Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 7 de Dezembro de 2011 (proc. 8163/11)

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Sumário:

1. Do regime da adjudicação por lotes em que "o bem objecto do procedimento é adjudicado na totalidade mas dividido em várias parcelas autónomas (e previamente autonomizadas nas peças do procedimento)", resulta o fraccionamento do procedimento, como que escalonado em partes em razão do objecto, rectius, em razão de cada lote, dando origem a tantas adjudicações e contratos quantos os lotes a que o procedimento respeita - cfr. artºs 73º nº 2 e 132º nº 3 CCP .
2. O conceito de rectificação em sede de contratação pública é aplicado fora do contexto das declarações negociais vazadas nas propostas apresentadas, na medida em que se limita às rectificações das peças do procedimento, e as suas implicações na prorrogação do prazo fixado para a apresentação das propostas, cfr. artºs. 50º nº 3, 61º nº 5 e 64º nº 2 CCP.

 

Texto Integral:

Agência Nacional de Compras EPE, com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dela vem recorrer, concluindo como segue:

1. No presente Concurso, não é admitida a apresentação de propostas variantes.
2. No "formulário proposta", os candidatos qualificados devem apresentar preços unitários para a aquisição de equipamentos, produtos e contratação de serviços, bem como os elementos da proposta exigidos nas tabelas constantes do Anexo VI do PC.
3. Esse anexo contêm outros campos que representam os termos ou condições, relativos a aspectos da execução do contrato a celebrar, não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos e aos quais a aqui Recorrente pretende que os candidatos qualificados se vinculem.
4. Ao contrário do que estava obrigada, a proposta apresentada pela Recorrida ao Lote 4 do Concurso não primou pela certeza, pois onde se exigia, como especificação mínima, "sim" (cfr. o "formulário proposta", Anexo L4 D, proposta tipo 7D), a Recorrida indicou "600x600", o que torna a sua proposta incongruente e verdadeiramente ininteligível.
5. Em todos as situações de incumprimento semelhantes às detectadas nas propostas da Recorrida, o Júri decidiu sempre no sentido de propor a exclusão das propostas - cfr. ponto 20 da matéria de facto dada como provada.
6. No caso vertente, não podia o Júri do Concurso ter solicitado quaisquer esclarecimentos à Recorrida sobre este ponto concreto da sua proposta, porquanto qualquer resposta que viesse a ser apresentada por aquela consubstanciaria, indubitavelmente, uma forma ilegal de "alterar" um elemento essencial a proposta (cfr. art. 72°, n° 2, do CCP), o que colide também com o princípio da intangibilidade das propostas.
7. O que acabou por se comprovar com a "lista de incorrecções" apresentada posteriormente pela Recorrida, a qual constituía uma verdadeira "lista de alterações" à proposta inicial.
8. Segundo o aludido princípio, as propostas devem ser apreciadas tal como são, não podendo a decisão de adjudicação recair sobre outra realidade que não seja a constituída pelas propostas dos concorrentes, tal como foram formuladas e apresentadas até ao termo do concurso, ou seja, o prazo para apresentação das propostas definidos nas peças concursais.
9. Citando Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira (in Concursos e Outros Procedimentos de Adjudicação Administrativa, 1998), as propostas "valem pelo seu conteúdo (e informação) inicial, pelo que nelas se contém, por mais nada." (cfr. neste sentido, o recente Acórdão do TCA Sul de 17.03.2011, proferido no Proc. n.° 07196/11, in www.dqsi.pt ).
10. Sendo assim, conclui-se que a exclusão da proposta da Recorrida relativamente ao Lote 4 foi perfeitamente válida, visto essa proposta não cumprir um dos requisitos exigidos nas peças do procedimento, e que não fora submetido à concorrência.
11. Por outro lado, a indicação "600x600" no campo da proposta em causa não pode configurar-se como um erro que possa ser rectificado nos termos do art. 249.° do Código Civil.
12. Em face do exposto, a Recorrente só podia tomar uma posição no caso vertente: aprovar o relatório final de avaliação das propostas elaborado pelo Júri, mantendo, nos seus exactos termos, a exclusão da proposta da Recorrida ao Lote 4 do Concurso (o mesmo se passando com as propostas apresentadas nos Lotes 5 e 8).
13. Com o devido respeito, que é muito, o Tribunal a quo concluiu precipitadamente que a denominada "omissão/falta de resposta" da Recorrida, na proposta apresentada ao Lote 4, podia "ser integrada por referência, quer ao conteúdo da proposta apresentada relativamente ao lote 5, onde foi indicado o mesmo equipamento, quer por iniciativa oficiosa do júri, uma vez que se trata de característica básica do equipamento da marca e modelo propostos "A... FS-6970DN", porquanto, afigura-se à Recorrente, a proposta apresentada num determinado lote de um procedimento pré-contratual não pode ser interpretada e integrada pela proposta - ainda que do mesmo concorrente - apresentada noutro lote desse procedimento concursal.
14. Com efeito, em face do disposto no art. 73.°, n.° 2, e 132.°, n.° 3, do CCP, sempre que o programa do procedimento admita adjudicações por lotes, as propostas apresentadas pelos Concorrentes são totalmente autónomas face aos restantes lotes do procedimento, constituindo, cada uma delas, declarações independentes que devem ser apreciadas tal como são (as propostas "valem pelo seu conteúdo (e informação) inicial, pelo que nelas se contém, por mais nada".
15. Na verdade, a cada um dos lotes do presente Concurso corresponde um contrato autónomo, e, por conseguinte, para cada contrato foi adjudicada uma proposta dos Concorrentes, que mereceu a avaliação do Júri em função das "condições específicas definidas para cada um dos lotes designadamente, o equipamento que constitui o seu objecto e respectivas especificações técnicas", como se salienta, e bem na sentença recorrida.
16. Ora, esta avaliação individualizada da proposta no contexto específico de um determinado lote não pode, legalmente, atender às especificações técnicas indicadas para os outros lotes, nem às características técnicas dos equipamentos propostos pelos Concorrentes, nos restantes lotes do Concurso.
17. Uma actuação do Júri nesse sentido não só violaria as regras do procedimento, como, no limite, colocaria o Júri do Concurso perante a obrigação de "refazer" as propostas dos Concorrentes sempre que estas sejam "omissas".
18. Por estranho que pareça à Recorrente, é esse o sentido e o alcance da decisão recorrida, que, assim, transfere para o Júri do Concurso o ónus de completar, "oficiosamente", a declaração negociai da Recorrida para o Lote 4 do Concurso, tendo por base a proposta apresentada no lote 5 em que foi apresentado o mesmo equipamento.
19. Ora, com o devido respeito, tal ónus extravasa o âmbito de actuação do Júri do Concurso, que deve avaliar as propostas tal como elas são apresentadas, em função das regras específicas de cada lote, e respeitando sempre todos os concorrentes por igual.
20. Assim, quando existam adjudicações por lotes, é possível configurar um "procedimento independente" que decorre, porém, sob a égide de um só procedimento pré-contratual/concurso: um lote - uma proposta - uma avaliação/adjudicação - um contrato (ver, no mesmo sentido, Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, in "Concursos e outros procedimentos de Contratação Pública", Almedina, 2011, págs. 1023 e 1024).
21. Com efeito, a aludida "independência estende-se à própria adjudicação e celebração dos contratos respeitantes a cada lote", significando isso que a mesma já vem de trás, ou seja, de momentos anteriores do Concurso, como sejam: a definição dos lotes nas peças do procedimento; a apresentação das propostas em função de cada lote (a um só a todos eles); e a sua avaliação autónoma pelo Júri do procedimento tendo por referência as regras específicas (técnicas ou de outra natureza) de cada um dos lotes.
22. É essa autonomia que se alastra até à própria adjudicação e celebração dos contratos relativamente a cada um dos lotes do Concurso.
23. Assim, forçoso é concluir que não podia haver lugar à interpretação ou integração da proposta da Recorrida no Lote 4 do Concurso, que não fosse suportada, única e exclusivamente, pelos documentos apresentados e declarações prestadas pelo Recorrida naquele lote.
24. Estamos, pois, perante um flagrante erro de julgamento, porquanto se afigura legalmente inadmissível o Júri do Concurso "interpretar e integrar" a proposta apresentada pela Recorrida no Lote 4 com base na proposta da Recorrida para o Lote 5 do mesmo Concurso.
25. Nesta conformidade, a sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação do disposto nos arts. 73.°, n.° 2 e 132.°, n.° 3, ambos do CCP.
26. Por outro lado, causa alguma perplexidade na Recorrente que o Tribunal a quo tenha concluído que, em função do equipamento apresentado nos Lotes 4 e 5 ser idêntico - "A... FS-6970DN" - tal "interpretação e integração" só não seria possível "(...) se a impressora da marca e modelo propostos pela A. só pudesse cumprir tal especificação se carecesse de algum equipamento complementar ou alguma adaptação, o que se não verifica."
27. Afirmando ainda "não [ser] possível a existência de impressoras da marca e modelo indicados que não cumpra a função em causa." - sabendo, de antemão, não ter meio de poder dar como provada esta afirmação.
28. Ou seja, entrando no campo da apreciação técnica das propostas - matéria reservada exclusivamente à Administração - o Tribunal a quo dá como certo aquilo que não pode ser demonstrado ou provado, mas fazendo-o em benefício da Recorrida.
29. No entender da Recorrente, saber se existem "impressoras da marca e modelo indicados que não cumpra a função em causa" não se trata de factos que não carecem de alegação ou de prova, porquanto não são factos notórios, nem o Tribunal tem conhecimento dos mesmos por virtude do exercício das suas funções. Era necessário, pois, que fosse junto ao processo documento que comprovasse tal afirmação.
