Sumário:
Viola o disposto no n.º 4 do artigo 60º do Código de Contratos Públicos, e como tal deve ser rejeitada, nos termos da alínea d) do nº 2 do artigo 146º, do mesmo diploma, a proposta, apresentada num concurso para empreitada de obra pública, que não veio acompanhada de qualquer declaração contendo os "preços parciais dos trabalhos a executar", documento este exigido também pelo programa do concurso.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Texto Integral:
EM NOME DO POVO
Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
E...- Engenharia e Construções, L.da, veio interpor, a fls. 175, o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, de 23 de Agosto de 2011, a fls. 152-170, pela qual foi julgada totalmente improcedente a acção de contencioso pré-contratual que intentou contra a Santa Casa da Misericórdia de Ovar visando impugnar a deliberação de 18 de Março de 2011, de adjudicação da empreitada de "Remodelação do Edifício Sede da Santa Casa da Misericórdia de Ovar", à empresa T... - Construções e Recuperação de Espaços, L.da.
Invocou para tanto que a sentença recorrida procedeu a uma incorrecta apreciação dos factos e a seu errado enquadramento jurídico, face ao disposto no artigo 60º, n.º4, do Código dos Contratos Públicos, pois deveria ter declarado nulos quer o acto de adjudicação impugnado que considerou que a proposta da ora Recorrente não satisfazia o disposto naquele preceito, quer o contrato e todos os actos subsequentes.
A Santa Casa da Misericórdia de Ovar apresentou contra-alegações defendendo a manutenção da sentença recorrida, porque acertada.
O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer também no sentido de ser negado provimento ao recurso. *Cumpre decidir já que nada a tal obsta. *São estas as conclusões das alegações do presente recurso jurisdicional e que definem respectivo objecto:
I. Por não se conformar, vem a aqui A. recorrer da sentença que julgou improcedente o peticionado pela Autora aqui Recorrente, nomeadamente fosse " o R. condenado a reconhecer e aceitar que: I)Seja julgado nulo o relatório final datado de 10/03/2011, por violação da Lei e Princípios enformadores dos procedimentos, nos termos supra expostos. II) Seja julgado nulo o acto administrativo de adjudicação da empreitada de "Remodelação do Edifício Sede da Santa Casa da Misericórdia de Ovar" ao concorrente T... - Construção e Recuperação de Espaços, Lda, praticado em 18 de Março de 2011 pela Santa Casa da Misericórdia de Ovar, nos termos do disposto no art.º 133º do CPA, com todas as devidas consequências legais. III) Seja julgado nulo e ineficaz tudo quanto tenha sido posteriormente praticado após o referido acto de adjudicação; IV) Seja condenado a Ré a repor tudo no estado anterior ao acto de adjudicação; V) Seja condenada a Ré a admitir a concorrente E... - Engenharia, S.A, e graduada no presente procedimento, sendo assim reposta a verdade, a justiça e a legalidade no presente concurso público."
II. Salvo devido respeito, a sentença recorrida padece de incorrecto julgamento quer por errada apreciação da matéria de facto, quer por errada aplicação do direito, porquanto fundamenta de modo errado e ilegal, o que se invoca para os devidos e legais efeitos.
III. O Tribunal a quo, no que respeita à matéria de facto considerou assente que a proposta da recorrente foi instruída com o documento 5 junto com a P.I., mas não considerou, como devia, provado que tal documento consubstancia a declaração de preços parciais correspondente a subcategoria de empreiteiro geral ou construtor geral de edifícios de construção tradicional, na classe 6 correspondente ao valor global da proposta (960.000.00€).
IV. Andou mal o Tribunal a quo ao não dar como provado que a Autora instruiu devida e regulamente a sua proposta. Isto porque não conheceu como devia, nem deu como provado que o documento referido na alínea J) dos factos assentes é efectivamente, como defendeu e alegou a recorrente em sede própria, a declaração de preços parciais, documento esse que a recorrida alegou estar em falta e no qual consubstanciou a exclusão da Autora aqui recorrente, no que se não concede ou consente.
