respectivo aviso de abertura foi publicado no Diário da República, 2ª série, de 11 de Novembro de 2010;
B) A abertura do concurso público urgente foi autorizada por deliberação da Câmara Municipal de Anadia, de 10 de Novembro de 2010, a qual aprovou, ainda, o programa do procedimento e o caderno de encargos;
C) Ao concurso apresentaram-se 4 concorrentes, tendo sido excluídos dois;
D) O prazo de execução da obra é de 180 dias;
E) A consignação da obra ainda não ocorreu;
F) O preço base da empreitada foi de 785.364,47 €;
G) De harmonia com o ponto 11 do Programa de Concurso, o critério de adjudicação foi o do preço mais baixo;
H) O ponto 9 do Anúncio de abertura do concurso estabeleceu que as propostas deveriam ser apresentadas até às 09 horas do quarto dia, a contar da data do envio do anúncio para publicação no Diário da República;
I) O Anúncio de abertura do concurso foi enviado para publicação no Diário da República, no dia 11 de Novembro de 2010, e dele constam - para além da indicação do objecto e do tipo do contrato, bem como da designação deste - a menção dos documentos que instruem as propostas e a informação do serviço onde se encontram disponíveis as peças do concurso para consulta dos interessados, além da informação de que o meio electrónico para a apresentação das propostas era a plataforma electrónica utilizada pela entidade adjudicante (www.vortalgov.pt);
J) Questionada a Câmara Municipal de Anadia sobre o fundamento da urgência invocada para justificar a adopção do procedimento pré-contratual utilizado (1), veio a mesma remeter o ofício nº 448, de 04-02-2011, com a referência 6ª secção, Proc. nº 240.02.00, no qual, além do mais, se diz o seguinte:
"...Relativamente a este ponto, importa referir que a data de abertura do primeiro concurso público para a empreitada de "Áreas de Acolhimento Empresarial - Zona Industrial de Vilarinho do Bairro" foi a 09 de Junho de 2010. Contudo, no decorrer do procedimento verificaram-se algumas falhas consideradas fundamentais para a perfeito funcionamento das infra-estruturas da rede de saneamento que constam do projecto da empreitada, como seja a falta do sistema de tratamento de águas residuais (ETAR), o que implicava alteração de aspectos fundamentais das peças de procedimento. Desta forma, a Câmara Municipal de Anadia, deliberou em 28 de Julho de 2010 revogar a decisão de contratar e por conseguinte anular o procedimento, tendo por base a alínea c) do n° 1 do art° 790, conjugado com o n° 2 do arte 80°, ambos do CCP (DOC 1). Neste procedimento não chegou a haver a apresentação de propostas.
Porque se tratava de uma obra importante para o Município, tendo em vista a criação de uma nova zona industrial em Vilarinho do Bairro projecto já se enquadrava na lista de obras a contratualizar no âmbito da Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro, com financiamento do QREN, a Câmara Municipal agilizou os procedimentos de forma a que a 4 de Agosto de 2010 aprovou o novo projecto, caderno de encargos e programa de procedimento e deliberou a abertura de novo concurso publico. Este procedimento seguiu os seus trâmites até à fase de Audiência Prévia, em que face à apresentação de uma reclamação sobre a não suspensão do prazo e consequente prorrogação do mesmo para apresentação de propostas, devido à apresentação de erros e omissões, e com base no parecer do Gabinete Jurídico sobre esta questão, o Órgão Executivo reconhecendo que se estaria a violar o disposto no n° 3 do Art° 61° do CCP, deliberou, uma vez mais, revogar a decisão de contratar, remetendo o processo aos serviços técnicos para que tivessem em conta as listas de erros e omissões apresentadas no âmbito do procedimento, com vista à abertura de um próximo procedimento (DOC 2). Neste procedimento houve a apresentação de 14 propostas.
Importa acrescentar que ambos os procedimentos acima referidos foram publicitados no Diário da República e na Plataforma VortalGov. Os concorrentes foram notificados da decisão de anulação dos procedimentos através da referida plataforma.
No âmbito do contrato de delegação de competências com subvenção global outorgado entre a Autoridade de Gestão do Programa Operacional Regional do Centro 2007-20013 e a Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro - Baixo Vouga da qual o Município de Anadia faz parte, está contratualizado um montante de investimento e respectiva comparticipação para sistemas de apoio a áreas de acolhimento empresarial.
Na plataforma do Programa Mais Centro e na submissão de candidaturas em contínuo através do "Balcão Permanente" para as candidaturas enquadradas pelo contrato de delegação de competências com subvenção global celebrado entre a Autoridade de Gestão do Programa Operacional Regional do Centro 2007-2013 e a Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro - Baixo Vouga, foi iniciado, em 21 de Junho de 2010, o Aviso (DOC 3) para apresentação de candidaturas até às 18:00 horas do dia 29.10.2010 de modo que estas "...possam ser apreciadas e reunir as condições de aprovação em 2010 e assim beneficiarem das iniciativas previstas no Memorando de Entendimento e das Alterações dos Regulamentos Específicos aprovadas a 20 de Abril de 2010 por deliberação da Comissão Ministerial da Coordenação dos Programas Operacionais do Continente." Foi com base neste Aviso e na perspectiva de poder apresentar a candidatura a este Programa que o Município lançou os dois procedimentos de concurso público anteriores.