30. O Tribunal a quo retirou essa convicção da simples análise de um catálogo, olvidando que, por regra, esses catálogos contêm a advertência de que os produtos podem ter sido objecto de alterações recentes e, por isso, podem não corresponder às características técnicas ali indicadas. Isto é, os próprios catálogos não vinculam os fabricantes quanto às afirmações nele produzidas.
31. Sendo este um elemento determinante na convicção do Tribunal a quo, e sendo legítimas
às dúvidas sobre matéria de natureza extremamente técnica, as regras do ónus da prova
impunham que a dúvida quanto a esse facto se resolve-se contra a Recorrida e não contra a
Recorrente (cfr. art. 516° do CPC ex vi art. 1° do CPTA).
32. Assim, não se podendo dar aquela afirmação como provada - até porque o teor de um catálogo não se pode sobrepor a uma declaração negociai formulada por um concorrente num procedimento pré-contratual - o Tribunal a quo não deveria ter concluído pela integração da proposta da Recorrida no Lote 4 com o equipamento apresentado no Lote 5.
33. Sendo que, ao contrário do que se afirma na sentença recorrida, a análise do Júri não traduz nenhum "rigor formal que impede a uma apreciação comparativa das propostas objectiva, ou seja, tendo em conta os reais equipamentos indicados nas propostas." Em primeiro lugar, e conforme se demonstrou, o Júri actuou de acordo com a lei, porquanto analisou autonomamente as propostas apresentadas a cada um dos lotes.
34. Em segundo lugar, e num plano mais técnico, o Júri entendeu que, pese embora os erros e omissões nas declarações terem ocorrido em número maior do que o desejável, não foram concedidas ou admitidas quaisquer rectificações das declarações constantes do formulário da proposta técnica e de preços, com excepção da situação do concorrente C..., sem que isso tenha constituído um tratamento mais favorável daquele concorrente em relação à Recorrida.
35. De facto, as situações são bastantes distintas como demonstram as deliberações do Júri do Concurso e foi amplamente comprovado pela ora Recorrente nos presentes autos. Ao contrário da resposta encontrada na proposta da Recorrida, a proposta da concorrente C... ao Lote 5 do Concurso continha elementos que, por si só, permitiram ao Júri do Concurso "integrar e interpretar" a declaração negociai daquela concorrente, ou seja, sem recurso a qualquer elemento exógeno à proposta ao referido lote.
36. Nesse caso concreto, em que não foi indicada a vida útil (n.° de agrafos) do consumível recarga de agrafos, mas em que existia também na proposta ao Lote 5 o mesmo consumível, para o mesmo equipamento, com a mesma designação comercial, o mesmo part-number e o mesmo preço, aí sim, o Júri concedeu aos concorrentes a possibilidade de procederem à rectificação das propostas apresentadas nestas condições.
37. Nessa situação, atendeu à simplicidade técnica do produto (recarga de agrafos) e ao facto de a sua identificação, nos termos acima descritos, garantir perfeitamente a estabilidade da característica em falta (acresce que não se tratava verdadeiramente de um erro de escrita, mas de uma omissão sanável, inequivocamente, através da estrita consulta do teor da proposta, sem recorrer a documentos ou declarações não integrantes da proposta).
38. No caso do Lote 4, a proposta da Recorrida não se encontrava nas condições acima mencionadas, pois, como se disse, o concorrente declarou "600 x 600" na resposta ao campo "Possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito" que obrigava a uma resposta obrigatória "sim".
39. Nesta situação, e em todos os casos idênticos (existem propostas excluídas com o
mesmo fundamento determinante da exclusão da proposta da Recorrida no Lote 4), não foi
concedido o direito à rectificação dos "alegados erros de escrita", mesmo que demonstráveis
através das brochuras de características emitidas pelos fabricantes, como insistiu a Recorrente e assim decidiu o Tribunal a quo, fazendo neste domínio, e ao arrepio da lei, Administração activa, porquanto a avaliação das propostas é tarefa exclusiva do Júri do Concurso.
40. Prosseguindo, não foi concedido o direito à rectificação porquanto o Júri do Concurso entende que a apresentação de um catálogo, no decorrer de um procedimento pré-contratual, não tem a virtualidade de passar a integrar a declaração negocial que o concorrente, através da sua proposta, dirigiu à Administração, no caso a ora Recorrente, nem tão pouco pode constituir uma "rectificação", válida e tempestiva, da proposta apresentada pela Recorrida.
41. E cabe aos concorrentes trazer ao procedimento, pela forma nele determinada, tudo o que ali se exige, sendo inaceitável transferir para a esfera jurídica do Júri do Concurso o ónus de "reconstrução" das propostas, libertando-se, assim, os concorrentes de formularem verdadeiras declarações negociais, nos termos material e formalmente, exigidos nas pelas do procedimento.
42. Por outro lado, o presente Concurso obriga os concorrentes a vincularem-se ao cumprimento de em conjunto de requisitos mínimos, que deverá ser ostentado pelo equipamento e respectivos acessórios e opções a fornecer posteriormente, ou seja, após a celebração do acordo quadro e nas futuras aquisições efectuadas pelas entidades públicas adquirentes a ele vinculadas ou meramente aderentes. Assim, nesta fase do Concurso, não se tratava de seleccionar equipamentos, mas antes de garantir a vinculação dos concorrentes ao cumprimento de um conjunto de requisitos técnicos e níveis de serviço que terão, obrigatoriamente, de ser assegurados pelos produtos a fornecer (com a configuração e as opções adequadas) em procedimentos a realizar ao abrigo do acordo quadro.
43. Ademais, o cumprimento de todos os requisitos e especificações técnicas exigidos não é determinado pelo part-number do produtos já que, no caso em apreço - equipamentos tecnicamente complexos e de concepção modular - note-se que, o mesmo produto, com o mesmo part-number, poderá apresentar configurações distintas (i.e. existência/capacidade de bandejas, tabuleiros ou de opções e/ou acessórios diversos que garantam o cumprimento de funcionalidades adicionais), inviabilizando o pretendido pela Recorrida, que consistia na correcção do erro com uma declaração de uma proposta a outro lote relativa a outro equipamento, tendo por base o facto de ambos possuírem urri part number idêntico.
44. Em suma: embora seja possível a apresentação de catálogos ou sítios de internet que indiquem o cumprimento, por parte do equipamento na sua versão base, da característica exigida, sempre existirão dúvidas relativas às possíveis diferenças nas especificações de produtos determinadas por particularidades dos diferentes territórios em que são comercializados ou decorrentes das evoluções pontuais que os equipamentos sofrem'ao longo do tempo (mantendo, contudo, a mesma identidade e o mesmo part-number).
45. Daí que, nenhum outro documento, poderá substituir a declaração negocial do concorrente, ou seja, o teor da sua proposta inicial.
46. E era só sobre esse documento que o Tribunal a quo se deveria ter debruçado e, consequentemente, dar como provado que a proposta da Recorrida teria, obrigatoriamente, de ser excluída do Lote 4 do Concurso (assim como nos lotes 5 e 8).
47. Assim, forçoso é concluir que a proposta apresentada pela Recorrida ao Lote 4 do Concurso viola, indiscutivelmente, um aspecto da execução do contrato não submetido à concorrência, facto que determina a exclusão obrigatória da proposta nos termos da al. b) do n°2 do art° 70° do CCP.
48. Tanto mais que, no caso vertente, não era possível proceder à "rectificação" da aludida indicação da proposta, quer por iniciativa da Recorrida - que seria sempre extemporânea e, por isso, colocava em causa o princípio da intangibilidade das propostas -, quer por iniciativa, oficiosa, do Júri do Concurso, na medida em que, da proposta ao Lote 4, nenhum elemento se extraía que pudesse dar por verificada a exigência técnica em causa, como ficou demonstrado nos autos.
49. Nesta conformidade, a sentença recorrida interpretou e aplicou incorrectamente, ao caso dos autos, o disposto nos arts. 70°, n° 2, al. b), e 184°, n° 2, al. e), ambos do CCP, erro esse que importa corrigir no presente recurso jurisdicional.
50. Considerando os fundamentos elencados nas decisões do Júri do Concurso, que aplicou, de forma correcta, isenta, objectiva e neutral, as normas do Concurso e o CCP, e atendendo ainda ao confessado incumprimento das regras do procedimento por parte da Recorrida - por um motivo que lhe é exclusivamente imputável e, por isso, não poderá ser atendido, sob pena de constituir um benefício ilegítimo face aos demais Candidatos - não restam quaisquer dúvidas que o acto impugnado é um acto de conteúdo vinculado a praticar, quer pelo Júri do Concurso, quer pelo órgão competente para a decisão de adjudicação (no caso, o Conselho de Administração da Recorrente) - cfr., neste sentido, o Acórdão do TCA Sul, de 25.01.2007, Proc. N.° 2205/09, in www.dgsi.pt .
51. Na doutrina, e na jurisprudência, existe unanimidade no sentido de que a inobservância de um requisito das peças procedimentais é cominada com a exclusão das propostas ou das candidaturas, mediante uma decisão vinculada do Júri do Concurso, a que este não se pode subtrair, uma vez que deve obediência ao definido na lei e no PC.
52. Face ao exposto, demonstrou-se, à saciedade, que o acto impugnado não padece do vício que determinou a sua anulação pelo Tribunal a quo, pelo que a proposta da Recorrida não pode ser "avaliada e ordenada na lista de classificação final por se não verificar qualquer dos fundamentos de exclusão previstos na al. b) do n.° 2 do art° 70° do CCP."


