Sumário:
1. Só existe nulidade por preterição do disposto no nº 4 do artº 91ºdo CPTA quando a parte que argua tal nulidade processual [não expressamente cominada ou fulminada pela lei como tal] alegue e demonstre que a nulidade ocorrida é susceptível de influir ou no exame ou na discussão/decisão da causa, não se podendo bastar com a sua mera invocação abstracta ou invocando apenas a mera junção do processo administrativo.
2. Sempre que exista nova e diferente argumentação por parte do júri do concurso e, alteração do reposicionamento de qualquer dos concorrentes, impõe-se o cumprimento do dever de audiência prévia, antes da decisão final de adjudicação.
3. Depois do conhecimento de todas as propostas, na fase final do procedimento concursal, não pode o júri do concurso alterar a ponderação/qualificação das propostas, com base em elementos que não constavam minimamente do Programa do Concurso, sob pena de violação de princípios basilares da contratação pública, tais como o da igualdade e da transparência, da confiança e da estabilidade concursal, não podendo as regras do concurso - plasmadas no respectivo programa - serem alteradas na pendência do processo concursal.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
1- RELATÓRIO
"E..., Ldª" e o MUNICÍPIO DE VALONGO, na qualidade de contra-interessada e réu/recorrente, respectivamente, interpuseram recurso jurisdicional da decisão proferida no TAF de Penafiel, que no âmbito da acção de contencioso pré-contratual intentada pela I... -, S.A. : (i) anulou a deliberação datada de 26 de Agosto de 2010 da Câmara Municipal de Valongo de adjudicação do objecto do Concurso Público nº 1565/2010 de "Fornecimento de refeições transportadas e refeições confeccionadas no local, em Jardins de Infância (JI) e Escolas do 1º ciclo do ensino básico (EB) do concelho de Valongo e ainda do Plano de emergência de apoio alimentar" à E...; (ii) anulou o contrato público celebrado na sequência do acto de adjudicação e respectivos efeitos, (iii) condenou o recorrente a praticar os actos necessários à adjudicação à A. do objecto do concurso público em apreço, com as legais consequências. *A E... formula as seguintes conclusões que aqui se reproduzem:
«A) O Tribunal a quo decidiu do mérito da acção após a prolação do despacho saneador, o que resulta numa nulidade processual, por não ter notificado as partes para apresentarem as suas alegações, nos termos e para os efeitos do disposto nos artºs 91º, nº 4 e 102º, nº 2 do CPTA.
B) Com as contestações as partes requereram a produção de prova testemunhal e produziram prova documental, pelo que não poderia o Tribunal a quo omitir aquela formalidade processual, sob pena de violação do disposto no artº 201º do CPC.
C) Por outro lado, a decisão recorrida enferma de diversos erros de julgamento, quer quanto à matéria de facto quer quanto à aplicação do direito.
D) Quanto aos factos dados por assentes, verifica-se que o Tribunal a quo adulterou os factos invocados pelo autor, não explicitando que o Relatório Final (3) substituiu o Relatório Final (2), ambos datados de 19 de Agosto de 2010, mas notificados aos concorrentes em momentos diferentes e com ordenações diferentes das propostas.
E) Devendo, em consequência, ser reapreciada a matéria de facto em função dos factos alegados pelas partes e dos documentos constantes dos autos.
F) Quanto à aplicação do direito aos factos, verifica-se que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quando considerou que todos os concorrentes têm direito de exercer audiência prévia sobre todos os relatórios proferidos pelo Júri.
G) Com efeito, nos termos do art.º 123º do CCP, apenas têm direito de audiência prévia os interessados, o que nos termos do disposto no artº 100º e seguintes do CPA, se consideram quem pode ser afectado pela decisão a tomar.
H) No caso do Relatório Final em apreço - o datado de 19 de Agosto de 2010 - o mesmo apenas confirmou a anterior decisão do Júri, tomada posteriormente à pronúncia do I... sobre o Relatório Final de 10 de Agosto de 2010.
I) Já quanto ao Relatório Final (3), datado de 19 de Agosto de 2010, que substituiu o anteriormente proferido, o mesmo beneficiou o I..., porque graduou a sua proposta em segundo lugar, em detrimento do terceiro lugar anteriormente atribuído.
J) Assim, não foi preterido qualquer direito de audiência prévia do I..., porque este não tinha direito a exercê-lo.
K) A haver preterição de audiência prévia foi da U..., que ficou prejudicada pela alteração da ordenação das propostas, mas apenas esta teria legitimidade para invocar tal ilegalidade.
L) Violou assim, o acórdão recorrido, o disposto no artº 148º, nº 2 do CCP e do artº 100º e seguintes do CPA.
M) No que respeita à classificação das propostas relativamente ao factor de avaliação de Garantia de Qualidade das Matérias-Primas, mal andou o Tribunal a quo em considerar que houve violação das regras concursais vigentes quando atribuiu pelo menos a mesma pontuação a concorrentes que apresentassem mais do que um fornecedor de matérias-primas.
N) O júri, mais não fez, porém, senão interpretar as regras concursais vigentes.
O) É que são valoradas de forma distinta e separada a certificação de qualidade do concorrente e dos seus fornecedores, por um lado e certificação ao nível da higiene e segurança alimentar, por outro.
P) Porém, também o número de fornecedores é relevante para a avaliação das propostas, na medida em que o júri aprecia distintamente os concorrentes que tenham nenhum, alguns ou todos os fornecedores certificados.
Q) Alguns e todos os fornecedores pressupõem que sejam mais do que um fornecedor, o que significa que o Júri não previu a possibilidade de serem apresentadas com apenas um fornecedor certificado.
