Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 1 de Abril de 2011 (proc. 168/10)

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Sumário:

1 - A aceitação de soluções alternativas pelos concorrentes, mesmo que não estejam de acordo com aspectos que a própria Administração considerou vinculados, implica a possibilidade de toda e qualquer solução, que casuisticamente a Administração irá validando de "forma a corresponder " às suas necessidades, ocorrendo no fundo uma alteração do objecto do concurso.
2 - Essa grande liberdade de escolha comporta riscos de arbítrio, por ausência de referência obrigatória quanto aos fundamentos da escolha, pelo que se impunha uma previsão ab initio dessa ausência de vinculação a fim de que estivesse devidamente prevista, ponderada e salvaguardada a forma de avaliação da mesma.*
* Sumário elaborado pelo Relator
   

Texto Integral:

O MUNICÍPIO DE VILA REAL vem interpor recurso jurisdicional do acórdão proferido pelo TAF DE MIRANDELA em 25/11/2010, que julgou procedente a acção de contencioso pré-contratual intentada pela sociedade J... ARQUITECTOS, LDA., com sede em Lisboa, e, em consequência, anulou a decisão do Presidente da Câmara Municipal de Vila real de 18/3/2010 que adjudicou à sociedade "M... - Arquitetos, Lda", aqui contra-interessada, o "Projecto de Execução para a Construção das Piscinas Municipais do Calvário".
Para tanto alega em conclusão:
"1 - Não deve ser considerada ilegal, nem viola os princípios da transparência e igualdade a decisão da administração que considera que o programa preliminar apresentado como conjunto de regras que definem o pretendido pelo dono da obra, pode deixar de ser cumprido desde que seja fundamentada na proposta a razão de ser dessa opção.
2 - Se a administração avisa previamente todos os concorrentes que o programa preliminar não é absolutamente imperativo, podendo ser proposto programa base que o contraria, sendo esta proposta apreciada livremente pelo júri, fica afastado qualquer risco de parcialidade ou falta de transparência já que todos os concorrentes estão em igualdade de circunstancias;
3 - A discricionaridade técnica que o júri detêm na apreciação das propostas não pode originar risco de falta de transparência se a decisão tomada for ou dever ser fundamentada, pois esta fundamentação permite que a decisão tomada seja apreciada e sindicada se for o caso.
4 - A decisão do réu de permitir aos concorrentes apresentarem propostas para elaboração de projecto em que o programa base do mesmo contraria aspectos constante do programa preliminar, nas circunstâncias em que foi tomada no concurso e apreciação, não origina riscos de falta de transparência ou igualdade.
5 - O facto de um concorrente remeter a justificação do preço proposto para regras que foram afastadas e revogadas por não serem adequadas á concorrência sem, por isso, fundamentarem os preços a apresentar, tem de ser penalizadora.
6 - Não deve considerar-se como excelente a justificação do preço proposto que se limita a remeter os cálculos de tais valores para legislação desadequada.
Assim, a sentença impugnada deve ser revogada e substituída por outra que não conceda provimento á acção e faça improceder o pedido apresentado, absolvendo o réu, assim se fazendo Justiça!"

A sociedade recorrida não contra-alegou.

O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado para o efeito, não emitiu parecer.
 
FACTOS FIXADOS EM 1ª INSTÂNCIA (e com relevância para os autos)