A Recorrida A... ..., Lda. concluindo como segue.
a. A Recorrente omitiu o dever de formular conclusões nos termos do disposto no artigo 685-A do CPC.
b. Ao verter o conteúdo das suas alegações nas conclusões (7 páginas com mais de 52 conclusões), frustrou o propósito legal da sua exigência, não permitindo à Recorrida e ao Tribunal uma apreensão sintética dos fundamentos do recurso, nem delimitando, de forma precisa, a matéria que entendeu submeter à apreciação do Tribunal superior.
c. Do exposto resulta que as alegações apresentadas não contêm verdadeiras conclusões, visto que não integram qualquer enunciado sintético e resumido dos fundamentos do recurso, limitando-se a Recorrente a «vazar os pormenores argumentativos próprios da alegação», circunstância a que este douto Tribunal não deverá deixar de atribuir as devidas e legais consequências. Por outro lado,
d. Entende a Recorrida que atendendo à natureza e origem cautelar deste processo, no âmbito do
qual (e ao abrigo do art° 121º do CPTA) foi antecipado o juízo de mérito sobre a causa principal, deve fixar-se ao recurso efeito meramente devolutivo, nos termos do disposto no art° 143º n° 2, sob pena de se verem frustrados os efeitos pretendidos pela antecipação de tal decisão. Quanto à prova,
e. O ponto 17 da fundamentação da matéria de facto refere o seguinte: "O equipamento proposto, a A... FS-6970DN" preenche o requisito/especificação "possibilidade de impressão automática frente e verso (duplex) - com a configuração por defeito" exigida pelo Programa de Concurso, cf. Doc. n°5 junto à p.i. (fls. 1190, vol. VI dos autos) "
f. Tendo a decisão de antecipação do juízo sobre a causa principal transitado em julgado, nos termos do disposto no n° 2 do art° 681 do CPC, não pode agora a Recorrente vir alegar que, para que o Tribunal pudesse decidir, outros elementos de prova deveriam ser analisados, ou suscitar dúvidas relativas a documentos e matéria probatória que lhe foi apresentada em tempo e que a mesma não impugnou.
g. A Recorrente aceitou que os elementos de prova carreados para os autos permitiam conhecer
do mérito da acção principal, renunciando, por isso, expressamente ao recurso que sobre esta
matéria lhe cabia nos termos do disposto no art° 121° do CPTA e do n° 2 do art° 681 do CPC.
h. A prova do facto acima transcrito foi feita por documento, junto com a pi e não impugnado pela ora Recorrente, não tendo a Recorrente demonstrado, em concreto, que o documento em causa (o catálogo do equipamento A... FS-6970DN) não fazia prova relativamente ao facto descrito no ponto 17.
i. A força probatória deste documento foi criticamente analisada e livremente apreciada pelo Tribunal e os meios probatórios disponíveis não impunham, sobre este ponto da matéria de facto, decisão diversa da recorrida - artigo 685.°-B, n.° 1, alínea b), do CPC.
j. A sindicância por Tribunal superior em sede de matéria de facto não visa alterar a decisão de facto com base na susceptibilidade de uma convicção diversa, fundada numa "suposição" aventada pela Recorrente, mas sim modificar o julgamento da matéria de facto, porque a prova produzida impunha, decisiva e forçosamente, outra diversa da aí tomada; é o que decorre das alíneas a), b) e c) do n.° 1 do artigo 712° do CPC
k. Portanto, o objecto do recurso da matéria de facto, nos casos de prova legalmente não vinculada, nunca pode ser a convicção (foro íntimo e insindicável) do Tribunal, mas a sua manifestação ou exteriorização na decisão proferida e a sua procedência pressupõe a existência do erro na apreciação das provas.
l. Nesta conformidade, face aos princípios da imediação e da livre apreciação da prova pela 1a
instância, a valoração da prova feita pelo Tribunal a quo não deve ser sindicada em sede de
recurso por este douto Tribunal, tanto mais que não estão em causa, nem a Recorrente
invocou ou demonstrou - como lhe competia (v. art. 342° do C. Civil) - quaisquer "erros
evidentes" ou "excepcionais erros de julgamento".
m. A decisão proferida não enferma de qualquer erro de julgamento na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa, sendo as sugestões, insinuações, suposições e dúvidas aventadas pela Recorrente (seja relativamente ao que os catálogos "em regra" referem seja quanto às variações de equipamentos com "part number idêntico"} manifestamente irrelevantes para a decisão do presente processo. Quanto à matéria das alegações,
n. A exclusão da Recorrida teve por base um lapso no preenchimento da sua proposta, na parte
referente a uma especificação do equipamento proposto no lote 4, que a torna nessa parte
"incongruente" (atente-se na expressão usada pela Recorrente), tendo porém o júri recusado a
integração de tal omissão por referência à especificação do equipamento proposto ao lote 5, já que se trata exactamente do mesmo.
o. Tal exclusão, nas palavras do Tribunal a quo, consubstancia "(...) um rigor de apreciação formal que impede uma apreciação comparativa das propostas objectiva, ou seja, tendo em conta os reais equipamentos indicados nas propostas."
p. Como bem avaliou o Tribunal a quo, o equipamento da marca e modelo propostos ao lote 4
corresponde integralmente às especificações exigidas pelo procedimento, sem necessidade de
adaptação ou equipamento complementar.
q. O equipamento proposto preenche o requisito/especificação "possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito" exigida pelo Programa de Concurso e, fá-lo, necessariamente (porque se trata do mesmo equipamento) tanto na parte da proposta que se refere ao lote 4 como à que refere ao lote 5.
r. Os "elementos ou declarações que as integrem ou sejam de contextualizar como mero erro de
escrita" já integravam o teor da proposta apresentada pela Recorrida, não havendo por isso
necessidade de acrescentar ou aditar qualquer outro elemento à proposta para que ela, neste
ponto, fosse preenchida.
s. Trata-se de apurar um dado objectivo, um dado de facto, que só depende das características que o bem (bem este que é o mesmo, em Marca e Modelo, apresentado para os lotes 4 e 5) efectivamente tem e que por isso, a existir, como sucede, já existia à data de entrega da proposta.
t. E resultando das declarações apresentadas pela Recorrida quaisquer dúvidas sempre poderia o júri, ao invés de excluir, solicitar esclarecimentos nessa matéria, o que do ponto de vista da
proporcionalidade da medida muito melhor se aceitaria.
u. A prestação deste esclarecimento por parte da Recorrida a pedido do júri não tinha por consequência qualquer violação do princípio da intangibilidade da sua proposta.
v. Cabia de facto ao júri, ao abrigo dos deveres que se lhe encontram legalmente cometidos, suprir o lapso material para o qual foi oportunamente alertado pela ora Recorrida
w. Como bem aponta a sentença posta em crise pela Recorrente, mal andou o júri ao decidir pela
exclusão da proposta da Recorrida ao lote 4. Primeiro, porque o fundamento de tal exclusão reside num excesso de formalismo injustificado, do qual não é possível retirar, numa perspectiva global e tendo em conta os interesses visado pelo procedimento concursal, qualquer efeito útil, e segundo, porque de forma totalmente desproporcional definiu como consequência de uma alegada "imprecisão e falta de clareza (nas palavras da própria Recorrente) não o pedido de esclarecimentos mas sim a exclusão.
x. Trata-se, neste caso, de um concurso limitado por qualificação prévia para a celebração de um
acordo quadro em que uma mesma proposta é feita a vários lotes e em que não foram identificados nos documentos do procedimento quaisquer requisitos específicos aplicáveis a cada lote, donde resulta, desde logo, a unicidade dos critérios e requisitos aplicáveis a todos os lotes.
y. A proposta, ainda que dividida em lotes, assume - neste caso em concreto - uma natureza unitária que não pode deixar de ser tida em conta, não só nos seus aspectos formais, mas também numa perspectiva mais material, ao nível da manifestação da vontade de contratar por parte da Recorrida.
z. A vontade da Recorrida não pode ser desgarrada do contexto em que a mesma foi expressa, isto é, não pode perder o sentido unitário da sua manifestação dirigida à celebração de um acordo quadro que regulará as relações jurídicas contratuais a estabelecerem-se ao nível dos diferentes lotes abrangidos por este procedimento concursal.
aa. O que se exigia ao júri não era que avaliasse a proposta da Recorrida ao lote 4 com base no
equipamento (e suas especificações) proposto para o lote 5, mas sim que avaliasse a proposta ao lote 4 com base no equipamento (e suas atribuições) proposto para o lote 4, considerando
apenas - dado tratar-se do mesmo equipamento e não ter sido minimamente alterada a proposta numa perspectiva material - que a especificação "possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito" teria quanto ao lote 4 a mesma resposta que teve quanto ao lote 5.
bb. Ao júri cabia proceder à integração da omissão/incongruência da proposta da Recorrida ao lote 4 através de uma de três formas: i. Fazendo prevalecer a materialidade do equipamento (que reúne desde início as características e especificações exigidas) sobre a formalidade do lapso no preenchimento do Anexo IV, ou; ii. Considerando, uma vez que o equipamento proposto para ambos os lotes é o mesmo, que da correcção do lapso não resultaria nenhuma alteração da proposta susceptível de pôr em causa o principio da intangibilidade das propostas, ou, finalmente; iii. Pedindo esclarecimentos, como aliás lhe cabia perante uma situação de erro como a identificada, especialmente se considerarmos que a alternativa era a exclusão.
cc. O Tribunal é naturalmente livre de sindicar a licitude de decisão de exclusão da Recorrida e tal não se confunde nem pode confundir com o exercício de qualquer poder legalmente cometido ao júri.
dd. O Tribunal limitou-se a sindicar aspectos vinculados (pela "legalidade concursal") que balizam a discricionariedade técnica do júri. Por outras palavras: aferir a legalidade do acto de exclusão não é uma actividade vedada ao juiz quando não estão em causa (como sucede) espaços próprios do exercício da função administrativa.
ee. O que está em causa, isso sim, é saber se a "incongruência de um atributo relativamente a um
equipamento proposto pela Recorrida, no âmbito do lote 4 deste concurso, é, por si só, causa de exclusão da mesma, ou se, ao invés, outra deveria ter sido a decisão do júri.
ff. Como tivemos oportunidade de detalhar, o excesso de formalismo imposto pelo júri com vista à exclusão da Recorrida não só não tem cobertura legal como, ao abrigo dessa formalidade, acaba por desconsiderar outros princípios - tão ou mais importantes que esse - como, por exemplo, o princípio da concorrência e o da igualdade entre concorrentes.
gg. E se é de incongruência que falamos, então melhor teria também decidido o júri caso optasse, como se lhe impunha, por solicitar os esclarecimentos que considerasse necessários com vista a "tornar claro, congruente ou unívoco o que nesses elementos era obscuro, incongruente ou passível de mais de um sentido."
hh. E nenhuma razão tem a Recorrente para afirmar que daí resultaria qualquer violação do princípio da intangibilidade das propostas ou da concorrência já que, como ficou provado nos autos e acima se alegou, o equipamento/proposta em causa não sofreria qualquer modificação por força do eventual esclarecimento que seria prestado pela Recorrida, consubstanciado tão simplesmente, na confirmação de que o equipamento em causa - também proposto para o lote 5 - possuía a funcionalidade "impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito"
ii. Bem decidiu, por tudo isto, o Tribunal a quo ao julgar procedente o pedido de anulação do acto de adjudicação do lote n° 4, devendo, por isso, a proposta ser "avaliada e ordenada na lista de classificação final por se não verificar qualquer dos fundamentos de exclusão previstos na al. b) do n° 2 do art° 70° do CCP".