R) Daí que tenha tido de necessidade de interpretar as normas concursais em função da realidade de facto que lhe foi apresentada.
S) Assim, não foram violados quaisquer princípios da estabilidade das peças concursais, nem introduzidas quaisquer novas regras de avaliação das propostas.
T) Acresce que a própria E... entende que o relatório Final (3) é ele próprio ilegal, por não ter mantido a desvalorização dos certificados apresentados pelo I... quanto ao seu fornecedor, porém o Tribunal a quo não invocou os fundamentos invocados pela ora recorrente.
U) Dá-se por reproduzidas as alegações constantes nos art.ºs 67º a 107º da contestação da recorrente, rogando a V. Exas. se dignem apreciar, nesta sede, as questões ali suscitadas.
V) Quanto à pontuação atribuída às propostas em função da textura das ementas ou da cor monocromática, verifica-se que o Tribunal a quo se substituiu de forma inadmissível, à entidade administrativa, violando o princípio da separação de poderes.
W) A apreciação do Júri nesta matéria constitui o exercício da actividade administrativa, da qual faz parte a discricionariedade técnica, insindicável judicialmente, a menos que resulte a violação de alguma norma imperativa ou algum erro grosseiro na aplicação das regras concursais, o que não é, manifestamente o caso.
Y) Por outro lado, não existe suficiente fundamentação de facto que justifique a decisão tomada, em violação do disposto no artº 668º, nº 1, al. b) do CPC.
Z) Por fim, se assim não se entender, no que não se concede, sempre se diga que bem andou o Júri do concurso ao pontuar as propostas como fez, atendendo à existência de três pratos de textura semelhante nas ementas do I... - "Arroz de pato", o "Arroz de codorniz" e a "Açorda de galinha".
AA) Pontuar de forma diferente resultaria numa violação do princípio da igualdade, na medida em que também a E... viu a sua proposta ser penalizada pela existência de dois pratos de textura semelhante.
BB) Quanto à decisão de condenação no acto devido, verifica-se que a mesma excede, manifestamente, os limites do artº 95º do CPTA». *O recorrente Município de Valongo também apresentou as suas alegações concluindo da seguinte forma:
«1 - O relatório final lavrado pelo júri do concurso datado de 10 de Agosto de 2010 propunha a adjudicação à empresa E....
2 - Desse relatório foram as concorrentes notificadas para se pronunciarem no prazo de 5 dias.
3 - Só a recorrida se pronunciou nessa sede.
4 - O relatório do júri do concurso datado de 19 de Agosto de 2010 não alterou a proposta de adjudicação para a empresa E..., mantendo a posição do concorrente.
5 - De acordo com o artº 148º do Código dos Contratos Públicos só é obrigatório proceder a nova audiência prévia quando existe alteração da ordenação das propostas.
6 - A sentença recorrida violou os artigos 147º, 123º, 148º, nº 2, 152º, 153º e 154º do CCP.
7 - A sentença recorrida violou o artigo 135º do CPA.
8 - O programa de concurso sub judice valorava a certificação dos fornecedores de matérias-primas alimentares dos concorrentes em sede de apreciação da proposta.
9 - Este critério visava potenciar uma melhor qualidade dos produtos alimentares das propostas dos concorrentes.
10 - O júri do concurso entendeu valorar as propostas dos concorrentes de forma que os concorrentes que apresentassem mais do que um fornecedor certificado não tivesse avaliação inferior à recorrida I..., que apresentou um só fornecedor certificado.
11 - Os concorrentes que apresentam mais do que um fornecedor certificado, não podem ser penalizados e terem a sua proposta valorada com pontuação inferior à da recorrida. Precisamente porque as propostas que apresentam mais do que uma avaliação, oferecem mais garantias à entidade adjudicante.
12 - Esta conclusão resulta da intenção da previsão dessa valoração nas peças procedimentais.
13 - Esta conclusão do júri não viola qualquer peça do procedimento, nem sequer o princípio da estabilidade das peças do procedimento. Não se trata de criar um novo critério, mas sim de aplicar o princípio que presidiu à elaboração de um deles.
14 - Não se pode concluir que aplicar um critério previsto nas peças processuais, de forma que a sua aplicação baseada precisamente na sua elaboração, viole as próprias peças procedimentais.
15 - A sentença recorrida violou os artigos 7.6 e 13 do programa do concurso.
16 - A sentença recorrida violou o artigo 74º do CCP».
A A./recorrida "I..., S.A." contra-alegou no sentido da improcedência de ambos os recursos, apresentando as seguintes conclusões:
«1.ª A douta decisão recorrida foi douta e brilhantemente fundamentada, não merecendo qualquer reparo ou censura.
2.ª Inexiste qualquer nulidade processual por suposta violação do disposto nos artigos 91º, nº 4, e 102º, nº 2, do CPTA.
3.ª As alegações destinam-se, essencialmente, a permitir ao demandante (e não ao demandado) pronunciar-se sobre elementos de prova apresentados no decurso do processo, aos quais, porventura, não tenha tido acesso antes.
4.ª A falta de notificação para produzir alegações constitui uma mera e irrelevante irregularidade, sendo que a recorrente E... nem sequer alegou ou demonstrou que a omissão dessa formalidade teve influência no exame ou na decisão da causa, sendo que o processo continha todos os elementos suficientes para a decisão.
5.ª Deve, pois, a putativa nulidade invocada ser julgada improcedente.
6.ª Pretendendo impugnar a matéria de facto, a recorrente E... não cumpriu os ónus previstos nas alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 685º-b do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do disposto no artigo 1º do CPTA.
