Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 5 de Novembro de 2009 (proc. 5506/09)

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Sumário:

I - Embora se possa entender que o recurso da decisão de antecipar o julgamento da causa não coincide com o recurso duma decisão que adopta uma providência cautelar, constituindo antes uma pronúncia sobre a própria matéria do processo principal, ao qual, por esse facto, deve ser atribuído efeito suspensivo, por não respeitar verdadeiramente ao recurso duma decisão respeitante à adopção de providência cautelar, o certo é que as consequências dessa decisão se afiguram inaceitáveis, por virem a redundar na denegação da tutela cautelar.
II - Uma decisão que, ao abrigo do disposto no artigo 121º do CPTA, antecipa o julgamento da causa principal, será, regra geral, favorável ao requerente da providência, como foi o caso presente. Ora, se os efeitos dessa sentença favorável ficarem suspensos, por força do efeito típico dos recursos previstos no CPTA [cfr. artigo 143º, nº 1], o interessado fica necessariamente na mesma situação em que se encontraria se não tivesse instaurado uma providência cautelar ou esta tivesse sido indeferida, e sem ter uma decisão final favorável que produza efeitos imediatos.
III - Deste modo, deve efectuar-se uma interpretação extensiva do artigo 143º, nº 2 do CPTA, em conformidade com o princípio constitucional da tutela judicial efectiva, de modo a enquadrar as decisões sobre o mérito da causa que forem proferidas ao abrigo do artigo 121º do CPTA na categoria das "decisões respeitantes à adopção de providências cautelares» a que aquele preceito se refere - o que não parece, de resto, suscitar grandes dificuldades na medida em que a decisão proferida ao abrigo do artigo 121º, ao optar por julgar o mérito da causa em vez de adoptar uma mera providência cautelar, é, em bom rigor, uma decisão que se recusa a adoptar providências cautelares e, portanto, uma decisão «respeitante à adopção de providências cautelares".
IV - O nº 1 do artigo 86º do CCP prevê uma consequência desfavorável para o adjudicatário que não apresente os documentos de habilitação no prazo que for fixado no programa do procedimento ou naquele que lhe for fixado pela entidade adjudicante ou ainda, quando não os apresente redigidos em língua portuguesa ou acompanhados de tradução devidamente legalizada; porém, faz depender essa caducidade da possibilidade de imputação das situações objecto da previsão da norma ao adjudicatário.
V - Inversamente, se as situações objecto da previsão da norma se verificarem por facto não imputável ao adjudicatário, impõe o nº 2 do artigo 86º do CCP que o órgão competente para a decisão de contratar deve conceder-lhe, em função das razões invocadas, um prazo adicional para a apresentação dos documentos em falta, sob pena de caducidade da adjudicação.
VI - A caducidade da adjudicação - seja por falta de apresentação dos documentos de habilitação no prazo que tiver sido fixado no programa do procedimento ou naquele que lhe for fixado pela entidade adjudicante, seja quando aqueles documentos não sejam apresentados redigidos em língua portuguesa ou acompanhados de tradução devidamente legalizada -, ocorre "ope legis", sem que se afigure necessária a notificação do adjudicante nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 100º e segs. do CPA.
VII - Ocorrendo a situação prevista no artigo 86º do CCP, a mesma deverá ter tratamento idêntico ao do justo impedimento, ou seja, deverá o adjudicante - por forma a habilitar o órgão competente para a decisão de contratar a aferir da imputabilidade ou não do facto invocado e, julgando válidas as razões invocadas, conceder-lhe, um prazo adicional para a apresentação dos documentos em falta - invocar desde logo, com a apresentação dos aludidos documentos ou da sua junção em língua portuguesa ou acompanhados de tradução devidamente legalizada, os factos que justificando essa apresentação tardia, demonstrem que a mesma não lhe foi imputável.
VIII - Não ocorre a violação do princípio da estabilidade das peças do procedimento se a conduta da entidade adjudicante, no sentido de solicitar aos adjudicatários a junção de certidões do registo comercial para prova da composição e situação dos seus órgãos de gerência e, no fundo, aferir, pelo cotejo dos CRC's daqueles, da existência ou não dos impedimentos previstos no artigo 55º do CCP, já que a mesma encontra cobertura legal no nº 8 do artigo 81º do CCP, que dispõe que "o órgão competente para a decisão de contratar pode sempre solicitar ao adjudicatário, ainda que tal não conste do programa do procedimento, a apresentação de quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações objecto do contrato a celebrar, fixando-lhe prazo para o efeito".

 

Texto Integral:

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL:

I. RELATÓRIO
"A...- Controlo de Ambiente, SA", com os sinais dos autos, intentou no TAC de Lisboa contra o Conselho de Administração da B..., EPE, uma PROVIDÊNCIA CAUTELAR requerendo a suspensão de eficácia da deliberação daquela entidade, de 5 de Março de 2009, que decidiu considerar a caducidade da adjudicação da proposta apresentada pela requerente para os lotes 1, 2, 4 e 9 a 13, no âmbito do Concurso Público para Selecção de Fornecedores de Produtos de Higiene e de Prestadores de Serviços de Limpeza [ANCP-AQ-2008HL], e ainda a intimação daquela para se abster da celebração dos respectivos acordos quadro referentes ao fornecimento de produtos de higiene e de prestação de serviços de limpeza, ou, caso os mesmos tenham sido celebrados antes do decretamento da presente providência cautelar, a suspensão de eficácia [e consequente suspensão da execução] dos mesmos acordos quadro.
Alegou, em síntese, que a decisão suspendenda é manifestamente ilegal, imputando à mesma vícios de violação (i) do disposto no artigo 11º do Programa de Concurso [Documentos de Habilitação], (ii) do princípio da estabilidade das peças do procedimento e (iii) do princípio da igualdade; preterição do Direito de Audiência Prévia dos Concorrentes; e vício de forma, por falta de fundamentação.
Por despacho de fls. 510/511, foi decido antecipar o conhecimento do mérito do processo principal.
Por sentença datada de 26-6-2009, foi o pedido impugnatório julgado procedente e anulado o acto impugnado no processo principal [cfr. fls. 512/530 dos autos].
Inconformada, veio a entidade requerida interpor recurso jurisdicional para este TCA Sul, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões:
"a) Nos termos do artigo 11º, nº 1 do PC, cada concorrente seleccionado devia entregar no prazo de 10 [dez] dias a contar da notificação da decisão de selecção os documentos de habilitação exigidos naquela peça concursal, prazo esse que terminou em 11-2-2009;
b) Entre os documentos de habilitação exigidos constava a certidão de registo criminal de todos os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência dos concorrentes seleccionados que se encontrem em efectividade de funções, para comprovação das situações referidas nas alíneas b) e i) do artigo 55º do CCP;
c) Em caso de incumprimento da referida obrigação, a adjudicação caducava, obrigatoriamente, para os adjudicatários faltosos, por força do disposto no artigo 86º do CCP;
d) Por Aviso publicitado em 25-2-2009, a recorrente solicitou, a todos os adjudicatários a apresentação, apenas, da respectiva certidão de registo comercial de forma a permitir comprovar a identidade dos titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência, que se encontravam em efectividade de funções;
e) O Aviso referido na alínea anterior não concedeu qualquer prazo adicional para apresentação das certidões de registo criminal, prazo esse que tinha terminado em 11-2-2009, nem o podia ter feito por a lei apenas prever, no nº 2 do artigo 86º do CCP, a apresentação de documentos de habilitação para além do prazo fixado quando tal se verifique por facto não imputável ao adjudicatário;
f) A recorrente nunca poderia ter considerado caducada a adjudicação relativamente à recorrida sem a verificação, através da certidão do registo comercial, de quais os membros do seu Conselho de Administração se encontravam em efectividade de funções, posto poderem ter ocorrido situações de renúncia ou destituição ainda não colmatadas;
g) A douta sentença não fez uma correcta interpretação da matéria de facto apurada, padecendo de erro nos pressupostos, que tem como consequência a sua revogação;
h) A decisão recorrida violou ainda o disposto no artigo 11º, nº 1 do PC e artigo 81º, nº 1, alínea b) e nº 8 e artigo 86º, nº 1, alíneas a) e b), todos do CCP, disposições regulamentares e legais que devem ser aplicadas e interpretadas com o sentido e alcance das precedentes conclusões".