Com substituição legal de vistos pela entrega das competentes cópias aos Exmos. Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência - artºs. 36º nºs. 1 e 2 CPTA e 707º nº 2 CPC, ex vi artº 140º CPTA.


Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade:

1. O procedimento do "Concurso limitado por prévia qualificação para a celebração de acordo quadro de cópia e impressão" foi publicitado no Jornal Oficial da União Europeia, de 12 de Maio de 2010, com o n.° 2010/S 92-138178, no Diário da República, n.° 90, 2.a série, de 10 de Maio de 2010, com o n.° 916/2010 e no Diário de Notícias e no Correio da Manhã do dia 12 de Maio de 2010, tendo por objecto a selecção de co-contratantes para a celebração de acordo quadro para a aquisição de equipamentos de digitalização, equipamentos de fax e equipamentos multifuncionais e impressoras, respectivos acessórios, consumíveis e assistência técnica, bem como a contratação de serviços de cópia e impressão em regime de outsourcing, em todo o território nacional (cfr. n° 2 do art.1° do Programa de Concurso - o "PC" -, cfr. documento junto ao processo administrativo, que aqui se dá por integralmente reproduzido);
2. O acordo quadro compreende 8 Lotes e disciplinará as relações contratuais futuras a estabelecer entre os co-contratantes e a ora Requerida, Unidades Ministeriais de Compras (UMC), entidades compradoras vinculadas e voluntárias, tal como definidas no Decreto-Lei n° 37/2007, de 19 de Fevereiro, (cfr. n.°s 3 e 4 do art. l.° do PC);
3. Foram disponibilizadas em plataforma electrónica as peças do procedimento - programa de concurso (PC) em anexo como doc l, caderno de encargos (CE) em anexo como doc 2 e respectivos anexos (disponíveis para consulta in http://www.ancp.gov.pt/PT/ComprasPublicas acordosquadro/Pages/Concursosadecorrer.aspx - e na sequência da decisão de qualificação proferida pelo Conselho de Administração da Agência Nacional de Compras Públicas E.P.E. (ANCP), foram disponibilizados em plataforma electrónica, além do mais, o relatório final da fase de qualificação e o convite à apresentação de propostas;
4. Os prazos para a formulação e para a prestação de esclarecimentos nesta fase terminaram nos dias 2 e 14 de Outubro;
5. Foram prestados esclarecimentos sobre a interpretação das peças concursais pelo Júri do concurso e publicados na plataforma electrónica no dia 11 de Outubro de 2010 e, nos termos do n.° 2 do artigo 166.° do Código dos Contratos Públicos (adiante CCP), o Júri do concurso procedeu ainda a rectificações adicionais ao PC e ao Convite (cfr. processo instrutor);
6. O prazo de entrega das propostas terminou às 17 horas do dia 26 de Outubro de 2010, tendo sido verificada a apresentação tempestiva de trinta e uma propostas, de entre elas, a proposta da Requerente;
7. O Júri procedeu à análise das propostas tendo elaborado o relatório preliminar que fez publicar na plataforma electrónica no dia 30 de Novembro de 2010 (cfr. processo instrutor);
8. Uma vez que do relatório preliminar do Júri se concluía pela exclusão da proposta que havia sido apresentada pela Requerente, no dia 6 de Dezembro de 2010 e ao abrigo do artigo 123.° n° ex vi artigo 147.°, ambos do CCP, a Requerente exerceu o seu direito de audição prévia;
9. No dia 17 de Janeiro de 2011 foi publicado o primeiro relatório final do Júri, nos termos do disposto no artigo 148° do CCP, dando à Requente novo prazo para o exercício do direito de audição prévia (cfr. processo instrutor);
10. No dia 24 de Janeiro de 2011, foi exercido o direito de audição prévia por parte da Requerente e, finalmente, no passado dia 7 de Fevereiro foi-lhe comunicada a decisão de adjudicação do Conselho de Administração da ANCP bem como a lista de concorrentes ordenados, em virtude da qual, aderindo inteiramente aos fundamentos e conclusões do Júri, constantes do segundo relatório final, foi a Requerente excluída (cfr. docs. n°s 3 e 4 juntos à p.i. e processo instrutor em suporte informático (CD));
11. Como já anteriormente se referiu em 7., em sede de audiência prévia e após a apresentação pelo Júri do relatório preliminar da fase de propostas, foi enviada pela Requerente uma lista de incorrecções constantes do ficheiro informático que serviu de base à sua proposta, relativamente aos lotes 4, 5 e 8 do acordo quadro conexo a este concurso, cfr. fls 413-414 dos autos;
12. O Júri do Concurso deliberou sobre a mencionada resposta, o seguinte:
"(...) verifica-se que o Concorrente n° 19 pede que lhe seja dado tratamento igual ao que foi dado ao Concorrente n° 6 - C... e, em consequência, lhe seja dado o direito à rectificação da sua proposta para o lote 4, equipamento 7D. Para tanto sustenta que a menção "600x600" para a especificação "Possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito" constitui mero erro de escrita demonstrável em face da sua declaração de vinculação para o equipamento do tipo 14E do lote 5, equipamento esse que é o mesmo apresentado para o lote 4, tipo 7D. Não tem porém razão o Concorrente n°19 uma vez que as declarações integrantes da proposta para o lote 5, relativo que é à aquisição de equipamentos de média gama, não podem ser desgarradas do respectivo contexto, para integrar declarações em contexto diverso, como são as declarações no âmbito do lote 4, que é relativo à aquisição de equipamentos de baixa gama.
Para além desta diversidade de contextos das propostas apresentadas para lotes distintos, importa salientar que, por força da exigência do artigo 24. ° n.° l - b) e Anexo Vl - D do PC para que se considere cumprida a exigência que este faz quanto às declarações relativas aos termos ou condições da execução do contrato a celebrar, não importa se o equipamento típico existente no mercado com uma determinada marca, modelo e part number é ou não em abstracto susceptível de suportar determinada função, mas antes que cada concorrente se vincule a assegurar essa função em concreto.
Em face da apontada diversidade de contextos, não se configura direito à rectificação nos termos do artigo 249° do Código Civil, nem tão pouco com fundamento no princípio da igualdade de tratamento, uma vez que a sua situação é diferente da situação do Concorrente n° 6 - C..., em relação ao qual se trata de erro revelado no contexto de uma mesma proposta.
