Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo:
I - RELATÓRIO 1.1.A A...... S.A., vem interpor recurso de revista, ao abrigo do n.º 1, do artigo 150.º do CPTA, do Acórdão do TCA Sul, de 13-10-2011, que, concedendo provimento ao recurso jurisdicional interposto pela ora Recorrida B......, Lda., revogou, a decisão do TAC de Lisboa, de 11-05-2011, que tinha julgado parcialmente procedente a acção de contencioso pré-contratual onde se pedia "a anulação do acto de adjudicação" à Sociedade ora recorrida, "do contrato de prestação de fornecimento de refeições em refeitórios escolares, decorrente do concurso público nº 1/ASE/2010, a exclusão da proposta da adjudicatária, a adjudicação do contrato" à ora Recorrente "e caso tenha sido ou venha a ser celebrado o contrato, a anulação do mesmo" - cfr. fls.306 -, acabando o TCA por absolver o Ministério de Educação dos pedidos contra ele formulados. No tocante à admissão da revista, a Recorrente refere, nas conclusões das suas alegações, nomeadamente, o seguinte: "A. As questões suscitadas nos autos são de importância fundamental, do ponto de vista da sua complexidade e relevância jurídica e social. B. a intervenção do Supremo Tribunal Administrativo justifica-se para uma melhor aplicação do direito, uma vez que o acórdão recorrido revela um flagrante erro na aplicação do direito, em manifesta disparidade com o entendimento da 1.ª instância. C. Estão preenchidos os pressupostos tipificados na lei para a admissão do presente recurso, nos termos do artigo 150º do CPTA. (...)" - cfr. fls. 524-525. 1.2. Por sua vez, a ora Recorrida, B......, Lda., contra-alegou, pronunciando-se pela não admissibilidade do recurso de revista, salientando, designadamente, nas conclusões das suas alegações, o seguinte: "(...) B) O que está em causa no presente recurso, não é, como a Recorrente pretende fazer crer, questões de elevada relevância social ou mesmo com qualquer complexidade jurídica fora do normal; C) Resulta das suas alegações que a Recorrente pretende a simples reapreciação do mérito dos autos; D) Porém, o CPTA não admite uma terceira instância de julgamento uma vez que o recurso de revista não é um mero recurso ordinário, mas antes uma recurso excepcional; E) A questão decidenda não tem relevância jurídica ou social na medida em que a solução encontrada pelo TCA Sul enquadra-se numa das juridicamente plausíveis e não terá aplicação fora do caso dos autos; F) Não está em causa a possibilidade de derrogação do art.º 60.º, n.º 3 do CCP por parte de qualquer norma concursal, mas antes e apenas a sua aplicabilidade ao caso dos autos, por falta de preenchimento dos respectivos requisitos; G) Pelo que a apreciação das questões suscitadas não ultrapassaria significativamente os limites do caso concreto; H) A solução das questões a apreciar não apresenta um grau de dificuldade superior à média, no que ao esforço interpretativo diz respeito, pelo que carecem de relevância social ou jurídica; I) A questão decidenda não foi erradamente decidida pelo TCA Sul, de forma que justificasse a intervenção do STA para uma melhor aplicação do direito; J) Razões por que não deve a presente revista ser admitida. (...)"- Cfr. fls. 575-576. 1.3. Cumpre decidir.