A requerente da providência - e ora recorrida - contra-alegou, requerendo, ao abrigo do disposto no artigo 684º-A do CPCivil, a ampliação do objecto do recurso, no sentido do Tribunal "ad quem" apreciar também os outros fundamentos de anulação do acto que o Tribunal "a quo" se absteve de conhecer, a saber, se a deliberação suspendenda violou o disposto nos artigos 100º e segs. e 125º e segs. do CPA [preterição do direito de audiência prévia e vício de forma, por falta de fundamentação] e se violou o princípio da estabilidade das peças do procedimento.
Para o efeito, concluiu a sua contra-alegação da seguinte forma:
"A. As presentes contra-alegações são apresentadas no âmbito do recurso jurisdicional da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, nos termos da qual - por antecipação do conhecimento do mérito do processo principal - foi considerado procedente o pedido impugnatório da recorrida e, consequentemente, declarada a anulação do acto impugnado no processo principal;
B. Antes de mais, entende a recorrida que, contrariamente ao requerido pela recorrente, o presente recurso deverá ser processado com efeito meramente devolutivo, porquanto, tratando-se de sentença proferido ao abrigo do disposto no artigo 121º e 132º, nº 7 do CPTA, o efeito suspensivo não acautelaria devidamente os direitos da recorrida, que ficaria - neste caso - na situação em que estava sem a providência cautelar [que não foi concedida, pese embora o Tribunal «a quo» ter entendido que assistia razão à recorrida], nem decisão favorável com efeitos imediatos;
C. Neste contexto, na senda do que consideram os referidos autores do Professor Mário Aroso de Almeida e do Juiz Conselheiro Carlos Alberto Fernandes Cadilha [in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2007, págs. 722 e 823 e 824], justifica-se plenamente efectuar-se uma interpretação extensiva do disposto no artigo 143º, nº 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, conjugando esta norma com o princípio constitucional da tutela judicial efectiva "... de modo a enquadrar as decisões sobre o mérito da causa que forem proferidas ao abrigo do artigo 121º na categoria das "decisões respeitantes à adopção de providências cautelares" a que aquele preceito se refere - o que não parece, de resto, suscitar grandes dificuldades na medida em que a decisão proferida ao abrigo do artigo 121º, ao optar por julgar o mérito da causa em vez de adoptar uma mera providência cautelar é, em bom rigor, uma decisão que se recusa a adoptar providências cautelares e, portanto, uma decisão "respeitante à adopção de providências cautelares" [vide op. cit, pág. 722];
Caso assim não se entenda, o que não se concede mas por cautela de patrocínio se pondera,
D. Requer-se a V. Exªs, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 143º, nº 3 do CPTA, se digne atribuir ao presente recurso um efeito meramente devolutivo, porquanto, a não ser assim, a recorrente poderá celebrar os contratos com os adjudicatários dos "Lotes 1 a 5 e 9 a 13", situação que tornará materialmente impossível, ou excessivamente onerosa, a restauração da situação de facto que existia anteriormente à emissão do acto administrativo impugnado;
E. Pois conforme resulta da sentença recorrida, a recorrida tem como clientes diversas entidades que integram;
F. Ora, a acontecer a celebração dos presentes Acordos Quadro, é manifesto que a recorrida ficará impedida de, durante um período significativo de tempo [entre 2 a 4 anos], prestar serviços ou fornecer bens a pelo menos algumas das entidades que integram o Sistema Nacional de Compras Públicas, as quais tomariam imediatamente a opção de denunciar os contratos presentemente em vigor;
G. Ora, se tal acontecer, a recorrida perderia a posição de vantagem actual que lhe advém de ter negócios com as referidas entidades públicas;
H. A recorrida subscreve o teor constante da douta sentença em recurso, bem como a respectiva fundamentação, não havendo motivo que justifique a procedência do recurso jurisdicional nos termos e com os fundamentos invocados pelos recorrentes, mormente por força de alegado erro nos pressupostos, porquanto não terá a sentença em recurso feito uma correcta interpretação da matéria de facto e, nessa medida, terá violado o disposto no artigo 11º, nº 1 do Programa de Concurso e os artigos 81º, nº 1, alínea b) e nº 8 e 86º, nº 1, alíneas a) e b), ambos do CCP;
I. A recorrente sustenta que a sentença proferida pelo Tribunal «a quo» considerou, erradamente, que relevaria o facto de a proposta apresentada pela recorrida não ter sido excluída inicialmente, i.e., no momento em que a recorrente determinou a caducidade das adjudicações de outros concorrentes que não haviam junto qualquer documento de habilitação exigido no PC.
J. Como é evidente, esta situação releva, e muito, para a boa apreciação do caso «sub iudice».
K. Com efeito, resulta da sentença recorrida que o Tribunal «a quo» determinou a anulação do acto administrativo, não apenas [mas também] porque a entidade adjudicante não "exclui" a recorrida numa fase inicial, mas, sim, porque o fez num momento [após 25-2-2009] em que já tinha emitido um esclarecimento destinado a todos os adjudicatários, sem distinção, e não apenas "... aos adjudicatários chamados para ocupar os lugares das adjudicações cuja caducidade fora, anteriormente declarada..." com a agravante de que, na data da emissão do acto administrativo impugnado mostravam-se reunidos todos os documentos de habilitação da recorrida, sem que aos mesmos tivesse sido apontado qualquer irregularidade.
L. Assim, não procede o primeiro argumento aduzido pela recorrente para sustentar a revogação da sentença recorrida.
M. O presente recurso assenta igualmente na impugnação do facto dado como provado pelo douto Tribunal «a quo», a saber que: "28. Através do aviso de 25-2-2009, a entidade demandada exigiu que os concorrentes apresentassem os certificados de registo criminal e, bem assim, as respectivas "certidões permanentes", o mais tardar, até dia 3 de Março de 2009", uma vez que, segundo a recorrente, mediante tal aviso apenas foi solicitado aos concorrentes [adjudicatários] que submetessem a respectiva "certidão permanente", não tendo sido concedido qualquer prazo adicional para a apresentação das certidões de registo criminal;
N. A mera leitura do aviso de 25-2-2009 permite constatar que não procede o entendimento perfilhado pela recorrente, sendo de concluir que, mediante o mesmo, veio a ora recorrente solicitar aos concorrentes [adjudicatários] que apresentassem os certificados de registo criminal de todos os membros dos respectivos órgãos sociais e, bem assim, a certidão de registo comercial;
O. Atenta a nova prorrogação do prazo concedida pela recorrente, a recorrida, em 3 de Março de 2009, procedeu à submissão a certidão do registo comercial e, a título complementar [porque já tinha apresentado o certificado de registo criminal do seu Administrador-Delegado, sendo este o único Administrador em exercício efectivo de funções], os certificados de registo criminal de todos os membros do respectivo Conselho de Administração;
P. O facto de se estar a lidar com um novo [e complexo] regime legal, sempre deveria justificar que as entidades adjudicantes - como é o caso da recorrente - procurassem, nas peças patenteadas a concurso, clarificar todas as questões legais susceptíveis de criar dúvidas nos interessados e concorrentes, com o objectivo de assegurar, desde logo, o bom andamento dos procedimentos concursais.
Q. Na mesma linha, não se pode aceitar que a recorrente possa invocar que se encontra legitimada a pedir outros documentos de habilitação, ao abrigo do disposto no artigo 81º, nº 8 do CCP, para depois não aceitar os documentos apresentados no prazo fixado pela própria recorrente;
R. Admitindo-se a tese defendida nos presentes autos pela recorrente de que a recorrida estava obrigada a submeter os certificados de registo criminal de todos os respectivos administradores, a recorrente podia [na opinião do Tribunal «a quo»], em 12 de Fevereiro de 2009 - momento em que foi determinada a caducidade da adjudicação de dois concorrentes por falta de apresentação de quaisquer documentos de habilitação -, ter considerado caducada a adjudicação da proposta apresentada pela recorrida, uma vez que a recorrida apenas tinha apresentado o certificado de registo criminal do seu Administrador-Delegado;
S. Assim, é legítimo questionar a tese defendida pela recorrente à luz dos factos que se acabam de enunciar. Com efeito, se a recorrente, como afirma, já tinha decidido, em momento anterior a 25-2-2009, que a adjudicação da recorrida já não era válida, é natural perguntar a razão que conduziu a mesma a não tomar tal decisão no momento em que determinou a caducidade das adjudicações dos demais concorrentes. Na mesma linha de raciocínio, pergunta-se igualmente o que terá levado a recorrente a emitir, em 25-2-2009 o sobredito esclarecimento cujos destinatários foram todos os concorrentes, sem distinção.
T. Pelo que, contrariamente ao que sustenta a recorrente, não é irrelevante que a recorrida não tenha sido "excluída" aquando da primeira decisão tomada pela recorrente, em 12-2-2009, de determinar a caducidade da adjudicação dos concorrentes que não apresentaram quaisquer documentos de habilitação;
U. Ademais, conforme ficou demonstrado supra, a recorrente violou, de forma manifesta, os princípios da igualdade e da concorrência;