O Concorrente n° 19 manifesta-se ainda contra a avaliação das propostas dos Concorrentes n.° 4 - B...no âmbito dos lotes 4, 6 e 8 e n.° 7 - D...no âmbito dos lotes 4, 5, 6, 7 e 8, com a alegação de que as respectivas propostas apresentam equipamentos multifuncionais e não impressoras, em violação da tipologia exigida conforme esclarecimento do Júri nº 2.1 da fase de propostas, alegação essa que todavia não põe em crise o conteúdo das declarações dos Concorrentes n.°s 4 e 7 referentes às características técnicas dos modelos em causa, integrantes das respectivas propostas, segundo o qual aqueles cumprem integralmente as especificações exigidas pelo artigo 24°, n° l - b) do PC para caracterizar a tipologia a que se referem.
Nestes termos, o Júri mantém a proposta de exclusão da proposta do Concorrente n.° 19 ao lote 4, bem como a proposta de ordenação relativa aos Concorrentes nº 4 -B...n.° 7 D..." - cfr. as referidas págs. 19 e 20 do Relatório Final (II) de 27.01.2011.
13. Conforme se constata através da análise do anexo VI D da proposta, no que respeita ao Lote 4, equipamento 7D, para a especificação "possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito" a Requerente indicou, por lapso, a seguinte resposta: "600x600'";
14. O equipamento indicado aqui em causa é a "A... FS-6970DN", cfr. o mesmo anexo VI D da proposta;
15. Tal equipamento foi apresentado pela proposta da ora Requerente ao Lote 5, equipamento 14E, como evidencia a proposta à especificação "Marca" e "Modelo" constante do mesmo anexo VI D;
16. Na proposta ao Lote 5, relativamente ao equipamento 14E e à especificação "possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito" a proposta da Requerente responde "sim".
17. O equipamento proposto, a "A... FS-6970DN" preenche o requisito/especificação "possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito" exigida pelo Programa de Concurso, cf. doe. n.° 5 junto à p.i. (fls 1190, vol. VI dos autos);
18. Analisada a proposta da Requerente, o Júri do Concurso concluiu o seguinte no relatório preliminar:
"a) As causas que conduziram à exclusão foram:
No que respeita ao lote 4, (1) a proposta relativa ao equipamento do tipo 7D apresenta 600x600" para a especificação "Possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito ", o que é incongruente e constitui a causa de exclusão da proposta prevista na alínea b) do n.° 2 do artigo 70. ° do CCP.
No que respeita ao lote 5, a proposta apresenta, (1) para os equipamentos dos tipos 10E e 11 E, "Não " no campo relativo à especificação "Comutação automática entre entradas de papel"; (2) para o equipamento do tipo 11 E, "Não" no campo relativo à especificação "Possibilidade de trabalhos múltiplos em conjuntos"; e (3) para o equipamento do tipo 16E, "Não "no campo relativo à especificação - Possibilidade de restrições e controlo de acesso ao equipamento através de código identificador ou de cartões com limites personalizáveis por utilizador ou grupo"; além disso (4) para o equipamento do tipo 16 E não cumpre a especificação mínima definida para o campo "Resolução " da "Função impressão ", na medida em que oferece "600x600 " em vez de "1200x1200, situações estas que constituem causa de exclusão da proposta nos termos da alínea b) do n. ° 2 do artigo 70. ° do CCP.
No que respeita ao lote 8, para o equipamento do tipo 2H, o concorrente preencheu (1)
com "-" o campo relativo à declaração de cumprimento da especificação "Possibilidade de digitalização para e-mail (SMTP)"; e (2) com "Não o campo relativo à declaração de cumprimento da especificação "Tabuleiro multifunções "; e (3) para os equipamentos dos tipos 5H, 18H, 19H e 20H a proposta não cumpre a especificação "Comutação automática entre entradas de papel", situações estas que determinam a exclusão da proposta nos termos da alínea b) do n° 2 do artigo 70° do CCP; (4) para os equipamentos dos tipo 12H, 13H, 14H, 15H, 16H, 17H, 18H, 19H, 20H, 21H e 22H o concorrente não preencheu o campo relativo ao "Part number", o que é causa de exclusão da proposta nos termos da alínea d) do nº 2 do artigo 146. °
conjugada com a alínea b) do n° l do artigo 57° do CCP; (5) além disso, para o equipamento do tipo 12H, a proposta não apresenta o atributo preço para as opções "Finalizador com empilhador em vários níveis" e "Agrafador integrado"; (6) também para os equipamentos dos tipos 17H, 19H, 22H e 24H não contempla o acessório opcional "Bandeja de saída de alta capacidade", o que constitui a causa de exclusão da proposta prevista na alínea b) do n° 2 do artigo 70° do CCP; (7) ainda relativamente ao equipamento do tipo 12H, a proposta apresenta "500" para a especificação "Bandeja de saída de alta capacidade", o que constitui uma incongruência e é causa de exclusão da proposta prevista na alínea b) do n° 2 do artigo 70° do CCP; (8) para o equipamento do tipo 20H, o concorrente não preencheu o campo relativo à vinculação "Agrafador integrado", o que constitui a causa de exclusão da proposta prevista na alínea d) do n° 2 do artigo 146°, conjugada com a alínea c) do nº l do artigo 57°do CCP; e (9) a proposta contém "Não" na especificação "Possibilidade de separação de trabalhos múltiplos em conjuntos", o que constitui a causa de exclusão da proposta prevista na alínea b) do n° 2 do artigo 70° do CCP; (10) para o equipamento do tipo 25H, a proposta contém "Não" na especificação "Possibilidade de restrições e controlo de acesso ao equipamento através de código identificador ou de cartões com limites personalizáveis por utilizador ou grupo", o que constitui a causa de exclusão da proposta prevista na alínea b) do n° 2 do artigo 70° do CCP; e (11) para o equipamento do tipo 32H o concorrente não preencheu o campo relativo à vinculação à especificação mínima "Velocidade cores" da função de impressão, o que constitui a causa de exclusão da proposta prevista na alínea d) do n° 2 do artigo 146°, conjugada com a alínea c) do n° l do artigo 57°do CCP" - cfr. págs. 67 a 70 do Relatório Final (I) da fase de apresentação e análise das propostas, e págs. 19 e 20 do Relatório Final (II) de 27.01.2011 ambos do Júri do Concurso, documentos juntos ao processo administrativo e que aqui se dão por integralmente reproduzidos;
19. O Júri do Concurso relativamente à proposta do Concorrente n° 6 - "C..." para o Lote 5 onde foi rectificado o "lapso de escrita", por se ter "revelado no contexto de uma mesma proposta", explicita que tal ocorreu por a própria proposta apresentada ao Lote 5 pelo Concorrente n° 6 - "C..." conter elementos que permitem ao Júri rectificar o lapso detectado e, com isso, o sentido do projecto de decisão inicial constante do relatório I por si elaborado. Diz o júri a este propósito, o seguinte:
