Acórdão n.º 12/2011, de 15 de Junho de 2011, do Plenário da 1.ª Secção do Tribunal de Contas (proc. n.º 1831/2010)

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ACÓRDÃO Nº 12 /11 - 15.JUN. 2011 - 1ª S/PL

RECURSO ORDINÁRIO Nº 6/2011

(Proc. nº 1831/2010)

 

DESCRITORES:

Apreciação e relevância de prova documental produzida em sede de recurso e respectivo enquadramento legal;

[In]tempestividade da junção de prova da habilitação técnica em prazo posterior ao estipulado no Procedimento e Consequências legais;

Financiamento da Obra;

Elementos da solução da obra a que alude o artº. 43º, nº. 5, do Código dos Contratos Públicos

 

SUMÁRIO:

1.
Pese embora o disposto no art.º 100º, n.º 2 da Lei nº 98/97, de 26.08, em sede de recurso mostra-se vedada a consideração positiva de elementos de prova não disponíveis ao tempo da prolação da decisão recorrida sempre que daí decorra a violação de lei ou de princípios que a estruturem;

2.
A não apresentação do documento comprovativo da habilitação técnica exigida para a execução da obra no prazo fixado no Programa do Procedimento determina a caducidade da adjudicação e o inerente dever de adjudicar a proposta ordenada em lugar subsequente [vd. art.º 86º, do C.C.P.];
O contrato celebrado sobre adjudicação em situação de caducidade revela- -se nulo e de nenhum efeito;
Admite-se a consideração de prova comprovativa da habilitação técnica para a execução da obra concursada e a atribuição dos necessários e respectivos efeitos probatórios, desde que a mesma [habilitação técnica] já fosse validamente detida pelo adjudicatário ao tempo do prazo fixado no Programa do Procedimento para a correspondente apresentação;

3.
Só a detenção efectiva de habilitação técnica exigida procedimentalmente e certificada pela entidade competente exibe conformação legal e permite a execução da obra objecto de concurso;

4.
Segundo o art.º 44.º, n.º 3, al. a), da Lei n.º 98/97, de 26.08, a nulidade constitui fundamento de recusa do Visto.  

O Conselheiro Relator: Alberto Fernandes Brás

 

ACÓRDÃO Nº 12/11 - 15.JUN. 2011 - 1ª S/PL

RECURSO ORDINÁRIO Nº 6/2011 - R

(Proc. nº 1831/2010)

 

I - RELATÓRIO

A.
1.
A Universidade de Aveiro, inconformada com o teor do acórdão n.º 8/2011- -1.ªS/SS, de 22.02, deste Tribunal, e que recusou o Visto ao contrato de empreitada para a construção do Edifício "Complexo Interdisciplinar de Ciências Físicas Aplicadas à Nanotecnologia e à Oceanografia" [Departamento de Física, 2.ª fase], celebrado entre aquela entidade e a Sociedade "Transfor II - Engenharia e Construção, S.A.", no valor de € 3 787 317,02, veio do mesmo interpor recurso jurisdicional, concluindo como segue:
"(...)
I. O adjudicatário é efectivamente detentor das habilitações técnicas necessárias à execução da empreitada;
II. A não corporização daquelas habilitações em documento formal compadece--se como mero vício formal, não compatível com a desproporção dos prejuízos que a decisão de não visar o contrato irremediavelmente acarreta, nomeadamente o risco sério da perda do financiamento oportunamente contratualizado;
III. O Interesse Público, imanente ao desígnio da empreitada em apreço, deverá ser prevalecente sobre um vício formal que, como no caso presente, e decorrente da declaração subscrita pelo InCI, tem elevado grau de previsibilidade de se ver sanado em prazo que aproveite à prática dos necessários actos atinentes ao cumprimento das obrigações contratualmente estabelecidas;
IV.Termos em que deve ser concedido o Visto ao presente contrato de empreitada.".  

A final, e peticionando, a recorrente requer, implicitamente, a revogação do acórdão recorrido e a respectiva substituição por um outro que conceda o "Visto" ao contrato em apreço.

2.
O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, em douto Parecer, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, advogando, ainda, a confirmação do acórdão recorrido nos precisos termos em que se encontra formulado.

3.
Foram colhidos os Vistos legais. 

II. FUNDAMENTAÇÃO

A.
Ao longo do acórdão recorrido, objecto do presente recurso, considerou-se estabelecida, com relevância para a análise em curso, a factualidade inserta no introito daquele aresto e, ainda, a seguinte:

1.
O contrato em causa foi precedido da realização de concurso público, tendo o correspondente Aviso sido publicado no Diário da República em 26.06.2009, no Jornal Oficial da União Europeia em 01.07.2009 e, ainda, em quatro jornais de grande circulação;