V. Ora, o documento alegadamente em falta é precisamente o documento 5 junto com a P.I. e cuja apresentação com a proposta pela Autora o Tribunal a quo dá como assente. O que expressamente a Autora alegou e defendeu ab initio, e que por si só implica decisão diversa à recorrida, o que se requereu e reitera.
VI. Assim e no que concerne à fundamentação de direito, a decisão recorrida incorre em erro de julgamento a partir do momento em que não considera provado que a Autora apresentou, como defendeu e alegou, com a proposta, a "declaração dos preços parciais dos trabalhos a executar, correspondente às habilitações contidas nos alvarás, nos termos do disposto no n.º 4 do art.º 60º do CCP".
VII.E andou mal o Tribunal a quo ao julgar que faltou à proposta da aqui recorrente um documento exigido pelo programa do concurso, validando a exclusão da proposta nos termos do disposto no art 57º 1 e d) n.º 2 do art.º 146º do CCP.
VIII. Como se alegou e reitera, a Autora, instruiu a sua proposta completa e regularmente, composta por todos os documentos exigidos em sede de programa de concurso, nomeadamente com o documento n.º 5 junto com a P.I. que é efectivamente a declaração de preços parciais dos trabalhos a executar, correspondente às habilitações contidas nos alvarás.
IX. A concorrente E... apresentou proposta ao procedimento concursal aqui em crise, tendo para o efeito concorrido com a 1ª Categoria (Edifícios e Património Construído), com a Subcategoria de Empreiteiro ou construtor Geral de Edifícios de construção Tradicional, Classe 6, tudo conforme Alvará de construção emitido pela entidade competente e junto com a proposta.
X. A Autora recorrente sendo titular da habilitação de empreiteiro geral/construtor geral adequada à obra em causa (para efeitos da alínea f) do ponto 15 do programa de concurso) e em classe que cobre o seu valor global, concorreu nessa qualidade de empreiteiro geral, o que lhe era permitido e admissível nos termos do referido ponto.
XI. Considera-se que ao concorrer como empreiteiro geral, a declaração dos preços parciais dos trabalhos a executar, correspondente às habilitações contidas nos alvarás, nos termos do disposto no n.º 4 do art.º 60º do CCP, não necessita de ser subdividida por qualquer outra subcategoria tendo em conta que o valor global da obra se insere na subcategoria de empreiteiro geral.
XII. Motivo pelo qual a Autora apresentou com a sua proposta declaração para a classe de empreiteiro geral correspondente ao valor global da proposta, obedecendo ao disposto no art.º 60º do CCP, e tudo de acordo com a alínea f) do ponto 15 do Programa de concurso.
XIII. Assim o documento exigido "declaração dos preços parciais dos trabalhos a executar, correspondente às habilitações contidas nos alvarás" (Doc. 5) reflecte o valor global da proposta, atendendo à possibilidade legalmente admissível e expressamente prevista no ponto 15 f) do Programa de concurso.
XIV. Pelo que a exclusão da Autora é incorrecta e manifestamente ilegal, e o relatório preliminar a que atempadamente se respondeu, e bem assim o relatório final do procedimento, fundamentaram errada e ilegalmente uma exclusão de um concorrente, nomeadamente da Autora, por alegada falta de apresentação de um documento, que, contrariamente ao referido pela Ré, se encontra regular e efectivamente junto à proposta apresentada.
XV. Face à ilegalidade que tais relatórios encerram, e nulidades que se invocam para os devidos e legais efeitos, fica assim ferida a decisão de adjudicação, bem como qualquer acto ou decisão que lhe suceda, designadamente o próprio contrato de empreitada que vier a ser celebrado. Por manifesta violação da lei e dos princípios gerais de direito aplicáveis a este tipo de procedimentos, designadamente o princípio da prossecução do interesse público, princípio da concorrência, da transparência, da igualdade, da boa-fé, da imparcialidade, entre outros.