"No que especificamente concerne à falta de menção ao atributo "Vida útil da recarga de agrafos (em n. ° de conjuntos de 25 páginas possíveis de agrafar com uma recarga)", lote 5, ponto (1), aduz o Concorrente n.° 6 tratar-se de lapso de preenchimento do respectivo campo, lapso esse que é patente em face do teor da declaração relativa ao equipamento do tipo 6E a qual, reportando-se precisamente à oferta do mesmo consumível "Recarga de agrafos part number 008R12941" com o mesmo preço para o Estado de "31,40€", indica a vida útil de "15.000".
Reexaminado o formulário da proposta relativa ao Lote 5, verifica o Júri que o elemento da fórmula de avaliação a que o mencionado lapso se refere se encontra efectivamente inscrito no texto da proposta nos termos indicados pelo Concorrente, ou seja, com o mesmo sentido e identidade jurídica. Inexistindo qualquer lacuna quanto ao mesmo, mas antes simples erro de escrita, revelado no contexto da proposta, reconhece o Júri o direito à sua rectificação nos termos do artigo 249. ° do código civil. " (cfr. Relatório Final (i) do Júri do Concurso);
20. Em todas as situações semelhantes às detectadas nas propostas da Requerente, o Júri decidiu sempre no sentido de propor a exclusão das propostas, citando-se, a título de exemplo, os seguintes casos: Concorrente n° l - "E..."; Concorrente n° 2 - "F..."; Concorrente n.° 4 - "B..."; Concorrente n.° 6 - "C... PORTUGAL"; Concorrente n° 8 - "G..."; Concorrente n° 9 - "H..."; Concorrente n.° 10 -"I..."; Concorrente n° 11 - "SAS"; Concorrente n° 12 - "J..."; Concorrente n.° 13 - K...SI", Concorrente n°14 - L..."; Concorrente n° 16 - "O..."; Concorrente n°20 - "P..."; Concorrente n° 22 - "Q..."; Concorrente n° 23 - "R..."; Concorrente n°25 - "S..."; Concorrente n°26 - "T..."; Concorrente n°27 -"U...", Concorrente n°28 - "V..."; e Concorrente n°29 -"X..." (cfr. as decisões tomadas relativamente aos mencionados candidatos nos relatórios finais do Júri do Concurso, documentos juntos ao processo administrativo e que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
21. Do anexo II à acta n° 7 do Concurso "Esclarecimentos das peças do concurso efectuados ao abrigo do artigo 166 do CCP", de l de Outubro de 2010, página 199 do doc. 3 junto ao r.i., consta o seguinte pedido de esclarecimento e respectiva resposta oferecida pelo Júri:
"Pedido de esclarecimento n° 2 Entidade: Z...(PORTO) SA, em agrupamento Assunto: Pedido de Esclarecimentos Data: 01-10-201016:29 Dúvidas relativas ao Anexo A-4 do Caderno de Encargos e aos Anexos V1D, VI-E, VI-F, VI-G, VI-H do Programa do Concurso: P2.1
l - Tipos de equipamentos. - Tendo por base a resposta à pergunta 27.4 presente na Acta n° 2 das reuniões do júri, "o concorrente poderá apresentar proposta contendo especificações com características superiores". Significa isto que o concorrente pode igualmente apresentar um equipamento multifuncional em substituição de uma impressora, desde que as características mínimas sejam observadas?
R2.1 Não é exacto o entendimento do concorrente. Não poderá ser proposto um equipamento multifuncional em substituição de uma impressora. As propostas têm que respeitar o equipamento a que cada tipo de produto se refere.";
22. A Requerente não se apresentou a concurso com equipamentos multifuncionais que pudessem satisfazer, para além de outras, as especificações e características exigidas pelo programa de concurso para um determinado equipamento ou Lote, assim dando cumprimento ao esclarecimento, prestado pelo Júri, acima identificado;
23. Tanto o concorrente D..., n° 7, como o concorrente B..., concorrente n.° 4, utilizaram, na sua proposta, equipamentos multifuncionais para lotes cujos requisitos exigiam "impressoras", nomeadamente nos seguintes casos:
CONCORRENTE D...Lote 4 - Tipos 7D e 9D - Foi apresentado o equipamento multifuncional IRADV C2020Í Lote 7 - Tipos 7G e 9G - Foi apresentado o equipamento multifuncional IRADV C2020Í Lote 8 - Tipos 7H e 9H- Foi apresentado o equipamento multifuncional IRADV C2020Í Lote 5 - Tipos 13E, 15E, 18E e 20E - Foi apresentado o equipamento IRADV C5045Í Lote 6 - Tipo 4F - Foi apresentado o equipamento IR-ADV C5045Í Lote 7 - Tipos 22G, 24G, 27G, 29G e 33G - Foi apresentado o equipamento IR-ADV C5 04 5 Lote 8 - Tipos 22H, 24H, 27H, 29He 33H - Foi apresentado o equipamento IR-ADV C5045Í Lote 5-Tipo 14E-Foi apresentado o equipamento multifuncional IR-ADV C2030Í Lote 7 -Tipo 23G- Foi apresentado o equipamento multifuncional IR-ADV C2030Í Lote 8 - Tipo 23H- Foi apresentado o equipamento multifuncional IR-ADV C2030Í Lote 5 - Tipos 17Ee 19E- Foi apresentado o equipamento IR-ADV C5030i Lote 7 - Tipos 26G e 28G - Foi apresentado o equipamento IR-ADVC5030Í Lote 8 - Tipos 26He 28H - Foi apresentado o equipamento IR-ADV C5030Í Lote 5 - Tipo 16E - Foi apresentado o equipamento IR-ADVC6055Í Lote 7 - Tipo 25G - Foi apresentado o equipamento IR-ADV C6055Í Lote 8 - Tipo 25H- Foi apresentado o equipamento IR-ADV C6055Í
CONCORRENTE B...Lote 4 -Tipo 6D-Foi apresentado o equipamento multifuncional AR-M201 Lote 8 - Tipo 6H- Foi apresentado o equipamento multifuncional ARM201 Lote 4 - Tipo 7D - Foi apresentado o equipamento multifuncional MXM200D Lote 8 - Tipo 7H- Foi apresentado o equipamento multifuncional MXM200D Lote 4 - Tipo 8D- Foi apresentado o equipamento multifuncional MX-C311 Lote 8 - Tipo 8H- Foi apresentado o equipamento multifuncional MX-C311 Lote 6 - Tipo 4F- Foi apresentado o equipamento multifuncional MXM453N Lote 8 - Tipos 22H, 24He 33H- Foi apresentado o equipamento multifuncional MX-M45 3 N Lote 8 - Tipos 27H e 29H - Foi apresentado o equipamento multifuncional MX-4100N, cuja listagem e catálogos se encontram a páginas 331 a 335 do doc. 3 junto ao r.i., requerimento no âmbito do exercício da audição prévia da concorrente P... em consequência da notificação do relatório preliminar do júri;
24. O júri afirma no seu relatório final (doc. 3 junto ao r.i.), o seguinte: "O Concorrente n° 19 manifesta-se ainda contra a avaliação das propostas dos Concorrentes n° 4 - B...no âmbito dos lotes 4, 6 e 8 e n° 7 - D...no âmbito dos lotes 4, 5, 6, 7 e 8, com a alegação de que as respectivas propostas apresentam equipamentos multifuncionais e não impressoras, em violação da tipologia exigida conforme esclarecimento do Júri nº 2.1 da fase de propostas, alegação essa que todavia não põe em crise o conteúdo das declarações dos Concorrentes n.°s 4 e 7 referentes às características técnicas dos modelos em causa, integrantes das respectivas propostas, segundo o qual aqueles cumprem integralmente as especificações exigidas pelo artigo 24°, n. ° l - b) do PC para caracterizar a tipologia a que se referem".