1. A Requerente tem como objecto social a realização de actos de arquitectura, projectos e planeamento.
2. Por anúncio, publicado no DR II S, nº 16 em 25 de Janeiro de 2010, o R. publicitou o lançamento do concurso público para aquisição do "Projecto de Execução para a Construção das Piscinas Municipais do Calvário - Projecto RU 1.1 do Programa de Acção, Parcerias para a Regeneração Urbana (Articular)", classificado como um tipo de contrato de "Aquisição de Serviços" - doc. n.º 1 da PI;
3. Dá-se aqui por reproduzido o caderno de encargos (onde se inclui as cláusulas especiais), com o seguinte destaque: "PISCINA (c) - A Piscina do Calvário tem como características: // Piscina de Tipo Desportivo (item 1/art.º4.º/ DL 317.97) // Piscina de Base Formativa (...)// Piscina de Uso Publico (...) Piscina coberta (...) As Piscinas permitirão actividades de : Natação Pura (aprendizagem/ aperfeiçoamento)//(...) Pólo aquático // (...) 3. Aspectos vinculativos // (...)Relativamente às piscinas são ainda consideradas como vinculativas as seguintes áreas mínimas de plano de água: // Tanque principal - 25,00 m X 17,00 m com profundidade constante de 2,00 m, descontando as necessárias pendentes para escoamento de água ( 8 pistas); // Tanque de aprendizagem - 21,00 m X 8,00 m com profundidade de 0,90 m, desenvolvida num plano tramo de 6,00 m de cumprimento e inclinado na restante área, até profundidade de 1,30 m (...) - docs. n.ºs 4 e 5
4. Era "permitida a apresentação de propostas variantes ao Estudo Prévio/aditamento 1 constante das peças patenteadas a concurso desde que seja atendido aos Aspectos Vinculativos expressos no ponto 3 do Programa Preliminar,..." e no ponto 3 do Caderno de Encargos (Clausulas Especiais) - doc. n.º 2, ponto 12; doc. n.º 3, ponto 3; doc. n.º 5, ponto 3
5. Foram solicitados, pela Requerente, e prestados, pelo Júri, os esclarecimentos que constam do doc. n.º 6, que aqui se dão por reproduzidos, com o seguinte destaque: "1.º É possível adaptar a área de implantação a uma Proposta Variante (...) ?// Resposta : //(...) O documento de viabilidade do programa preliminar apresentado permite ao concorrente atestar da viabilidade da obra de acordo com o programa preliminar fornecido ou apresentar soluções alternativas com o esquema da obra e programação das diversas operações a realizar, caso entenda por conveniente.// Se o concorrente achar que, no todo ou em qualquer parte, o programa preliminar fornecido não é exequível ou que não é a solução que melhor serve os interesses do Dono da Obra, deve e pode propor soluções alternativas, mesmo que estas não estejam de acordo com os aspectos considerados vinculativos. Devendo sempre apresentar as possíveis soluções alternativas de forma a proporcionar ao Donio da Obra a conmpreensão clara das soluções propostas pelo projectista com base nas indicaçõers expressas no programa prelimiar" // (...) 4.º Pretende-se uma piscina que também permita a realização de Competições de Natação Nível Nacional? // Resposta:// Sim, conforme Programa Preliminar, parte integrante das peças patenteada a concurso"
6. A Requerente submeteu a sua proposta em 17 de Fevereiro de 2010, tendo sido constituída de todos os documentos exigidos pelo Requerido, no Ponto 11 do Programa do Procedimento, designadamente e com relevância para a causa: "11.1.2 -Documentos que, em função do objecto do contrato a celebrar e dos aspectos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar." - art.º 9.º da PI, não contestado e doc. n.º 2