V. Com efeito, conforme resulta da matéria dada como provada pelo Tribunal «a quo», a adjudicação das propostas apresentadas, nomeadamente, pelos Concorrentes nº 17 - WWT - Worldwide Trading, Ldª -, e do Concorrente nº 20 - Safira Services - Limpeza e Espaços Verdes, Ldª -, caducou por "não apresentação, no prazo fixado na notificação efectuada através da plataforma no dia 25 de Fevereiro de 2009 com o assunto "Certidões de Registo Criminal e de Registo Comercial" da Certidão de Registo Comercial [...]", pelo que, foi atendida para os concorrentes mencionados a prorrogação do prazo para apresentação dos documentos de habilitação, o que não sucedeu quanto à recorrida, assim se revelando um tratamento diferenciado dos concorrentes no âmbito do presente procedimento concursal;
W. Ora, a diferenciação de tratamento dos concorrentes no âmbito do procedimento concursal «sub iudice», sem que nada o justifique, é violadora dos princípios da igualdade e da concorrência, consagrados expressa e nomeadamente no artigo 1º, nº 4 do CCP e, ainda, nos artigos 5º e 6º do CPA;
X. Atento o exposto, não procede o entendimento perfilhado pela recorrente de que a sentença recorrida não fez uma correcta interpretação da matéria de facto apurada, pelo que a mesma não padece de erro nos pressupostos e, consequentemente, deverá ser mantida a decisão de anulação do acto administrativo «sub iudice»;
Y. Ainda que o recurso interposto pela recorrente procedesse, o que não se concede, nunca o pedido impugnatório da recorrida poderia improceder, dado que o acto administrativo impugnado padece de outras ilegalidades, as quais foram enunciados no requerimento de providência cautelar.
Z. Contudo, não tendo as referidas ilegalidades sido apreciadas pelo Tribunal «a quo», justifica-se na opinião da recorrida a sua análise por este Venerando Tribunal Superior. Nestes termos, a recorrida requer, ao abrigo do disposto no artigo 684º-A do CPCivil [aplicável «ex vi» do artigo 1º do CPTA] e do artigo 149º do CPTA, a ampliação do objecto do presente recurso;
AA. A recorrida invocou, expressamente, como fundamento para a anulação do acto impugnado a violação do princípio da estabilidade das peças do procedimento, pois na sua opinião a recorrente subverteu as regras concursais estabelecidas no Programa de Concurso, uma vez que exigiu dos concorrentes que apresentassem os certificados de registo criminal e, bem assim, as respectivas "certidões permanentes" [isto é, o mais tardar, até dia 3 de Março, conforme definido pela Recorrente], quando, na verdade, em lado algum do algum do Programa de Concurso, é exigida a apresentação destes documentos;
BB. Contudo, o Tribunal «a quo» decidiu não apreciar - a entender da recorrida, mal - esta questão por considerar que a "A. não questiona a exigência em si, mas o momento em que a mesma surge, uma vez que não foi anunciada no programa de concurso e só através do aviso de 25-2-2009, ou seja, já depois da declaração de caducidade dos concorrentes que não tinham apresentado qualquer dos documentos de habilitação exigidos é que é anunciada. Porém, tais considerações irrelevam para a economia dos autos, uma vez que não constituem qualquer dos fundamentos de anulação invocados";
CC. Razão pela qual se requer a este Venerando Tribunal Superior que reaprecie favoravelmente esta questão, isto é, no sentido de considerar que existiu por parte da recorrente uma violação do princípio da estabilidade das peças do procedimento concursal e, consequentemente, determine a revogação da douta sentença nesta parte.
DD. Por outro lado, requer-se a apreciação do argumento enunciado pela recorrida no requerimento da providência cautelar e na acção principal, segundo o qual o acto administrativo impugnado está inquinado de vício de violação de lei, por não ter sido respeitado o direito da recorrida a ser ouvida em sede de audiência prévia antes de ser proferido o sobredito acto administrativo;
EE. Com efeito, a recorrida foi confrontada com a caducidade da adjudicação que lhe havia sido concedida, sem que a recorrente lhe tenha dado a oportunidade de se pronunciar sobre as razões de facto e de direito que presidiram à prolação da mesma, sendo que estes factos foram dados como provados pelo Meritíssimo Tribunal «a quo» e com relevo para a decisão do mérito da causa [cfr. nº 21 da Fundamentação de Facto da sentença recorrida];
FF. Ora, na esteira da imposição constitucional de participação dos interessados na formação das decisões que lhes digam respeito [vide artigo 267º, nº 5 da CRP], o CPA estabelece, no seu artigo 100º, o direito de audiência dos interessados no procedimento, antes de ser tomada a decisão final;
GG. O direito de audiência prévia reconduz-se a dois princípios gerais da actividade administrativa contemplados no CPA, concretamente o princípio da colaboração da Administração com os particulares, previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 7º, e o princípio da participação, previsto no respectivo artigo 8º;
HH. O direito de audiência prévia, consagrado no nº 1 do artigo 100º do CPA, consiste, assim, num princípio estruturante, no que respeita ao processamento da actividade administrativa, devendo o mesmo ser entendido, não apenas como um direito meramente formal de o interessado no procedimento apresentar/dizer aquilo que lhe aprouver, como, sobretudo, o direito de o interessado ser efectivamente ouvido pela Administração;
II. A este respeito, cumpre notar que a deliberação «sub iudice», pese embora não seja a deliberação de adjudicação [nos termos do disposto no artigo 73º do CCP], reveste-se, «in fine», dos seus efeitos, porquanto determina a consumação da adjudicação das propostas de determinados concorrentes e a exclusão dos demais, i.e., só neste momento se torna efectiva a adjudicação;
JJ. Nesta medida, tendo a deliberação sob análise determinado a caducidade de adjudicação da proposta da recorrida, a recorrente tinha o dever legal de ouvir a recorrida sobre o projecto da deliberação que pretendia tomar;
KK. E não se diga que a fase de habilitação dos concorrentes constitui uma mera fase de apresentação de documentos, pois esta fase procedimental é merecedora de dignidade no âmbito dos procedimentos pré-contratuais previstos no CCP e, ademais, é por demais evidente que esta fase de habilitação dos concorrentes acarreta consequências de particular relevo e impacto nos mesmos.
LL. Por tudo isto, entende a recorrida que a recorrente violou o direito de audiência prévia que lhe assistia nos termos do artigo 100º do Código do Procedimento Administrativo, na medida em que, perante o projecto de decisão de caducidade de adjudicação da sua proposta, a recorrente tinha o dever legal de lhe conceder o direito de se pronunciar sobre tal decisão que determinara o seu afastamento do procedimento concursal em apreço;
MM. Ora, a preterição do direito de audiência prévia por parte da recorrente consubstancia uma preterição de uma formalidade essencial do acto administrativo impugnado, a qual determina a nulidade da deliberação sob análise, ou caso assim não se entenda, a anulabilidade dessa deliberação;
NN. Ademais, a recorrida entende que o acto administrativo impugnado está inquinado de vício de forma, por falta de fundamentação, porquanto na deliberação «sub iudice», a recorrente, para justificar a caducidade da adjudicação da proposta da recorrida, se limitou a fazer uma mera remissão para um preceito legal, aplicável segundo ela ao caso concreto, a saber que a recorrida terá incumprido o disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 11º do PC e da alínea b) do nº 1 do artigo 81º do CCP;
OO. Ora, como é evidente tal remissão não permite objectivamente à recorrida apreender os factos e motivações que determinaram a subsunção daqueles ao disposto no artigo 86º do CCP, ou seja, à caducidade de adjudicação da sua proposta para os lotes 1, 2, 4, 5 e 9 a 13;
PP. Tal fundamentação é legalmente exigida, ao abrigo do disposto no artigo 124º do Código do Procedimento Administrativo e deverá, com o devido respeito, no mínimo, consistir na identificação da situação real [os factos] em apreço, a subsunção da mesma na norma jurídica e, por último, na enunciação das respectivas consequências para o interessado;
QQ. A recorrente dispensou-se, ao abrigo de uma mera remissão legal, de sustentar os factos e a subsunção dos mesmos ao direito que determinaram uma decisão tão gravosa quanto a decisão de caducidade da adjudicação da proposta apresenta pela recorrida;
RR. Ora, o dever de fundamentação de actos administrativos desfavoráveis resulta expressamente da alínea a) do nº 1 do artigo 124º do CPA e encontra consagração constitucional no nº 3 do artigo 268º da Constituição da República Portuguesa [CRP] a um verdadeiro direito fundamental de natureza análoga;
SS. O dever de fundamentação expressa é ainda um incentivo à ponderação cuidada dos vários interesses em presença, bem como dos danos que potencialmente possam advir de prática de uma determinada decisão;
TT. A jurisprudência tem sido claramente unânime quanto à necessidade de um acto administrativo invocar as razões de facto que consubstanciaram a tomada de decisão, independentemente de ser favorável ou não ao interessado;
UU. A violação do dever de fundamentação determina a ilegalidade da deliberação em apreço, sendo a mesma anulável, pelo que a sentença recorrida, também por força deste vício, concluiria no sentido de considerar procedente o pedido impugnatório, declarando a anulação do acto administrativo impugnado".