XVI. Deste modo peticionou e reitera a Autora aqui recorrentes que deve o acto de adjudicação em crise ser considerado nulo, por vício de violação de lei, nos termos do disposto no art.º 133º d) do CPA, o que se invoca e requer para os devidos e legais efeitos.
XVII. Apesar de a R. ter considerado que a Autora se encontra devidamente habilitada para a realização da empreitada em causa, insistiu e reiterou na alegada falta de um documento exigido pelo Programa de Concurso e previsto no n.º 4 do artigo 60º do CCP, no que se não concede, nem aceita, como supra defende, reitera e supra descreveu.
XVIII. É um facto que o procedimento concursal é o regulamento aplicável, assim como se aceita que a Entidade Adjudicante não pode dispensar a apresentação de qualquer documento exigido nos termos do art.º 57º do CCP. Mas não pretendeu a Autora aqui recorrente ser dispensada da apresentação de qualquer documento exigido, antes defendeu que apresentou o documento alegadamente em falta.
XIX. A questão subjudice trata apenas de aferir se o documento n.º 5 junto com a P.I., apresentado com a proposta pela Autora é ou não o documento exigido pela Entidade Adjudicante em sede de procedimento concursal. E defendeu e reitera a Autora recorrente que o documento 5 junto com a P.I. corresponde à declaração de preços parciais exigida. E apesar de a mesma retratar o valor global da proposta, o documento que o programa do procedimento concursal em causa exige é uma declaração dos preços parciais dos trabalhos a executar, correspondentes às habilitações contidas nos alvarás. Ora, se a Autora se propõe a concurso habilitada na 1ª Categoria (Edifícios e património construído, na subcategoria de Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Edifícios de construção tradicional, em Classe 6, todos os trabalhos a executar se inserem em tal subcategoria e habilitação.
XX. O documento n.º 5 junto com a P.I. é a "Declaração dos preços parciais dos trabalhos a executar, correspondente às habilitações contidas nos alvarás, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 60º do CCP"
XXI. Sem prescindir, nos termos do disposto no art.º 60º do CCP, nomeadamente no seu n.º 4, que a exigência do documento em crise é para "para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações."
XXII. A declaração foi apresentada pelo valor da proposta, ou seja, pelos €960.000,00, tendo em conta que a Autora aqui recorrente se propôs executar os trabalhos da empreitada lançada a concurso, tendo em conta a sua habilitação na 1ª Categoria (Edifícios e património construído, na subcategoria de Empreiteiro Geral ou Construtor Geral de Edifícios de construção tradicional, em Classe 6.
XXIII. Pelo que é inequívoco e deveria ter resultado provado que o documento exigido nos termos do n.º 9 do concurso foi apresentado pela Autora, legítima e tempestivamente. Resulta aliás dos autos, que tal documento junto com a P.I. como doc 5, foi apresentado, e tal documento é o mesmo que a Recorrida alegou estar em falta, no que se não concede ou concedeu em momento algum. Daqui decorre desde logo que a decisão recorrida incorre em erro de julgamento, pelo que a mesma deverá ser revista e corrigida por este Venerando Tribunal. Por tudo isto, se reitera o que se requereu.
XXIV. A Autora recorrente não pretendeu ser dispensada da apresentação de qualquer documento exigido nos termos do programa do concurso. A Autora recorrente efectivamente apresentou o documento exigido, e contrariamente ao que alegou a Ré Recorrida em sede de relatório final, a declaração junta pela Autora, descriminando o valor correspondente ao valor global da proposta de acordo com a alínea f) do n.º 15 do Programa do Concurso, cumpre o exigido no ponto 9 do Programa de Concurso.