7. Dá-se aqui por reproduzida a "Nota Justificativa do Preço Proposto" - doc. 11 da PI, no seguinte segmento: "O valor dos honorários de projecto das diferentes especialidades foi aprovado em função da estimativa de Custo Geral da Obra, elaborando-se um cálculo com base nas Tabelas para o Cálculo de Honorários, referentes a projectos de Obras Públicas, afectado de um desconto de 50% e arredondamento" :
8. Para esse ponto, os concorrentes, como a Requerente, haviam de atentar à informação que era exigida pelo Regulamento de Avaliação, para ser submetida à classificação no factor "Preço" - Artigo 9º do Regulamento de Avaliação -, no factor "Coerência da Proposta" - Artigo 10º RA - e no factor "Viabilidade do Programa Preliminar" - Artigo 11º RA - dos requisitos, em cada item, dos respectivos subfactores - doc. n.º 2 ( Anexo IV - Regulamento de Avaliação);
9. O factor Preço era constituído pelos subfactores valor da prestação; e Nota justificativa do preço, que incluiria: a) lista de preços parcelares correspondentes às diferentes partes da prestação de serviços, com demonstração do preço global do conjunto dos trabalhos; //b) cronograma de meios humanos em gráfico de barras indicadoras da afectação com o desenrolar dos trabalhos; //c) inclusão dos meios auxiliares, nomeadamente, coordenação de segurança em projecto, o plano de segurança e saúde, a compilação técnica, plano de recolha de resíduos, estudos geotécnicos e outros custos que concorram para a formação do preço global;// d) listagem e caracterização de trabalhos parte integrante do trabalho a desenvolver, não associados a um preço unitário.
10. O factor Coerência da Proposta, continha os seguintes subfactores : - A) A Metodologia da Realização do Projecto, que incluiria - memória descritiva e justificativa do modo de organização da prestação, critérios de concepção e dimensionamento proposta para garantir a aprovação do projecto; articulação prevista com as entidades que tenham de se pronunciar sobre o projecto.// B) O Programa de Realização do Projecto, que incluiria: a) apresentação de faseamento com descrição pormenorizada e cronograma detalhado por semana e por actividade, com respeito pelos prazos parcelares vinculativos, incluindo trabalhos auxiliares; b) compatibilização com as intervenções dos diferentes técnicos; c) identificação do caminho crítico; d) indicação da estratégia adoptada para o controle e superação desse caminho crítico. C) O Organigrama da Equipa Técnica, que incluiria: a) a sua constituição e cronograma da mobilização dos meios humanos e materiais; b) demonstração da coerência com a programação da realização do projecto; c) discriminação o número de meios e especialização para cada tarefa; d) referenciação do coordenador técnico do projecto e corpo técnico afecto, incluindo as qualificações profissionais e o vinculo profissional ao concorrente, de cada um; e) organograma funcional de articulação com as entidades externas, incluindo entidades licenciadoras e entidade adjudicante.
11. Para o factor Viabilidade do Programa Preliminar, que, com vista a proporcionar ao dono da obra a compreensão clara das soluções propostas pelo concorrente com base nas indicações expressas no Programa Preliminar, deveria conter: a) Memória descritiva onde ateste sobre a viabilidade da Obra de acordo com o Programa Preliminar, apresentando, caso ache conveniente (obrigatório no caso de verificação da não viabilidade do Programa Preliminar fornecido) soluções alternativas com o esquema da obra e programação das diversas operações a realizar; b) Definição dos critérios gerais de dimensionamento