Em 28 de Julho e a 13 de Outubro de 2010 na mesma plataforma e através do Balcão Permanente surgiram, respectivamente, dois Avisos (DOC 4 e DOC 5) dando nota das alterações das condições de admissão e aceitação das operações aprovadas nas respectivas Comissões Directivas do Mais Centro e onde se pode ler "No caso dos concursos públicos urgentes: Não é exigível que o procedimento esteja em fase de intenção de adjudicação, quando os beneficiários recorram ao procedimento do concurso público urgente, nos termos previstos no n° 2 do artigo 52° do DL 72-A/2010 de 18 de Junho de 2010. Nestes casos exige-se a prova de publicação em Diário da República."
Refere-se ainda que em qualquer dos casos, a aprovação, pela Comissão Directiva, das operações submetidas com base nos procedimentos concursais referidos, só se efectuará quando o beneficiário fizer prova de que a empreitada se encontra efectivamente adjudicada.
Foi na sequência destas comunicações e face à impossibilidade de proceder à adjudicação através de concurso público normal, pelas razões atrás aduzidas que o Órgão Executivo deliberou proceder à abertura de concurso público urgente, (no qual participaram 4 concorrentes) nos termos do Art° 155° e seguintes do CCP, conjugado com o n° 2 do Art° 52° do DL 72-A/2010, na perspectiva de ainda haver possibilidade de aceder à plataforma, poder apresentar esta candidatura e assim obter a aprovação ao respectivo financiamento.
(...)
Com efeito e no cumprimento do n° 2 do Art° 52° do DL 72-A/2010, conjugado com o Art° 155° do CCP o Órgão Executivo deliberou, por unanimidade, a abertura de Concurso Público Urgente de forma a poder apresentar a candidatura ao Mais Centro e obter a aprovação e o contrato de financiamento confirmando desta forma a comparticipação já prevista e enquadrada no âmbito dos projectos contratualizados pelo Município de Anadia no âmbito da Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro - Baixo Vouga (conforme confirma declaração em anexo - DOC 8). Pelas razões expostas e considerando os fundamentos e os documentos que comprovam os prazos e as condições de admissão e aceitação das operações no regime de balcão permanente para submissão de candidaturas ao Mais Centro, o Município entendeu estarem reunidas as condições para abreviar a sua candidatura e por conseguinte a sua aprovação, ressalvando-se que apenas seriam admitidas com a apresentação do anúncio publicado em Diário da República (na modalidade de concurso público urgente) e/ou com a confirmação pelo beneficiário da adjduicação...".
K) Questionada ainda a Câmara Municipal de Anadia, sobre como considerava compatível com a natureza da obra e a observância do princípio da concorrência, a concessão de um prazo de quatro dias para a apresentação de propostas (2), veio a Autarquia a responder o seguinte (3):
"... a) Relativamente a este ponto, e conforme anteriormente já se informou esse Tribunal, este procedimento concursal foi antecedido de dois procedimentos os quais tiveram de ser anulados (pelos motivos também já justificados a esse Tribunal em oficio anterior), sendo por conseguinte revogada a decisão de contratar. Estes dois procedimentos anteriores foram também procedimentos de concurso público, publicitados no Diário da República e na Plataforma VortalGov".
"... a data de abertura do primeiro concurso público para a empreitada de "Áreas de Acolhimento Empresarial - Zona Industrial de Vilarinho do Bairro" foi a 09 de Junho de 2010. Contudo, no decorrer do procedimento verificaram-se algumas falhas consideradas fundamentais para a perfeito funcionamento das infra-estruturas da rede de saneamento que constam do projecto da empreitada, como seja a falta do sistema de tratamento de águas residuais (ETAR), o que implicava alteração de aspectos fundamentais das peças de procedimento. Desta forma, a Câmara Municipal de Anadia, deliberou em 28 de julho de 2010 revogar decisão de contratar e por conseguinte anular o procedimento, tendo por base a alínea c) do n° 1 do art° 79°, conjugado com o n° 2 do art° 60°, ambos do CCP (DOC 1). Neste procedimento não chegou a haver a apresentação de propostas.
Porque se tratava de uma obra importante para o Município, tendo em vista a criação de uma nova zona industrial em Vilarinho do Bairro e porque este projecto já se enquadrava na lista de obras a contratualizar no âmbito da Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro, com financiamento do QREN, a Câmara Municipal agilizou os procedimentos de forma a que a 4 de Agosto de 2010 aprovou o novo projecto, caderno de encargos e programa de procedimento e deliberou a abertura de novo concurso publico. Este procedimento seguiu os seus trâmites até à fase de Audiência Prévia, em que face à apresentação de uma reclamação sobre a não suspensão do prazo e consequente prorrogação do mesmo para apresentação de propostas, devido à apresentação de erros e omissões, e com base no parecer do Gabinete Jurídico sobre esta questão, o Órgão Executivo reconhecendo que se estaria a violar o disposto no n° 3 do Art° 61° do CCP, deliberou, uma vez mais, revogar a decisão de contratar, remetendo o processo aos serviços técnicos para que tivessem em conta as listas de erros e omissões apresentadas no âmbito do procedimento, com vista à abertura de um próximo procedimento (DOC 2). Neste procedimento houve a apresentação de 14 propostas.
Importa acrescentar que ambos os procedimentos acima referidos foram publicitados no Diário da República e na Plataforma VortalGov. Os concorrentes foram notificados da decisão de anulação dos procedimentos através da referida plataforma".