XXV. Isto porque, sendo ambas normas do regulamento imposto pela própria Ré Recorrida, têm igual valor e, na medida em que no ponto 15 do Programa do Concurso se na alínea f1) exige a titularidade pelo concorrente de determinadas subcategorias em classe correspondente ao valor dos trabalhos correspondentes na proposta, OU, Alvará de empreiteiro Geral na classe correspondente ao valor global da proposta,
XXVI. Não faz pois sentido nem corresponde à verdade que se tenha verificado a falta de qualquer documento exigido no programa do concurso, antes foi o mesmo junto à proposta que declara o valor correspondente a subcategoria de empreiteiro geral ou construtor geral de edifícios de construção tradicional, na classe correspondente ao valor global da obra.
XXVII. Sempre se dirá ainda que, pretendeu a Ré fundamentar tal exigência de discriminação de preços na eventual necessidade de o adjudicatário subempreitar trabalhos, e de modo a poder aferir da eventual capacidade técnica de tais subempreiteiros para determinados trabalhos. E se não pretender sequer a Autora subempreitar o que quer que seja? É a Autora obrigada a subempreitar? Detendo a Autora plena capacidade técnica para todos os trabalhos para os quais apresentou proposta, é violador dos princípios enformadores deste tipo de procedimentos uma exclusão com tal alegado fundamento.
XXVIII. Pelo exposto deverá concluir-se que a proposta apresentada pela concorrente E... - Engenharia, S.A., Autora e aqui recorrente, e documentação constante da mesma, não tem qualquer tipo de causa ou fundamento de exclusão.
XXIX. Nas decisões administrativas têm de imperar os Pr. da Boa-fé, o Pr. da defesa do Interesse Público, o Pr. da Concorrência, entre outros, o que não sucede com o acto de adjudicação que se impugna, porquanto o mesmo tem origem num relatório final que exclui de forma infundamentada, violadora das garantias da concorrente aqui Autora, a proposta por este apresentada ao procedimento concursal aqui em crise. E que exclui a proposta da recorrente no presente procedimento concursal, fundamentando com tal alegada falta de documento, proposta esta aliás correspondente melhor preço para a empreitada em causa.
XXX. Pelo que o acto administrativo que impugnado é assim desrespeitador dos princípios de Direito supra referidos, desrespeitador da lei e do seu espírito, desrespeitador das garantias dos particulares, desrespeitador do interesse público e neste caso concreto da Concorrente E... - Engenharia, S.A..
XXXI. A recorrente não reconheceu em momento algum a não apresentação de qualquer documento exigido em sede de concurso. Antes pelo contrário, defendeu e defende que apresentou todos os documentos exigidos e necessários à admissão, apreciação, avaliação e graduação da sua proposta.
XXXII. Face à manifesta vantagem da Autora aqui recorrente, no que ao factor preço respeita, culminaria na adjudicação do contrato à aqui recorrente.
XXXIII.A declaração em causa foi exigida em sede de programa de concurso nos termos no n.º 4º do art.º 60º do CCP, pelo que a recorrente apresentou como podia, a declaração junta como documento 5 da P.I., pelo valor global da proposta. Pelo que não tinha a Recorrida que dispensar a apresentação de nenhum documento em falta, não se concedendo que tal falta existisse, antes se considerando provado que tal documento instrui a proposta apresentada em devido tempo.
XXXIV. O que a Ré e a sentença recorrida erradamente consideraram foi que o documento apresentado não correspondia ao exigido, no que se não concede ou aceita.
I- A Matéria de facto
Embora formalmente a Recorrente dirija também o seu ataque à matéria de facto seleccionada na decisão recorrida, na verdade o que efectivamente pretende é que se retire da matéria dada como provada conclusão diversa da que foi retirada na sentença, em concreto, que com a apresentação, em sede do concurso, do documento junto como n.º 5 com a petição inicial e cujo teor foi dado como provado na alínea J), ficou devidamente instruída a sua proposta.