das diferentes partes constituintes da obra; c) Indicação dos condicionamentos principais relativos à ocupação do terreno/espaço, nomeadamente os legais, topográficos, urbanísticos, geotécnicos e ambientais; d) Peças escritas e desenhadas e/ou outros documentos informativos necessários para o perfeito esclarecimento da proposta do concorrente, no todo ou em qualquer das suas partes, incluindo as que porventura se justifiquem para definir as alternativas de solução propostas pelo projectista e avaliar da sua viabilidade em função das condições de espaços, técnicas, de custos e de prazos; e) Estimativa Geral do custo da Obra, tendo em conta os encargos mais significativos com a sua realização e análise comparativa dos custos de manutenção e consumos da obra nas soluções propostas, deve ainda ser dada especial relevância e de uma forma autónoma de qual o volume de água e de ar a tratar de acordo com a zona de piscina considerada; f) Descrição sumária das opções relacionadas com o comportamento, funcionamento, exploração e conservação da obra; g) Informação sobre a necessidade de obtenção de elementos topográficos, geológicos, geotécnicos, hidrológicos, climáticos, características das componentes acústica do ambiente, redes de infra-estruturas ou de qualquer outra natureza que interessem à elaboração do projecto.
12. Os níveis de valoração quantitativa que o Relatório de Avaliação fixava para os subfactores, a retirar da análise qualitativa dos descritores ou sub-subfactores, eram ( art.º 12.º do RA):
Excelente - 100 pts - Demonstra o cumprimento total das exigências, exaustivo e totalmente adequado aos objectivos
Muito Bom - 80 pts - Demonstra o cumprimento das exigências de forma extensa, exposição dos elementos fornecidos com detalhe
Bom - 70 pts - Apresentação dos aspectos mais importantes, argumentação não totalmente explicita
Suficiente - 60 pts - Apresentação razoável mas incompleta dos elementos solicitados, exposição muito sintética e deficiente na abordagem de alguns pontos
Insuficiente - 40 pts - Dificilmente compatível e/ou desadequada quanto aos objectivos, não totalmente/claramente fundamentada
Inexistente - 0 pts - Omissa ou sem apresentação de qualquer resposta compatível com o exigido
13. Com data de 1 de Março de 2010, foi disponibilizado na plataforma electrónica o Relatório Preliminar de avaliação das propostas, no qual por unanimidade se propôs a adjudicação à sociedade " M..., Arquitectos, Lda" do "Projecto de Execução para a Construção das Piscinas do Calvário" - doc. n.º 8 da PI, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
14. Em 9/3/2010, em sede de audiência prévia, a Requerente apresentou a sua exposição/reclamação, por discordar com a avaliação feita pelo Júri, nalguns factores, levando ao desfavor da sua classificação final, por não terem sido correctamente aplicadas as regras do procedimento - doc. n.º 9 da PI, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
15. Dá-se aqui por reproduzida a resposta do Júri à Exposição/reclamação que a A. apresentou, - doc. 10, fls. 21 a 28 da PI,
16. Dá-se aqui por reproduzido o "Relatório Final" do júri do concurso, no qual manteve o teor das conclusões do relatório preliminar (proposta de adjudicação à "M...") - Doc. n.º 10 da PI;
17. Em 18 de Março de 2010 foi disponibilizado na plataforma o Relatório Final, onde, mantendo o Júri todas as pontuações do Relatório Preliminar, se vê aposta a decisão do Senhor Presidente da Câmara "Adjudicar e ratificar na próxima reunião de Câmara" ( doc. n.º 10 da PI) - acto aqui impugnado;