2.
O preço-base do concurso foi fixado em € 3 950 000,00, acrescido de IVA;

3.
De acordo com o Programa de Concurso, o critério de adjudicação é o do mais baixo preço;

4.
Nos termos do art.º 29.º, ainda do Programa de Concurso, sobre o adjudicatário impendia a obrigação de apresentar, entre o mais, alvarás ou os títulos de registo emitidos pelo Instituto de Construção e do Imobiliário, I.P., demonstrativos da aptidão adequada e necessária à execução do contrato, sendo que o adjudicatário poderia apresentar as habilitações constantes do ponto 6.1. ou do ponto 6.2., ainda, do referido art.º 29.º, do Programa de Concurso e cujo teor se passa a transcrever:
"(...)
6.1) Subcategoria em classe que cubra o valor global da obra:
2.ª Subcategoria (Estruturas metálicas) da 1.ª categoria (Edifícios e património construído);
Subcategorias relativas aos restantes trabalhos a executar e nas classes correspondentes:
Subcategorias da 1.ª categoria (Edifícios e património construído): 1.ª (Estruturas e elementos de betão), 4.ª (Alvenarias, rebocos e assentamento de cantarias), 5.ª (Estuques, pinturas e outros revestimentos), 6.ª (Carpintarias), 7.ª (Trabalhos em perfis não estruturais) e 8.ª (Canalizações e condutas em edifícios);
Subcategorias da 4.ª categoria (Instalações eléctricas e mecânicas): 1.ª (Instalações eléctricas de utilização de baixa tensão), 7.ª (Infra-estruturas de telecomunicações), 8.ª (Sistemas de extinção de incêndios, segurança e detecção), 9.ª (Ascensores, escadas mecânicas e tapetes rolantes), 10.ª (Aquecimento, ventilação, ar condicionado e refrigeração) e 12.ª (Redes de distribuição e instalações de gás);
Subcategorias da 5.ª categoria (Outros trabalhos): 2.ª (Movimentação de terras), 11.ª (Impermeabilizações e isolamentos) e 12.ª (Andaimes e outras estruturas provisórias);
6.2) Empreiteiro geral de edifícios com estrutura metálica da 1.ª categoria (Edifícios e património construído) e em classe que cubra o seu valor global;"

5.
O art.º 30.º, n.º 2, do Programa de Concurso, estabelece que o adjudicatário deve apresentar os documentos de habilitação exigidos no prazo de dez dias a contar da notificação da decisão de adjudicação;

6.
A concurso foram apresentadas 14 propostas, tendo sido excluídas 6 devido a falta de documentos e 3 por indicação de preço superior ao preço-base;

7.
Em 26.11.2009, a Reitoria da Universidade de Aveiro adjudicou a obra à proposta apresentada pelo consórcio "Ferreira Construções, S.A." e "Alberto Mesquita & Filhos", adjudicação essa confirmada pelo novo Reitor em 11.10.2010, que também aprovou a minuta do contrato;

8.
Em 08.11.2010, a adjudicatária, alegando a "falência" de uma das empresas do consórcio concorrente, reconheceu e deu a conhecer a impossibilidade de cumprir a proposta;

9.
Em 12.11.2010, o Reitor da Universidade de Aveiro, na impossibilidade de o primeiro classificado no concurso em apreço levar a efeito a execução da empreitada e tal assumir contratualmente, adjudicou esta ao concorrente "Transfor II - Engenharia e Construção, S.A.", a qual tinha sido classificada em segundo lugar;

10.
Notificada, em 12.11.2010, para juntar os necessários documentos de habilitação, a adjudicatária "Transfor II - Engenharia e Construção, S.A.", fez a sua apresentação em 22.11.2010, onde se incluía o alvará n.º 57137;

Este alvará, para a 1.ª categoria, inclui as autorizações habilitacionais, a saber:
- Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Edifícios de Construção Tradicional, classe 6;
- Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Reabilitação e Conservação de Edifícios, classe 6;
- 1.ª Subcategoria, classe 5;
- 2.ª Subcategoria, classe 5;
- 3.ª Subcategoria, classe 4;
- 4.ª Subcategoria, classe 5;
- 5.ª Subcategoria, classe 5;
- 6.ª Subcategoria, classe 4;
- 7.ª Subcategoria, classe 4;
- 8.ª Subcategoria, classe 4;
- 9.ª Subcategoria, classe 3;
- 10.ª Subcategoria, classe 2;

11.
O contrato foi celebrado em10.12.2010;

12.
Oportunamente [ao tempo da instrução do processo de Fiscalização Prévia], o Tribunal de Contas questionou a Universidade de Aveiro sobre a [in]viabilidade da celebração do contrato com a adjudicatária em causa, pois esta não detinha o alvará exigido na classe correspondente ao valor total da obra [2.ª subcategoria da 1.ª categoria ou Empreiteiro Geral de Edifícios com Estrutura Metálica [1.ª categoria];