Deverá assim dar-se como assente a seguinte matéria de facto, constante da sentença recorrida:
A) A Autora é uma sociedade anónima que tem como objecto a actividade de construção civil e obras públicas.
B) Por anúncio de procedimento nº 4003/2010, publicado na II Série do Diário da República, Parte L, nº 170, de 01 de Setembro de 2010, foi aberto concurso público para adjudicação da empreitada de Remodelação do Edifício Sede da Santa Casa da Misericórdia de Ovar, sendo entidade adjudicante a referida Santa Casa - cfr. Doc. 1 junto com a PI.
C) A Autora e as empresas identificadas no Relatório Preliminar apresentaram propostas ao referido Concurso Público através da plataforma electrónica de contratação pública VortalGOV - cfr. Doc. 2 junto com a PI.
D) Do Programa de Concurso - (Ponto 9) constava que os concorrentes tinham que apresentar com a proposta:
«Declaração dos preços parciais dos trabalhos a executar, correspondente às habilitações contidas nos alvarás, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 60º do CCP».
E) Do Programa de Concurso - (Ponto 15) constava que, após a adjudicação, o adjudicatário deveria apresentar, através da plataforma electrónica de contratação pública, no prazo de cinco dias, entre outros, o seguinte documento:
«F) Alvará emitido pelo Instituto de Construção e Imobiliário, IP, contendo as habilitações adequadas e necessárias à execução da obra a realizar, nomeadamente:
F1) a 1ª, 2ª, 4ª, 5ª, 6ª, 7ª, 8ª e 9ª subcategoria da 1ª categoria, na classe correspondente ao valor dos trabalhos correspondentes incluídos na proposta a 9ª subcategoria da 2ª Categoria, na classe correspondente ao valor dos trabalhos correspondentes incluídos na proposta, e 1ª subcategoria da 5ª Categoria, na classe correspondente ao valor dos trabalhos correspondentes incluídos na proposta ou Alvará de Empreiteiro Geral de Obras de Edifícios de Construção Tradicional, na classe correspondente ao valor global da proposta».
F) Em sede de Relatório preliminar elaborado pelo Júri do procedimento em 25/01/2011, o Júri propôs a exclusão de vários concorrentes, entre os quais a Autora, referindo concretamente no que diz respeito à mesma, o seguinte:
"Na proposta do concorrente E..., Engenharia e Construções, LA., falta a indicação dos preços parciais dos trabalhos que se propõe executar conforme solicitado no ponto 9 do Programa de Concurso e de acordo com os n.ºs 4 e 5 do art.º 60.º do CCP. O facto de o concorrente ser titular de habilitação de empreiteiro geral não dispensa a apresentação deste documento, propondo-se a sua exclusão ao abrigo da alínea d) do n-°2 do art.º 146.º conjugado com a alínea c) do n.-° 1 do art.º 57.º do CCP". - cfr. Doc. 2 anexo a Petição Inicial.
G) O Relatório preliminar foi notificado a todos os concorrentes, tendo a Autora, em sede de audiência prévia, apresentado a sua reclamação contra o conteúdo do mesmo sustentando entre o demais, que o Relatório preliminar em causa ao excluir a Autora por alegada falta de apresentação de um documento exigido pelo Programa de concurso pela mesma, não respeita a lei nem os vários princípios gerais de direito subjacentes aos procedimentos concursais - cfr. Doc. 3 anexo à Petição Inicial.
H) Decorrido o prazo de audiência prévia o júri do procedimento do concurso elaborou, em 10.03.2011 o Relatório Final, notificado à Autora em 18.03.2011, mediante o qual o Júri do deliberou manter as pontuações e ordenação das propostas constante do Relatório Preliminar, indeferindo a pretensão expressa pela Autora em sede de audiência prévia, com o seguinte teor:
«Relativamente ao concorrente E... - Engenharia, S.A. foi proposta a sua exclusão por incumprimento do ponto 9 do Programa de Concurso, no que se refere à apresentação da "Declaração dos preços parciais dos trabalhos a executar correspondente às habilitações contidas nos alvarás, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 60º do CCP".