QUESTÕES QUE IMPORTA CONHECER

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, tendo presente que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º, n.º 3 todos do Código de Processo Civil (CPC) "ex vi" art. 140º do CPTA.
Mas, sem esquecer o disposto no artº 149º do CPTA nos termos do qual ainda que o tribunal de recurso declare nula a sentença decide do objecto da causa de facto e de direito.
As questões que aqui importa conhecer é se o acórdão recorrido violou os princípios da transparência e da igualdade ao entender que estes foram postos em causa no concurso assim como a portaria 701-H/2008 ao entender que o acto em causa a tinha violado.

O DIREITO

Vem o recorrente sindicar o acórdão sentença recorrido por entender que não foram violados no concurso aqui em causa os princípios da transparência e igualdade, como aquela pressupôs.
A seu ver não existia no procedimento o risco de existirem actuações parciais podendo o decisor apreciar livremente as propostas apresentadas assim como aceitar propostas alternativas que não estivessem de acordo com aspectos vinculados do programa preliminar.
Extrai-se, relativamente a esta questão, do acórdão recorrido:
"À contratação pública são especialmente aplicáveis os princípios da transparência, igualdade e concorrência - art.º 1.º, n.º 4 do CCP.
Por outro lado, e como já decidiu o TCA- norte em 11/8/2010 no Ac. 00853/09.7BELSB, em posição que se acompanha, vigora no direito concursal especiais exigências em matéria de transparência e do respectivo princípio, sendo que a transparência não se realiza apenas através do princípio da publicidade com a divulgação de tudo quanto possa contender ou relevar para os concorrentes se candidatarem e/ou formularem as respectivas propostas. Assim, ocorrerá violação do princípio constitucional da imparcialidade, gerador de vício autónomo de violação de lei, sempre que sejam levados a cabo procedimentos que contenham o risco de consubstanciarem actuações parciais, independentemente da demonstração efectiva de ter ocorrido uma actuação destinada a favorecer algum dos interessados em concurso, com prejuízo de outros.
No caso dos autos, e em fase de esclarecimentos, o R. tinha informado a A. da sua posição relativamente a à adaptação da área de implantação consoante proposta dos concorrentes. Ou seja, "se o concorrente achar que, no todo ou em qualquer parte, o programa preliminar fornecido não é exequível ou que não é a solução que melhor serve os interesses do Dono da Obra, deve e pode propor soluções alternativas, mesmo que estas não estejam de acordo com os aspectos considerados vinculativos. Devendo sempre apresentar as possíveis soluções alternativas de forma a proporcionar ao Dono da Obra a compreensão clara das soluções propostas pelo projectista com base nas indicações expressas no programa preliminar// (...) os aspectos vinculativos devem ser entendidos no seu sentido mais lato, correspondendo às necessidades expressas pelo Dono da Obra, à sua nota de encomenda (...)"
Ora, se é certo que a posição da Administração relativamente àquela questão foi publicitada, designadamente à A., não poderemos afirmar que o entendimento tido pelo R. não contém o risco de consubstanciar actuações parciais. Antes pelo contrário: se os concorrentes podem propor soluções alternativas mesmo que não estejam de acordo com aspectos que a própria Administração considerou vinculados, então estar-se-á a abrir a possibilidade de toda e qualquer solução, que casuisticamente a Administração irá validando de "forma a corresponder " às suas necessidades.
Portanto há violação dos princípios da transparência e da igualdade, pelo que procede a pretensão da A. fundamentada nesta causa de pedir. "
Quid jure?
Não nos parece que a recorrente tenha razão nesta parte.
Senão vejamos.
Está aqui em causa um concurso público para aquisição do "Projecto de Execução para a Construção das Piscinas Municipais do Calvário - Projecto RU 1.1 do Programa de Acção, Parcerias para a Regeneração Urbana (Articular)", classificado como um tipo de contrato de "Aquisição de Serviços.
No caso sub judice apesar de constar do Relatório Preliminar e do caderno de Encargos elementos vinculativos como os pontos 3 dos mesmos ( nomeadamente as áreas no plano da água) o que é certo é que o recorrente informou a recorrida de que "se o concorrente achar que, no todo ou em qualquer parte, o programa preliminar fornecido não é exequível ou que não é a solução que melhor serve os interesses do Dono da Obra, deve e pode propor soluções alternativas, mesmo que estas não estejam de acordo com os aspectos considerados vinculativos. Devendo sempre apresentar as possíveis soluções alternativas de forma a proporcionar ao Dono da Obra a compreensão clara das soluções propostas pelo projectista com base nas indicações expressas no programa preliminar// (...) os aspectos vinculativos devem ser entendidos no seu sentido mais lato, correspondendo às necessidades expressas pelo Dono da Obra, à sua nota de encomenda (...)"
O que não podia, não obstante tal esclarecimento, por estar na plataforma eletrónica, fosse acessível a todos os restantes concorrentes.
Na verdade, não é por a posição da Administração relativamente àquela questão ter sido publicitada, que tal implique a sua admissibilidade.