A abertura deste concurso público urgente para a empreitada de "Áreas de Acolhimento Empresarial - Zona Industrial de Vilarinho do Bairro" teve por base o processo do procedimento anterior o qual tinha sido remetido aos serviços técnicos para terem em conta as listas de erros e omissões apresentadas no âmbito daquele procedimento (no qual houve a apresentação de 14 propostas).
Assim, e uma vez que se tratava de um projecto que era lançado a concurso pela terceira vez, apenas com pequenas alterações, que os muitos dos anteriores concorrentes até já conheciam, considerou-se que o prazo de 4 dias seria um prazo razoável não violando o principio da concorrência.
b) A candidatura ao financiamento comunitário ainda não se encontra aprovada pelas razões já anteriormente já justificadas. Resumindo, com a anulação dos anteriores procedimentos perdeu-se a oportunidade de apresentar a candidatura, para a qual era exigida a publicação do anúncio do concurso público urgente e/ou a intenção de adjudicação, em tempo útil. Entretanto as regras de acesso as fundos comunitários ainda não foram publicitadas (desconhecendo-se as condições de admissibilidade, que taxa de comparticipação, etc), aguardando-se a abertura do balcão permanente na plataforma do Mais Centro a onde terá de se apresentar a candidatura uma vez que este projecto se integra na rubrica das Áreas de Acolhimento Empresarial que o Município propôs no âmbito da Contratualização na CIRA (Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro). Certo é que o Município aguarda o visto desse Tribunal para consignação da obra e por conseguinte ter a certeza que a adjudicação será efectivada e ter condições de poder fazer prova da mesma, para efeitos de candidatura ao Mais Centro e obter o respectivo contrato de financiamento.
c) No decorrer do primeiro concurso público para a empreitada de "Áreas de Acolhimento Empresarial - Zona Industrial de Vilarinho do Bairro" verificaram-se algumas falhas consideradas fundamentais para o perfeito funcionamento das infra-estruturas da rede de saneamento que constam do projecto da empreitada, como seja a falta do sistema de tratamento de águas residuais (ETAR), o que implicava alteração de aspectos fundamentais das peças de procedimento. Desta forma, a Câmara Municipal de Anadia, deliberou em 28 de Julho de 2010 revogar a decisão de contratar e por conseguinte anular o procedimento, tendo por base a alínea c) do n° 1 do art° 79°, conjugado com o n° 2 do art° 80°, ambos do CCP (DOC 1). Neste procedimento não chegou a haver a apresentação de propostas.
O segundo procedimento seguiu os seus trâmites até à fase de Audiência Prévia, em que face à apresentação de uma reclamação sobre a não suspensão do prazo e consequente prorrogação do mesmo para apresentação de propostas, devido à apresentação de erros e omissões, e com base no parecer do Gabinete Jurídico sobre esta questão, o Órgão Executivo reconhecendo que se estaria a violar o disposto no n° 3 do Art° 61° do CCP, deliberou, uma vez mais, revogar a decisão de contratar, remetendo o processo aos serviços técnicos para que tivessem em conta as listas de erros e omissões apresentadas no âmbito do procedimento, com vista à abertura de um próximo procedimento (DOC 2).
L) No ponto 14 do anúncio do concurso público urgente, publicado no Diário da República, 2ª série, Parte L, de 11-11-2010, refere-se o seguinte: "O Município de Anadia reserva-se o direito de, nos termos da lei, não adjudicar a presente empreitada a nenhum dos concorrentes, bem como de revogar a decisão de contratar, caso os pressupostos que estiverem na base da decisão de contratar venham a sofrer alterações de em função de uma alteração superveniente das circunstâncias, nomeadamente se a candidatura apresentada ao QREN - Programa Mais Centro não for aprovada pela entidade competente".
M) A presente empreitada não dispõe de financiamento por fundos comunitários, tendo em conta que, solicitada à Câmara Municipal de Anadia, informação sobre se já havia sido aprovada a candidatura ao financiamento comunitário (4), veio a Autarquia responder o seguinte, em síntese (5):
"... A candidatura ao financiamento comunitário ainda não se encontra aprovada pelas razões já anteriormente já justificadas. Resumindo, com a anulação dos anteriores procedimentos perdeu-se a oportunidade de apresentar a candidatura, para a qual era exigida a publicação do anúncio do concurso público urgente e/ou a intenção de adjudicação, em tempo útil. Entretanto as regras de acesso as fundos comunitários ainda não foram publicitadas (desconhecendo-se as condições de admissibilidade, que taxa de comparticipação, etc), aguardando-se a abertura do balcão permanente na plataforma do Mais Centro a onde terá de se apresentar a candidatura uma vez que este projecto se integra na rubrica das Áreas de Acolhimento Empresarial que o Município propôs no âmbito da Contratualização na CIRA (Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro). Certo é que o Município aguarda o visto desse Tribunal para consignação da obra e por conseguinte ter a certeza que a adjudicação será efectivada e ter condições de poder fazer prova da mesma, para efeitos de candidatura ao Mais Centro e obter o respectivo contrato de financiamento...".
III - O DIREITO
1. Suscita-se, no presente processo, a questão de ter sido adoptado um concurso público urgente, nos termos do artigo 52º, nº2, do DL nº 72-A/2010 de 18 de Junho e dos artigos 155º e seguintes do Código dos Contratos Públicos (CCP), a anteceder a celebração do contrato, ora submetido a fiscalização prévia deste Tribunal.