A entidade recorrente pronunciou-se sobre o pedido de ampliação do objecto do recurso, nos termos constantes de fls. 688/707, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, concluindo pela improcedência dos respectivos fundamentos.

Por despacho de fls. 711 foi o recurso admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo.

O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste TCA Sul, notificado, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º, nº 1 e 147º do CPTA, para emitir parecer, querendo, nada disse.

Sem vistos, vêm os autos à conferência para julgamento.

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A sentença recorrida deu como assente a seguinte factualidade:
i. Por Anúncio nº 266642, publicado no JOUE S 201, de 16 de Outubro de 2008, e nº 187/2008, publicado no Diário da República, II Série, nº 200, de 15 de Outubro de 2008, foi aberto o "Concurso público para selecção de fornecedores de produtos de higiene e de prestadores de serviços de limpeza" pela entidade ora demandada;
ii. A entidade demandada, enquanto entidade gestora do Sistema Nacional de Compras Públicas, lançou o Concurso nos termos das peças concursais aprovadas - cfr. Programa do Concurso, Anúncio do Procedimento nº 187/2008 e Caderno de Encargos, juntos ao r.i., respectivamente como documentos nºs 2, 3 e 4.
iii. O Concurso tem por objecto a celebração de um acordo quadro para a selecção de fornecedores de produtos de higiene e de prestadores de serviços de limpeza [incluindo fornecimento de produtos de higiene] em todo o território nacional, Portugal Continental e Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
iv. Nos termos do previsto no artigo 1º do Programa de Concurso, o acordo quadro referido incluirá, respectivamente, os seguintes lotes regionais e nacionais:
a) Fornecimento de Produtos de Higiene:
i) Lote 1 - Produtos de Higiene para a Região Norte;
ii) Lote 2 - Produtos de Higiene para a Região Centro;
iii) Lote 3 - Produtos de Higiene para a Região Lisboa e Vale do Tejo;
iv) Lote 4 - Produtos de Higiene para a Região Alentejo;
v) Lote 5 - Produtos de Higiene para a Região Algarve;
vi) Lote 6 - Produtos de Higiene para a Região Autónoma dos Açores;
vii) Lote 7 - Produtos de Higiene para a Região Autónoma da Madeira;
viii) Lote 8 - Produtos de Higiene a nível Nacional;
b) Prestação de Serviços de Limpeza e fornecimento de produtos de higiene:
i) Lote 9 - Serviços de Limpeza para a Região Norte;
ii) Lote 10 - Serviços de Limpeza para a Região Centro;
iii) Lote 11 - Serviços de Limpeza para a Região Lisboa e Vale do Tejo;
iv) Lote 12 - Serviços de Limpeza para a Região Alentejo;
v) Lote 13 - Serviços de Limpeza para a Região Algarve;
vi) Lote 14 - Serviços de Limpeza para a Região Autónoma dos Açores;
vii) Lote 15 - Serviços de Limpeza para a Região Autónoma da Madeira;
viii) Lote 16 - Serviços de Limpeza a nível Nacional.
v. Ao abrigo do referido acordo quadro, os concorrentes seleccionados irão celebrar contratos de fornecimento de produtos de higiene e de prestação de serviços de limpeza com as entidades compradoras vinculadas e voluntárias que integram o Sistema Nacional de Compras Públicas, nos termos do Decreto-Lei nº 37/2007, de 19 de Fevereiro.
vi. A ora requerente apresentou a respectiva proposta, no dia 5 de Dezembro de 2008, para os lotes 1 a 5 e 9 a 13.
vii. Analisadas as propostas e tendo em conta o critério de adjudicação estabelecido no artigo 4º do Programa do Concurso - o critério do preço mais baixo - o Júri do Concurso, no respectivo Relatório Preliminar, procedeu à ordenação e selecção das propostas classificadas nos dez primeiros lugares para efeitos de celebração do Acordo Quadro - cfr. documento nº 2 e Relatório Preliminar, que constitui documento nº 5.
viii. De acordo com o referido relatório, a requerente ficou classificada do seguinte modo:
a) Lote 1: 9º lugar;
b) Lote 2: 10º lugar;
c) Lote 3: 11º lugar;
d) Lote 4: 10º lugar;
e) Lote 5: 10º lugar;
f) Lote 9: 1º lugar;
g) Lote 10: 1º lugar;
h) Lote 11: 1º lugar;
i) Lote 12: 1º lugar;
j) Lote 13: 1º lugar.
ix. Em 21-1-2009, a requerente foi notificada:
"(i) Da decisão final do concurso, adoptada pelo Conselho de Administração da Entidade Requerida, de 19 de Janeiro de 2009, nos termos da qual lhe seriam adjudicados os lotes 1, 2, 4, 5 e 9 a 13;
(ii) Do pedido de apresentação dos documentos de habilitação exigidos nos termos do artigo 81º do CCP e no artigo 11º° do Programa de Concurso, até ao dia 4 de Fevereiro de 2009;
(iii) Para, nos termos do artigo 100º, nº 2 e 101º do CCP, se pronunciar por escrito, até ao dia 28 de Janeiro de 2008, sobre o teor das minutas do contrato; e,
(iv) Da solicitação do preenchimento dos campos em branco das minutas de contrato" - cfr. documento nº 6 junto ao r.i..
x. Por e-mail datado de 28-1-2009, a requerente apresentou os seus comentários, por escrito, sobre as minutas de contrato que lhe foram remetidas, tendo igualmente indicado os elementos necessários para o preenchimento dos campos em branco destas mesmas minutas, comentários estes em relação aos quais nunca obteve resposta - cfr. documento nº 7 junto ao r.i..
xi. Nesse mesmo e-mail, a requerente alertou a entidade requerida para as dificuldades de natureza técnica verificadas na "...colocação dos documentos de habilitação na área de procedimentos respondidos, disponível no portal https://concursos.ancp.gov.pt quando a A...selecciona o procedimento o botão de "documentos de habilitação" não se encontra disponível para edição, apenas os seguintes "ver processo de concurso", "informação dos concorrentes" e "solicitar esclarecimento". Como deveremos então enviar os documentos de habilitação? Esta solicitação de esclarecimento vai de igual modo ser colocada na plataforma".
xii. Após o que, no próprio do dia do envio do e-mail supra referido, foi publicado na plataforma electrónica da entidade requerida o seguinte esclarecimento:
"Considerando que o prazo dado aos concorrentes seleccionados no "concurso público para selecção de fornecedores de produtos de higiene e de prestadores de serviços de limpeza", para a entrega dos documentos de habilitação, nos termos do artigo 77º do CCP, termina hoje, dia 28 de Janeiro de 2009;
Considerando que não foi possível aos concorrentes seleccionados até à data estipulada entregarem os documentos de habilitação, através de plataforma electrónica, uma vez que esta funcionalidade não se encontrava disponível e considerando que hoje, dia 28 de Janeiro esta funcionalidade ficará disponível;
Informam-se todos os concorrentes seleccionados que o prazo para entrega dos documentos supra referidos, através da plataforma electrónica, foi prorrogado por mais 10 dias úteis, até ao dia 11 de Fevereiro de 2009." - cfr. documento nº 8.
xiii. Na sequência da referida notificação, a requerente submeteu, atempadamente, no dia 11-2-2009, os documentos de habilitação solicitados e exigidos no Programa de Concurso, a saber:
"a) Declaração referida na alínea a), conforme Anexo VI disponível no portal https://concursos.ancp.gov.pt,  e os documentos referidos na alínea b), ambas do nº 1 do artigo 81º do Código dos Contratos Públicos, entre os quais o certificado de registo criminal do seu Administrador-Delegado, o Senhor Dr. Ricardo Alexandre Ponce de Mascarenhas, o único administrador da requerente que se encontra efectivamente em funções;
b) Informação Empresarial Simplificada [IES] referente aos anos de 2006 e 2007, entregue para efeitos fiscais e comprovativo da entrega da referida declaração;
c) Declaração na qual indica, em relação aos dois últimos anos, os valores das rubricas das peças contabilísticas fundamentais, relativas aos produtos ou serviços objecto do presente concurso, utilizando para o efeito o formulário do Anexo II do programa de concurso, disponível no portal https://concursos.ancp.gov.pt 8;
d) Declarações de clientes, em número mínimo de 4 [quatro], relativas a fornecimentos de produtos de higiene ou a prestação de serviços de limpeza;
e) Declarações de remunerações dos trabalhadores ao seu serviço efectuadas à Segurança Social, relativas ao último ano;
f) Documento comprovativo da certificação de qualidade para fornecimento de produtos de higiene ou prestação de serviços de limpeza".
xiv. No dia 12-2-2009, a requerente foi notificada da publicação de um aviso na plataforma electrónica com o assunto «Documentos de Habilitação» correspondente ao procedimento em apreço.
xv. O referido aviso respeitava a uma notificação efectuada nos termos do artigo 86º, nº 3 do CCP, do Concorrente nº 4, "Lusoquímica - Produtos Químicos de Manutenção Industrial, Ldª", seleccionado para o Lote 3; do Concorrente nº 16, "Operandus - Limpeza Profissional, Ldª", seleccionado para os Lotes 10, 11 e 12 para efeitos de apresentação dos documentos de habilitação enunciados no artigo 11º, nº 1 do Programa de Concurso, sem que o mesmo aviso tivesse qualquer fundamentação para além da referência ao mencionado preceito legal - cfr. documento nº 9 [e não 10, como por lapso é referido no probatório da sentença recorrida], junto ao r.i., a fls. 289/290, vol II dos autos.
xvi. Posteriormente, em 25-2-2009, foi a requerente notificada, por correio electrónico, que teria sido publicado um aviso na plataforma electrónica com o assunto «Certidões de Registo Criminal e de Registo Comercial» - cfr. documento nº 10 [e não 11, como por lapso é referido no probatório da sentença recorrida] junto ao r.i., a fls. 291/292, vol. II dos autos.
xvii. O supra referido aviso referia, expressamente, que a comprovação de que os adjudicatários não se encontram nas situações previstas nas alíneas b) e i) do artigo 55º do CCP é obrigatoriamente feita mediante:
"a) Apresentação de certidões do registo criminal de todos os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência, que se encontrem em efectividade de funções;
b) Apresentação de certidão do registo comercial do adjudicatário, com todas as inscrições em vigor, ou disponibilização do código de acesso para a sua consulta online, nos termos previstos no nº 2 do artigo 83º do CCP, no nº 5 do artigo 75º do Código de Registo Comercial e no artigo 17º da Portaria nº 1416-A/2006, de 19 de Dezembro, para comprovação da identidade dos titulares dos referidos órgãos e do pleno cumprimento da obrigação da alínea anterior".
xviii. Mais previa a referida notificação que:
"Atendendo a que o Programa do Concurso não especifica a obrigatoriedade de apresentação da certidão do registo comercial ou de disponibilização do código de acesso, embora estes actos, por serem instrumentais da referida comprovação, decorram da adequada interpretação da lei, entende a B...fixar o prazo até às 17h00m do próximo dia 3 de Março de 2009, para apresentação da certidão do registo comercial ou disponibilização do código de acesso para a sua consulta online, sob pena de caducidade da adjudicação, nos termos do disposto no artigo 86º do CCP...".
xix. A requerente, em 3-3-2009, procedeu à submissão da certidão do registo comercial e, a título complementar, dos certificados de registo criminal dos membros do seu Conselho de Administração - cfr. documento nº 11 [e não 12, como por lapso é referido no probatório da sentença recorrida] junto ao r.i., a fls. 293/301 dos autos.
xx. Em 6-3-2009, a requerente foi notificada da deliberação tomada pela entidade requerida, em 5-3-2009, nos termos da qual foi decidido:
"Considerar a adjudicação caducada, nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 86º do CCP, quanto aos concorrentes que não apresentaram, no prazo fixado no PC, todos os documentos de habilitação referidos no nº 1 do artigo 11º do PC e os concorrentes que não cumpram os requisitos previstos no artigo 5º do PC, com os seguintes fundamentos:
[...]
- Concorrente nº 30, A...- Controlo de Ambiente, SA [lotes 1 a 5 e 9 a 13], pela não apresentação, no prazo fixado no PC, em relação a todos os titulares dos órgãos de gerência, de certidão do registo criminal comprovativa de não se encontrar em nenhuma das situações previstas nas alíneas b) e i) do artigo 55º do CCP, em incumprimento do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 11º do PC e da alínea b) do nº 1 do artigo 81º do CCP; a falta deste documento impediu, ainda, a comprovação da condição constante da alínea a) do nº 1 do artigo 5º do PC" - cfr. documento nº 1.
xxi. A requerente não foi notificada de qualquer projecto de decisão nesse sentido de que a adjudicação da sua proposta para os lotes 1, 2, 4, 5 e 9 a 13 havia caducado.
xxii. A requerente impugnou administrativamente a referida deliberação, mediante a apresentação de reclamação perante a entidade requerida.
xxiii. A entidade demandada, através de deliberação de 24-3-2009, indeferiu a mencionada reclamação - cfr. documento nº 12 [e não 13, como por lapso é referido no probatório da sentença recorrida] junto ao r.i., a fls. 302/316 dos autos.
xxiv. O Programa de Concurso, no seu artigo 11º, previa que os documentos de habilitação deveriam ser apresentados pelos concorrentes seleccionados, no prazo de dez dias a contar da decisão de selecção, a saber:
"a) Declaração referida na alínea a), conforme Anexo VI disponível no portal https://concursos.ancp.gov.pt,  e os documentos referidos na alínea b), ambas do nº 1 do artigo 81º do Código dos Contratos Públicos.
b) Informação Empresarial Simplificada [IES] referente aos anos de 2006 e 2007, entregue para efeitos fiscais e comprovativo da entrega da referida declaração, que deverão ser enviados em ficheiro com a designação "IES_[designação_empresa]_[ano].pdf";
c) Declaração do concorrente na qual indique, em relação aos dois últimos anos, os valores das rubricas das peças contabilísticas fundamentais, relativas aos produtos ou serviços objecto do presente concurso, utilizando o formulário do Anexo II a este programa de concurso, disponível no portal https://concursos.ancp.gov.pt, que deverá ser enviada num ficheiro com a designação "Anexo_II_[designação_empresa].xls";
d) Declarações de clientes, em número mínimo de 4 [quatro], relativas a fornecimentos de produtos de higiene ou a prestação de serviços de limpeza, consoante o(s) lote(s) a que concorram, que tenham totalizado, desde 1 de Janeiro de 2007 até à data da apresentação da proposta, os valores referidos nos pontos (i) e (ii), da alínea d) do artigo 5º deste programa de concurso, que deverá ser enviada num ficheiro com a designação "Declarações_Clientes_[designação_empresa].pdf";
e) Declarações de remunerações dos trabalhadores ao seu serviço efectuadas à Segurança Social pelo concorrente que concorra, pelo menos, a um dos lotes 9 a 16, relativas ao último ano, que deverá ser enviada num ficheiro com a designação "DR-SS_xx-yy_[designação_empresa].pdf", onde xx deve indicar o mês e yy o ano a que se referem as declarações;
f) Documento comprovativo da certificação de qualidade do concorrente para fornecimento de produtos de higiene ou prestação de serviços de limpeza, conforme o caso, em conformidade com as normas ISO 9001 e, se for o caso, ISO 14001 ou equivalente, que deverão ser enviados em ficheiros com a designação "ISO_9001_[designação_empresa].pdf" e "ISO_14001_[designação_empresa].pdf", respectivamente".
xxv. A requerente apresentou no dia 11 de Fevereiro de 2009, apenas o certificado de registo criminal respeitante ao seu Administrador-Delegado, o Senhor Dr. Ricardo Alexandre Ponce de Mascarenhas - cfr. Documento nº 8.
xxvi. Desde a nomeação do Sr. Dr. Ricardo Alexandre Ponce de Mascarenhas como Administrador-Delegado, todos os actos de administração têm sido praticados pelo mesmo sem qualquer intervenção dos demais membros do Conselho de Administração da requerente.
xxvii. A adjudicação das propostas apresentadas pelos concorrentes nº 17 - WWT - Worldwide Trading, Ldª - e nº 20 - Safira Services - Limpeza e Espaços Verdes, Ldª -, caducaram por "não apresentação, no prazo fixado na notificação efectuada através da plataforma no dia 25 de Fevereiro de 2009 com o assunto "Certidões de Registo Criminal e de Registo Comercial" da Certidão de Registo Comercial [...]".
O facto constante do probatório sob o nº xxvii. [os dois demais membros do Conselho de Administração da requerente não exercem, de facto, quaisquer funções na mesma sociedade, não tendo, até ao momento, praticado qualquer acto em nome da requerente], por ser manifestamente conclusivo e estar em contradição com o teor da certidão do registo comercial de fls. 293/298, é eliminado do probatório, sendo o facto constante do ponto nº xxviii. igualmente eliminado, por estar em contradição com a matéria de facto dada como assente nos pontos nºs xvi. a xviii. do probatório [cfr. artigo 712º, nº 1, alínea b) do CPCivil].