Nos termos do artº 646º nº 4º CPC ex vi artºs. 1º e 140º do CPTA no item 13. do probatório dá-se por não escrita a expressão modal "por lapso" por a mesma, atento o objecto do processo e concreta causa de pedir, encerrar uma conclusão de direito e consistir na decisão do pleito levada ao probatório, o que não é adjectivamente atento o regime do artº 653º nº 2 CPC; nestes termos, o teor do citado item 13 passa a ser o seguinte:

13. Conforme se constata através da análise do anexo VI D da proposta, no que respeita ao Lote 4, equipamento 7D, para a especificação "possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito" a Requerente indicou a seguinte resposta: "600x600'";


DO DIREITO

Relativamente ao procedimento de concurso limitado para a formação de um acordo-quadro plural com várias entidades para a aquisição de bens e prestação de serviços (artºs. 251º, 252º nº 1 b), 253º nº 1, 16º nº 1 c), 162º/163º e ss., CCP), em via de convolação do processo cautelar em processo principal o Tribunal a quo julgou inválida a exclusão da proposta apresentada ao Lote nº 4 pela contra-interessada e ora Recorrida A... ..., Lda. e anulou o respectivo acto de adjudicação.
Ou seja, a questão trazida a recurso centra-se na selecção do elenco de fornecedores susceptível de assumir a posição jurídica de co-contratantes nas futuras relações contratuais a estabelecer ao abrigo deste acordo-quadro (artº 257º nº 2 CCP) e, na economia do procedimento escolhido para esta selecção, na fase de apresentação e análise das propostas e adjudicação do concurso limitado (artºs. 189º a 192º CCP) expressa pela não aceitação do pedido de rectificação da proposta ao Lote nº 4 apresentada pelo Concorrente nº 19, a ora contra-interessada e Recorrida A... ..., Lda.


1. aspecto da execução do contrato não submetido à concorrência, vinculativo;

De acordo com o probatório a pretendida rectificação da proposta apresentada ao Lote 4, equipamento tipo 7D, traduz-se em substituir a menção de "600x600" por si atribuída à especificação técnica "Possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito" pela menção "sim".
Nesta fase do concurso limitado de apresentação e análise das propostas e adjudicação, foi levada ao item 12 do probatório a resposta do Júri à pretendida rectificação formalizada pelo do Concorrente nº 19 em sede de audiência prévia (artºs. 147º ex vi 162º nº 1 CCP) e fundamentada na circunstância de ter incorrido em "mero erro de escrita demonstrável em face da sua declaração de vinculação para o equipamento tipo 14E do lote 5 equipamento esse que é o mesmo apresentado para o Lote 4, tipo 7D" - item 12 do probatório - sendo que "ao Lote 5, relativamente ao equipamento 14E e à especificação "possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito" a proposta da Requerente responde "sim""- item 16 do probatório.
Foi levado ainda ao item 12 do probatório que "(..) importa salientar que, por força da exigência do artigo 24º nº l, b) e Anexo VI-D do PC para que se considere cumprida a exigência que este faz quanto às declarações relativas aos termos ou condições da execução do contrato a celebrar, não importa se o equipamento típico existente no mercado com uma determinada marca, modelo e part number é ou não em abstracto susceptível de suportar determinada função, mas antes que cada concorrente se vincule a assegurar essa função em concreto. (..)".
O que significa que a especificação técnica referida pela "Possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex) - com configuração por defeito" exigida no artº 24º nº 1 b) e Anexo VI-D do Programa do Concurso para o equipamento tipo 7D do Lote 4 constitui uma qualidade funcional descrita em termos fixos e, como tal, vinculativa em sede de propostas a apresentar pelos concorrentes, relativa a um aspecto da execução dos (futuros) contratos não submetido à concorrência (artº 42º nº 5, 1ª parte, CCP).
Sendo um limite de carácter funcional, na circunstância configurado por uma qualidade do equipamento discriminada em termos vinculativos para os concorrentes, a sua inobservância por violação - questão diversa da inobservância por omissão - importa a exclusão da proposta por disposição expressa do artº 70º nº 2 b) CCP. (1)


2. rectificação da declaração (erro ostensivo); adjudicações por lotes - artºs. 73º nº 2 e 132º nº 3 CCP; esclarecimentos sobre as propostas - artº 72º CCP;

Em termos civilistas do artº 249º C. Civil, a rectificação da declaração negocial destina-se a corrigir os termos materiais da declaração anterior, traduzida em erro material de escrita (ou de cálculo) caso o erro seja ostensivo, no sentido de que o erro deve revelar-se no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, sob pena de o caso ficar sob a alçada do artº 247º C. Civil, próprio do erro obstáculo ou erro na declaração.
Cabe referir que em sede de contratação pública, o conceito de rectificação é aplicado fora do contexto das declarações negociais vazadas nas propostas apresentadas, na medida em que se limita às rectificações das peças do procedimento, artºs. 50º nº 3, 61º nº 5 CCP e as suas implicações na prorrogação do prazo fixado para a apresentação das propostas, nos termos do artº 64º nº 2 CCP.