Vejamos, então, em que se traduz esta questão:
O artigo 52º, do DL nº 72-A/2010 de 18 de Junho (6), sob a epígrafe "Disposições especificas na aquisição de bens e serviços", dispõe o seguinte, no seu nº 2:
Artigo 52º
Disposições especificas na aquisição de bens e serviços
............................................................................
2 - Pode adoptar-se o procedimento do concurso público urgente, previsto nos artigos 155º e seguintes do Código dos Contratos Públicos (CCP), na celebração de contratos de empreitada, desde que:
a) Se trate de um projecto co-financiado por fundos comunitários;
b) O valor do contrato seja inferior ao referido na alínea b), do artigo 19º, do CCP; e
c) O critério de adjudicação seja o do mais baixo preço.
............................................................................
Por seu lado, o artigo 155º do CCP, integrado na Secção VII (Concurso público urgente), do Capítulo II, do Título III, da Parte II do mesmo Código, sob a epígrafe "Âmbito e pressupostos", estabelece o seguinte:
Artigo 155º
Âmbito e pressupostos
Em caso de urgência na celebração de um contrato de locação, ou de aquisição de bens imóveis ou de aquisição de serviços de uso corrente para a entidade adjudicante, pode adoptar-se o procedimento de concurso público nos termos previstos na presente secção, desde que:
a) O valor do contrato a celebrar seja inferior aos referidos na alínea b) do nº1 e no nº2, do artigo 20º, consoante o caso; e
b) O critério de adjudicação seja o do mais baixo preço.
Uma das particularidades mais salientes do regime do concurso público urgente é a que consta do artigo 158º do CCP, relativamente ao prazo para a apresentação das propostas, tema este que, adiante, se analisará.
É a seguinte a redacção deste artigo 158º:
Artigo 158º
Prazo mínimo para a apresentação das propostas
O prazo mínimo para a apresentação das propostas é de vinte e quatro horas, desde que estas decorram integralmente em dias úteis.
2. Verifica-se, assim, que, durante a vigência do citado DL nº 72-A/2010, o legislador entendeu estender o regime do concurso público urgente, previsto nos artigos 155º e seguintes do CCP, aos contratos de empreitada, desde que ocorressem os pressupostos definidos nas alíneas a) a c) do nº2, do artigo 52º daquele diploma legal.
2. 1. Analisemos, então, esta ampliação do regime do concurso público urgente às empreitadas de obras públicas, começando por observar se se verificam os pressupostos exigidos pelo nº2, deste artigo 52º, do DL nº 72-A/2010, tendo em conta a matéria de facto dada por assente no probatório:
a) Um dos pressupostos da adopção do concurso público urgente, estabelecidos no nº2, do artigo 52º, do DL nº 72-A/2010, de 18 de Junho, para a celebração de contratos de empreitada, é o de que o valor do contrato seja inferior ao valor estabelecido na alínea b), do artigo 19º, do CCP.
No caso em apreço, o valor do contrato é de 650.769,34 €, o que significa que está abaixo do valor atrás referido, pelo que se mostra preenchido o dito pressuposto.
b) Outro pressuposto exigido para a adopção do citado concurso público urgente, é o de que o critério de adjudicação seja o do mais baixo preço.
É o caso dos autos, em que, de harmonia com o ponto 11 do Programa de Concurso, o critério de adjudicação da empreitada, é o da proposta de mais baixo preço, apresentada pelos concorrentes.
Está, pois, igualmente satisfeita a verificação deste requisito.
c) O terceiro dos pressupostos exigidos pelo nº2, do artigo 52º, do DL nº 72-A/2010, de 18 de Junho, é o de que se trate de um projecto co-financiado por fundos comunitários.
Ora, face ao que consta da matéria de facto dada por assente, designadamente a que consta da alínea M) do probatório, temos que, no caso em apreço, não se encontra aprovado o financiamento comunitário e, inclusivamente, não se encontra, ainda, formalizada a apresentação de candidatura à obtenção de tal financiamento.
Efectivamente, além de dizer que "a candidatura ao financiamento comunitário ainda não se encontra aprovada", a Câmara Municipal de Anadia refere, também, que "as regras de acesso aos fundos comunitários ainda não foram publicitadas ... aguardando-se a abertura do balcão permanente na plataforma do Mais Centro aonde terá de se apresentar a candidatura...".
Por outro lado, o próprio anúncio de abertura do concurso público urgente, publicado no Diário da República, estabelece, no seu ponto 14, que o Município de Anadia reserva o direito de não adjudicar a empreitada e de revogar a decisão de contratar, "se a candidatura apresentada ao QREN - Programa Mais Centro não for aprovada pela entidade competente".
2. 2. Nesta conformidade, há que ter em conta que foi aberto um concurso público urgente, tendente à celebração de um contrato de empreitada de uma obra pública, sem que se verificasse o requisito previsto na al. a), do nº2, do artigo 52º, do DL nº 72-A/2010 de 18 de Junho.
Assim, deste ponto de vista, importa concluir que, não se verificando todos os pressupostos que, no âmbito do nº2, do citado artigo 52º, são fixados para a adopção do mecanismo excepcional de aplicação do procedimento do concurso público urgente, regulado pelos artigos 155º e seguintes do CCP, não era possível recorrer a este tipo de procedimento pré-contratual.
3. Dissemos atrás que a adopção do procedimento de concurso público urgente, no caso vertente, constituía um mecanismo excepcional.