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Sendo esta a matéria de facto relevante, importa, antes de analisar o mérito do recurso, decidir a questão colocada pela recorrida Climex, no sentido de ver fixado ao mesmo o efeito meramente devolutivo.
Entende a recorrida A...que se não for fixado efeito meramente devolutivo ao recurso, ficará exactamente na mesma situação em que estaria se não tivesse deduzido uma providência cautelar [que não lhe foi concedida, não obstante o Tribunal ter entendido que lhe assistia razão, daí o ter antecipado o julgamento da causa principal], nem uma decisão final favorável susceptível de produzir efeitos imediatos.
Afigura-se-nos que tal argumentação é de aceitar. Vejamos porquê.
Não obstante se poder entender que o recurso da decisão de antecipar o julgamento da causa não coincide com o recurso duma decisão que adopta uma providência cautelar, constituindo antes uma pronúncia sobre a própria matéria do processo principal, ao qual, por esse facto, deveria ser atribuído efeito suspensivo, por não respeitar verdadeiramente ao recurso duma decisão respeitante à adopção de providência cautelar, o certo é que as consequências dessa decisão se afiguram inaceitáveis, por virem a redundar na denegação da tutela cautelar [cfr., neste sentido, Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, no Comentário ao CPTA, Almedina, 2005, a págs. 624/625, em anotação ao artigo 121º do CPTA].
É que é preciso não esquecer que uma decisão que, ao abrigo do disposto no artigo 121º do CPTA, antecipa o julgamento da causa principal, será, regra geral, favorável ao requerente da providência, como foi o caso presente. Ora, se os efeitos dessa sentença favorável ficarem suspensos, por força do efeito típico dos recursos previstos no CPTA [cfr. artigo 143º, nº 1], o interessado fica necessariamente na mesma situação em que se encontraria se não tivesse instaurado uma providência cautelar ou esta tivesse sido indeferida [o que foi o caso dos autos, em que o Tribunal se absteve de decretar a providência por ter considerado que assistia razão à requerente da mesma, por via do juízo antecipatório que fez sobre o mérito da causa principal], e sem ter uma decisão final favorável que produza efeitos imediatos.
Daí que os autores citados defendam que "as razões expostas justificam que se efectue uma interpretação extensiva do artigo 143º, nº 2 do CPTA, em conformidade com o princípio constitucional da tutela judicial efectiva, de modo a enquadrar as decisões sobre o mérito da causa que forem proferidas ao abrigo do artigo 121º do CPTA na categoria das «decisões respeitantes à adopção de providências cautelares» a que aquele preceito se refere - o que não parece, de resto, suscitar grandes dificuldades na medida em que a decisão proferida ao abrigo do artigo 121º, ao optar por julgar o mérito da causa em vez de adoptar uma mera providência cautelar, é, em bom rigor, uma decisão que se recusa a adoptar providências cautelares e, portanto, uma decisão «respeitante à adopção de providências cautelares»" [cfr., os autores e obra citados, a págs. 625, em anotação ao artigo 121º do CPTA].
Daí que, e em consequência, deferindo ao requerido, fixa-se ao presente recurso efeito meramente devolutivo. * * * * * *Vejamos então agora o mérito do recurso.
A recorrente - B..., EPE - discorda da sentença recorrida, na medida em que esta considerou que a solicitação efectuada em 25-2-2009, na plataforma electrónica, autorizava a A...a apresentar os CRC's dos titulares dos seus órgãos sociais e que se encontravam em falta [dois], até ao dia 3-3-2009, e que portanto considerou não ter a adjudicação caducado, nos termos do artigo 86º, nº 1 do CCP, deste modo anulando a deliberação daquela entidade, de 5-3-2009, que decidira que a adjudicação caducara.
Vejamos se assiste razão à recorrente ANCP, EPE.
O Programa do Concurso, no tocante à admissão dos concorrentes que iriam ser partes no acordo quadro, estabelecia no nº 1, alínea a) do artigo 5º, sob a epígrafe "Concorrentes", o seguinte:
"1- Serão admitidos os concorrentes que cumpram, cumulativamente, os seguintes requisitos:
a) Não se encontrar em nenhuma das situações referidas no artigo 55º do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei nº 18/2008, de 29 de Janeiro".
O cumprimento destes requisitos por parte dos concorrentes seleccionados, os adjudicatários no presente acordo quadro, tinha de ser obrigatoriamente comprovado através dos documentos de habilitação exigidos nos termos do artigo 11º do Programa do Concurso, e do artigo 81º, nº 1 do CCP, aprovado pelo DL nº 18/2008, de 29 de Janeiro.
Com efeito, sob a epígrafe "Documentos de Habilitação", dispunha o artigo 11º, nº 1 do Programa do Concurso o seguinte:
"1- Cada concorrente seleccionado deve entregar no prazo de 10 [dez] dias a contar da notificação da decisão de selecção os seguintes documentos de habilitação:
a) Declaração referida na alínea a), conforme Anexo VI disponível no portal https://concursos.ancp.gov.pt 8, e os documentos referidos na alínea b), ambas do nº 1 do artigo 81º do Código dos Contratos Públicos".
Por seu turno, o artigo 81º, nº 1, alínea b) do CCP, determina que:
"1 - Nos procedimentos de formação de quaisquer contratos, o adjudicatário deve apresentar os seguintes documentos de habilitação:
[...]
b) Documentos comprovativos de que não se encontra nas situações previstas nas alíneas b), d), e) e i) do artigo 55º".
Finalmente, o artigo 55º, alíneas b) e i) do CCP prevê que não podem ser candidatos, concorrentes ou integrar qualquer agrupamento as entidades que:
"[...]
b) Tenham sido condenadas por sentença transitada em julgado por qualquer crime que afecte a sua honorabilidade profissional, se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação, no caso de se tratar de pessoas singulares, ou, no caso de se tratar de pessoas colectivas, tenham sido condenados por aqueles crimes os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência das mesmas e estes se encontrem em efectividade de funções;
[...]
i) Tenham sido condenadas por sentença transitada em julgado por algum dos seguintes crimes, se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação, no caso de se tratar de pessoas singulares, ou, no caso de se tratar de pessoas colectivas, tenham sido condenados pelos mesmos crimes os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência das mesmas e estes se encontrem em efectividade de funções, se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação".
Uma vez que o CCP inovou, relativamente ao regime da contratação pública até aí vigente, no sentido de acabar com o acto público, enquanto fase de habilitação prévia, a que estavam sujeitos todos os concorrentes, passando tal fase de habilitação para um momento posterior à escolha dos concorrentes, todos aqueles que fossem seleccionados [os adjudicatários] tinham, assim, que apresentar os documentos de habilitação no prazo de 10 [dez] dias a contar da notificação da decisão de selecção [cfr. o citado artigo 11º, nº 1 do Programa do Concurso, e o artigo 77º, nº 2, alínea a) do CCP].
Daí que, por força do disposto no artigo 86º, nº 1, alínea b) do CCP, em caso de incumprimento da referida obrigação, a adjudicação caducava, obrigatoriamente, para os adjudicatários faltosos, "se, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não apresentar os documentos de habilitação [...] no prazo fixado pelo órgão competente para a decisão de contratar, no caso previsto no nº 8 do artigo 81º".
Conforme foi dado como assente pela sentença recorrida, a A...foi notificada da decisão final do concurso [a deliberação da ora recorrente de 19-1-2009], em 21-1-2009, para apresentar os aludidos documentos de habilitação até ao dia 4-2-2009, o qual foi posteriormente prorrogado, mediante aviso publicado na plataforma electrónica em 28-1-2009, até ao dia 11-2-2009.
E, como também foi dado como assente, a A...submeteu, até essa data, e entre outros documentos de habilitação, o certificado de registo criminal do seu Administrador-Delegado, Ricardo Alexandre Ponce de Mascarenhas, mas não já dois seus dois outros administradores, como a própria A...veio a reconhecer, ao só entregar os respectivos CRC's em falta no dia 3-3-2009.
Como a comprovação da não verificação dos impedimentos previstos nas alíneas b) e i) do artigo 55º do CCP só pode ser feita através da apresentação das certidões de registo criminal de todos os titulares dos órgãos sociais da administração, direcção ou gerência, que se encontrem em efectividade de funções, a recorrente entendeu que a comprovação de que as certidões de registo criminal apresentadas pelos adjudicatários correspondiam às de todos os titulares dos seus órgãos sociais de administração, direcção ou gerência apenas podia ser feita por recurso à certidão do registo comercial.
Daí que, por aviso publicitado na plataforma electrónica em 25-2-2009, solicitou a todos os adjudicatários que apresentassem a respectiva certidão do registo comercial, por forma a permitir-lhe comprovar a identidade dos titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência, que se encontravam em efectividade de funções, fixando para o efeito um prazo até às 17h00m do dia 3-3-2009.
Ora, como se viu da matéria de facto dada como assente, só com o referido aviso é que a A...veio, em 3-3-2009, apresentar não só a certidão de registo comercial que lhe era solicitada, mas também a certidão de registo criminal dos restantes membros do seu Conselho de Administração, o que levou a entidade recorrente a considerar que a apresentação, naquela data, das certidões de registo criminal dos restantes membros do seu Conselho de Administração era extemporânea, deliberando desse modo considerar caducada a adjudicação.
A sentença recorrida, apreciando a factualidade supra-descrita, considerou que do esclarecimento de 25-2-2009 não resultava que o mesmo só se destinava aos adjudicatários chamados para ocupar os lugares das adjudicações cuja caducidade fora anteriormente declarada e só restritamente, se aplicaria aos demais.
Efectivamente, tal esclarecimento, veiculado pelo aviso de 25-2-2009 tinha como destinatários todos os adjudicatários, tendo em vista respeitar o princípio da igualdade, uma vez que todos eles - fossem aqueles que nessa qualidade foram considerados na deliberação da recorrente de 19-1-2009, fossem os que foram chamados em 12-2-2009 - tinham que proceder à apresentação da certidão do registo comercial.
Porém, do teor desse aviso não pode concluir-se que foi concedido um prazo adicional para a apresentação das certidões do registo criminal, visto que o prazo para esse efeito havia terminado no dia 11-2-2009.
De resto, como salienta a recorrente, a solicitação de documentos comprovativos da habilitação dos adjudicatários, mesmo que tal não constasse do programa de procedimento, é expressamente admitida no artigo 81º, nº 8 do CCP, sem que com isso resulte violado o princípio da estabilidade das peças do concurso.