Em resposta, a recorrente, aduziu o seguinte:
"(...)
a) O concorrente apresentou o respectivo alvará correspondente à classe 6- classe que cobre o valor global da proposta - de "Empreiteiro geral ou construtor geral de edifícios de construção tradicional"(...);
b) Apresentou, ainda, em sede do referido alvará, subcategorias próprias, que complementadas com o alvará de um subempreiteiro (...) corresponderam a todas as subcategorias exigidas;
c) Verifica-se, porém, que a classe da 2.ª subcategoria (Estruturas metálicas) da 1.ª categoria (Edifícios e património construído) apresentada pelo concorrente não cobre o valor global da obra;
d) Cumpre, contudo, sublinhar que, face aos elementos constantes do referido alvará, o concorrente, actual adjudicatário - "Transfor II- Engenharia e Construção SA" -, é detentor das habilitações requeridas para a obtenção da classificação de "Empreiteiro ou construtor geral de edifícios de estruturas metálicas", ao abrigo do normativo aplicável, concretamente o artigo 12.º, n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de Janeiro, "A classificação em empreiteiro geral ou construtor geral é concedida com base: a) Na classificação das subcategorias determinantes, podendo, no limite e em função da apreciação que resulte das alíneas seguintes, ser concedida até duas classes acima da classe mais elevada detida naquelas subcategorias;
f) Por outro lado, resulta dos elementos constantes do alvará apresentado pelo concorrente que as classes das subcategorias determinantes para a obtenção da classificação de "Empreiteiro geral ou construtor geral de edifícios com estrutura metálica", respectivamente, 2.ª (Estruturas metálicas) e 4.ª (Alvenarias, rebocos e assentamento de cantarias) são (...) 5 (cinco) e 5 (cinco);
g) Parece-nos, assim, legítimo concluir, de forma inequívoca, que o concorrente, à luz do citado normativo, detém, efectiva e materialmente, as habilitações inerentes a "Empreiteiro geral ou construtor geral de edifícios com estrutura metálica", no mínimo, em classe 6, logo, em classe que cobre o valor global da proposta apresentada;
Em conclusão, o adjudicatário detém, nos termos explanados, as condições necessárias e exigíveis para a integral execução da presente empreitada."

13.
Ao processo em apreço, e ainda em sede de instrução, foi junta uma declaração da "AECOPS", Associação de Empresas de Construção, Obras Públicas e Serviços, com o seguinte teor:
"A pedido da empresa nossa associada TRANSFOR II - ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO, SA, pessoa colectiva n.º 508155096,declaramos que, na presente data, 28 de Janeiro de 2011, a titular do alvará de construção n.º 57137, é detentora das habilitações determinantes para o pedido de obtenção de Empreiteiro ou Construtor Geral de Edifícios de Estruturas Metálicas:

1.ª Categoria - Edifícios e Património Construído
Subcategorias
2.ª Estruturas Metálicas
4.ª Alvenarias rebocos e assentamento de cantarias".

14.
A consignação da obra ocorreu em 03.01.2011;

15.
O prazo de execução da obra é de 539 dias, contados a partir da data da consignação [vd. cláusula 3.ª do contrato];

16.
A obra foi objecto de um contrato de financiamento celebrado entre a Universidade de Aveiro e o Programa Operacional Temático Valorização do Território, que visa uma comparticipação financeira do FEDER, e onde se fixa o dia 30.06.2011 como data da conclusão física da operação e 30 de Setembro de 2011 como data da respectiva conclusão financeira;

B.
Em anexo às alegações de recurso sob apreciação foram juntos, com relevância, os seguintes documentos:
1. Calendário da operação de financiamento da obra em causa, Plano financeiro anual e indicação das fontes de financiamento [comunitário e nacional], o que traduz a reprogramação temporal e financeira da obra em causa;
2. Declaração da AECOPS, passada a pedido da empresa "Transfor II - Engenharia e Construção, S.A.", onde se afirma que esta, em 28.01.2011, era titular do alvará de construção n.º 57137, sendo, ainda, detentora das habilitações determinantes para o pedido de obtenção de empreiteiro ou Construtor Geral de Edifícios de Estrituras Metálicas - 1.ª Categoria [Edifícios e Património Construído] - Subcategorias [2.ª - Estruturas Metálicas e 4.ª - Alvenaria rebocos e assentamento de cantarias];
3. Certidão emitida pelo Instituto de Construção e do Imobiliário, I.P., em 10.03.2011, e onde se atesta que, em 25.02.2011, a empresa "Transfor II - Engenharia e Construção, S.A.", deu entrada naquele Instituto de um requerimento onde peticiona a reclassificação de alvará para as habilitações, a saber:

1.ª Categoria - Edifícios e Património Construído
- Edifícios com Estrutura Metálica - classe 6
- Edifícios de Madeira - classe 5  

5.ª Categoria - Outros Trabalhos
- 4.ª Fundações especiais - classe 3.

4. Certidão do Alvará n.º 57137, com validade até 31.01.2011.

C.
Sob solicitação do Tribunal de Contas, de 30.05.2011, o Instituto Nacional da Construção e do Imobiliário remeteu a informação seguinte:
"Assunto: Pedido de Reclassificação - (Novas Habilitações) por parte da empresa 'TRANSFOR II, ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO,SA'
A empresa 'TRANSFOR II, ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO,SA' apresentou em 25-02-2011, um pedido de Reclassificação - Novas habilitações, onde requereu entre outras habilitações, a classificação na Categoria de Edifícios e Património Construído - 'Empreiteiro/Construtor Geral de Edifícios de Construção Metálica' na classe 6, sobre o qual foi emitido projecto de decisão de deferimento total, que lhe foi comunicado em 23-03-2011.
Em 24-05-2011, a empresa procedeu ao pagamento da taxa devida pela emissão do alvará, tendo sido, em 25.05.2011, efectuada a respectiva actualização do alvará no portal do InCI, data a partir da qual se considera a empresa habilitada para realizar obras enquadráveis na Categoria de Edifícios e Património Construído, designadamente 'Empreiteiro/Construtor Geral de Edifícios de Construção Metálica' em classe 6 (€5.312.000)."  