A E... - Engenharia, S.A., em sede de audiência prévia, vem recorrer dessa intenção de exclusão alegando que:
1 - Sendo titular da habilitação de empreiteiro geral na classe que cobre o valor global da obra, concorreu nessa qualidade.
2 - Ao abrigo da alínea f) do Ponto 15 do Programa de Concurso, está o concorrente devidamente habilitado para executar a obra.
3 - O concorrente apresentou a declaração de preços parciais pelo valor global correspondente à subcategoria de empreiteiro geral.
4 - Ao concorrer como empreiteiro geral, é desnecessária a declaração dos preços parciais subdividida pelas diferentes subcategorias.
5 - A proposta encontra-se devidamente instruída, não existindo fundamento para exclusão do concorrente.
6 - O Relatório Preliminar deve ser alterado, de forma a que seja admitida a proposta da E... - Engenharia, S.A. e que esta seja pontuada em função do critério de adjudicação estabelecido.
Perante o exposto, o júri tomou as seguintes deliberações:
1 - O Programa de Concurso refere na alínea f) do ponto 15, que o concorrente deve ser detentor de "alvará emitido pelo Instituto de Construção e Imobiliário, IP, contendo as habilitações adequadas e necessárias à execução da obra a realizar, nomeadamente: f1) a 1ª, 2ª, 4ª, 5ª, 6ª, 7ª, 8ª e 9ª subcategoria da 1ª categoria, na classe correspondente ao valor dos trabalhos correspondentes incluídos na proposta a 9ª subcategoria da 2ª Categoria, na classe correspondente ao valor dos trabalhos correspondentes incluídos na proposta, e 1ª subcategoria da 5ª Categoria, na classe correspondente ao valor dos trabalhos correspondentes incluídos na proposta ou Alvará de Empreiteiro Geral de Obras de Edifícios de Construção Tradicional, na classe correspondente ao valor global da proposta.
2 - O concorrente é efectivamente titular de habilitação de empreiteiro/construtor geral adequada à obra em causa e em classe que cobre o valor global.
3 - O artigo 31.º. do Decreto-Lei nº 12/2004, de 9 de Janeiro, que estabelece o regime jurídico de ingresso e permanência na actividade da construção, refere que "1 - Nos concursos de obras públicas e no licenciamento municipal, deve ser exigida uma única subcategoria em classe que cubra o valor global da obra, a qual deve respeitar ao tipo de trabalhos mais expressivo, sem prejuízo da eventual exigência de outras subcategorias relativas aos restantes trabalhos a executar e nas classes correspondentes. 2 - A habilitação de empreiteiro geral ou construtor geral, desde que adequada à obra em causa e em classe que cubra o seu valor global, dispensa a exigência a que se refere o número anterior".
4 - A dispensa a que se reporta o nº 2 do artigo 31º do Decreto-Lei nº 12/2004, é o da posse da habilitação do empreiteiro geral nas subcategorias identificadas na alínea f) do ponto 15 do Programa de Concurso.
5 - O motivo invocado para a exclusão do concorrente não foi a falta de habilitações para a execução da obra, uma vez que se encontra devidamente habilitado para a realização da empreitada em causa, mas sim a falta de um documento exigido pelo Programa de Concurso e previsto no nº 4 do artigo 60º do CCP.
6 - A declaração de preços parciais dos trabalhos exigida no ponto 9 do Programa de Concurso, releva para aferição dos trabalhos a executar pelo empreiteiro geral e de eventuais declarações de subempreiteiros intervenientes, uma vez que o facto de o empreiteiro ser detentor de todas as autorizações exigidas, não invalida que este subempreite certos trabalhos, por esta última opção ser às vezes mais viável por exemplo por economia de custos na deslocação de recursos.