Deste modo, e contrariamente ao que resulta da sentença recorrida, não foi concedido nenhum prazo adicional para a apresentação de qualquer documento de habilitação, à excepção das aludidas certidões do registo comercial - nem poderia sê-lo, uma vez que o artigo 81º, nº 2 do CCP só admite a apresentação de documentos de habilitação para além do prazo fixado quando tal se verifique por facto não imputável ao adjudicatário, o que não é, manifestamente, o caso.
Assim, é possível concluir que o fim subjacente ao aviso de 25-2-2009 era o de que a apresentação da certidão do registo comercial se destinava à comprovação da identidade dos titulares dos referidos órgãos e do pleno cumprimento da obrigação de apresentação, no prazo fixado - 11-2-2009 -, das certidões do registo criminal de todos os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência, que se encontrassem em efectividade de funções, não tendo o mesmo o efeito de conceder qualquer prazo adicional para a apresentação das certidões de registo criminal, nem beneficiar nenhum adjudicatário em detrimento de outros.
Por outro lado, ao contrário do que entendeu a sentença recorrida, não colhe o entendimento de que a ora recorrente deveria ter declarado a caducidade da adjudicação das propostas da recorrida entes da emissão dos esclarecimentos de 25-2-2009, por não fazer sentido solicitar a certidão do registo comercial quando já sabia que aquela só havia apresentado um certificado de registo criminal, isto porque, sendo aquela uma sociedade anónima, necessariamente que haveria de ter mais do que um administrador.
Tal conclusão, contida na sentença recorrida, foi no mínimo precipitada, já que na verdade, só na posse da referida certidão do registo comercial é que a recorrente podia ficar a saber quem é que efectivamente integrava a administração da Climex, pois a efectiva situação dos seus órgãos sociais de administração, com a demonstração de que os restantes administradores não estavam suspensos de funções ou destituídos, só poderia ser comprovada com a apresentação da certidão do registo comercial, pelo que só depois do conhecimento desse facto era possível extrair a conclusão de que aquela adjudicatária não havia apresentado no prazo fixado todas as CRC's exigidas, o que acarretava, como decorre do disposto no artigo 86º, nº 1 do CCP, a caducidade da adjudicação.
Ora, como sustenta com acerto a recorrente, só foi possível ter a certeza desses factos com a verificação, através da apresentação da certidão de registo comercial, de qual a concreta situação dos órgãos sociais de administração da Climex, pois do teor da aludida certidão é que foi possível verificar que os três membros do Conselho de Administração da A...se encontravam em efectividade de funções.
Deste modo, conclui-se que a apresentação dos dois CRC's em falta por parte da A...em 3-3-2009, foi efectivamente extemporânea, posto que o prazo que para o efeito havia sido concedido, terminara em 11-2-2009.
E então, qual a consequência da não junção tempestiva dos CRC's dos restantes membros do conselho de administração da Climex?
Para a recorrente, a não junção desses documentos de habilitação tinha como consequência necessária a caducidade da adjudicação, como decorre do disposto no artigo 86º, nº 1 do CCP, como efeito automático e sem necessidade de quaisquer outras formalidades, nomeadamente com a dispensa do cumprimento do direito de audiência prévia previsto nos artigos 100º e segs. do CPA, formalidade essa que a A...reclama ter sido ilegalmente preterida.
Vejamos se é correcto o entendimento defendido pela entidade recorrente.
O artigo 86º do CCP, sob a epígrafe "Não apresentação dos documentos de habilitação", dispõe o seguinte:
"1 - A adjudicação caduca se, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não apresentar os documentos de habilitação:
a) No prazo fixado no programa do procedimento;
b) No prazo fixado pelo órgão competente para a decisão de contratar, no caso previsto no nº 8 do artigo 81º;
c) Redigidos em língua portuguesa ou, no caso previsto no nº 2 artigo 82º, acompanhados de tradução devidamente legalizada.
2 - Quando as situações previstas no número anterior se verifiquem por facto que não seja imputável ao adjudicatário, o órgão competente para a decisão de contratar deve conceder-lhe, em função das razões invocadas, um prazo adicional para a apresentação dos documentos em falta, sob pena de caducidade da adjudicação.
3 - [...].
4 - [...].".
O nº 1 do artigo em causa prevê uma consequência desfavorável para o adjudicatário que não apresente os documentos de habilitação no prazo que for fixado no programa do procedimento ou naquele que lhe for fixado pela entidade adjudicante ou ainda, quando não os apresente redigidos em língua portuguesa ou acompanhados de tradução devidamente legalizada; porém, faz depender essa caducidade da possibilidade de imputação das situações objecto da previsão da norma - não apresentação atempada dos documentos de habilitação ou apresentação dos mesmos não redigidos em língua portuguesa ou desacompanhados de tradução devidamente legalizada - ao adjudicatário.
Inversamente, se as situações objecto da previsão da norma se verificarem por facto não imputável ao adjudicatário, impõe o nº 2 do artigo 86º do CCP que o órgão competente para a decisão de contratar deve conceder-lhe, em função das razões invocadas, um prazo adicional para a apresentação dos documentos em falta, sob pena de caducidade da adjudicação.
Porém, a caducidade da adjudicação - seja por falta de apresentação dos documentos de habilitação no prazo que tiver sido fixado no programa do procedimento ou naquele que lhe for fixado pela entidade adjudicante, seja quando aqueles documentos não sejam apresentados redigidos em língua portuguesa ou acompanhados de tradução devidamente legalizada -, ocorre "ope legis", sem que se afigure necessária a notificação do adjudicante nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 100º e segs. do CPA.
Ocorrendo a situação prevista no artigo 86º do CCP - o adjudicante juntou fora de prazo documentos de habilitação ou juntou-os em prazo mas sem serem redigidos em língua portuguesa ou acompanhados de tradução devidamente legalizada -, a mesma deverá ter tratamento idêntico ao do justo impedimento, ou seja, deverá o adjudicante - por forma a habilitar o órgão competente para a decisão de contratar a determinar da imputabilidade ou não do facto invocado e, julgando válidas as razões invocadas, conceder-lhe, um prazo adicional para a apresentação dos documentos em falta - invocar desde logo, com a apresentação tardia dos aludidos documentos ou da sua junção em língua portuguesa ou acompanhados de tradução devidamente legalizada, os factos que justificando essa apresentação tardia, demonstrem que a mesma não lhe foi imputável [cfr. o que propósito dispõe o artigo 146º do CPCivil, para as situações de justo impedimento invocadas para justificar a prática não atempada de acto em juízo].
Era isso que se impunha que a A...tivesse feito quando procedeu à junção fora do prazo dos CRC's dos seus dois outros administradores, ou seja, invocar factos tendentes a demonstrar que essa apresentação tardia não lhe era imputável, visando obter desse modo a concessão de um prazo adicional para a apresentação dos documentos em falta, sob pena de caducidade da adjudicação.
Não o tendo feito, a caducidade da adjudicação operou automaticamente, nos termos previstos no artigo 86º, nº 1 do CCP.
Deste modo, a deliberação do Conselho de Administração da B..., EPE, de 5 de Março de 2009, que decidiu considerar a caducidade da adjudicação da proposta apresentada pela requerente para os lotes 1, 2, 4 e 9 a 13, no âmbito do Concurso Público para Selecção de Fornecedores de Produtos de Higiene e de Prestadores de Serviços de Limpeza [ANCP-AQ-2008HL], não violou o disposto nos artigos 100º e segs. do CPA.
Improcedem, deste modo, as conclusões DD. a MM. da contra-alegação da recorrida Climex. * * * * * *Resta apenas referir que os dois outros vícios imputados pela A...à deliberação impugnada - vício de forma, por falta de fundamentação e violação do princípio da estabilidade das peças do procedimento - não se verificam, pelas seguintes razões:
- Relativamente ao primeiro - vício de forma, por falta de fundamentação -, a deliberação impugnada explicita de forma clara as razões de facto e de direito pelas quais considerou a adjudicação caducada relativamente à A...- não apresentação, no prazo fixado no Programa do Concurso, em relação a todos os titulares dos órgãos de gerência, de certidão do registo criminal comprovativa de não se encontrar em nenhuma das situações previstas nas alíneas b) e i) do artigo 55º do CCP, em incumprimento do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 11º do PC e da alínea b) do nº 1 do artigo 81º do CCP; a falta deste documento impediu, ainda, a comprovação da condição constante da alínea a) do nº 1 do artigo 5º do Programa do Concurso -, razões essas que aquela compreendeu, como o demonstra o rigor com que elaborou o requerimento cautelar. Além do mais, constitui Jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores da jurisdição administrativa que a fundamentação varia em função do tipo legal de acto, visando responder às necessidades de esclarecimento do seu destinatário, procurando-se através dela informá-lo do seu itinerário cognoscitivo e valorativo, por forma a dar-lhe a conhecer as razões que estiveram na sua génese, razão pela qual esta não necessita de ser uma exaustiva descrição de todas as razões que determinaram o acto, antes implicando uma exposição suficientemente esclarecedora de tais razões, de modo a que o seu destinatário fique ciente porque se decidiu num sentido e não noutro [cfr., por todos, o recente Acórdão do STA, de 24-9-2009, da 1ª Subsecção do CA, proferido no âmbito do recurso nº 428/09]; e,
- Relativamente ao segundo - violação do princípio da estabilidade das peças do procedimento -, este também não ocorre, uma vez que a conduta do órgão competente para a decisão de contratar, no sentido de solicitar aos adjudicatários a junção de certidões do registo comercial para prova da composição e situação dos seus órgãos de gerência e, no fundo, aferir, pelo cotejo dos CRC's daqueles, da existência ou não dos impedimentos previstos no artigo 55º do CCP, encontra cobertura legal no nº 8 do artigo 81º do CCP, que dispõe que "o órgão competente para a decisão de contratar pode sempre solicitar ao adjudicatário, ainda que tal não conste do programa do procedimento, a apresentação de quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações objecto do contrato a celebrar, fixando-lhe prazo para o efeito" [negrito e sublinhados nossos].
Consequentemente, com a improcedência das conclusões U. a CC. e NN. a UU. da contra-alegação da recorrida Climex, improcede "in totum" o recurso subordinado por esta interposto ao abrigo do artigo 684º-A, nº 1 do CPCivil.