III. O DIREITO

Conforme decorre do acórdão recorrido, a recusa do Visto ao contrato de empreitada celebrado entre a Universidade de Aveiro e a Sociedade "Transfor II - Engenharia e Construção, S.A.", assenta, básica e essencialmente, no seguinte:

No domínio do procedimento em apreço exigiu-se que o adjudicatário fosse titular de alvará ou título de registo emitido pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, que, no mínimo, comprovasse a detenção de habilitação técnica correspondente à 2.ª Subcategoria [Estruturas Metálicas] da 1.ª Categoria [Edifícios e Património Construído] para o valor global da obra, acrescido de autorizações em diversas Subcategorias das 1.ª, 4.ª e 5.ª Categorias [estas, para os valores parcelares dos trabalhos], ou, em alternativa, a posse de Alvarás de Empreiteiro Geral de "Edifícios com Estrutura Metálica", da 1.ª Categoria, em classe correspondente ao valor da obra;
O Alvará apresentado pelo adjudicatário demonstra, tão-só, que o mesmo está habilitado ao desenvolvimento de trabalhos da 2.ª Subcategoria [Estruturas Metálicas] da 1.ª Categoria [Edifícios e Património Construído], mas apenas na Classe 5 [obras até ao montante de € 2 656 000,00];  

Daí que o adjudicatário não detenha as habilitações técnicas exigidas e necessárias à execução da obra contratada;

- Para além disso, a entidade adjudicante não dá suficiente cumprimento às exigências decorrentes do art.º 43.º, n.º 5 [elementos que devem acompanhar o projecto de execução] e, também, não faz prova cabal do financiamento da obra.
Por seu turno, a entidade recorrente impugna o decidido, sustentando, no essencial, que a entidade adjudicatária detém, materialmente, as necessárias habilitações técnicas para proceder à execução da empreitada [embora não se mostrem certificadas por entidade e documento competentes], o interesse público deverá prevalecer sobre questões de natureza formal [onde se inclui a comprovação documental das habilitações] e, por fim, afirma ter assegurado a reprogramação financeira, por forma a garantir o melhor financiamento da obra, e ter implementado a necessária regularização documental, em cumprimento da exigência contida no art.º 43.º, n.º 5, do Código dos Contratos Públicos.
Assim, e consequentemente, a recorrente peticiona a concessão do Visto ao presente contrato de empreitada.

Sumariada a questão sob controvérsia, urge analisar as questões daí emergentes e que, com relevância para a análise em curso, são as seguintes:

- Relevância da Prova Produzida em Fase posterior à Prolação da Decisão recorrida. 
- Modificabilidade/Alteração da Decisão de Facto em sede de recurso.
- Enquadramento legal.
- O caso em apreço.
- [In]suficiência das habilitações técnicas apresentadas pela entidade adjudicatária face às exigências decorrentes do Programa do Concurso e, bem assim, da complexidade e valor da obra em apreço e legais consequências.
- [In]tempestividade da junção de Prova de Habilitação Técnica exigida no Programa do Concurso e ponderação da respectiva relevância
- Do financiamento da obra e elementos a que alude o art.º 43.º, n.º 5, do C.C.P. .
- Das Ilegalidades.
- O Visto. 

A. Da modificabilidade/Alteração
Da Matéria de Facto fixada na Decisão Recorrida.
Enquadramento Legal e Doutrinário.
O caso em apreço.

1.
Sob a epígrafe "Tramitação", o art.º 99.º, n.º 5, da Lei n.º 98/97, de 26.08, dispõe que, em qualquer altura do processo [mas na pendência do recurso], o Relator poderá ordenar as diligências indispensáveis à decisão do recurso.
Por outro lado, o art.º 100.º, n.º 2, daquela Lei, sob a epígrafe "Julgamento", estabelece que «nos processos de fiscalização prévia o Tribunal pode conhecer de questões relevantes para a concessão ou recusa do Visto, mesmo que não abordadas na decisão recorrida ou na alegação do recorrente, se suscitadas pelo Ministério Público no respectivo Parecer, cumprindo-se o disposto no art.º 99.º, n.º 3».
E, por último, o art.º 99.º, n.º 3, ainda da Lei n.º 98/97, obriga à notificação do recorrente para emitir pronúncia sempre que o Ministério Público suscite novas questões em sede de Parecer.
Pela sua vacuidade e insuficiente precisão, o regime legal invocado conduz, necessariamente, ao surgimento de dificuldades aquando da delimitação da natureza e extensão dos poderes do Tribunal para, em sede de recurso e inerente julgamento, considerar factos novos e supervenientes à decisão recorrida.
E, no encalço da solução para tais escolhos, impõe-se, ainda, o apelo à jurisprudência e doutrina elaboradas no domínio da aplicação do Código de Processo Civil e sobre situações idênticas ou próximas da presente.