7.ª De qualquer modo, bem sabe a recorrente E... que o relatório final (3), datado de 19 de Agosto de 2010 e notificado ao recorrido em 3 de Setembro do mesmo ano - após a notificação da adjudicação - não foi precedido de audiência prévia, sendo a este último relatório que se reporta a douta decisão recorrida, pelo que é irrelevante para a boa decisão da causa a introdução de qualquer alteração da matéria de facto.
8.ª A douta decisão recorrida interpretou e aplicou correctamente o disposto no artigo 148º, nº 2 do CPTA.
9.ª Para além de ser prejudicial ao recorrido, a fundamentação constante do relatório final (3) suscita questões novas e assenta, portanto, numa argumentação totalmente diferente da invocada nos relatórios precedentes, pelo que sempre deveria ter sido observada a prévia participação do recorrido.
10ª. Acresce que a graduação das propostas foi também modificada, incluindo a graduação da proposta do recorrido I..., estando assim preenchidos os pressupostos de aplicação do disposto no artigo 148º, nº 2 do Código dos Contratos Públicos.
11.ª A proposta da recorrente E... não podia ser valorada e beneficiada em função do número de fornecedores que apresenta, sendo evidente que só alguns dos seus fornecedores é que eram certificados pelo que, ao contrário do fornecedor do recorrido I..., não detinham ambas as certificações em matéria de qualidade e higiene alimentar.
12.ª À luz do disposto no artigo 13º do programa do concurso, os concorrentes não estavam obrigados a apresentar mais do que um fornecedor, sendo que não se pode confundir qualidade com quantidade, como pretende a recorrente E....
13.ª Para efeitos de valoração das propostas em matéria de qualidade era irrelevante o número de fornecedores apresentados pelos concorrentes.
14.ª Pela lógica dos recorrentes E... e Município de Valongo quem apresentasse 40 fornecedores ofereceria mais garantias do que quem apresentasse um número inferior, o que é totalmente errado e subversivo das regras procedimentais.
15.ª E isto quando, como se constata, apesar de apresentar mais fornecedores, a recorrente E..., ao contrário do recorrido I..., não apresenta fornecedores que detenham ambas as certificações previstas no programa do concurso em matéria de qualidade e higiene alimentares.
16.ª O programa do concurso não estabelecia um número mínimo ou máximo de fornecedores e não estabelecia qualquer critério de valoração da qualidade em função do número de fornecedores.
17.ª Ao ter sobrevalorizado a proposta da concorrente E..., atendendo ao número de fornecedores e não às suas certificações, o júri do concurso violou claramente o disposto no artigo 13.4. alínea b) do programa do concurso e, bem assim, o princípio da estabilidade das regras concursais.
18.ª A qualidade das matérias-primas alimentares não se afere em função da quantidade de fornecedores mas sim em função das suas certificações em matéria de qualidade e higiene alimentares, pelo que a proposta da concorrente E... não poderia obter, quanto a este subcritério, a mesma pontuação da proposta do I....
19.ª E, como o próprio júri reconheceu no relatório final (3), ao contrário do fornecedor do ora recorrido, os fornecedores apresentados pela concorrente E... não possuem ambas as certificações em matéria de qualidade e higiene alimentares previstas no programa do concurso.
20.ª Muito bem andou, assim, o tribunal a quo, ao considerar verificado tão evidente vício e ao determinar a anulação do acto de adjudicação, com todas as consequências legais.
21.ª Uma vez que padecia de erro manifesto, bem andou também o tribunal a quo ao determinar que fosse igualmente revista a pontuação atribuída ao recorrido em matéria de ementas.
22.ª Estando em causa a correcta interpretação e aplicação das regras procedimentais, não tem, pois, razão a recorrente E... quando sustenta que tal decisão representou uma abusiva ingerência do tribunal em matéria sujeita a discricionariedade técnica.
23.ª Não se compreende como pode o recorrente Município de Valongo referir que no relatório final (3) não se verificou qualquer alteração da graduação das propostas, incluindo a proposta do recorrido I.... Essa alteração é evidente e resulta expressamente do próprio relatório em causa.
23.ª É errado e infundado o entendimento do recorrente de que a proposta da concorrente E... oferecia mais garantias de qualidade só por apresentar mais do que um fornecedor, quando só alguns desses fornecedores detinham certificação e, ao contrário do fornecedor do I..., não detinham ambas as certificações em matéria de qualidade e higiene.
24.ª Se o Município de Valongo pretendia valorar a quantidade de fornecedores e não a qualidade dos mesmos, deveria ter feito constar essa regra das peças procedimentais e não fez.
25.ª É descabida a invocação do princípio do aproveitamento do acto jurídico.
26.ª Foi o próprio município que, no relatório final (3) considerou não ter qualquer fundamento a desvalorização da proposta do I... em virtude de o seu fornecedor de matérias-primas (pessoa jurídica autónoma e detentora das suas próprias certificações em matéria de qualidade e higiene) fazer parte do mesmo grupo de empresas, pelo que não se compreende nem se aceita que venha invocar tal suposto argumento na presente acção, em total incongruência com o que antes apreciou e decidiu.
27.ª A douta decisão recorrida não violou quaisquer normas nem padece de nenhum dos vícios que lhe foram assacados pelos recorrentes.
28.ª Muito bem andou o tribunal a quo ao decidir anular o acto de adjudicação, o contrato celebrado entre os recorrentes Município de Valongo e E... e, bem assim, ao determinar a adjudicação do objecto do concurso em apreço ao recorrido I...». *O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para os efeitos previstos nos artºs 146º e 147º, ambos do CPTA, não emitiu pronúncia. *Com dispensa de vistos, nos termos do disposto no artº 36º, nºs 1 e 2 do CPTA, os autos foram submetidos à Conferência para julgamento.