Ora, a afirmação de que a previsão do artigo 52º, nº2, do DL nº 72-A/2010, de 18 de Junho, constitui um mecanismo excepcional de aplicação do procedimento do concurso público urgente, regulado pelos artigos 155º e seguintes do CCP, tem por base o seguinte:
Por um lado, o DL nº 72-A/2010 é um diploma que visa estabelecer disposições relativas à execução do Orçamento do Estado para 2010, e não matérias relativas à contratação pública.
Por outra banda, o artigo 52º, deste diploma legal, tem por epígrafe, como se disse acima, "Disposições específicas na aquisição de bens e serviços" e, não obstante, regula, num dos seus números, matéria concernente a empreitadas de obras públicas...
Além disso, se é certo que o artigo 155º do CCP define o âmbito e os pressupostos de aplicação do concurso público urgente, logo se vê que esta modalidade de concurso não está vocacionada, nem prevista, para a celebração de contratos de empreitada de obras públicas, o que, aliás, bem se compreende, dado que a apresentação de propostas, para este tipo de obras, se insere num procedimento pré-contratual mais elaborado e demorado, que se não compagina com o procedimento "aligeirado" que se encontra previsto nos artigos 155º e seguintes do CCP.
Por isso, é que, ao prever a adopção do concurso público urgente, este artigo 155º estabelece que tal procedimento é aplicável em caso de urgência, e, por outro lado, na celebração de um contrato de locação, ou de aquisição de bens móveis, ou ainda de aquisição de serviços de uso corrente para a entidade adjudicante.
Ora, uma vez que o artigo 157, nº2, do CCP, estabelece, relativamente ao concurso público urgente, que o programa de concurso e o caderno de encargos devem constar do anúncio do concurso, manifesto é que tal regime não é compatível com o conteúdo de um anúncio de abertura de um procedimento respeitante à celebração de um contrato de empreitada, pois que, como é óbvio, não é possível, designadamente, incorporar no anúncio os elementos de solução da obra que devem integrar o caderno de encargos, em conformidade com o que estabelece o artigo 43º, do mesmo Código.
Por outro lado, como também se referiu acima, o artigo 158º do CCP estabelece que o prazo mínimo para a apresentação das propostas é de vinte e quatro horas, desde que estas decorram integralmente em dias úteis.
Ora, se repararmos na redacção do artigo 135º, do mesmo Código, verificamos que, de acordo com o seu nº1, para a apresentação de propostas num concurso público cujo anúncio não seja publicado no Jornal Oficial da União Europeia (JOUE) não pode ser fixado um prazo inferior a 9 dias.
Além disso, e no concerne, especificamente, ao procedimento de formação de um contrato de empreitada de obras públicas, o prazo para a apresentação de propostas é de 20 dias, a contar da data do envio do anúncio para publicação no Diário da República.
Só em caso de manifesta simplicidade dos trabalhos necessários à realização da obra, é que o CCP, no nº2, do mesmo artigo 135º, estabelece que aquele prazo mínimo, para a apresentação de propostas, pode ser reduzido em 11 dias, ou seja, pode a apresentação de propostas ser efectuada num prazo de apenas 9 dias.
Assim é que um prazo mínimo de 24 horas, para a apresentação de propostas - tal como fixado no artigo 158º, do CCP - podendo ser admissível num procedimento que tenha em vista a prestação de certos serviços, ou o fornecimento de bens móveis, não se coaduna com a natureza dos contratos de empreitada.
É que, por outra banda, tal prazo de 24 horas não se mostra conforme com as exigências que decorrem da observância do princípio da proporcionalidade - com assento constitucional - e ainda com o respeito pelos princípios da igualdade e da concorrência.
Aliás, os elementos exigidos pelo artigo 57º, nºs 1 e 2, do CCP, para o conteúdo das propostas, mostram amplamente a complexidade que está associada à celebração de contratos de empreitada de obras públicas e que não é comparável, sequer, com o procedimento inerente à celebração de contratos de aquisição de serviços ou de aquisição de bens móveis.
Efectivamente, num procedimento conducente à formação de contratos de empreitada de obras públicas, as propostas dos concorrentes são constituídas pelos documentos mencionados no nº1, do artigo 57º do CCP e ainda pelos elementos referidos no nº2, deste normativo, ou seja: i) uma lista dos preços unitários de todas as espécies de trabalhos previstas no projecto de execução; ii) um plano de trabalhos, tal como definido no artigo 361º do mesmo Código, quando o caderno de encargos seja integrado por um projecto de execução; iii) um estudo prévio, nos casos previstos no nº3, do artigo 43º do CCP, competindo a elaboração do projecto de execução ao adjudicatário.
4. De acordo com o estabelecido no artigo 156º, nº1, do CCP, o procedimento de concurso público urgente rege-se, com as necessárias adaptações, pelas disposições que regulam o concurso público, em tudo o que não esteja especialmente previsto nos artigos seguintes, ou que com estes seja incompatível.
Uma das formalidades essenciais a observar, no concurso público urgente, é, como se dispõe no artigo 157º, nº1, do CCP, a publicitação do mesmo no Diário da República, através de anúncio conforme modelo aprovado por portaria dos ministros responsáveis pela edição do Diário da República e pelas áreas das finanças e das obras públicas.
Por outro lado, devem constar do anúncio, o programa do concurso e o caderno de encargos, de harmonia com o definido no nº2, do mesmo artigo 157º, do CCP.