IV. DECISÃO
Nestes termos, e pelo exposto, acordam em conferência os Juízes do 2º Juízo do TCA Sul em conceder provimento ao recurso interposto pela "B..., EPE", e em negar provimento ao recurso interposto ao abrigo do disposto no artigo 684º-A, nº 1 do CPCivil pela "A...- Controlo de Ambiente, SA", revogando a sentença recorrida e julgando improcedente o pedido impugnatório, com a consequente manutenção da deliberação impugnada na ordem jurídica.

Custas a cargo da "A...- Controlo de Ambiente, SA", na 1ª instância e neste TCA Sul, que se fixam em 8 e 10 UC, respectivamente.
Lisboa, 5 de Novembro de 2009

[Rui Belfo Pereira - Relator]
[António Vasconcelos]
[Cristina Santos] Declaração de voto de vencido: Salvo o devido respeito pela tese que obteve vencimento, não se acompanha a mesma pelas razões que, sucintamente, se apresentam.
Além do recurso principal da Recorrente, entidade adjudicante B..., para a hipótese de revogação da decisão em 1ª Instância que lhe foi favorável, a Recorrida A...interpõe recurso subsidiário quanto aos fundamentos não considerados pelo Tribunal a quo em via de prejudicialidade de conhecimento (artºs. 684º-A CPC ex vi 140º CPTA).
Em sede de sentença recorrida, não se acompanha o entendimento sustentado no tocante à solicitação de entrega de documentação de habilitação dos adjudicatários através do Aviso publicitado via plataforma electrónica em 25.02.2009, na medida em que se entende que, ao abrigo do disposto no artº 81º nº 8 CCP, tal Aviso remete para "(..) a apresentação da certidão do registo comercial ou disponibilização do código de acesso para a sua consulta on line, sob pena de caducidade da adjudicação (..)", sem abranger os certificados do registo criminal dos titulares do órgão societário.
Em consequência, também não se acompanha o entendimento sustentado de que a declaração de caducidade do acto de adjudicação por omissão de entrega no prazo do programa de concurso de dois certificados de registo criminal respeitantes a dois dos titulares da administração da Recorrida Climex, teria que preceder a emissão do dito Aviso de 25.02.2009 quanto aos certificados de registo comercial, por se tratar de documentação que, na circunstância do concreto concurso, tem tratamento jurídico autónomo.
De modo que, neste enquadramento jurídico, revogaria a sentença proferida, cumprindo seguir com a apreciação dos fundamentos do recurso subsidiário interposto pela Recorrida.