Pelo que vem dito, a apreciação da invocada rectificação há-de conter-se, para ser válida, no domínio da previsão do artº 249º C. Civil, isto é, do erro de escrita ostensivo revelado no contexto da declaração ou das circunstâncias, no caso, documentadas, em que foi feita.
Para tal invocou a contra-interessada e ora Recorrida A... ..., Lda. a título de circunstância reveladora do erro de escrita a resposta dada no Lote 5 à citada especificação técnica, ou seja, invoca a proposta por si apresentada no domínio de lote diverso daquele em que incorreu no alegado erro (o Lote 4), entendimento jurídico sufragado pelo Tribunal a quo e que a ora Recorrente impugna com fundamento nas disposições conjugadas dos artºs 73º nº 2 e 132º nº 3 CCP.
Efectivamente, segundo os mencionados normativos, na adjudicação por lotes "(..) o bem objecto do procedimento é adjudicado na totalidade mas dividido em várias parcelas autónomas (e previamente autonomizadas nas peças do procedimento) que podem ser atribuídas a concorrentes diversos (..) celebrar-se-ão então, correspondentemente, contratos com os concorrentes que apresentarem as melhores propostas para cada um dos tais lotes (..)" cumprindo introduzir no programa do concurso não só a adjudicação por lotes como identificar as regras específicas aplicáveis a cada lote, ou seja "(..) todas as regras específicas aplicáveis às propostas a apresentar para cada lote e ao modo da sua avaliação e ordenação. (..)".
Seguindo a doutrina que vimos citando, "(..) o procedimento é um só (não há tantos procedimentos quantos os lotes previstos) mas isso não significa, em nossa opinião, que as vicissitudes que ocorrem por causa de um lote e que determinem a sua demora ou suspensão se reflictam os outros lotes, impedindo o seu desenrolar normal. A regra, portanto, seria a de que os actos e decisões relativos a cada lotes são independentes e não prejudicam a validade e eficácia das decisões sobre o outro lote ou a respectiva tramitação, sendo que a referida independência se estende à própria adjudicação e celebração dos contratos respeitantes a cada lote. Só não será assim se o programa do procedimento dispuser diversamente, se existirem laços entre a avaliação e ordenação do lote "problemático" com os restantes - que tornem impossível avaliar ou ordenar as propostas relativas a estes sem que aquele outro já o esteja também (..)" (2)
Neste sentido, do regime da adjudicação por lotes dos artºs 73º nº 2 e 132º nº 3 CCP resulta o fraccionamento do procedimento, como que escalonado em partes em razão do objecto, rectius, em razão de cada lote, dando origem a tantas adjudicações e contratos quantos os lotes a que o procedimento respeita.
Neste sentido, não tem viabilidade jurídica invocar a menção "sim" aposta na especificação "possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex)-com configuração por defeito" relativamente ao equipamento 14E do Lote 5, para efeitos de rectificação (artº 249º CC) da declaração da menção "600x600" atribuída à especificação técnica "Possibilidade de impressão automática frente-e-verso (duplex)-com configuração por defeito" na proposta apresentada ao Lote 4, equipamento tipo 7D.
Donde se conclui que a pretensão deduzida pela ora Recorrida A... ..., Lda. configura uma alteração da proposta por si apresentada quanto a um aspecto vinculativo da execução do futuro contrato no tocante ao Lote 4, não submetida à concorrência.
O que não é possível, na medida em que essa via entra em violação do princípio da concorrência, na vertente da comparabilidade das propostas porque, como é doutrina assente, "(..) sem possibilidade de confronto entre as candidaturas ou entre as propostas (entre si e com o processo patenteado), isto é, sem possibilidade de fazer funcionar a concorrência nos termos em que esta foi suscitada fica prejudicada a própria finalidade ou função do concurso. (..)
Do que se trata, afinal, para que haja uma concorrência real e efectiva é assegurar que todos os concorrentes respondam aos mesmos quesitos e requisitos do concurso (ou a um núcleo básico dele) de modo a possibilitar a plena comparação das propostas, a possibilidade de confrontá-las enquanto propostas contratuais a quesitos idênticos, para saber, objectiva e imparcialmente, a final, qual o melhor concorrente ou a melhor proposta que o mercado ofereceu. (..)
(..) o princípio da comparabilidade comunga, ao contrário do que poderia parecer, tanto de elementos objectivos como elementos subjectivos. Objectivos, porque exige que as propostas base (ou de qualquer outra espécie admitida) respondam clara e precisamente aos requisitos que, nos documentos do concurso, se pedia fossem concretizados ou quantificados pelos concorrentes. Mas também se integram aí elementos subjectivos, pois a determinação daquilo que num concurso é comparável é estabelecido pela entidade adjudicante de acordo com a sua vontade adjudicatória, expressa no programa do concurso e (sobretudo) no caderno de encargos. (..)
Os requisitos, os modelos, os projectos, as especificações (quantitativas e qualitativas) do bem ou utilidades pretendidos pela entidade adjudicante constituem, pois, em princípio, um ponto de referência obrigatória para todos os concorrentes, a fim de tornar comparáveis entre si (e com o padrão do concurso) as respectivas propostas. (..)" (3)
Isto porque "(..) as propostas para serem comparáveis (analisadas, avaliadas e classificadas racionalmente), devem responder a um padrão comum, é dizer, a todas as (e apenas às) especificações solicitadas pelas peças do procedimento e dentro dos limites por elas impostos. (..) Há várias manifestações da exigência da comparabilidade das propostas no CCP, nomeadamente, continuando com a doutrina que vem sendo citada, "(..) o CCP estabelece também o dever de exclusão das propostas cuja impossibilidade de avaliação decorra da forma de apresentação de algum dos respectivos atributos [artigo 70º/2, alínea c)], designadamente, por equivocidade ou falta de clareza - admitindo-se que, por regra, essa impossibilidade de avaliação apenas deva ser afirmada depois de o júri solicitar um esclarecimento ao concorrente (e desde que, no caso, a admissibilidade do esclarecimento não contrarie o regime do art° 72°/2 do CCP) (..)" (4)
Mas também a prestação de esclarecimentos sobre as propostas a solicitação do júri se mostra inviável, atento o regime legal próprio constante do art° 72° CCP, na medida em que se trata de "(..) matéria de alta sensibilidade concorrencial, situada nas fronteiras do (praticamente) inviolável princípio da intangibilidade das propostas, por se tratar de um instrumento, esse do seu esclarecimento, que desemboca ou pode desembocar de maneira fácil, consciente ou inconscientemente, numa adaptação ou ajustamento da proposta que torne válido ou valioso aquilo que não o era ou não parecia tanto assim (..) A ideia essencial deste preceito é, portanto, a de que os esclarecimentos são isso mesmo, algo (uma informação ou explicação, etc.) destinado a aclarar, a tornar claro, congruente ou inequívoco um elemento que na proposta estava (ou parecia estar) apresentado ou formulado de modo pouco claro ou menos apreensível, não percebendo o júri (ou não percebendo ele seguramente) o que aqui se queria dizer. (..)" (5)
Por isso, os esclarecimentos sobre documentos das candidaturas não podem extravasar o conteúdo próprio do que se entende por "esclarecer" que é tornar claro, inequívoco e congruente o texto das declarações negociais apresentadas e não proceder à alteração do texto anteriormente apresentado.
Por último, no que respeita ao conteúdo dos futuros contratos a celebrar ao abrigo do acordo-quadro, cabe lembrar que os termos antecipadamente fixados não podem ser objecto de alterações substantivas (artº 257º nº 2 CCP) salvo uma panóplia legal de condições estritas, sob clausulado expressamente previsto no caderno de encargos do acordo-quadro (artº 257º nº 3 CCP), o que necessariamente abrange os aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência descritos em termos fixos.

Tendo presente que as situações previstas no art° 70° n° 2 CCP dizem essencialmente respeito ao conteúdo da proposta e não a razões formais, por todo o exposto não é de acompanhar o entendimento do Tribunal a quo no sentido da invalidade do acto de exclusão da proposta apresentada ao Lote 4 pela ora Recorrida A... ..., Lda., cumprindo revogar a sentença proferida e manter a validade da adjudicação do Lote 4 nos termos decididos pela ora Recorrente Agência Nacional de Compras EPE.

Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso e revogar a sentença proferida.

Custas a cargo da Recorrida.

Lisboa, 07.DEZ.2011.

(Cristina dos Santos)
(António Vasconcelos)
(Paulo Carvalho) (Vencido por entender que no simples erro material constactável das peças do concurso, mesmo que sejam lotes diferentes, deve ser admitida a correcção).



1- Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e outros procedimentos de contratação pública, Almedina/2011, págs. 587/590.
2- Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos... Almedina/2011, págs. 1020/1024.
3- Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e outros procedimentos de adjudicação administrativa -das fontes às garantias, Almedina/2003, págs.103/104, nota (178) e 441/442.
4- Rodrigo Esteves de Oliveira, Os princípios da contratação pública, Estudos de Contratação Pública - I, CEDIPRE, org. Pedro Gonçalves, Coimbra Editora/2008, págs.70/72.
5- Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos..., Almedina/2011, págs. 294/296, 600/601 e 622/623.