Acontece que a portaria, atrás referida, é a Portaria nº 701-A/2008 de 29 de Julho, a qual, de acordo com o seu artigo 1º, nº1, al. b), contém, no seu Anexo II, o modelo de anúncio de concurso público urgente.
Tal modelo especifica que o anúncio deste concurso deve incluir informação, designadamente, sobre o "objecto do contrato" (nº 2 do Anexo II), e, dentro deste, a designação do contrato (7), com a descrição sucinta do seu objecto, bem como o tipo de contrato (8) (locação de bens imóveis/aquisição de bens móveis/aquisição de serviços) (9), para além do Programa de Concurso (nº12 do Anexo II) e do Caderno de Encargos (nº 13 do Anexo II), os quais são de preenchimento obrigatório.
Ora, no caso em apreço, o anúncio do concurso foi publicado no Diário da República, mas não obedeceu totalmente ao modelo previsto na citada Portaria nº 701-A/2008, uma vez que não incluiu o Programa de Concurso nem o Caderno de Encargos, tal como exigido no seu Anexo II.
5. Embora, como vimos, não ocorram todos os pressupostos para a adopção, no caso sub judice, de um procedimento de concurso público urgente, tal como exigido pelo artigo 52º, nº2, do DL nº 72-A/2010, de 18 de Junho, vejamos se se verifica um outro relevante pressuposto, para a adopção do citado procedimento, qual seja o da ocorrência de uma situação de urgência.
Já vimos que se trata, aqui, de um procedimento de formação de um contrato de empreitada de obras públicas, que só pode ser objecto de um concurso público urgente, em face da existência de uma norma (artigo 52º, nº2, do DL nº 72-A/2010 de 18 de Junho) que, excepcionalmente, o consente, mas dentro dos apertados termos a que acima aludimos.
Todavia, a adopção de um procedimento de concurso público urgente, ao abrigo do disposto no artigo 155º e seguintes do CCP, tem, desde logo, um pressuposto prévio, que é determinante da sua admissibilidade - ou não - no caso em apreço: a circunstância de se estar perante um caso de urgência na celebração do contrato a que se destina.
O termo urgente veicula um conceito indeterminado.
Conceitos indeterminados ou conceitos standard, são, como referem J. M. SANTOS BOTELHO, A. PIRES ESTEVES e J. CÂNDIDO DE PINHO (10), aqueles que, por concreta opção do legislador, envolvem uma definição normativa imprecisa a que, na fase de aplicação, se deverá dar uma significação específica, em face de factos concretos, de tal forma que o seu emprego exclui a existência de várias soluções possíveis.
Por isso, constituindo a urgência um conceito com esta natureza, torna-se necessário proceder a operações tendentes à sua concretização específica, o que passa pelo recurso a valores e após ponderação das circunstâncias de cada caso.
A urgência, como fundamento de um desvio à tramitação normal dos procedimentos administrativos constitui, como salienta ANDRADE DA SILVA (11), uma excepção à regra da concorrência nos termos gerais.
Uma vez que a caracterização e o preenchimento do conceito de urgência, carece apreciação casuística, pode afirmar-se que, para que uma situação possa ser considerada de urgência, terá que se estar perante um caso em que a utilização de um procedimento normal resultaria ineficaz ou revelar-se-ia inidóneo para dar, em tempo oportuno, a resposta necessária.
Há que assinalar, aliás, que a urgência se distingue da celeridade, dever que impende sobre a Administração, nos termos do disposto no artigo 57º do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
Na verdade, a celeridade procura atingir outros valores, designadamente a prontidão e a eficácia da acção administrativa.
Ao invés, uma situação de urgência tem a ver com casos em que a Administração se vê confrontada com uma circunstância de risco ou perigo iminente e actual que ameace seriamente a satisfação de certo interesse público ou a satisfação prioritária de certos interesses públicos (12).
No caso sub judice, porém, não se configura qualquer situação de urgência, com estes contornos, que tenha sido determinante da adopção do modelo de concurso público urgente.
Efectivamente, como resulta da matéria de facto dada por assente na alínea J) do probatório, quando questionada sobre qual a urgência que se verificou para justificar a adopção do procedimento pré-contratual utilizado, a Câmara Municipal de Anadia veio dizer, por um lado, que, tendo aberto dois concursos públicos, com o mesmo objectivo, anulara um desses procedimentos devido a deficiências do projecto da empreitada, e o outro por "falhas" procedimentais, relacionadas com a eventual violação do disposto no artigo 61º, nº3, do CCP.
Por outro lado, veio, também, a Câmara Municipal de Anadia referir que se tratava de uma obra importante para o Município, tendo em vista a criação de uma nova zona industrial em Vilarinho do Bairro e que o projecto se enquadrava na lista de obras a contratualizar no âmbito da Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro, com financiamento do QREN.
Além disso, aludiu ainda a Autarquia a circunstâncias relacionadas com a obtenção de financiamento comunitário - e a passos dados nesse sentido - no âmbito do Programa Operacional Regional do Centro.
Ora, como já várias vezes decidiu este Tribunal (13), a invocação da utilização de fundos comunitários, não serve como fundamento justificativo de urgência.
Por isso, não pode tal circunstância constituir fundamento da adopção de um procedimento pré-contratual com a natureza de um concurso público urgente.