2 - FUNDAMENTOS
2.1 - MATÉRIA DE FACTO
Da 1ª decisão recorrida resultam assentes os seguintes factos [corrigindo-se, desde já, os pontos 14 e 16, na medida em que fazem referência à deliberação referida em 12, quando a mesma consta do ponto 13, assim se substituindo os nºs "12" por "13"]:
«1 - Por anúncio publicado no Diário da República nº 77, 2ª série, de 21 de Abril de 2010, a Câmara Municipal de Valongo abriu o concurso público internacional nº 1565/2010 para "Prestação de serviços de fornecimento de refeições nos Estabelecimentos de Educação e Ensino do Município de Valongo bem como no âmbito do Plano de Emergência de Apoio Alimentar".
2 - O Concurso referido em 1) tem como peças do procedimento o Caderno de Encargos, junto de fls. 12 a 52 do P.A., e o Programa do Concurso, junto de fls. 53 a 68 do PA, os quais se dão aqui por inteiramente reproduzidos.
3 - Apresentaram-se a concurso as concorrentes "A..., Lda"; "E..., Lda"; "I...- Indústria e Comércio Alimentar, S.A."; "I..., S.A." e "U..., S.A.", tendo todas sido admitidas a concurso, cujas propostas se dão aqui por inteiramente reproduzidas (cfr. fls. 116 do PA).
4 - O Júri do concurso propôs "...a adjudicação à Empresa I... pelo preço global de 5.106.276,32€...", no Relatório Preliminar, o qual se dá aqui por inteiramente reproduzido (cfr. fls. 102 a 116 do P.A.).
5 - Foram as concorrentes notificadas para, no prazo de cinco dias úteis, se pronunciarem, por escrito, para efeitos de audiência prévia.
6 - Em 22 de Julho de 2010, pronunciou-se a concorrente E..., pedindo "...a reformulação do Relatório Preliminar e do consequente projecto de decisão...procedendo-se a) À exclusão das propostas do I... e da I...; b) À reclassificação das propostas admitidas a Concurso, por forma a ser adjudicado o presente fornecimento à E......".
7 - Em 9 de Agosto de 2010, o Sector de Apoio Jurídico Contencioso e Execuções Fiscais emitiu Parecer jurídico concluindo que "...o júri do concurso em apreço deve avaliar as propostas reclamadas, considerando que as mesmas não apresentam qualquer fornecedor certificado, devendo, caso seja necessário, proceder à sua reclassificação, o qual se dá aqui por inteiramente reproduzido (cfr. fls. 203 a 213 do P.A.).
8 - Em 10 de Agosto de 2010, o júri emitiu Relatório Final e propôs a adjudicação ao concorrente E... pelo preço global de 3.622.712,28€, o qual se dá aqui por inteiramente reproduzido (cfr. fls. 216 a 235 do P.A.).
9 - Foram as concorrentes notificadas para, no prazo de cinco dias úteis, se pronunciarem, por escrito, para efeitos de audiência prévia.
10 - Pronunciou-se a concorrente I..., requerendo que "...A - Seja deliberada a graduação da proposta da I... em primeiro lugar para efeitos de adjudicação; B - Seja elaborada nova proposta de adjudicação do objecto do presente concurso ao I..., por ter sido o concorrente que apresentou a proposta economicamente mais vantajosa para o Município de Valongo ..."(cfr. fls. 320 a 340 do P.A.).
11 - Em 17 de Agosto de 2010 o Sector de Apoio Jurídico Contencioso e Execuções Fiscais emitiu Parecer jurídico concluindo que "...o júri do concurso em apreço deve avaliar as propostas reclamadas, valorando os concorrentes que apresentem mais do que um fornecedor com certificação de qualidade não sejam valorados com pontuação inferior à do concorrente I......", o qual se dá aqui por inteiramente reproduzido (cfr. fls. 342 a 346 do P.A.).
12 - Em 19 de Agosto de 2010, o júri do concurso emitiu Relatório Final e propôs a adjudicação ao concorrente E... pelo preço global de 3.622.712,28€., o qual se dá aqui por inteiramente reproduzido (cfr. fls. 348 a 363 do P.A.).
13- Em 26 de Agosto de 2010, a Câmara Municipal de Valongo deliberou, por unanimidade, "...Adjudicar o concurso público...para a prestação de serviços de fornecimento de refeições nos estabelecimentos de Educação e Ensino do Município bem como no âmbito do Plano de Emergência de Apoio Alimentar à empresa E... Portugal, L.da, pelo montante de 3.622.712,28€...", a qual se dá aqui por inteiramente reproduzida (cfr. fls. 362 e 363 do P.A.).
14 - Em 28 de Agosto de 2010, pelo ofício nº 811/SA.DAI/230/10, foram todos os concorrentes notificados da deliberação referida em 13), a qual se dá aqui por inteiramente reproduzida (cfr. fls. 370 e 371 do P.A.).
15 - Em 2 de Setembro de 2010, a E... prestou caução junto do Banco Santander Totta, a qual se dá aqui por inteiramente reproduzida (cfr. fls. 379 do P.A.).
16 - Em 2 de Setembro de 2010, a Requerente I... instaurou providência cautelar de suspensão de eficácia da deliberação referida em 13) neste TAF de Penafiel.
17- Em 20 de Setembro de 2010, o Réu e a Contra-interessada E..., S.A. celebraram o Contrato adjudicado (cfr. apenso de providência cautelar)». *Atento o disposto no artº 712º do CPC aplicável ex vi dos arts. 1º e 140º do CPTA, aditam-se os seguintes factos à matéria assente:
18. A fls. 190 dos autos o juiz a quo proferiu despacho saneador tabelar, acrescentando ainda que.
"II Compulsados os autos, consideramos não haver necessidade em determinar a abertura de um período de produção de prova, pois a prova documental constante dos autos conjugada com o processo administrativo é suficiente para a decisão da presente acção.