7 - A detenção da habilitação de empreiteiro geral em classe que cubra o valor global da obra, segundo o artigo 12º do Decreto-Lei nº 12/2004, "habilita o seu titular a subcontratar a execução de trabalhos enquadráveis nas subcategorias necessárias à concretização da obra, sendo responsável pela sua coordenação global, desde que: a) o valor total da obra não exceda o limite definido pela classe que detém; b) Os trabalhos subcontratados sejam executados por empresas devidamente habilitadas".
8 - A apresentação da declaração dos preços parciais dos trabalhos, não é facultativa, conforme estabelecido no nº 4 do artigo 60º e na alínea h) do nº 1 do artigo 132º do Decreto-Lei 18/2008, de 29 de Janeiro, com a alteração introduzida pelo Decreto-Lei nº 278/2009, de 2 de Outubro, não tendo o júri competência para dispensá-la.
9 - O Programa de Procedimento inscreve de forma imperativa os trâmites e as formalidades respeitantes às propostas a apresentar. Não pode a entidade adjudicante alterar, retirar ou substituir as disposições do Programa de Procedimento, sob pena de violação do princípio de estabilidade das regras concursais.
10 - A declaração de preços parciais dos trabalhos a executar apresentada pelo concorrente não dá cumprimento ao exigido no ponto 9 do Programa de Concurso dado não se encontrar subdividida pelas subcategorias correspondentes aos trabalhos previstos.
11 - De acordo com a alínea d) do nº 2 do artigo 146º, o júri deve propor a exclusão das propostas "Que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos do disposto no nº 1 do artigo 57º".
12 - Face ao exposto, o júri deliberou manter a proposta de exclusão do concorrente E.... Engenharia, S.A. ao abrigo da alínea d) do nº 2 do artigo 146º conjugado com a alínea c) do nº 1 do artigo 57º do CCP»."- cfr. Doc. 6. junto à Petição Inicial.
I) O Relatório final foi notificado a todos os concorrentes.
J) Com a proposta a Autora apresentou declaração do valor correspondente a subcategoria de empreiteiro geral ou construtor geral de edifícios de construção tradicional, na classe 6 correspondente ao valor global da proposta (960.000.00€) de acordo com o ponto 15.º, alínea f), do Programa de Concurso e conforme Alvará de construção emitido pela entidade competente e junto com a proposta - cfr. doc n.º 5 anexo à Petição Inicial.
K) A Santa Casa da Misericórdia de Ovar é uma instituição particular de solidariedade social tendo como principais actividades de apoio social: a) No sector de idosos: Lar de Idosos, Centro de Dia, Apoio Domiciliário, Centro Comunitário. b) No sector da infância: Creche, Creche familiar e Pré-escolar.
L) Previamente à presente acção, a Autora instaurou o processo cautelar n.º 318/11.7BEAVR, que foi julgado improcedente.
M) A presente acção foi apresentada em 08.04.2011 - cfr. fls. 2 dos autos e registo do SITAF.
II - Enquadramento jurídico
Antes de mais importa referir que os vícios imputados ao acto de adjudicação apenas seriam susceptíveis de determinar a sua anulação e não a declaração de nulidade, pois não se vislumbra no caso concreto sequer a possibilidade de ter sido violado o conteúdo essencial de um qualquer direito fundamental, nem a Impugnante, apesar de invocar o disposto no artigo 133º, alínea d) do Código de Procedimento Administrativo (artigo 29º da petição inicial), concretiza a violação de qualquer direito fundamental.
Provavelmente invocou a nulidade tendo em conta o apertado prazo a que alude o artigo270º do Código de Contratos Públicos.
Dito isto vejamos.