2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. O recurso de revista a que alude o n.º 1, do artigo 150.º do CPTA, que se consubstancia na consagração de um duplo grau de recurso jurisdicional, ainda que apenas em casos excepcionais, tem por objectivo facilitar a intervenção do STA naquelas situações em que a questão a apreciar assim o imponha, devido à sua relevância jurídica ou social e quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito. Por outro lado, se atendermos à forma como o Legislador delineou o recurso de revista, em especial, se olharmos aos pressupostos que condicionam a sua admissibilidade, temos de concluir que o mesmo é de natureza excepcional, não correspondendo à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, na medida em que das decisões proferidas pelos TCA's em sede de recurso não cabe, em regra, recurso de revista para o STA. Temos assim, que de acordo com o já exposto, a intervenção do STA só se justificará em matérias de maior importância sob pena de se generalizar este recurso de revista o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os fins obtidos em vista pelo Legislador (cfr., a "Exposição de Motivos", do CPTA). Vejamos, então. 2.2. Na sua decisão, de 11-05-2011 o TAC de Lisboa julgou parcialmente procedente a acção de contencioso pré-contratual, considerando, desde logo, procedente "o pedido de anulação do acto de adjudicação, na medida em que, como ficou enunciado, assentou numa interpretação da proposta de preço não consentida pelo CCP, designadamente, pelos arts. 51º e 60º, e, ao proceder a tal interpretação, aceitou uma proposta que deveria ter sido excluída, nos termos do disposto no art. 70º/2/b do CCP, por não respeitar o disposto o ponto 1.3.1 do art. 11º do PC", já, quanto, ao pedido de exclusão da proposta apresentada pela ora Recorrida referiu que "(...)não se afigurando, para já, que a referida proposta, assim interpretada, padeça de algum dos vícios nos quais a Autora assentou o pedido de exclusão daquela proposta, que assim improcede", por último, e relativamente, ao pedido de condenação na prática de um acto que adjudique o fornecimento à Autora, considerou que "(...) a pronúncia condenatória, no caso, não pode ir além da condenação da Demanda a reavaliar as propostas de acordo com o critério de adjudicação previsto no PC, interpretando a proposta da B...... de acordo com o disposto no art.º 60º do CCP, ou seja, considerando o valor previsto no anexo B2 e, caso a tal nada mais obstar, proceder à adjudicação do fornecimento à proposta da Autora" -cfr. fls. 322-324. O TCA Sul, diferentemente, concluiu, não haver divergência "entre o anexo B1 e o anexo B2, pelo que a questão da incompatibilidade entre o artº 60.3 do CCP e o caderno de encargos não se põe, sendo aqui inaplicável a referida disposição legal". Salientou, também, que "entendeu a sentença recorrida que a interpretação do júri não dava cumprimento ao disposto no ponto 1.3.1. do artº 11 do PC, segundo o qual o preço unitário por refeição deve corresponder a pelo menos 50% de matéria prima alimentar", ora, "constando da proposta da recorrente € 1,24 por refeição, constando do anexo B1 que 0,62 eram de matéria alimentar e 0,62 correspondiam a encargos com pessoal, é evidente que a simples menção de € 30,00 no anexo B2, quando inserida num universo de € 13.775.549,00 não pode ter como consequência a interpretação de que a regra de metade da despesa ter de ser com a alimentação não foi cumprida, tanto mais não seja por força do princípio da proporcionalidade (...)". - cfr. fls. 460 Já a Recorrente discorda do decidido no Acórdão do TCA Sul nos termos que explicita na sua alegação de recurso. Sucede que, no caso em apreço, não se evidencia que a decisão do TCA enferme de erro grosseiro, antes se apresentando como uma das soluções plausíveis em face do quadro factual apurado, o que, de per si, afasta a possibilidade de fazer ancorar a admissão da revista numa hipotética necessidade de melhor aplicação do direito. Por outro lado, temos que a resolução das questões apreciadas no Acórdão recorrido não envolveu a realização de operações lógico-jurídicas de especial complexidade, não se afastando do que é usual nas controvérsias judiciárias, não suscitando dúvidas interpretativas assinaláveis, como que bem se patenteia pela análise do discurso argumentativo adoptado no Acórdão do TCA, o que tudo nos leva a concluir no sentido de as questões levantadas pela Recorrente em sede de revista se não apresentarem como especialmente relevantes em termos jurídicos. Finalmente, também não deparamos com questões de particular relevo social, na medida em que a resolução do presente pleito assentou fundamentalmente em circunstâncias próprias do clausulado no Programa de um específico concurso, não apresentando, na situação dos autos, um interesse objectivo para a aclaração do quadro legal susceptível de vir a colocar-se em muitos outros casos similares, não tendo, por isso, repercussão social que torne claramente necessária a intervenção do STA em revista excepcional. É, assim, de concluir pela não verificação dos pressupostos de admissão do recurso de revista.
3 - DECISÃO Nestes termos, acordam em não admitir o recurso de revista do Ac. do TCA Sul, de 13-10-2011. Custas pela Recorrente. Lisboa, 5 de Janeiro de 2012. - José Manuel da Silva Santos Botelho (relator) - Rosendo Dias José - Luís Pais Borges.
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