Notifique.
Oportunamente, abra conclusão para prolação de decisão final"
19. Após vicissitudes várias, a fls. 236 foi de novo proferido outro despacho notificado a todos os intervenientes processuais que termina da seguinte forma: "Oportunamente, conclua os autos para prolação de decisão final".
2.2 - O DIREITO
Os recursos jurisdicionais interpostos pelos recorrentes serão apreciados à luz dos parâmetros estabelecidos nos artºs 660º, nº 2, 664º, 684º, nº 3 e 4, e 685º-Aº todos do C.P.C. aplicáveis ex-vi artº 140º do CPTA.
QUESTÕES A DECIDIR:
A) Quanto ao recurso da contra interessada E..., SA:
1 - Nulidade do acórdão do TAF de Penafiel, por alegada falta de fundamentação - al. b) do nº 1 do artº 668º do CPC - cfr. conclusão Y) das suas alegações.
2 - Nulidade processual, por alegada omissão de despacho que notifique as partes para apresentarem alegações de direito, nos termos dos arts 91º, nº 4 e 102º, nº 2 do CPTA - cfr. conclusões A) e B) das alegações;
3 - Erro de julgamento, quanto à matéria de facto - cfr. conclusões D) e E) das alegações.
4 - Erro de julgamento quanto à aplicação do direito:
· Falta de audiência prévia - cfr. conclusões F) a L) das alegações;
· Classificação das propostas, quanto ao factor de avaliação de "Garantia de Qualidade das matérias-primas" - cfr. conclusões M) a S)das alegações;
· Pontuação atribuída às propostas em função da textura das ementas ou da cor monocromática - cfr. conclusões V), W) e Z) a AA) das alegações;
· Excesso de pronúncia no que concerne à decisão de condenação do acto devido, por exceder os limites do artº 95º do CPTA - cfr. conclusão BB) das alegações;
B) Quanto ao recurso do R./recorrente Município de Valongo:
1 - Erro de julgamento quanto à aplicação do direito:
2 - Falta de audiência prévia - cfr. conclusões 1 a 6 das alegações; e,
3 - Classificação das propostas, quanto ao factor de avaliação de "Garantia de Qualidade das matérias-primas" - cfr. conclusões 8 a 16 das alegações.
DO RECURSO DA CONTRA-INTERESSADA E..., S.A.:
1 - Quanto à nulidade do acórdão do TAF de Penafiel, por alegada falta de fundamentação - al. b), do nº 1, do artº 668º do CPC.
Alega a recorrente E..., SA, a este propósito - mas sem argumentação sedimentada para que se possa conhecer em plenitude dessa arguição, sendo mesmo que depois refere excesso de pronúncia - cfr. pontos 7 e 8 do corpo das alegações -, que o tribunal não dispunha de matéria de facto suficiente para avaliar acerca do critério da monocromaticidade dos pratos, no que concerne ao erro de julgamento, quanto à pontuação da textura semelhante e cor monocromática.
Sem necessidade de considerações técnicas acerca do preenchimento em abstracto desta nulidade (ou mesmo entendendo-a como de excesso de pronúncia - al. d) do nº 1 do artº 668º do CPC), temos que inexiste qualquer razão à recorrente.
Na verdade, em primeiro lugar, o tribunal apreciou e decidiu acerca de questão que vinha colocada nos autos, desde a p.i., conhecimento que se mostrava obrigatório, sob pena de nulidade por omissão de pronúncia; depois, em segundo lugar, questionando-se se determinados pratos tinham ou não textura semelhante/cor monocromática o TAF de Penafiel entendeu que um prato monocromático, para um bom pai de família, é um prato com uma só cor que pode ter um só tom ou vários tons dentro da mesma cor; e, atenta esta evidência para os julgadores entenderam os mesmos que as ementas apresentadas, quer fossem da recorrente E..., quer da recorrida I..., tinham todas elas várias cores, pelo que deveriam ser pontuadas com a pontuação correspondente.
Ora - mal ou bem - questão que respeita ao eventual erro de julgamento, que não com qualquer nulidade da decisão - o tribunal fundamentou a sua opção e pronunciou-se acerca de questão que era objecto obrigatório de pronúncia, pois que essa análise/decisão dessa questão em concreto não se mostrava prejudicada pela resposta dada a outras.
2 - Quanto à nulidade processual, por alegada omissão de despacho a notificar as partes para apresentarem alegações, nos termos dos arts 91º, nº 4 e 102º, nº 2 do CPTA:
Analisados os autos, verificamos que, na verdade, não foi proferido despacho a notificar as partes para produzirem alegações, nos termos dos normativos supra referidos.
Mas, porque nas contestações - seja da E..., SA, seja do Município de Valongo - não foram apresentados quaisquer documentos, nem veio a ser produzida prova testemunhal, ainda que requerida por todas as partes, por o tribunal ter entendido que a mesma se mostrava desnecessária - cfr. despacho de fls.190/191 - o qual não foi objecto de qualquer objecção das partes, [pois que apesar de lhe ter sido notificado e no mesmo se dizer que oportunamente se prolataria decisão final, nada foi dito em contrário por qualquer das partes], não tinha que ser elaborado despacho a notificar as partes para produzirem alegações.