1.1.
Vista a disciplina contida nos citados art.os 99.º, n.º 5 e 100.º, n.º 2 da L.O.P.T.C., logo se intui que os poderes decorrentes de tais normas exibem maior vastidão e flexibilidade do que os contidos nas regras correspondentes [vd. art.os 712.º e 771.º] constantes do Código de Processo Civil.
Na verdade, enquanto no domínio do Código de Processo Civil [vd. art.os 712.º e segs.] a alteração pela Relação da matéria de facto fixada em 1.ª instância deve pressupor que do processo constem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre a matéria de facto em causa, que os elementos fornecidos pelo processo imponham solução diversa e que o recorrente junte documento novo superveniente e suficiente para "abalar" a prova em que radica a decisão sob recurso, a normação correspondente e inserta na Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas permite a consideração em sede de apreciação do recurso de matéria não abordada pelo Tribunal no aresto recorrido, bastando, para tanto, que esta revele alguma conexão [de facto e de direito] com a questão objecto de impugnação.
Apesar da flexibilidade demonstrada, importa reter que a Lei n.º 98/97, de 26.08, no seu art.º 100.º, n.º 2, condiciona a apreciação [em sede de recurso] de matéria não conhecida no domínio da decisão recorrida à indispensabilidade e relevância desta para a concessão ou recusa do Visto. E, no reforço e melhor explicitação desta orientação legal, convirá esclarecer que a consideração de elementos de prova não disponíveis ao tempo da prolação da decisão recorrida se revela vedada sempre que daí decorra a violação de Lei ou de Princípios que a estruturem.

2.
Conforme assinalámos em II., deste acórdão, a entidade adjudicatária, quando, em 12.11.2010 foi instada a apresentar os documentos que comprovassem a sua habilitação técnica, ainda de acordo com as exigências contidas no Procedimento, juntou o Alvará n.º 57137, o qual, para a 1.ª Categoria, incluía as autorizações, a saber:

Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Edifícios de Construção Tradicional, Classe 6;
Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Reabilitação e Conservação de Edifícios, Classe 6;
- 1.ª Subcategoria, Classe 5;
- 2.ª Subcategoria, Classe 5;
- 3.ª Subcategoria, Classe 4;
- 4.ª Subcategoria, Classe 5;
- 5.ª Subcategoria, Classe 5;
- 6.ª Subcategoria, Classe 4;
- 7.ª Subcategoria, Classe 4;
- 8.ª Subcategoria, Classe 4;
- 9.ª Subcategoria, Classe 3;
e
- 10.ª Subcategoria, Classe 2;

Considerando as habilitações técnicas exigidas no Programa do Concurso, é óbvia a não detenção pela adjudicatária de alvará exigido para a Classe [6] correspondente ao valor total da obra - € 3 787 517,02 [2.ª Subcategoria da 1.ª Categoria (Edifícios e Património Construído), ou, em alternativa, alvará relativo a Empreiteiro Geral de Edifícios com Estrutura Metálica, 1.ª Categoria]. Dito de outro modo, o alvará apresentado pela entidade adjudicatária em momento sequente à adjudicação e emitido pelo Instituto da Construção e do Imobiliário evidencia que a mesma está habilitada à execução de trabalhos da 2.ª Subcategoria [Estruturas Metálicas] da 1.ª Categoria [Edifícios e Património Construído], mas apenas na Classe 5. Ou seja, a habilitação então junta permitia-lhe, apenas, a execução de trabalhos até ao montante de € 2 656 000,00 [vd., também, o Decreto-Lei n.º 12/2004, de 09.01 e Portarias n.os 21/2010, de 11.01 e 57/2011, de 28.01, que fixam o número da classe em função do valor das obras].
E, conforme se infere do aresto sob recurso, a ausência da habilitação técnica exigida constituíu, afinal, a razão determinante da recusa de Visto.

2.1.
A recorrente, para além de outros documentos [vd. II.B.1., deste acórdão] que acompanharam as alegações por si deduzidas, juntou cópia de Alvará [n.º 57137], com validade até 31.01.2011, o qual persiste em habilitar a adjudicatária a executar trabalhos da 2.ª Subcategoria [Estruturas Metálicas] da 1.ª Categoria, mas apenas na classe 5 [trabalhos de valor máximo correspondente a € 2 656 000,00]. Ou seja, e nesta parte, este documento não modifica ou altera a matéria de facto tida por assente no âmbito da decisão sob recurso e que determinou o sentido desta.
Porém, e sublinhe-se, a recorrente, em 14.04.2011 [já posteriormente, à junção das alegações de recurso] promoveu a incorporação nos autos de extracto de documento que confere à entidade adjudicatária a titularidade de habilitação [Alvará de Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Edifícios com Estrutura Metálica e em Classe 6] que lhe permite, na condição de Empreiteiro Geral de Edifícios com Estrutura Metálica, a execução de trabalhos da 1.ª Categoria e em Classe [6] correspondente ao valor global da obra.
Removendo dúvidas, o Tribunal de Contas, em 30.05.2011, solicitou ao Instituto Nacional da Construção e do Imobiliário informação sobre a actual habilitação técnica da adjudicatária, tendo aquele organismo informado [vd. fls.69, do processo] que a empresa "Transfor II, Engenharia e Construção, S.A.", é, desde 25.05.2011 [data da actualização ou reclassificação de Alvará n.º 57137] portadora de Alvará que lhe permite a realização de obras enquadráveis na Categoria de Edifícios e Património Construído, designadamente "Empreiteiro/Construtor Geral de Edifícios de Construção Metálica" em Classe 6 [€ 5 312 000,00].
Deste modo, contrariando o Alvará antes apresentado, a entidade adjudicatária dispõe, agora de habilitação técnica que satisfaz a exigência formulada no domínio do Programa do Procedimento, conferindo ao respectivo titular aptidão para proceder à execução dos trabalhos objecto do concurso.
Assim, e pese embora o sustentado pela recorrente ao longo da fase instrutória do processo e, ainda, no domínio das alegações de recurso, a recorrente - Universidade de Aveiro - estava ciente de que as habilitações técnicas detidas pela entidade adjudicatária à data de tais intervenções processuais não satisfaziam a exigência contida no Programa do Procedimento. E, daí, certamente, ter insistido na obtenção da habilitação técnica, agora junta aos autos.
Importa, no entanto, indagar da relevância da junção de tal documento, nomeadamente, na perspectiva da sua aptidão para legitimar a concessão do Visto [vd. sustentação legal inscrita em III. A.].