De todo o modo, mesmo tendo em conta a obra em causa, as circunstâncias em que se desenvolveram os procedimentos pré-contratuais realizados - e anulados - e, ainda, as diligências - sem sucesso garantido - com vista ao seu financiamento por verbas comunitárias, não se configura uma situação de verdadeira urgência, no sentido de que se esteja perante um caso de risco ou perigo iminente e actual a ameaçar seriamente a satisfação de interesses colectivos.
Assim, não se mostrando existir uma situação de urgência na efectivação da obra, a que se refere o presente contrato, motivo não havia para a adopção do concurso público urgente previsto nos artigos 155º e seguintes do CCP, o que, aliás, também se verificava em virtude da não ocorrência do pressuposto indicado na alínea a), do nº2, do artigo 52º, do DL nº 72-A/2010 de 18 de Junho.
6. No caso em apreço, e com a utilização do concurso público urgente, foi estabelecido, no respectivo anúncio de abertura, que a apresentação de propostas deveria ser efectuada até às 09 horas do quarto dia a contar do envio, para publicação, do dito anúncio.
Embora, como se disse, o artigo 158º do CCP estabeleça que o prazo mínimo, para a apresentação de propostas, num concurso público urgente, é de vinte e quatro horas, cabe aqui indagar da admissibilidade e da conformidade legal de tal prazo, no caso vertente.
Na verdade, como vimos atrás, por ausência de verificação de uma situação de urgência, não era possível, para a celebração de um contrato de empreitada de obras públicas, recorrer-se a um procedimento de concurso público nos termos previstos na Secção VII, do Capítulo II, dom Título III, da Parte II, do CCP.
Assim, cabe perguntar também se, para a apresentação de propostas para um concurso de empreitada de obras públicas, é suficiente o prazo de quatro dias, tal como foi estabelecido no caso em apreço.
É que será questionável se o referido prazo de quatro dias permite a elaboração completa, fundamentada e consistente de propostas para a realização da obra posta a concurso.
Além disso, ainda se pode questionar se aquele prazo de quatro dias permite o acesso, ao concurso, do mais vasto leque possível de concorrentes e, com isso, a observância dos princípios da igualdade e da concorrência estabelecidos no artigo 1º, nº4, do CCP.
Para estas questões, a resposta não pode deixar de ser negativa.
Efectivamente, importa recordar que, como se assinalou atrás, o artigo 135º, nº1, do CCP estabelece que o prazo mínimo para a apresentação de propostas, no caso de se tratar de um procedimento tendente à celebração de um contrato de empreitada de obras públicas, é de 20 dias, a contar do envio, para publicação, do respectivo anúncio de abertura.
Só em caso de manifesta simplicidade dos trabalhos é que a lei consente que tal prazo mínimo pode ser diminuído, e, ainda assim, não pode ser inferior a 9 dias.
Ora, tratando-se, no caso em apreço, de uma obra relativa a áreas de acolhimento empresarial, na zona industrial de Vilarinho do Bairro, no concelho de Anadia, e tendo presente o valor do contrato em causa, bem como o prazo de execução da obra, não poderá dizer-se que se está perante trabalhos com manifesta simplicidade.
Mas, ainda que assim fosse, o certo é que o prazo para a apresentação das propostas, que foi fixado, é inferior, até, ao prazo mínimo de 9 dias, definido legalmente para a apresentação de propostas relativas a uma obra que tenha essa natureza!
Reconhecendo-se, à entidade adjudicante, alguma margem de liberdade na fixação do prazo de apresentação de propostas, pelos operadores económicos que desenvolvem a sua actividade no mercado, tal liberdade está limitada pela observância dos princípios da proporcionalidade e da concorrência, devendo ser utilizada de modo a assegurar e respeitar estes princípios.
É que, como acentuou o Acórdão de 25 de Março de 2010, do Tribunal Central Administrativo Norte (14), na concretização dos princípios da proporcionalidade e da concorrência, devem ainda ser observados os deveres de prossecução do normal funcionamento do mercado e da protecção subjectiva dos potenciais concorrentes, por forma a assegurar o mais amplo acesso aos procedimentos, por parte dos interessados em contratar.
E não se diga, como justificou a Câmara Municipal de Anadia, que o prazo de quatro dias para a apresentação de propostas era suficiente, porque "se tratava de um projecto que era lançado a concurso pela terceira vez, apenas com pequenas alterações, e que muitos concorrentes já conheciam".
É que, na situação vertente, concorreram quatro empresas, quando o certo é que no procedimento anteriormente levado a cabo, haviam sido apresentadas 14 (catorze) propostas...
Por outro lado, importa reter que o prazo para apresentação de propostas é uma matéria a que a Directiva nº 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, dá especial relevo.
Na verdade, o artigo 38º, nº1, desta Directiva, determina que as entidades adjudicantes, ao fixarem os prazos de recepção das propostas e dos pedidos de participação, deverão ter em conta, especialmente, a complexidade do contrato e o tempo necessário à elaboração das propostas. A este propósito deve, também lembrar-se que o nº4, do mesmo artigo 38º, estabelece que no caso de as entidades adjudicantes terem publicado um anúncio de pré-informação, o prazo mínimo para a recepção das propostas pode ser reduzido, mas nunca para menos de 22 dias.
Aliás, há que salientar que o recentemente publicado decreto lei de execução orçamental para 2011 - o DL nº 29-A/2011 de 1 de Março - continuando, embora, a permitir a adopção do procedimento de concurso público urgente, na celebração de contratos de empreitada, verificados que sejam os pressupostos que já eram exigidos pelo nº2, do artigo 52º do DL nº 72-A/2010 de 18 de Junho, estabelece, no seu artigo 35º, nº6, que a tal procedimento é aplicável o prazo mínimo de 15 dias para apresentação de propostas.