Aliás, a junção do P.A. em si mesma não pode servir para justificar a notificação para produção de alegações, pois que essa junção é obrigatória - cfr. artº 84º, ex vi, artº 102.º, nº 1 do CPTA - e assim a admitir-se que a junção do P.A. corresponderia à produção de prova com a contestação, seria esvaziar de sentido a restrição constante do nº 2 do artº 102 - cfr., neste sentido, a anotação ao artº 102º, nº 2 do CPTA, no "Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos" - Mário Aroso de Almeida e Calos Cadilha - 2.ª ed. revista, 2007, págs 607/608.
Mesmo assim, caso se entendesse que a junção do P.A. importaria a notificação para alegações sempre careceria de razão a recorrente.
Com efeito, a verdade é que a recorrente para além de ter tido possibilidade de oportunamente suscitar tal questão [cfr. matéria de facto aditada], não vem neste recurso jurisdicional alegar de que forma tal nulidade é susceptível de influir no exame da causa.
Ao invés, limita-se tão só a invocá-la, alegando haver sido preterida uma formalidade essencial.
Ora essa alegação mostra-se relevante, como se decidiu no Ac. deste TCAN, proferido em 09/02/2006, in rec. nº 01300/04.6BEVIS onde se sumariou o seguinte:
« (...) IV. Omitido nos autos o acto de notificação das partes para produzirem, por escrito, as suas respectivas alegações de direito quando as mesmas não hajam sido legalmente dispensadas ocorre nulidade processual.
V. Tal nulidade constitui possível objecto de conhecimento em sede de recurso jurisdicional se estiver coberta por uma decisão judicial que a sancionou ou a confirmou ainda que de forma implícita.
VI. Do cotejo dos normativos em questão não deriva expressamente o sancionamento com o desvalor invalidante da nulidade em caso de prolação de sentença final em acção administrativa especial quando tenha ocorrido omissão da notificação das partes para a dedução de alegações escritas nos termos do art. 91º, n.º 4 do CPTA, pelo que importa aferir se "in casu" tal omissão é susceptível de gerar ou não nulidade na medida em que "possa influir no exame ou na decisão da causa".
VII. A parte que argua nulidade processual, não expressamente cominada ou fulminada pela lei como tal, terá de alegar e demonstrar que a nulidade ocorrida é susceptível de influir ou no exame ou na discussão/decisão da causa, não se podendo bastar com a sua mera invocação abstracta».
Assim, inexistia qualquer razão para que se notificassem as partes para produzirem alegações, improcedendo, deste modo, a argumentação da recorrente E..., SA, também quanto a este segmento do recurso.
3 - Quanto ao erro de julgamento, no que se refere à matéria de facto.
A este propósito refere a recorrente E... que, quanto aos factos dados por assentes, verifica-se que o Tribunal a quo adulterou os factos invocados pelo autor, não explicitando que o Relatório Final (3) substituiu o Relatório Final (2), ambos datados de 19 de Agosto de 2010, mas notificados aos concorrentes em momentos diferentes e com ordenações diferentes das propostas.
Contudo, pese embora, da factualidade provada não resultar evidente essa verificação em concreto - sendo contudo de referir, em abono da verdade e contrariamente ao que refere a recorrente, que são de datas diferentes (um de 10 /8/2010 e outro de 19/8/2010 - cfr. fls. 216/235 versus 347 a 365, do P.A., respectivamente) - nem por isso essa falta de indicação importou que a decisão quanto ao mérito dos autos fosse de algum modo influenciada por essa falta de pormenorização.
Na verdade, dos autos resulta que houve um Relatório Final (2) que veio a ser substituído por outro Relatório Final (3); aquele, datado de 10/8/2010 - ponto 8 dos factos provados (fls. 216 a 235 do P.A.) - e este (3) de 19/8/2010 - ponto 12 dos factos provados (fls. 347 a 365 do P.A.) -, que contêm fundamentação diferente e graduação diferente das propostas (no 1º, de 10/8/2010, a concorrente I... foi posicionada em 3º lugar, com 77,6 pontos e no 2º Relatório - de 19/8/2010 - em 2º lugar, com 98,6 pontos) e foram notificados em datas diferentes (aquele em 28/8/2010 e este em 3/9/2010, já após a adjudicação do concurso público).
Ora essa evidência fáctica que ninguém questiona não deixou de ser analisada pela decisão recorrida que, aliás, justificou a sua opção com a diversidade fundamentadora dos dois relatórios e que as partes bem apreenderam como decorre do teor das respectivas alegações e contra alegações.
Carece, deste modo, de razão justificante a recorrente para se aditar/alterar a matéria de facto dada como provada pela 1ª instância.
4 - Quanto ao erro de julgamento quanto à aplicação do direito, concretamente quanto à falta de audiência prévia - comum ao recurso do R./Município de Valongo.
No que a esta matéria concerne, resulta evidente dos autos (posição das partes vertida nos respectivos articulados) e do P.A., que após o Relatório Preliminar datado de 15/7/2010 - fls. 102 a 116 do P.A. - que graduou a concorrente I... em 1º lugar, foram os candidatos ao concurso notificados para efeitos de audiência prévia.
Apresentada pronúncia pela recorrente E..., nos termos do Relatório Final (2), de 10/8/2010 foi alterada a graduação ficando a recorrente E... posicionada em 1º lugar e a I... em 3º lugar.
Notificadas as concorrentes para nova audiência prévia, veio a pronunciar-se a I... e foi elaborado novo Relatório Final (3), onde se mantém a classificação da E... em 1.º lugar e a I... passa de 3º para 2º lugar.
Ora o que se questiona nos autos é se perante a argumentação completamente diferente do júri e reposicionamento relativo da recorrida I..., mesmo em desacordo com a fundamentação que o júri já havia defendido no anterior Relatório (2), não se deveria ter dado a possibilidade de as concorrentes se pronunciarem, mais uma vez, antes da decisão final de adjudicação.