2.2.
Conforme assinalámos em III.A.1.1., a Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, no seu art.º 100.º, permite a apreciação em sede de recurso de matéria não abordada em 1.ª instância, desde que o conhecimento da mesma se revele indispensável e relevante para a concessão ou recusa do Visto.
Atento o objecto de recurso, admite-se, pois, a apreciação do documento [Alvará] ora junto e comprovativo da habilitação técnica presentemente titulada pela entidade adjudicatária, embora a aferição da respectiva aptidão para alterar o sentido da decisão contida no aresto recorrido constitua tarefa a desenvolver, de seguida.
Exercício a que procederemos. 

B. Da[In]suficiência das habilitações técnicas detidas pela
Entidade Adjudicatária para a Execução da Obra.

1.
Nos termos do art.º 81.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos, no âmbito da formação de quaisquer contratos de empreitada de obras públicas, o adjudicatário deve apresentar os alvarás ou títulos de registo emitidos pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, I.P., contendo as habilitações adequadas e necessárias à execução da obra a realizar.
Por outro lado, o art.º 132.º, n.º 1, al. f), preconiza que o programa do concurso deve indicar os documentos de habilitação, directamente relacionados com o objecto do contrato a celebrar e a apresentar nos termos indicados no citado art.º 81.º, do Código dos Contratos Públicos.
Como resulta da factualidade dada como provada [vd. II e III, deste acórdão], a entidade adjudicante, em sede de Programa do Concurso, para além de elencar, sem reparo, as habilitações técnicas exigidas ao eventual adjudicatário para a execução dos trabalhos concursados [cumprindo, assim, o disposto no art.º 31.º, n.os 1 a 4, do Decreto-Lei n.º 12/2004, de 09.01], estabelece [vd. art.º 30.º, n.º 2, do Programa do Concurso], ainda, que o adjudicatário apresente os documentos de habilitação exigidos no prazo de 10 dias, contados a partir da notificação da decisão de adjudicação.
Ora, como bem se documenta nos autos, e se afirma no presente acórdão [vd. II. 9., deste acórdão], a adjudicação da obra em causa à empresa "Transfor II - Engenharia e Construção, S.A.", ocorreu em 12.11.2010, tendo esta apresentado o documento comprovativo das suas habilitações técnicas em 22.11.2010. E estas, como já acentuámos e demonstrámos, não satisfaziam as exigências contidas no Programa do Procedimento, não conferindo, assim, ao correspondente titular a necessária aptidão para levar a cabo os trabalhos objecto do Procedimento.

Questiona-se:

A obtenção [em 25.05.2011] de Alvará comprovativo de habilitação técnica para executar a obra, ocorrida em tempo que não permite o cumprimento do prazo previsto no Programa do Procedimento para junção dos documentos comprovativos da habilitação técnica, legitima, apesar disso, a concessão do Visto ao contrato de empreitada em questão?

Afigura-se-nos que não.

Na verdade, muito embora se imponha o acatamento da disciplina contida no art.º 100.º, da L.O.P.T.C., e, em consequência, se deva apreciar o teor da habilitação técnica obtida, apenas, em 25.05.2011, esta não poderá conduzir, sem mais, a concessão do Visto.
Este juízo assenta, de resto, em diversa argumentação e razões.

2.
Desde logo, e em primeiro lugar, porque o art.º 86.º, do C.C.P., dispõe que a falta de apresentação do documento comprovativo da habilitação técnica exigível à execução da obra no prazo fixado no programa do procedimento determina a caducidade da adjudicação e o inerente dever de adjudicar a proposta ordenada em lugar subsequente.
Ora, «in casu», e como resta amplamente demonstrado, o alvará entregue [em 22.11.2010] no prazo fixado, não só não titulava as habilitações necessárias e exigidas para a execução dos trabalhos a realizar, como, e acrescente-se, só a entidade adjudicatária é responsável pela verificação de tal facto.
Depara-se-nos, assim e ainda, a apresentação de um documento de habilitação, que, pela sua insuficiência e inidoneidade [o que induz a falta de apresentação de documento comprovativo de habilitação técnica exigida no Programa do Procedimento], só poderia conduzir à caducidade da adjudicação realizada e, em consequência, obrigava, de um lado, a entidade adjudicante a não celebrar contrato com a Sociedade "Transfor II - Engenharia e Construção, S.A.", e, do outro, a adjudicar a obra à proposta ordenada em lugar subsequente [vd. art.º 86.º, n.º 3, do C.C.P.].
A entidade adjudicante, ao não proceder de acordo com o determinado na citada norma [art.º 86.º, do C.C.P.], adjudicando a obra à adjudicatária em apreço e celebrando contrato com a mesma, agiu, manifestamente, ao arrepio da lei aplicável.
Decorrentemente, verifica-se a caducidade da adjudicação [vd. art.º 86.º, n.º 1, do C.C.P.] realizada e em que a empresa "Transfor II - Engenharia e Construção, S.A.", figura como adjudicatária, e, por consequência, ocorre, também, a nulidade do contrato, atenta a inexistência de adjudicação válida em que este último [contrato] pretendeu fundar-se [vd., a propósito, o disposto no art.º 96.º, n.º 1, al. b), do C.C.P., e a exigência de indicação expressa de acto de adjudicação na textura do contrato a celebrar].
E secundando idêntico juízo já vertido no acórdão recorrido, a nulidade do contrato sempre assentaria nas normas contidas nos art.os 284.º, n.º 2, do C.C.P., e 133.º, n.º 1, do Código de procedimento Administrativo, pois, sendo a adjudicação [válida!] um elemento determinante para a celebração do contrato, a sua ausência força, necessariamente, a nulidade deste último.