A celeridade processual é um elemento essencial de um Estado de Direito.
Porém, como resulta da lição de MARTIN BULLINGER (15), a necessidade de celeridade, pode, também, ser olhada como um perigo para este mesmo Estado de Direito, já que pode conduzir a uma consideração da factualidade e da situação jurídica, sem a profundidade exigida para uma correcta aplicação da lei, e, dizemos nós, ao atropelo de princípios fundamentais que a lei entendeu salvaguardar sem tibiezas.
7. Nesta conformidade, resulta de todo o exposto que, para além de não se verificar o requisito previsto na al. a), do nº2, do artigo 52º, do DL nº 72-A/2010 de 18 de Junho, foi utilizado, no caso em apreço, um procedimento que não garante o respeito pelos princípios da legalidade, da concorrência e da igualdade previstos no artigo 1º, nº4, do Código dos Contratos Públicos.
A violação de lei verificada, sendo susceptível de restringir o universo de potenciais concorrentes, é do mesmo modo susceptível de alterar o resultado financeiro do contrato.
Assim, tal ilegalidade enquadra-se no disposto no artigo 44º, nº3, al. c) da Lei nº 98/97 de 26 de Agosto, quando este prevê a existência de uma -"ilegalidade que... possa alterar o respectivo resultado financeiro".
Ora, quando a lei - referindo-se a um acto, ou contrato ou outro instrumento gerador de despesa ou representativo de responsabilidades - alude a uma "ilegalidade que possa alterar o respectivo resultado financeiro", pretende significar, como é jurisprudência pacífica e reiterada deste Tribunal, que basta o simples perigo ou risco de que, da ilegalidade cometida, possa resultar a alteração do correspondente resultado financeiro.
Por isso é que tal ilegalidade é fundamento de recusa de visto, como estabelece a alínea c), do nº 3, do artigo 44º, da Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto.
IV - DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes da 1ª Secção do Tribunal de Contas, em subsecção, em recusar o visto ao presente contrato.
São devidos emolumentos (artigo 5º, nº3 do Regime Jurídico dos Emolumentos do Tribunal de Contas anexo ao DL nº 66/96 de 31 de Maio).
Lisboa, 15 de Março de 2011.
Os Juízes Conselheiros - (António M. Santos Soares, relator) - (João Figueiredo) - (Alberto Fernandes Brás)
Fui presente
O Procurador-Geral Adjunto - (Jorge Leal)
(1) O que foi efectuado pelo ofício deste Tribunal, com a referência DECOP/UAT 1/ 213/2011, de 12 de Janeiro de 2011.
(2) O que foi efectuado pelo ofício com a referência DECOP/UAT 1/ 1483/2011, de 23-02-2011.
(3) Através do ofício nº 884, com a referência 6ª Secção, Proc. nº 240.02.00, de 07-03-2011.
(4) Solicitação efectuada através do ofício com a referência DECOP/UAT. 1/ 1483/2011, de 23-02-2011.
(5) Através do ofício nº 884, com a referência 6ª Secção, Proc. nº 240.02.00, de 07-03-2011.
(6) Diploma que estabelece as disposições necessárias à execução do Orçamento do Estado para 2010 e que, entretanto, foi objecto das alterações que lhe foram introduzidas pela Lei nº 50/2010 de 7 de Dezembro.
(7) De preenchimento obrigatório.
(8) Também de preenchimento obrigatório.
(9) Obviamente que no tipo de contrato não se inclui o de empreitada de obras públicas pelas razões supra referidas: não se previa a adopção de um concurso público urgente para a formação de um contrato de empreitada e porque o artigo 155º do CCP apenas o previa para a celebração de um contrato de locação, ou de aquisição de bens móveis, ou de aquisição de serviços.
(10) Vide o "Código do Procedimento Administrativo Anotado e Comentado", 3ª edição, Almedina, 1996, pág. 639, em anotação ao artigo 135º.
(11) Vide o "Código dos Contratos Públicos, Anotado e Comentado", 2008, ed. Almedina, pág.484.
(12) Veja-se, neste sentido, FREITAS DO AMARAL e MARIA DA GLÓRIA GARCIA, in "O Estado de Necessidade e a Urgência em Direito Administrativo", ROA, 59º, II, pág.515.
(13) Vide, designadamente, os Acórdãos da 1ª Secção, em subsecção, nºs 155/2001, de 2 de Outubro de 2001, proferido no Proc. nº 2158/2001 (publicado na Revista do Tribunal de Contas, nº 36, pág. 327 e segs.) e 104/99, de 7 de Dezembro de 2009, no Proc. nº 13.744/99, bem como o Acórdão de 25 de Maio de 1999, proferido em Plenário, no Recurso Ordinário nº14/99.
(14) In Proc. nº 1257/09.7BEPRT, pesquisado em www.dgsi.pt
(15) In "Procedimiento Administrativo al ritmo de la economia y la sociedad‖, R.E.D.A. , nº 69, 1991, pág. 8, citado no "Código do Procedimento Administrativo, Anotado e Comentado‖ de J. M. SANTOS BOTELHO, A. PIRES ESTEVES e J. CÂNDIDO DE PINHO, 3ª edição, Almedina, Coimbra, 1996, pág. 245.