A sentença entendeu e bem que foi omitida essa formalidade - cfr. artº 148º do CCP - com a seguinte argumentação:
" a) Falta de audiência prévia
Alega a A. que deveria ter havido nova notificação dos interessados após a elaboração do Relatório Final, em 19 de Agosto de 2010, para efeitos de audiência prévia porque neste Relatório o júri do concurso efectuou uma reformulação e reclassificação dos concorrentes.
O réu, em sede de contestação, nada alega quanto a esta questão.
A Contra-interessada alega que o júri não realizou nova notificação para efeitos de audiência prévia mas também não tinha que o fazer, porquanto o Relatório Final de 19 de Agosto de 2010 resultou da realização de audiência prévia e a posição da Autora não lhe permite suscitar tal questão porque não foi prejudicada pela reclassificação operada pelo júri naquele Relatório Final.
De acordo com o Código dos Contratos Públicos, vigora a regra geral de exigência de audiência prévia de TODOS os concorrentes após a elaboração pelo júri de Relatórios, quer sejam relatórios preliminares quer sejam Relatórios Finais (cfr. artºs 147º, 123º, nº 2 do art. 148º, 152º, 153º e 154º, todos do CCP).
Assim, constata-se que o artº 154º deste diploma legal preceitua que "Ao segundo relatório final é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artº 148º".
O que significa que, resultando das ponderações das observações dos concorrentes, em sede de audiência prévia, uma alteração da ordenação das propostas constantes do 1º relatório final, o segundo relatório final elaborado pelo júri tem obrigatoriamente que ser notificado a todos os concorrentes para efeitos de nova audiência prévia.
Ora, na situação em análise tal notificação não ocorreu pelo que houve, efectivamente, preterição de uma formalidade do concurso público.
O disposto no art. 100º do CPA, como a jurisprudência e a doutrina vêem fundamentando, visa pôr em prática a directiva constitucional da "participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito (art. 267º nº 5 da CRP) constituindo, por isso, uma importante manifestação do princípio do contraditório pois que, dessa forma, não só se possibilita o confronto dos pontos de vista da Administração com os do Administrado como também se permite que este requeira a produção de novas provas que invalidem, ou pelo menos ponham em causa, as decisões que a Administração projecta proferir.
Estes preceitos gerais são precisamente reforçados a nível de normas concursais nos preceitos do Código dos Contratos Públicos supra referidos.
Constatando-se que, nos presentes autos, o direito de participação da Autora e demais concorrentes na conformação da decisão proferida foi posto em causa pela actuação da Administração, nomeadamente pela falta de notificação do 2º Relatório Final elaborado pelo júri para, querendo, se pronunciarem, a Deliberação impugnada padece do vício de forma de preterição de audiência prévia e, por isso, é susceptível de anulação, conforme determinado no art. 135º do CPA".
Ora, porque efectivamente no Relatório Final (3) o júri do concurso alterou completamente a fundamentação que antes havia aduzido para propor a adjudicação nos termos do Relatório Final (2) - deixando de repercutir essa anterior avaliação na graduação agora proposta e que altera também a graduação das propostas - se bem que mantenha a proposta de graduação da 1ª concorrente - temos que se impunha a audiência prévia dos concorrentes, sem com isto se querer significar que a audiência prévia se perpetuaria perante qualquer novo relatório.
No caso concreto, o que temos é que a fundamentação [antes, no Relatório de 10/8/2010 entendeu-se que o programa do concurso não exigia um número máximo ou mínimo de fornecedores, antes apenas se indicava que deveria referir "todos os fornecedores", adiantando mesmo que se determinada proposta identifica cinco ou cinquenta fornecedores era assunto que só ao concorrente dizia respeito pois que era o responsável pela elaboração da proposta, enquanto no 2º Relatório Final (3), de 19/8/2010 se entendeu que era relevante e deveria ser valorado o facto de um concorrente apresentar mais que um fornecedor] e graduação dos concorrentes foi alterada em sentido e com fundamento completamente diferente daquele que anteriormente havia sido apresentado, ainda que, para tal tenha contribuído o Parecer colhido pelo Município junto do seu Sector de Apoio Jurídico Contencioso e Execuções Fiscais (cfr. ponto 11 dos factos provados - fls. 342 a 346 do P.A.), o que não deixa de ser indiferente para a solução a encontrar.
Deste modo, entendemos que bem decidiu o acórdão do TAF de Penafiel, improcedendo assim esta vertente da alegação dos recorrentes E... e Município de Valongo.
5 - Quanto à classificação das propostas, no que respeita ao factor de avaliação de "Garantia de Qualidade das matérias-primas"(igualmente comum ao do R. Município).
Também, nesta parte, não assiste razão aos recorrentes.
A este respeito [e que no nosso entender justifica plenamente a opção tomada] escreveu-se na decisão recorrida
"(...) Assim, concordamos com a Autora quando afirma que o Júri violou as regras concursais vigentes no concurso em análise, pelo que há lugar, consequentemente, à anulabilidade da Deliberação impugnada, uma vez que o juízo formulado não se apoia em norma nenhuma constante do procedimento concursal e este deve, em toda a sua extensão, ser observado pelo júri de forma a cumprir o princípio da confiança, da igualdade e da transparência, princípios fundamentais dos concursos públicos, bem como do princípio da estabilidade do concurso, segundo o qual as regras do concurso, aberto este, tornam-se firmes, não podendo ser alteradas na pendência do processo adjudicativo.