3.
O exposto já sugere a inaptidão do Alvará concedido em 25.05.2011 [e comprovativo da detenção da habilitação técnica exigida no âmbito do Procedimento] para alterar a decisão recorrida.
Na verdade, constituindo a apresentação tempestiva [prazo prescrito no procedimento] da habilitação técnica bastante para a execução do trabalhos um instrumento de consolidação e de definitividade do acto adjudicatório [vd. art.º 86.º, do C.C.P.], mal se compreenderia que do incumprimento de tal obrigação e dever legal não resultassem quaisquer consequências e, nomeadamente, que este não determinasse a caducidade da adjudicação e a subsequente não celebração do contrato.
A recorrente entenderá que, emprestando relevância ao Alvará entrado neste Tribunal em 14.04.2011 e apenas emitido pelo Instituto Nacional da Construção e do Imobiliário em 25.05.2011, não só afrontaríamos directamente a lei aplicável, como, implicitamente, daríamos acolhimento à preterição dos demais concorrentes e potenciais adjudicatários que, ao tempo da prática do acto adjudicatório, já fossem detentores da exigida habilitação técnica para levar por diante a obra concursada [vd. art.º 86.º, n.os 1 e 3 do C.C.P.].
O Alvará n.º 57137, na versão conferida pelo INCI em 25.05.2011, só desencadearia a alteração da decisão de facto fixada em 1.ª instância [detenção ou não de habilitação técnica para a execução da obra concursal] e, por consequência, uma nova solução de direito [porventura, conveniente à concessão do Visto] caso comprovasse que aquela entidade adjudicatária já era detentora de tal habilitação técnica em tempo anterior ao limite do prazo estipulado pela Universidade de Aveiro para juntar os necessários documentos de habilitação.
E, como sobejamente demonstrámos, o referido Alvará, objecto de alteração, não atesta tal circunstância.
Ademais, o Alvará n.º 57137, reclassifica em 25.05.2011 [vd. II. C.] constitui um documento novo que, naturalmente, operará a partir da data da sua emissão, não detendo alguma eficácia retroactiva no domínio do presente procedimento. Ou seja, e mais concretamente, a habilitação técnica aí certificada não estenderá os respectivos efeitos ao tempo da celebração do contrato «sub judice».
Enquanto nota final, assinalaremos que a eventual consideração positiva da habilitação técnica contida no Alvará n.º 57137, agora reclassificado, inconsideraria, em absoluto, as mais elementares regras e princípios que envolvem a tramitação procedimental e, mais vastamente, a contratação pública, subverteria os valores da segurança e certeza que informam o direito e, por último, libertaria a entidade adjudicante [Universidade de Aveiro] da observância de regras a que esta se vinculou em sede de Programa de Procedimento, que, como é sabido, assume natureza regulamentar.  

C. Da Detenção "Material"
da
Habilitação Técnica exigida

1.
Ao longo das alegações de recurso, a recorrente, em coerência com a orientação perfilhada na fase instrutória do processo, advoga que a adjudicatária, aquando da celebração do contrato, já detinha, "efectiva e materialmente", as habilitações inerentes a "Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Edifícios com estrutura Metálica", no mínimo, em Classe 6, logo, em Classe que cobre o valor global da proposta apresentada. E, explicitando, esclarece que a empresa adjudicatária, embora não seja "formalmente" detentora do Alvará exigido no procedimento, reúne condições técnicas que fundam, sem equívoco, a atribuição do mesmo.
Assim, e implícitamente, a recorrente basta-se com a verificação da materialidade capaz de justificar a atribuição da habilitação técnica exigida, qualificando de "mera formalidade" o respectivo reconhecimento e/ou certificação pela entidade competente [Instituto da Construção e do Imobiliário].
Entendimento a que, obviamente, não aderimos.