Importa esclarecer que se segue o entendimento doutrinário que atribui à declaração de caducidade a natureza jurídica de acto verificativo pelo qual "(..) a Administração atesta que se verificaram certos factos que nos termos da lei originam a cessação dos efeitos de certo acto administrativo (..) acto meramente declarativo, resultando então a supressão dos efeitos, não da declaração da caducidade, mas dos factos objectivos ocorridos, que nos termos da lei são causa de extinção do acto administrativo. É por isso que, mesmo não tendo havido declaração, o acto em relação ao qual se verifique um motivo de caducidade deve considerar-se como tendo caducado. (..)" (1)

A não apresentação no prazo estipulado no programa do concurso dos documentos de habilitação (pré-contratual) legal para a execução do contrato e relativos à inexistência de impedimento nos domínios tributário e criminal para contratar (artºs. 55º e 81º CCP), além de configurar um ilícito derivado do incumprimento dum dever jurídico (e não mero ónus ao serviço do interesse do adjudicatário para evitar uma desvantagem), obedece a regimes distintos consoante as hipóteses legais dos nºs. 1 ou 2 do artº 86º CCP, assente na existência ou não de culpa do adjudicatário pela ultrapassagem do prazo, distinguindo a lei duas situações.
Por um lado, a entidade adjudicante deve, é este o termo constante do artº 86º nº 2 CCP, conceder um prazo adicional para a apresentação dos documentos de habilitação caso tais faltas de entrega "(..) se verifiquem por facto que não seja imputável ao adjudicatário (..)" e, por sua vez, o prazo adicional será fixado "(..) em função das razões invocadas (..)" pelo adjudicatário inadimplente em matéria documental habilitante.
Diversamente, a não observância do prazo por facto imputável ao adjudicatário não permite qualquer concessão de prazo adicional, operando a caducidade por decurso do prazo inserto no programa do concurso - artº 86º nº 1 CCP.
Ou seja, o acto que declara a caducidade do acto de adjudicação - decisão de adjudicação que lhe é anterior, cfr. artºs. 76º nº 1 e 77º nºs. 1 e 2 a) CCP - tem natureza meramente declarativa limitada a enunciar perante o destinatário uma consequência inerente à previsão típica da norma fundada no incumprimento do prazo contido no programa do concurso (artº 86º nº 1 a) CCP), sendo que a operatividade dessa consequência legal - a caducidade do acto de adjudicação - é por lei condicionada a um juízo de apreciação de imputabilidade do facto causal expresso em acto administrativo da competência da entidade adjudicante à luz das circunstâncias do caso concreto.
É que não lhe sendo imputável a causa da inobservância do prazo do programa, tem o adjudicatário direito a "um prazo adicional" para entrega dos documentos de habilitação em falta, prazo a estabelecer por acto administrativo nos termos consignados pelo artº 86º nº 2 CCP; só o incumprimento deste segundo prazo é que opera automaticamente a cessação dos efeitos da adjudicação, aplicando-se, agora sim, o segmento doutrinário citado supra de que, independentemente da data de emissão da "(..) declaração, o acto em relação ao qual se verifique um motivo de caducidade deve considerar-se como tendo caducado. (..)".

O supra exposto permite concluir que, embora o prazo constante do programa do concurso para entrega dos documentos de habilitação e cujo decurso foi accionado pela notificação a que alude o artº 77º nº 2 a) CCP se tenha esgotado, este motivo, que é causa legal de caducidade, não opera automáticamente na esfera jurídica do adjudicatário na data do termo ad quem independentemente da emissão do acto declarativo porque tal operatividade está, nos termos legais, na dependência da verificação do requisito da imputabilidade subjectiva do facto que dá causa ao incumprimento, verificação essa a fazer "em função das razões invocadas" pelo adjudicatário, conforme textualmente expresso no nº 2 do artº 86º citado.
Tal significa que é necessário carrear para o procedimento os elementos necessários à instrução procedimental desta matéria, em ordem à emissão por parte da entidade adjudicante ou da declaração de caducidade (artº 86º nº 1) ou da concessão de prazo adicional (artº 86º nº 2), consoante a não apresentação dos documentos de habilitação no prazo, seja do programa do concurso ou do acto praticado ao abrigo do artº 81º nº 8 CCP, seja ou não seja imputável ao adjudicatário inadimplente.
Neste sentido, cumpre saber como entender do ponto de vista das partes na relação jurídica procedimental esta junção dos elementos necessários à fundamentação da decisão da entidade adjudicante de declaração da caducidade (86º nº 1) ou de concessão de prazo adicional (86º nº 2).

Enquadrar a situação subjectiva de obrigação instrumental do adjudicatário, na veste de condição legal, em ordem à realização do seu interesse na concessão do prazo adicional, significa configurá-la como ónus jurídico, em que o acto instrutório não visa satisfazer o interesse de outrem que não seja o do próprio onerado, isto é, o adjudicatário com os documentos em falta, cuja inobservância acarreta uma simples desvantagem.
Todavia, tendo presente a relação jurídica, o acto de adjudicação constitui o concorrente e a Administração no direito e no dever de contratar em conformidade com os termos da proposta aceite, salvaguardadas as especificidades legais de ajustamentos e modificação objectiva, matérias que não vêm ao caso.
Deste ponto de vista, a junção de documentos de habilitação legal a cargo do adjudicatário pelo específico contrato a celebrar, artº 81º CCP, assume para este a natureza de dever jurídico decorrente do acto de adjudicação cuja consequência, em caso de inobservância, gera a respectiva caducidade, extinguindo o direito conferido de contratar com a entidade adjudicante nos termos da proposta por si apresentada e por aquela aceite no acto da adjudicação.

Acresce, por outro lado, que a concessão do prazo adicional na circunstância do nº 2 do artº 86º não visa apenas a satisfação do interesse do adjudicatário em não perder a posição jurídica que lhe permita celebrar o contrato a cujo procedimento concorreu, porque na salvaguarda da relação contratual que adjudicação tem por finalidade, também está em causa o interesse público, que é sempre, por definição, um interesse alheio à concreta entidade adjudicante, evidenciado nas atribuições que lhe cumpre prosseguir, e não um interesse próprio que os suportes do órgão competente para a decisão possam manipular segundo as circunstâncias.
De facto, não esquecendo que "(..) o regime dos contratos administrativos está moldado em termos de assegurar a prevalência do interesse público ou a primazia da "lógica da função" sobre a "lógica do contrato"(..)" (2) tal prevalência não se esgota no domínio dos poderes exorbitantes da Administração face ao contratante particular colocado em situação de sujeição jurídica, também se expressa na natureza do acto de adjudicação pelo qual a Administração se propõe contratar mediante a aceitação da(s) proposta(s) apresentada(s) a concurso, aceitação que configura uma verdadeira declaração negocial que vincula a entidade administrativa adjudicante perante o adjudicatário.
Como tal, associando a natureza de acto constitutivo de direitos da decisão de adjudicação às circunstâncias concretas de interesse público subjacentes ao específico objecto do contrato que a Administração declarou pretender celebrar, parece claro que, também, só por motivos supervenientes de interesse público será de declarar a cessação de efeitos do acto que traduz a decisão final do procedimento para o concreto concorrente que passou a ex-adjudicatário.
Pelos interesses, nomeadamente públicos, que se entende estarem em causa, a instrução procedimental em matéria de caducidade da adjudicação nos exactos termos do preceituado no artº 86º nºs. 1 e 2 CCP, não é passível de ser entendida como traduzindo um mero ónus procedimental a cargo do adjudicatário.
Pelo que vem de ser dito, e com todas as cautelas que a complexidade da matéria em sede do Código dos Contratos Públicos aconselha, não parece adequado enquadrar a instrução da imputabilidade no domínio do ónus jurídico mas do dever jurídico configurado do lado da Administração na medida em que lhe cumpre emitir um acto administrativo de verificação dos pressupostos - dos factos objectivos ocorridos - e de imputabilidade do facto causal, em ordem a declarar a caducidade da adjudicação ou conceder um prazo adicional para apresentar a documentação que esteja em falta, sendo que na hipótese de segundo incumprimento a caducidade da adjudicação é automática com o termo ad quem deste segundo prazo - artº 86º nºs. 1 e 2 CCP.

Concluindo, antes do juízo apreciativo do facto causal da caducidade do acto de adjudicação por não apresentação pelo adjudicatário dos documentos de habilitação legal cumpre à entidade adjudicante enxertar no procedimento uma fase de audiência prévia, nos termos do artº 100º CPA, hipótese para que se propende no domínio do enquadramento doutrinário que se transcreve:
"(..) embora a lei não o tenha previsto expressamente em lado algum, parece que dados os efeitos drásticos da caducidade da adjudicação e o facto de na sua base poderem estar factos juridicamente censuráveis, culposos - deve exigir-se que a respectiva declaração (que para uma parte da doutrina constitui um acto administrativo) seja precedida de audiência prévia (ou então de exposição da iniciativa do interessado a requerer fundamentadamente que não se declare a caducidade) - Em caso de falta não culposa, concede-se uma prorrogação para cumprir a formalidade em falta, caducando a adjudicação em caso de novo incumprimento (86º/2) (..)" (3)

Neste sentido, porque esta fase de audiência prévia não foi observada pela Recorrente, B... EPE (B...), julgaria procedente o recurso subsidiário deduzido pela Recorrida, A...- Controlo de Ambiente, SA, confirmando, se bem que por diversa fundamentação, o sentido decisório da sentença proferida.

(Cristina dos Santos)

1 - Marcelo Caetano, Manual de direito administrativo, Vol. I pág. 534; no mesmo sentido da natureza jurídica, Sérvulo Correia, Noções de direito administrativo, Danúbio/1982, pág. 472; Freitas do Amaral, Direito administrativo, III, Lisboa/1989, pág. 355;Mário Aroso de Almeida, Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, Almedina/2002, pág. 102;

2 - Pedro Gonçalves, O contrato administrativo - uma instituição de direito administrativo do nosso tempo, Almedina/2004, pág. 45.

3 - Mário Esteves de Oliveira, Paulo Pinheiro, Rodrigo Esteves de Oliveira, Tiago Amorim, Catarina Pinto Correia, Código dos Contratos Públicos e legislação complementar - Almedina/2008, pág. 479.