É que, a aceitação de soluções alternativas pelos concorrentes, mesmo que não estejam de acordo com aspectos que a própria Administração considerou vinculados, implica a possibilidade de toda e qualquer solução, que casuisticamente a Administração irá validando de "forma a corresponder " às suas necessidades, ocorrendo no fundo uma alteração do objecto do concurso.
Ora é permitida a alteração do contrato final nos termos dos artigos 311º e 312º do CCP, o mesmo não acontecendo quanto à alteração das regras procedimentais.
E não se diga que tal actuação se compreende dentro da discricionaridade do Município na análise das várias soluções que esperava fossem apresentadas para a obra a executar nem que os aspectos mesmo designados como vinculativos do programa preliminar deviam ser " entendidos no seu sentido mais lato" já que, tal programa não definia ainda e rigorosamente, uma ideia acabada da administração antes integrando apenas uma visão ou conceito da obra, que seria escolhida e executada apenas e essencialmente de acordo com o projecto que viesse a ser aceite, e elaborado após contrato.
É que, a aceitação de propostas alternativas ao que constava do programa preliminar origina grande liberdade de escolha e com o consequente risco de arbítrio, por ausência de referência obrigatória quanto aos fundamentos da escolha.
O que pressupunha naturalmente uma previsão ab initio a fim de que estivesse devidamente prevista, ponderada e salvaguardada a forma de avaliação da mesma.
Por outro lado, nos termos do art. 49º do CCP " As especificações técnicas...devem constar do caderno de encargos e são fixadas por forma a permitir a participação dos concorrentes em condições de igualdade e a promoção da concorrência".
E, se o art. 50º permite esclarecimentos e rectificação ao mesmo tal não contempla a alteração das regras procedimentais.
Se a recorrente pretendia um concurso de ideias para encontrar a solução mais adequada e com grande escolha de liberdade sobre diversos aspectos para a construção da piscina no referido local tinha à sua disponibilidade o lançamento de um concurso de concepção previsto no art. 219º do CCP.
É que neste tipo de concurso e porque estão em causa elementos subjectivos é exigível o anonimato já que era muito fácil ao júri ser influenciado pelo autoria da proposta.
Pelo que para evitar isso só se sabe quem são os concorrentes em momento posterior quando já não se podem reordenar as propostas.
A principal especificidade deste concurso é a parte subjectiva ser avaliada em sistema de anonimato.
Mas, se vai ao mercado pretendendo um projecto/ideia e a sua execução e se impõe aspectos vinculativos fica sujeita aos mesmos a partir do momento em que estes constam do caderno de encargos, sujeitando todo o procedimento aos mesmos.
São esses aspectos vinculativos que salvaguardam a transparência e a concorrência.
Portanto há violação dos princípios da transparência e da igualdade.
E, a tal não obsta o decidido no Ac. do TCAS 06338/10 de 24-06-2010 donde se extrai:
"Por outro lado, prevê-se que o prazo possa ser prorrogado quando haja lugar, designadamente, a esclarecimentos que não possam ser fornecidos nos prazos legais (n.º 3).
Mas em lado algum do referido diploma se prevê que tais esclarecimentos possam dar lugar ao reinício da contagem do prazo para apresentação das propostas. Aliás, resulta o inverso do disposto no seu art.º 95.º, que dispondo no seu n.º 1 que tal prazo não pode ser inferior a 52 dias (quando haja lugar à publicação no JOCE), expressamente refere que esse prazo se conta "a partir da data do envio para publicação do anúncio a que se refere o artigo 87.º" (n.º 3).
Por outro lado, há que ter presente que tal rectificação, implicitamente introduzida no programa de concurso, não pode ser considerada substancial.
A alteração ou modificação substancial do concurso ou programa de concurso é aquela que descaracteriza a sua concepção inicial, que lhe muda o figurino, a sua própria face, que permite afirmar que se está perante um outro concurso ou programa de concurso diferente do inicialmente delineado.
Ora, no caso presente nada disso sucede. A rectificação operada através do esclarecimento prestado pelo IEFP é de pequena monta, não altera a matriz do programa do concurso e portanto não pode ser encarada como alteração substancial. E não o sendo não se justifica que seja reiniciado o prazo para apresentação das propostas.
É que, como aliás se refere o acórdão recorrido, não obstante o princípio da estabilidade das regras concursais, nada impede a rectificação se determinada por "erros de cálculo (erros aritméticos ou de contagem) e/ou a erros materiais (ou de escrita, o chamado lapsus calami, quando a vontade declarada diverge da vontade real), quando manifestos (cfr. art.° 148.°, n.° 1, do CPA), ou seja, quando revelados no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita (cfr. art.° 249.° do C. Civil)".
Assim, a rectificação do preço mínimo de refeição, constante do programa de concurso, que expressamente refere que tal preço é fixado de harmonia com o CCT aplicável, por divergência entre o preço indicado e o que efectivamente consta do CCT, não constitui alteração substancial do programa de concurso."
Na verdade, este caso é diverso do do caso concreto já que neste está precisamente em causa uma alteração substancial efectuada em sede de esclarecimentos, susceptível de interferir com apropria avaliação das propostas e a natureza do contrato.
Não ocorre, pois, a ilegalidade invocada.