A ora Recorrente limita-se no recurso a reiterar os argumentos que já vinha a aduzir ao longo do processo em Primeira Instância, sem agora trazer nenhum argumento novo significativo que ponha em crise o decidido.
Defende a ora Recorrente que exclusão da sua proposta no concurso em apreço viola a lei e vários princípios gerais de direito subjacentes aos procedimentos de concurso dado que o documento que juntou como n.º 5 à petição inicial é precisamente o documento exigido pela norma constante do n.º 4 do artigo 60º do Código de Contratos Públicos, e pelo Ponto 9 do Programa de concurso, a declaração dos preços parciais dos trabalhos a executar, correspondente às habilitações contidas nos alvarás.
Mas sem razão.
Como se refere na sentença recorrida, "o Programa do concurso público assume a natureza jurídica regulamentar, funcionando como parâmetro normativo-regulamentar em relação aos actos administrativos e demais actos procedimentais praticados no decorrer do concurso público, projectando-se assim as suas disposições no domínio da legalidade e validade administrativas dos actos praticados no seu seio por qualquer das pessoas que nele intervêm, incluindo a entidade adjudicante que fica auto vinculada ao bloco de legalidade por ela própria instituído no Programa do Concurso"(Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, in Concursos e Outros Procedimentos de Adjudicação Administrativa, Almedina, 2005, p. 131,ver também Margarida Olazabal Cabral in O Concurso Público nos Contratos Administrativos, págs. 170 a 176).
Ora o Ponto 9 do Programa do concurso aqui em causa exigia a apresentação, com as propostas, da "Declaração dos preços parciais dos trabalhos a executar, correspondente às habilitações contidas nos alvarás, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 60º do CCP".
O que nos remete para o disposto no n.º 4 do artigo 60º do Código de Contratos Públicos:
"No caso de se tratar de procedimento de formação de contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, o concorrente deve indicar na proposta os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondentes às habilitações contidas nos alvarás ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, I. P., nos termos do disposto na alínea a) do n.º 5 do artigo 81.º, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações.".
Reportando-nos ao caso concreto da proposta da ora Recorrente, esta não foi acompanhada de qualquer declaração contendo os "preços parciais dos trabalhos a executar".
E o documento junto como n.º 5 da petição inicial não satisfaz esta exigência, como se disse no acto impugnado, e na sentença recorrida que confirmou a sua validade, dado não se encontrar subdividida pelas subcategorias correspondentes aos trabalhos previstos.
Faltou pois à proposta da Autora um documento exigido pelo Programa de Concurso, previsto no nº 4 do artigo 60º do Código de Contratos Públicos, cuja apresentação era obrigatória e, por isso, não podia ser dispensada.
Por outro lado, o ponto 15 f) do Programa de Concurso que a ora Recorrente invoca em defesa da sua tese, não é aplicável ao caso.
A norma aqui contida diz respeito, como defende a Entidade Recorrida, aos documentos exigíveis após a adjudicação, ao adjudicatário, nos termos do disposto no artigo 81º,do Código de Contratos Públicos, e cuja falta de apresentação determina a caducidade da adjudicação, nos termos do disposto no artigo 86º do mesmo diploma.
Assim sendo, a exclusão da Autora por incumprimento do ponto 9 do Programa de Concurso e de acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 60º e na alínea d) do nº 2 do artigo 146º, ambos do Código de Contratos Públicos,a exclusão da proposta da ora Recorrente não padece do vício de violação de lei.
Em suma, decidiu acertadamente o Tribunal a quo ao julgar válidos o acto de adjudicação e os subsequentes, e, em consequência, improcedentes os pedidos formulados.
Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em negar provimento ao recurso jurisdicional, mantendo a decisão recorrida.
Custas pelo Recorrente. *Porto, 27 de Outubro de 2011
Ass. Rogério Paulo da Costa Martins
Ass. Ana Paula Soares Leite Martins Portela
Ass. Maria do Céu Dias Rosa das Neves