2.
Perante a argumentação deduzida pela recorrente, até se admite que a entidade adjudicatária, à altura da celebração do contrato, já reunisse condições materiais que fundassem a atribuição de habilitação técnica exigida no programa do Procedimento. E, em abono do afirmado, lembramos que esta última, ciente da sua capacidade técnica, dirigiu, em 25.02.2011 [vd. doc. n.º 4, junto às alegações de recurso], ao Instituto da Construção e do Imobiliário o necessário pedido de reclassificação do Alvará, que, finalmente e após instrução, foi objecto de deferimento em 23.03.2011 embora com eficácia a partir de 25.05.2011.
Porém, a legislação disponível e aplicável no caso concreto [vd. art.º 31.º, n.os 3 e 4, do decreto-Lei n.º 12/2004, de 09.01] com inquestionável clareza, manda, por um lado, que nos procedimentos de formação dos contratos de empreitada de obras públicas os donos de obras públicas assegurem que os trabalhos sejam executados por detentores de alvará ou título de registo contendo as habilitações correspondentes à natureza e valor dos trabalhos a realizar e, por outro, que a comprovação de tais habilitações se faça mediante a exibição do original do alvará ou do título de registo e sem prejuízo de outras exigências legalmente previstas.
E, acrescente-se, tais alvarás são, necessariamente, emitidos pelo referido Instituto da Construção e do Imobiliário.
Neste contexto, legal e fáctico, é indubitável que só a detenção efectiva [e não a mera espectativa] de habilitação técnica exigida procedimentalmente e certificada pela entidade competente [INCI] é legalmente válido para efeito de execução da obra objecto do concurso.
Mas tal exigência de certificação radica, também, no facto de a concessão e manutenção dos Alvarás obrigar a que, cumulativamente, a empresa destinatária revele, não só capacidade técnica, mas, ainda, idoneidade e capacidade económica e financeira [vd. art.º 7.º, do Decreto-Lei n.º 12/2004, de 09.01]. E a prova de tais requisitos, pela sua óbvia complexidade, exige avaliação rigorosa.
Nesta parte, a recorrente [Universidade de Aveiro], atenta a sua condição de Estabelecimento de Ensino Superior, compreenderá bem a indispensabilidade da certificação da aptidão técnica por entidades competentes e legalmente habilitadas para o efeito, por oposição à admissão meramente fáctica da mesma [aptidão técnica].
E, acolhendo a bondade de tal certificação, estamos seguros de que a erguerá à condição de instrumento essencial da comprovação do conhecimento, não a relegando, assim, para o universo das formalidades inúteis e, porventura, inócuas [vd. o sustentado no domínio das alegações].

D.
Em anexo às alegações de recurso, a entidade recorrente juntou documentação que, de um lado, satisfaz as exigências decorrentes do art.º 43.º, n.º 5, do C.C.P. [elementos de solução da obra], e, do outro, faz prova de adequado financiamento da obra, por via da comparticipação comunitária.
Entendemos que, nesta parte, a entidade recorrente supriu as insuficiências procedimentais assinaladas no acórdão recorrido, afastando, relevantemente, a eventual recusa do Visto com base em tais circunstâncias.
E não se diga que a consideração e atribuição de efeitos [de natureza positiva] a esta prova documental não se revela coerente com o sustentado em relação à comprovação da habilitação técnica mediante alvará [reclassificado] junto ao processo em 14.04.2011, porquanto, e a propósito, convirá lembrar que a relevância emprestada a tais documentos, para além de completar o Procedimento, não ofende as expectativas e direitos dos concorrentes, não viola a lei aplicável à contratação pública ou algum princípio estruturante desta e, por último, abriga-se à norma contida no art.º 99.º, n.º 5, da L.O.P.T.C. .  

E. Das Ilegalidades.
Do Visto.
1. Da Ilegalidade.

Conforme deixámos dito em III.A.2. a 2.2.2., deste acórdão, cujo conteúdo se dá aqui por inteiramente reproduzido, a entidade adjudicatária, no prazo estabelecido no Programa do Concurso, não apresentou documento comprovativo da habilitação técnica exigida no Programa do Concurso, mas sim um outro que, entre o mais, não lhe reconhecia capacidade bastante para a execução da obra.
Logo, e consequentemente, verificou-se a caducidade da adjudicação realizada.
A celebração do concurso neste contexto [sem acto de adjudicação válido] induz, como já expendemos acima, a nulidade deste [vd. art.os 96.º e 284.º, do C.C.P. e 133.º do C.P.A. .

2. Do Visto.

Segundo o art.º 44.º, n.º 3, al. a) da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, a nulidade constitui fundamento de recusa do Visto.
Por outro lado, e ainda nos termos do citado art.º 44.º, n.º 3, al. c), a ilegalidade que "altere ou possa alterar o resultado financeiro do Contrato" funda, também, a não concessão do Visto.
Ora, assente a nulidade do contrato celebrado e certos de que o incumprimento da obrigação legal de adjudicar a obra à proposta ordenada em lugar subsequente é, ainda, susceptível de alterar o resultado financeiro do mesmo, persiste a imposição de recusa do Visto e a consequente manutenção do acórdão recorrido.
E tal juízo não colide com a invocada defesa do interesse público, que, como bem se intui, não se sobrepõe ao cumprimento da lei estabelecida e observância dos princípios que enformam a contratação pública, sob pena de perigarem os esteios que suportam o estado de direito.  

IV. DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes da 1.ª Secção, em Plenário, negar provimento ao recurso, mantendo o acórdão recorrido.
Emolumentos legais.
Registe e notifique.
Lisboa, 15 de Junho de 2011.   

Os Juízes Conselheiros,

(Alberto Fernandes Brás - Relator)
(Carlos Alberto Morais Antunes)
(Helena Maria Ferreira Lopes)   

Fui presente,

(Procurador-Geral Adjunto)
(António Cluny)