Entende o recorrente que, contrariamente ao decidido, não foi por si violada a Portaria 701-H/2008 já que este normativo não justificou a decisão tomada de atribuir nota inferior ao valor máximo previsto á proposta da autora quanto á justificação do preço proposto.
Na verdade, a nota atribuída à recorrida relativamente ao preço proposto, concretamente á sua justificação, foi correctamente atribuída não devendo ser classificado o concorrente com a nota máxima, já que a simples remissão para uma portaria de cálculo que foi expressamente revogada por não permitir o funcionamento do mercado, não pode, sem mais, justificar o preço proposto.
A justificação deste há-de resultar de factos ou referências concretas do concorrente. Tal como foi explicado, o preço não é analisável com a clareza que a nota máxima exigia.
Decidiu a sentença recorrida que:
"Da avaliação do subfactor " Nota justificativa do preço proposto" e da classificação de 100 da contra interessada "M..."
Não alega a A. qual foi o preço que propôs.
Levanta a questão porque o júri lhe atribuiu a pontuação de 80 fundamentado no facto da A. ter fundamentado a sua proposta com base na tabela de instruções para o cálculo de honorários referentes a projectos de obras públicas na Portaria do MOP de 7/2 já revogada pela Portaria 701-H/2008, de 29/7.
Como consta da al. c) do preâmbulo, esta portaria 701-H/2008 eliminou todos os procedimentos de cálculo e avaliação de honorários.
Como consta da sua "Nota Justificativa de Preço Proposto "O valor dos honorários de projecto das diferentes especialidades foi aprovado em função da estimativa de Custo Geral da Obra, elaborando-se um cálculo com base nas Tabelas para o Cálculo de Honorários, referentes a projectos de Obras Públicas, afectado de um desconto de 50% e arredondamento". Ora, se a Portaria 701-H/2008 eliminou todos os procedimentos de cálculo e avaliação de honorários, então significa que a A. não estava impedida de os justificar em critérios que considerou adequados - pelo que, por esse motivo, não poderia o R. atribuir-lhe apenas a pontuação de 80.
Quid jure?
Parece-nos que a recorrente tem razão nesta parte já que da " nota justificativa do preço proposto " não resulta a violação da Portaria 701-H citada na sentença.
É que, não nos parece que ocorra qualquer erro grosseiro por parte do Júri ao entender que a referência a uma norma já revogada expressamente e em desuso por desadequada, só por si, não permite a fundamentação do preço proposto no sentido da atribuição da pontuação máxima.
Em suma, não foi esta Portaria que fundamentou a pontuação, mas sim a análise que o júri fez das razões ou fundamentos (ou falta deles) que o concorrente indicou ( ou não ) na proposta que apresentou.
Não estando justificado com excelente fundamentação o porquê do preço proposto, é legítimo não atribuir ao concorrente a nota máxima neste item.

Em face de todo o exposto acordam os juízes deste TCAN em negar provimento ao recurso mantendo a sentença recorrida apenas com um dos fundamentos da mesma.
Custas pela recorrente.
R. e N.
Porto, 01/04/2011
Ass. Ana Paula Soares Leite Martins Portela
Ass. José Augusto Araújo Veloso
Ass. Lino José Baptista Rodrigues Ribeiro