Em obediência a este princípio da estabilidade, as peças do procedimento não podem sofrer qualquer alteração do seu conteúdo, numa manifesta protecção dos interesses dos potenciais e principalmente dos efectivos candidatos ou concorrentes, de forma, a que os termos das propostas tenham um substrato de fiabilidade, de confiança e de garantia de estabilidade.
Ora, esta proibição de alteração do conteúdo das peças procedimentos estende-se, obviamente, às interpretações a fazer destas mesmas peças e seus normativos, o júri ao defender o referido supra introduziu uma alteração no procedimento, alteração que viola o princípio da estabilidade do concurso porquanto ao nada dizer nas peças procedimentais quanto à valorização da proposta em função do número de fornecedores certificados e depois valorar as propostas segundo o número de fornecedores criou, após a publicitação do concurso e das suas peças procedimentais, um novo item ou subcritério incompatível com a observância do princípio da estabilidade concursal e princípio da confiança, criando, de surpresa, um subcritério de valoração das propostas com o qual os concorrentes não estavam a contar e, por este elemento surpresa, é a deliberação impugnada anulável".
Ora, tendo por base o Programa do Concurso onde consta que:
"13.1. O critério no qual se baseia a adjudicação será o da proposta economicamente mais vantajosa, nos termos da alínea a) do nº 1 do artº 74º do CCP.
13.2. Os factores que o compõem e respectivas ponderações são os a seguir indicados:
a) Preço - 50%
b) Garantia de qualidade das matérias - primas - 30%.
c) Avaliação do Plano de Ementas - 20% (...).
13.4. (...)
b) Garantia de qualidade das matérias - primas: 30%
A proposta deverá identificar todos os fornecedores de matérias-primas alimentares a que o concorrente irá recorrer para a execução da prestação.
A avaliação deste factor será efectuada de acordo com a seguinte tabela de percentagens, até ao máximo de 100 valores.
Tipo de Qualificação (Higiene e Segurança Alimentar/Qualidade)/Fornecedores Certificados-Qualificados/Fornecedores sem certificação-qualificação/total máximo de pontuação" - sublinhado nosso -, temos para nós que não se toma como termo de valoração o número de fornecedores de matérias primas alimentares; apenas a avaliação levará em consideração a certificação desses fornecedores, segundo dois itens: (1) Certificado de Qualidade e (2) Certificado de Higiene e Segurança Alimentar.
Quer isto significar que - contrariamente ao que entendeu o júri, baseado em Parecer Jurídico - não podia, já com o conhecimento de todas as propostas, na fase final do procedimento concursal, alterar a ponderação/qualificação das propostas com base em elementos que não constavam minimamente do Programa do Concurso, sob pena de violação de princípios basilares da contratação pública, tais como o da igualdade e da transparência, da confiança e da estabilidade concursal, não podendo as regras do concurso - plasmadas no respectivo programa - serem alteradas na pendência do processo concursal.
Ou seja, não se podiam passar a valorar as propostas de acordo com o número de fornecedores indicados, quando esse critério não estava anteriormente definido, até porque, como supra já se referiu e o júri havia aduzido em relatório anterior (de 10/8/2010) não importava o número de fornecedores indicados na proposta, mas antes se estavam certificados em termos de qualidade alimentar e higiene/segurança alimentar.
Assim, não podiam as propostas - como a da recorrente E... - ser revalorizadas com critério que não havia sido previamente apresentado; antes dever-se-iam ter em consideração os parâmetros previamente fixados e de acordo aliás com o que foi decidido e justificado no Relatório Preliminar.
Em conclusão, carecem de razão os recorrentes, também, nesta parte. *Ora, atenta a decisão quanto ao dever de audiência prévia que, como vimos deveria ter sido exercitada e a verificação da ilegalidade enunciada em 5. relativa à classificação das propostas com apelo a critério/factor novo, fica prejudicado o conhecimento das demais questões objecto dos recursos, pois que, cumprido o dever de audiência prévia, cabe ao júri pronunciar-se acerca de eventuais reclamações e assim a decisão a tomar pode ser outra, não podendo o tribunal substituir-se à entidade administrativa nessa conformação correcta do procedimento concursal.
Com efeito, por força do disposto no artº 95º do CPTA, ao Tribunal a quo estava vedado o conhecimento das demais ilegalidades, pelo que se impõe a parcial revogação da decisão recorrida; ao invés cabia-lhe, após ter detectado estas ilegalidades ter remetido os autos ao júri do concurso, por ser a entidade a quem pertence emitir nova pronúncia, expurgada das ilegalidades ora verificadas, o que se impõe que façamos de imediato. *Concluímos pela procedência parcial dos recursos, pela revogação da sentença na parte em que conheceu de invalidades que se mostravam prejudicadas e pela anulação da decisão impugnada, devendo o procedimento concursal ser retomado nos termos acima enunciados.
3 - DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em:
- conceder provimento parcial aos recursos jurisdicionais interpostos;
- revogar a sentença recorrida, na parte em que conheceu de invalidades cujo conhecimento ficou prejudicado com a verificação da falta de audiência prévia;
- anular a deliberação impugnada e ordenar a continuação do procedimento concursal, de acordo com o julgamento acima enunciado. *Custas a cargo dos recorrentes ("E..., L. da"" e MUNICÍPIO DE VALONGO) e recorrida "I... -, SA", na proporção de 2/3 e 1/3, respectivamente, em ambas as instâncias.
Notifique.
DN.
Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pela relatora (cfr. artº 138º, nº 5 do CPC "ex vi" artº 1º, do CPTA).
Porto, 27 de Outubro de 2011
Ass. Maria do Céu Dias Rosa das Neves
Ass. Carlos Luís Medeiros de Carvalho
Ass. José Augusto Araújo Veloso